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Modelos de Atencao a Saude no Brasil nov 3 11 20h

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Capítulo 4 - Modelos de Atenção à Saúde no Brasil
Célia Regina Rodrigues Gil. Doutora em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Oswaldo Cruz. Professora Adjunta do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Londrina.
Sayuri Tanaka Maeda. Doutora em Enfermagem pela Universidade de São Paulo. Professora Assistente do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da Universidade de São Paulo. 
Pontos a Aprender
Ao final deste capítulo espera-se que o leitor compreenda:
1) Os contextos brasileiro onde se entrelaçam fatores que determinam os modelos de atenção à saúde. 
2) Os conceitos de Modelo de Atenção à Saúde na perspectiva da cidadania. 
3) As singularidades dos contextos da Atenção Primária, Atenção Básica e Saúde da Família no Brasil.
 4) A influência dos modelos Ação Programática, Vigilância da Saúde e Em Defesa da Vida na construção da Atenção Primária e da Saúde da Família. 
5) As Redes de Atenção à Saúde e as possibilidades do cuidado integral. 
Palavras-chave: 
Modelos de Atenção. Atenção Primária à Saúde. Atenção Básica. Redes de Atenção à Saúde. Sistema Único de Saúde. 
Estrutura dos Tópicos:
Introdução. A Reforma Sanitária Brasileira e as mudanças do modelo assistencial. Conceito de modelo de atenção. Modelo Assistencial e Modelos de Atenção à Saúde. A Reforma Sanitária Brasileira e os Conceitos de Atenção Primária, Atenção Básica e Saúde a Família. A influência dos modelos de Ações Programáticas, Vigilância da Saúde e Em Defesa da Vida e suas contribuições ao processo de mudança dos modelos. As Redes de Atenção como perspectiva da integralidade do cuidado. Considerações finais. Resumo. Propostas de estudo. Referências bibliográficas. Para saber mais.
INTRODUÇÃO
	Para melhor compreender os fatores que se entrelaçam na construção dos modelos de atenção à saúde no Brasil é importante contextualizar a realidade do nosso país. O Brasil é um país de dimensão geográfica continental e dados apresentados pelo IBGE mostram um expressivo número de municípios — 5.565, sendo que destes, 48,1% (2.676) têm população inferior a 10 mil habitantes e cerca de 90% do total de municípios (5.003) têm população de até 50 mil revelando um país formado por um expressivo conjunto de municípios de pequeno porte distribuídos nos 26 estados e no distrito federal da união. Com população de 50 a 100 mil habitantes estão 5,6% dos municípios (309), com mais de 100 e até 500 mil, 3,9% (219) e com mais de 500 mil, apenas 0,6% (34)1. 
Quadro 1 ─ Distribuição dos municípios brasileiros por faixa populacional e região. Brasil, 2011.
	População/Região
	Norte
	Nordeste
	Centro-
Oeste
	Sudeste
	Sul
	Total
Nº %
	Até 10 mil habitantes
	182
	663
	269
	826
	736
	2676 48,1
	De 10 até 50 mil habitantes
	219
	997
	165
	612
	354
	2327 41,8
	De 50 até 100 mil habitantes
	31
	103
	19
	103
	53
	 309 5,6
	De 100 até 500 mil habitantes
	15
	41
	9
	111
	43
	 219 3,9
	Mais de 500 mil habitantes
	2
	10
	4
	16
	2
	 34 0,6
	TOTAL
	449
	1793
	466
	1668
	1188
	5565 100
 Fonte: IBGE – Estimativa Populacional, 2009.
Da mesma forma, ao se pensar nas cinco grandes regiões brasileiras fica evidente a diversidade socioeconômica política e cultural entre elas, dando características singulares a cada região do país. De acordo com os Indicadores e Dados Básicos para a Saúde — IDB 2003, a mortalidade infantil no país varia de 16/1000 nascidos vivos na região sul até 43/1000 nascidos vivos na região nordeste. Por sua vez, a proporção de pobres — percentual da população com renda familiar per capita de até meio salário mínimo, varia de 19% nas regiões centro-oeste e sul até 53% na região nordeste2.
O Índice de Gini indicador que mede de 0 a 1 a distribuição de renda entre a população mais pobre e a mais rica (0 significa completa igualdade e 1 completa desigualdade) mostra que em 2004, o Brasil aparece com um índice de 0,580. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 2006), o Brasil é o 10º país mais desigual numa lista de 126 países e territórios, estando melhor apenas que a Colômbia, Bolívia, Haiti e seis países da África Subsaariana. Estes dados evidenciam parte do retrato das desigualdades que caracterizam o país e que se refletem, conseqüentemente, na situação de saúde da população e na forma como são organizados, ofertados e mantidos os serviços nas diferentes regiões e suas localidades3,4. 
Por fim, cabe considerar ainda que a organização intergovernamental vigente no país, a de Estado Federativo em que cada esfera de governo (união, estados e municípios) tem autonomia de poder, é um sistema político complexo tanto do ponto de vista conceitual quanto do ponto vista do funcionamento efetivo do sistema. Por sua vez, a Assembléia Nacional Constituinte de 1988 redefiniu o arranjo federativo no país transferindo significativa capacidade decisória, funções e recursos da união para estados e, principalmente, para municípios5. 
Estes dados apresentados acima ajudam a compreender a complexidade dos processos de negociação, pactuação e coalizão em torno das deliberações e tomadas de decisão quando estão envolvidos os estados, o distrito federal e os municípios, todos com autonomia e responsabilidades compartilhadas de poder. Demonstram também as dificuldades que nosso país encontra para a implementação de políticas públicas principalmente na perspectiva do fortalecimento da democracia e consolidação das políticas sociais, como é o caso do SUS.
Portanto, é neste contexto que se inserem as reflexões sobre os modelos de atenção à saúde e é importante considerá-lo na análise sobre os modelos de atenção à saúde. 
CONCEITO DE MODELOS DE ATENÇÃO 
Modelos de atenção à saúde são combinações tecnológicas estruturadas para a resolução de problemas e para o atendimento das necessidades de saúde da população, sejam elas individuais ou coletivas. Os modelos podem ser concebidos por meio de normas, padrões e referências para o campo técnico-científico, para orientar escolhas técnicas, decisões políticas e financiamentos. Concisamente, são as formas de organização tecnológica do processo de prestação de serviços de saúde que resultam do estabelecimento de intermediações entre o técnico e o político6. 
Portanto, refletir sobre modelos de atenção é refletir sobre as políticas públicas. Este é um campo de conhecimento interdisciplinar que busca analisar as ações impulsionadas pelo governo e que situa diversas partes do conhecimento em totalidades organizadas, configurando um território de várias disciplinas comportando teorias, metodologias e modelos analíticos. Nesses diversos olhares, as políticas públicas desenhadas e formuladas desdobram-se em planos, programas, projetos, bases de dados, sistema de informação e pesquisas. A formulação de políticas públicas constitui-se no movimento de transformação dos propósitos em ações que produzirão mudanças no mundo real7.
O SUS adquiriu status de uma das mais importantes políticas públicas governamentais com as Leis Orgânicas da Saúde. A partir daí houve muitos desdobramentos a fim de traduzir seus propósitos legais em recursos operacionalizáveis incluindo, necessariamente, aspectos políticos, econômicos e sociais, estruturados com tecnologias apropriadas ao contexto das práticas de cuidado à saúde, em especial na atenção básica. No entanto, vários foram os contextos do setor saúde no Brasil antes do advento do SUS e é importante destacar nos distintos tempos e políticas de saúde as principais características que delinearam os principais modelos até se alcançar a expansão da ação estatal no setor saúde. 
A REFORMA SANITÁRIA BRASILEIRA E AS MUDANÇAS DO MODELO ASSISTENCIAL	
Muitas foram as lutas para se chegar à conquista de criação e instituição do SUS e, para muitos autores e pesquisadores, o SUS representa um grande avanço sociopolítico e institucional, principalmente ao se considerar a realidade acimadescrita do nosso país.
	As discussões sobre a necessidade de mudanças do modelo assistencial ganharam força no final dos anos 70 com a emergência do movimento da Reforma Sanitária Brasileira. A crítica ao modelo de saúde dominante no Brasil, altamente centralizado, fragmentado e restrito às ações curativas apontava a necessidade de profundas transformações, evidenciando a necessidade da descentralização dos serviços, humanização do atendimento e da atenção integral garantindo o acesso à saúde para toda a população. 
Cabe ressaltar que do início do século passado até meados da década de 1970, de modo bastante resumido, a política de saúde passou por distintos períodos e modelos de assistência. O período compreendido do início do século XX até 1929 (Primeira República), caracterizado pela economia agro-exportadora e tendo o café como um dos principais produtos de exportação originou na saúde pública, o modelo sanitarista campanhista voltado essencialmente ao controle das endemias. A assistência à saúde individual era prestada quase que exclusivamente de forma privada, excluindo o acesso de grande parte da população que não podia pagar por estes cuidados, restando-lhes os serviços filantrópicos de caridade6,8. 
O momento seguinte, compreendido entre aproximadamente 1920 a 1945, não marca grandes transformações na saúde pública que continua voltado ao combate das doenças endêmicas e, na assistência individual começa a se delinear o modelo médico assistencial previdenciário com as Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPS) e os Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP) e que ganhará força no período seguinte6,8. 
De 1945 até meados da década de 1970 vários acontecimentos agravam as condições sociais da população brasileira, em decorrência do período pós-guerra, da acelerada urbanização, do assalariamento de parcelas crescentes da população e da reivindicação por assistência médica e benefícios sociais. Com o golpe militar de 1964 e a intervenção do Estado nos institutos (IAP), ocorre a unificação dos mesmos com a criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). Do ponto de vista de saúde pública, este novo quadro substitui a ênfase na prevenção das doenças endêmicas pelas doenças de massa agravadas pelas condições de vida e de trabalho e, na saúde individual, cresce o modelo médico privatista centrado na assistência médica, nas práticas curativas altamente especializadas e fragmentadas, no cuidado individual e na organização voltada ao complexo médico-hospitalar8,9. 
É no final da década de 1970 que cresce a discussão em torno da necessidade de mudanças dos modelos de assistência à saúde praticados no Brasil que, além de excludentes, primavam pela dicotomia entre as ações preventivas e curativas. Este debate ganha expressão por meio de um movimento nacional suprapartidário composto por intelectuais, lideranças políticas, profissionais e dirigentes de saúde e por representantes da sociedade civil organizada que se articularam em torno desta temática configurando o movimento pela Reforma Sanitária Brasileira (RSB)10. 
Cabe ressaltar que no final dos anos 70, vários municípios brasileiros implantam serviços de saúde organizados na perspectiva da descentralização do sistema. Campinas, Londrina, Niterói e Montes Claros, entre outros, são exemplos de municípios pioneiros na estruturação dos primeiros serviços municipais de saúde sob esta nova lógica. A grande contribuição que trouxeram ao contexto da RSB foram os resultados advindos destas novas formas de organização dos serviços com impactos positivos nos indicadores de saúde e na cobertura à população desprovida de acesso aos serviços de saúde10. Naquele período, em âmbito mundial, ocorre a Conferência Internacional de Alma-Ata (1978) que traz para o centro de discussão a Atenção Primária à Saúde (APS) como proposta de reordenamento dos sistemas de saúde11. 
No transcorrer da década de 1980 vários acontecimentos contribuíram favoravelmente para o crescimento de experiências estaduais e municipais de saúde. Com a severa crise econômica da Previdência Social o modelo assistencial predominante revela sua ineficiência e ineficácia por meio dos altos gastos com a prestação de serviços e da baixa qualidade dos mesmos. Decorrente disso surge oportunidades de reorganização do sistema por meio das Ações Integradas de Saúde (AIS) e do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), ambas as propostas voltadas à descentralização fortalecendo a perspectiva de municipalização dos serviços e de mudança do modelo assistencial9. 
Em 1986 ocorre a VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS) que foi um marco de referência para as mudanças no setor saúde. Ao propugnar a saúde como direito de todos e dever do Estado, esta conferência reafirma e consolida as propostas do movimento sanitário brasileiro e amplia o conceito de saúde conferindo-lhe o caráter de direito de cidadania12. 
Com a criação do SUS na Constituição de 1988 e sua instituição pelas Leis Orgânicas da Saúde nº 8080/90 e nº 8142/90 ficam assegurados os princípios que devem reger a organização do sistema de saúde brasileiro, a saber: descentralização, equidade, integralidade, participação da população e universalização13. 
	Como é possível observar, a necessidade de mudanças do modelo de atenção à saúde tem sido reiteradamente discutida no Brasil antes inclusive da criação do SUS, numa perspectiva de se criar um sistema de saúde que efetivamente valorize as ações de promoção da saúde e de prevenção das doenças articulados com a atenção, recuperação e reabilitação das pessoas na perspectiva da integralidade do cuidado e do acesso aos serviços. Estes pressupostos são identificados como vetores capazes de produzir impacto positivo na construção de novos modelos, superando o anterior que permanece amalgamado na supervalorização da doença, das práticas da medicina curativa, especializada e hospitalar e que induz ao excesso de procedimentos tecnológicos e medicamentosos e, sobretudo, à fragmentação do cuidado em saúde14. 
Portanto, a década de 1980 termina com muitos avanços para a saúde pública brasileira, em especial para o nível primário de atenção que ganha nova visibilidade no contexto brasileiro com a perspectiva de ampliação do acesso da população a estes serviços. A instituição do arcabouço jurídico-legal do SUS no início dos anos 90 fortalece esta tendência e inaugura a operacionalização do sistema por meio de normas, leis e decretos que visam assegurar o cumprimento dos princípios e diretrizes do SUS na lógica das mudanças do modelo de atenção. 
Da mesma forma, a implantação do Programa Saúde da Família em 1994 com diferentes tipos de incentivos operacionais e financeiros aos municípios contribui para a ampliação do acesso e da descentralização das ações de saúde e inaugura novas reflexões sobre o modo de fazer saúde e a necessidade de mudanças das práticas profissionais e institucionais14. 
No final da década de 1990 e início dos anos 2000, a acelerada expansão da Saúde da Família torna-se uma das principais estratégias de reorientação do modelo contribuindo para a inauguração de um novo cenário nacional de organização dos serviços. Contudo, ainda que com os incentivos e o crescimento de número de equipes, da cobertura populacional, da criação dos mecanismos de apoio tanto para a formação de profissionais (cursos de especialização e residências) e prestação do cuidado multiprofissional e interdisciplinar (Núcleos de Apoio à Saúde da Família – NASF), ainda são grandes os desafios para a superação do modelo de saúde ainda hegemônico no país14. 
MODELO ASSISTENCIAL OU MODELO DE ATENÇÃO À SAÚDE?
	 Esta pergunta é recorrente nos debates e reflexões sobre modelos. Embora não haja estudos que apontem diferenças conceituais sobre estes dois termos, há referências empíricas que evidenciam a necessidade de aprofundamento desta reflexão à luz da luta pela saúde como direito de cidadania. 
	 Ao se consultar o dicionário Aurélio, encontra-se por “assistência” os seguintessignificados: proteção, amparo, arrimo; auxílio, ajuda; socorro médico; benefício concedido àqueles que não podem demandar ou defender-se por falta de meios econômicos; serviços gratuitos de naturezas diversas que o Estado presta aos membros da comunidade. Da mesma forma, encontra-se como definição do termo “atenção” a aplicação cuidadosa da mente a alguma coisa, concentração, reflexão, aplicação; ato ou palavras que demonstram consideração; recomendação.	Pode parecer num primeiro momento pouco significante este jogo de palavras, mas, ao contrário, elas demonstram uma racionalidade subjacente que permeia a luta e conquista da saúde como direito de cidadania. 
		Se modelo assistencial ou modelo de atenção é o modo como são organizadas, em uma dada sociedade, as ações de atenção à saúde, envolvendo os aspectos tecnológicos e assistenciais e é a forma de organização e articulação entre os diversos recursos físicos, tecnológicos e humanos disponíveis para enfrentar e resolver os problemas de saúde de uma coletividade15, cabe aprofundar o significado destas terminologias à luz da Constituinte.
	O processo de implantação do SUS veio acompanhado de muitas reflexões sobre os caminhos que melhor estruturassem o sistema dentro dos seus princípios finalísticos e diretrizes estabelecidas. Uma das importantes reflexões refere-se ao direito de cidadania que desde a VIII Conferência Nacional de Saúde está presente na agenda da Reforma Sanitária Brasileira e que, apesar de assegurada pela Constituição de 1988, requer amplas mudanças sociais, políticas, econômicas e culturais no país para sua efetivação16. 
No Brasil, a dívida política marcada pelo autoritarismo que dominou o país por duas décadas, deixou importantes seqüelas que estão refletidas na fragilidade do processo de democratização da sociedade e de luta pela conquista de políticas sociais mais estáveis e duradouras que atendam ao bem-estar da população. O direito de cidadania não está incorporado ao cotidiano dos indivíduos e famílias que ainda necessitam lutar pela sua sobrevivência mais do que por seus direitos humanos14. 
O direito à cidadania ainda é visto como privilégio de poucos e concessão do Estado e, ainda, os direitos dos cidadãos aparecem como benesse, sujeitos ao controle de uma burocracia que, por meio de normas, estabelece quem tem ou não direitos, configurando assim o que se denomina de “cidadania regulada”, evidenciando a existência de fragilidades do acesso aos direitos de cidadania que estão fortemente presentes no contexto brasileiro9,17. 
Diante dessas reflexões e das bases de criação do SUS, aos poucos o termo modelo assistencial vem sendo substituído por modelo de atenção à saúde por se entender que a denominação “assistencial” traz, em seu bojo, a representação de cidadania considerada como dádiva, como benevolência ou favor e não como direito de cidadania e responsabilidade do Estado em garantir o acesso aos serviços públicos por meio de políticas sociais consistentes, duradouras e de boa qualidade. 
Da mesma forma, considerando as diferentes realidades regionais brasileiras o termo modelo ganhou pluralidade e cada vez é mais comum falar-se em modelos de atenção na perspectiva de que o SUS, por meio de seus princípios e diretrizes, constitui-se em um referencial ideológico norteador da organização dos serviços de saúde. 
Portanto, no contexto da Reforma Sanitária Brasileira, quando se fala em mudança do modelo de atenção à saúde é importante compreender que esta mudança é relativa ao modelo ainda hegemônico no Brasil, ou seja, o modelo centrado nas ações médico-curativas, excessivamente especializado, de alto custo e baixa resolutividade, com ênfase no cuidado fragmentado e no ambiente hospitalar e, portanto, não estruturado, não centrado no cidadão. 
O modelo idealizado para o SUS é o oposto haja vista que preconiza a integralidade do cuidado, a garantia do acesso, a regionalização e descentralização dos serviços, as ações humanizadas e resolutivas de saúde e voltadas às necessidades de toda a população por meio de ações de planejamento e avaliação que respeitem as diferentes necessidades e problemas de saúde locais e regionais13. Para tanto, requer um processo de luta política e social visando garantir avanços em direção às mudanças pretendidas. 
Desta forma, há que se reconhecer que para mudar a lógica do modelo hegemônico faz-se necessário promover mudanças também no lócus de prestação do cuidado, buscando intervir nos problemas de saúde de forma mais precoce e longitudinal, ou seja, com possibilidades de acompanhamento dos indivíduos em seus contextos familiares e territoriais. Nesse sentido, a organização da rede básica de saúde representa uma oportunidade de acúmulo de forças em direção à própria consolidação dos princípios e diretrizes do SUS. 
 
A REFORMA SANITÁRIA BRASILEIRA E OS CONCEITOS DE ATENÇÃO PRIMÁRIA, ATENÇÃO BÁSICA E SAÚDE DA FAMÍLIA 
Pode-se considerar como o marco zero da descentralização dos serviços de saúde no Brasil o final da década de 1970, quando são inauguradas as primeiras experiências municipais que se espelharam, pouco depois, na Atenção Primária à Saúde (APS). Desde então, na trajetória da descentralização dos serviços de saúde no Brasil, os conceitos de Atenção Primária e, posteriormente, de Atenção Básica e de Saúde da Família, foram incorporados paulatinamente ao cenário da RSB14,18. 
No período anterior à criação do SUS, a APS representava um marco referencial para a organização dos serviços, sendo considerada como uma das principais alternativas de mudança do modelo assistencial. Por sua vez, desde a criação do SUS e do desenvolvimento de seus mecanismos financeiros e operacionais, percebe-se que ora se utiliza o termo Atenção Básica, ora Atenção Primária. 
A gênese da Atenção Primária à Saúde encontra-se nas formulações de Bertrand Dawson (Inglaterra) quando, no início do século XX, Abraham Flexner propõe, nos EUA, um modelo polarizado de atenção à saúde, no qual, de um lado, estava o médico da comunidade, cuja formação deveria ser generalista para atuar nas pequenas cidades americanas e, de outro, o médico especialista cuja formação deveria ser mais qualificada para atender nos hospitais, apontando, nesta proposição, uma superioridade dos médicos especialistas sobre os generalistas. Em contraposição, Dawson, por meio de uma consistente crítica a este modelo, propõe um sistema de saúde integrado, organizado por níveis de complexidade crescente, com serviços regionalizados e realizados, basicamente, por médicos de formação generalista14,19,20. 
Os sistemas de saúde da Inglaterra, Canadá, Cuba e Espanha têm, nos serviços de Atenção Primária, a porta de entrada promovendo cuidados primários contínuos para toda a população atuando integradamente aos demais componentes do sistema. Neles, a APS constitui a base do sistema que é universal, gratuito e público21.
Nos anos de 1950, numa escala mundial, devido ao aumento generalizado dos gastos com saúde decorrentes da demanda crescente por serviços cada vez mais especializados, aumento das internações hospitalares, elevação contínua dos custos da assistência devido ao envelhecimento e aumento da expectativa de vida da população, baixa qualidade da relação médico-paciente e falta de acesso da população aos serviços de saúde, generaliza-se uma crise setorial16. Para superá-la, uma das estratégias internacionais foi a realização, em 1978, da Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde — Conferência de Alma Ata, sob auspícios da Organização Mundial de Saúde e do Fundo das Nações Unidas para a Infância, na qual a Atenção Primária à Saúde torna-se uma referência para a organização dos serviços.
O Relatório de Alma Ata reafirma um conjunto de preceitos essenciais para a reorganização dos serviços, tais como: saúde como direito humano fundamental; responsabilidade dos governos pela saúde de sua população; adequação tecnológica, porta de entrada do sistema, universalidade, participação da comunidade, acessibilidade;racionalidade nos custos e continuidade no processo de assistência; e construção dos sistemas a partir dos principais problemas de saúde, educação em saúde, serviços de promoção, prevenção, cura e reabilitação, intersetorialidade e articulação com serviços de referência11.
No Brasil, o referencial proposto em Alma Ata da Atenção Primária à Saúde não só inspirou e fortaleceu as primeiras experiências empíricas de implantação dos serviços municipais de saúde como trouxe aportes conceituais e práticos para a organização dos serviços. Na década de 1980, vários fatores que contribuíram para a descentralização do sistema na perspectiva da APS. Entretanto, naquele período vivia-se a discussão sobre o como descentralizar os serviços de atenção médica do então Instituto Nacional de Assistência Médica Previdenciária e Social (Inamps) por meio das Ações Integradas de Saúde (AIS). Por um lado, havia experiências de organização dos serviços de atenção primária, centrados no papel dos médicos generalistas, no trabalho em equipe, nas patologias delegadas aos enfermeiros e auxiliares e nas ações de prevenção das doenças. Por outro lado, havia o debate sobre a incorporação das especialidades médicas básicas nas Unidades de Saúde - da Pediatria, da Ginecologia e Obstetrícia e da Clínica Geral como forma de ampliar o acesso, tornar os serviços mais efetivos e aumentar a cobertura destas especialidades nos grupos mais vulneráveis da população, principalmente crianças e mulheres na fase reprodutiva. Ao final, o que predominou na organização dos serviços foi um mix de ambos os modelos, mas com perda significativa para o processo de valorização do médico generalista, do papel do enfermeiro e do trabalho em equipe em relação às atividades clínico-assistenciais no âmbito dos serviços municipais de saúde14. 
As reformas decorrentes da reorganização da política nacional de saúde a partir das Ações Integradas de Saúde não tiveram um impacto suficiente para melhorar a qualidade dos serviços oferecidos à população. Elas transformaram a função e o papel das secretarias estaduais, das regionais de saúde e dos municípios, mas, do ponto de vista do modelo de atenção, estas reformas não quebraram a hegemonia do projeto privado nem a predominância do enfoque curativo e medicalizante22. 
A década de 1990 começa com algumas conquistas no plano político brasileiro – a recém aprovação da Constituição Federal trazendo avanços na esfera social e a eleição direta para presidência da República. Também inicia com a formulação das leis infraconstitucionais do SUS, editadas em dezembro de 1990 (Leis Nº. 8.080/90 e Nº. 8.142/90). Estas leis instituem o SUS de acordo com a concepção da saúde como um Direito Universal proposto na Constituinte e, portanto, como uma condição de cidadania17,18. 
Naquele momento, os textos da Constituinte, das Leis 8.080 e 8.142 e das Normas Operacionais Básicas (NOB 91 e 92) não fazem qualquer referência ao desenho de modelo de atenção à saúde para nortear os municípios na estruturação dos seus sistemas de saúde e do papel dos estados neste processo. Não há qualquer indicativo sobre as ações específicas a serem asseguradas pelo SUS nos diferentes níveis de complexidade do sistema: primário (ou básico), secundário (ou especializado) e terciário (ou hospitalar). Neles, tampouco, há uma orientação explícita definindo o rol das ações de saúde de competência de cada nível. As ações explicitamente citadas são as de vigilância sanitária, vigilância epidemiológica, saúde do trabalhador, alimentação e nutrição e saneamento básico. Da mesma forma, não há citação sobre atenção primária ou atenção básica nem atividades correlatas, como responsabilidade do primeiro nível de atenção. 
O uso da terminologia “Atenção Básica” parece surgir a partir dos documentos oficiais com a NOB/96, a criação do Piso Assistencial Básico (PAB) e das novas modalidades de gestão. Do ponto de vista do modelo de atenção, é nela que encontram-se as primeiras citações sobre a necessidade de mudança do modelo de atenção à saúde apontando o Programa Saúde da Família como alternativa estratégica para a organização dos serviços básicos14.
A instituição do PAB em suas modalidades – PAB fixo e variável é que define, pela primeira vez, recursos a serem repassados aos municípios contemplando as ações básicas já desenvolvidas (ou a ser desenvolvidas) pelos municípios, mediante financiamento per capita (PAB fixo) e por incentivos específicos às áreas consideradas estratégicas para a Atenção Básica (PAB variável) como os programas de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), de Saúde da Família (PSF); de Combate às Carências Nutricionais; a Farmácia Básica e as Ações Básicas de Vigilância Sanitária. E ainda, assegura incentivos à execução de experiências inovadoras nos serviços municipais com aumento de transferências de recursos federais para estados e municípios, estimulando a expansão dos Programas de Saúde da Família e de Agentes Comunitários de Saúde e a organização de redes de referência em vários municípios e estados22.
 Ao que parece, a NOB 96 é a que dá um novo impulso à configuração de um novo modelo de organização dos serviços de saúde ao prever, pela primeira vez desde a implantação do SUS, recursos exclusivos para o financiamento da Atenção Básica assim como o que já existia na assistência ambulatorial de média e alta complexidade. Desta forma, a Atenção Básica deixa de ser apenas um conjunto de procedimentos da tabela SIA/SUS (ações básicas) presentes nas Normas Operacionais Básicas anteriores, passando gradativamente a representar um nível de organização dos serviços de saúde no SUS. Neste momento, pode-se dizer que ocorre uma equivalência entre os conceitos de atenção básica e de atenção primária em saúde22,23. 
O próprio Ministério da Saúde deixa lacunas sobre esta questão em seus documentos orientadores. Como exemplo, o Manual da Atenção Básica24, documento produzido como orientador a todos os municípios reitera que a organização da Atenção Básica tem como fundamentos os princípios do SUS, ou seja, Saúde como Direito, Integralidade da Assistência, Universalidade, Eqüidade, Resolutividade, Intersetorialidade, Humanização do Atendimento e Participação. E ainda, torna mais explícita a responsabilidade dos sistemas municipais de saúde, tanto na gestão dos serviços como na atenção às pessoas. No entanto, no que se refere ao redirecionamento do modelo de atenção à saúde, propugna que deve ser “transformado em um modelo de atenção centrado na qualidade de vida das pessoas e do seu meio ambiente, bem como na relação da equipe de saúde com a comunidade, especialmente com os seus núcleos sociais primários - as famílias” (p.10). Mais adiante, neste mesmo documento, aponta a Saúde da Família como a estratégia da Atenção Básica na construção de um modelo de saúde mais resolutivo e humanizado. Neste documento é perceptível a ausência de qualquer referência à Atenção Primária à Saúde.
No ano de 2000, o Ministério da Saúde edita o documento “O Trabalho do Agente Comunitário de Saúde” – Manual do ACS25, e neste documento observa-se um resgate histórico da Conferência de Alma Ata e dos conceitos de Atenção Primária e cuidados primários de saúde. Ao tratar da Atenção Básica à Saúde, apresenta os termos atenção primária, assistência primária, ações do primeiro nível de assistência e atenção básica como sinônimos e, ao mesmo tempo, ao discorrer sobre o PACS e o PSF volta a fazer referências à atenção básica. 
Mais recentemente, em 2006, é editado o Pacto pela Saúde composto por três dimensões: Pacto pela Vida, Pacto em Defesa do SUS e Pacto de Gestão. Este Pacto apresenta propostas de importantes mudanças para a efetivação do SUS entre elas a substituição do processo de habilitação (gestão plena da atenção básica e gestão plena do sistema) por uma adesão solidária aos Termos de Compromisso de Gestão; a Regionalização solidária e cooperativa como eixo estruturante do processo de descentralização; a integração das várias formas de repasse dos recursosfederais e a unificação dos vários pactos existentes no âmbito do SUS26.
A elaboração do Pacto pela Saúde envolveu dirigentes e técnicos do Ministério da Saúde e atores políticos de instâncias importantes do SUS, como os representantes dos conselhos nacionais de secretários estaduais e municipais de saúde e é hoje a diretriz vigente nas pactuações do SUS em todas as esferas de governo. Na sua dimensão Pacto pela Vida aponta claramente para o compromisso entre os gestores do SUS de seis prioridades, entre elas o fortalecimento a Atenção Básica assumindo a estratégia Saúde da Família como a prioritária para tal. A dimensão Gestão aponta cinco blocos de financiamento para o custeio do SUS, sendo um deles o da Atenção Básica composto por dois pisos: da Atenção Básica e da Atenção Básica Variável sendo que neste último está incluso o financiamento para a Saúde da Família, Agentes Comunitários de Saúde, Saúde Bucal e outros. 
O Pacto pela Saúde apresenta a Política Nacional de Atenção Básica aprovada pela Portaria nº 648/GM de 28 de março de 2006 que traz toda a estruturação e competências intergovernamentais para seu desenvolvimento. Em todo o documento constata-se a referência à estratégia Saúde da Família como o eixo condutor da reorganização da Atenção Básica dentro dos preceitos do SUS as não há referências sobre a APS. 
 Em síntese, o que se evidencia no cenário brasileiro é uma indefinição e imprecisão dos referencias conceituais adotados na definição das políticas públicas, situação observada nos principais documentos do Ministério da Saúde e dos órgãos e instâncias representativas do SUS (CONASS, CONASEMS e Relatórios das Conferências Nacionais de Saúde). O consenso existente é que a Estratégia Saúde da Família é o locus privilegiado da organização do cuidado em saúde em ambos os referenciais.
 OS MODELOS DE AÇÕES PROGRAMÁTICAS, VIGILÂNCIA DA SAÚDE E EM DEFESA DA VIDA E SUAS CONTRIBUIÇÕES PARA A CONSTRUÇÃO DAS NOVAS PRÁTICAS PROFISSIONAIS E INSTITUCIONAIS
Ao longo do processo da Reforma Sanitária Brasileira, diferentes modelos de atenção à saúde foram desenvolvidos visando ao fortalecimento dos princípios e diretrizes do SUS. 
A proposta do modelo Ações Programáticas em Saúde foi desenvolvida no final da década de 1980, por um grupo de docentes e pesquisadores do Departamento de Medicina Preventiva e Social da USP e do Centro de Saúde Escola Samuel Pessoa e apresentada, entre outros, por Mendes-Gonçalves, Nemer e Schraiber. Foi construída a partir das reflexões e debates sobre a programação como forma de organização da oferta de serviços na ótica da APS e seus pressupostos estão inspirados na Programação em Saúde revisitada. Seu arcabouço teórico-conceitual foi elaborado a partir das reflexões sobre a programação em saúde enquanto uma tecnologia que pode ser utilizada para a reorganização do processo de trabalho e trata, fundamentalmente, da problemática da dimensão técnica das práticas em saúde na organização social da produção dos serviços, incorporando o enfoque da epidemiologia numa perspectiva crítica27. 
A Programação em Saúde revisitada emerge em meio às reflexões sobre as práticas em saúde onde convivem as lógicas assistenciais do trabalho clínico centrado no procedimento médico e no atendimento individual, e do trabalho sanitário centrado nos ações da saúde coletiva, incluindo ações de promoção e prevenção nos programas de saúde. Defende, em seus princípios, que como modelo tecnológico para a assistência na e da Saúde Pública, a programação não se reduz à técnica do planejamento e, pelo contrário, agrega como parte de seus fundamentos, os princípios de integração sanitária e da hierarquização do cuidado.
E ainda, ressalta o uso social da epidemiologia para a priorização dos problemas de saúde; a organização das ações programáticas como recurso tecnológico; a transição necessária da dimensão da clínica médica individual para a centrada na dimensão coletiva da saúde e o trabalho do médico como componente do trabalho coletivo em saúde como modo de organização tecnológica do trabalho27. 
A proposta Vigilância em Saúde foi elaborada pelo grupo de pesquisadores e docentes do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA e colaboradores e apresentada por Paim e Mendes, no início dos anos 90. Foi desenvolvida a partir do SUDS e das experiências dos Distritos Sanitários, contando com o apoio da Organização Panamericana de Saúde (OPAS). Está pautada nas seguintes diretrizes operacionais: ênfase na descentralização e regionalização dos serviços, criação de Distritos Sanitários, Territorialização em Saúde; planejamento estratégico com análise situacional; organização dos serviços orientada por problemas; criação da autoridade sanitária local (gerente local); hierarquização; intersetorialidade; integralidade; adequação entre demanda espontânea e oferta organizada28,29. 
Este referencial de modelo propõe uma redistribuição de poder entre os três entes federativos, com mudanças e adequações de papéis em cada um deles, apresentando em seus argumentos a importância das instâncias estaduais como espaço de controle e regulação da oferta de serviços e coordenação do enfrentamento de problemas e situações de saúde que extrapolem as bases territoriais dos municípios, numa perspectiva de trabalho articulado e colaborativo. Traz como referencial neste debate, entre outros, a concepção da APS como eixo de reordenamento do setor.
A proposta Em Defesa da Vida foi elaborada pelo grupo de pesquisadores e docentes do Laboratório de Planejamento e Administração da UNICAMP e apresentada por Merhy, Campos e Cecílio, em meados da década de 1990. Foi desenvolvida a partir de estudos sobre a prática de gestão e tem como objeto de análise o processo de trabalho em saúde, tendo como finalidade a criação de metodologias e instrumentos de gestão e organização do trabalho coletivo. Aposta na criação de processos que provoquem profundas transformações no âmbito das instituições e que resultem em novas relações entre gestores, trabalhadores e usuários, mediadas pela subjetividade e autonomia dos sujeitos. Prioriza, nos serviços, os processos de acolhimento, vínculo, contrato e autonomia dos sujeitos na organização do cuidado progressivo à saúde 30.
O crescimento da Saúde da Família trouxe para a centralidade dos debates a insuficiência dos arranjos organizacionais atuais e os limites das práticas profissionais e de gestão no que se refere especificamente à mudança do paradigma que rege o tradicional modelo de atenção à saúde. A Saúde da Família, embora esteja mais estruturada nos referenciais da Vigilância em Saúde, referencial este que sustenta a Saúde da Família como eixo estruturante da Atenção Básica ou da Atenção Primária à Saúde e que diverge, portanto, das análises que entendem a Saúde da Família como a versão contemporânea da medicina simplificada; como um programa; como medicina familiar ou apenas como atenção materno-infantil, também incorpora aspectos das concepções apresentadas pelas propostas Em Defesa da Vida e das Ações Programáticas.
Embora a Saúde da Família tenha crescido sobremaneira no país e enfrente vários desafios para viabilizar-se como estratégia estruturante da APS nos municípios, é uma estratégia com grande potencial para a produção de mudanças das práticas e, ao mesmo tempo em que cresce, desvenda as fragilidades crônicas já presentes nos serviços e para as quais ainda não foram dadas soluções concretas. Entre essas estão as práticas profissionais e as práticas institucionais, ambas não atendendo adequadamente às novas necessidades que estão colocadas para a saúde da população. Neste contexto, surge o modelo das redes de atenção como proposta de articulação entre os diferentes modelos com vistas ao redesenho organizacional dos serviços no SUS.
AS REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE COMO CAMINHO PARA O FORTALECIMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE 
	Como visto anteriormente, há necessidade de se avançar no processo da Reforma Sanitária Brasileira. Isso fica evidente ao se constatar os limitesdas estratégias adotadas até então para a superação do modelo e práticas de saúde ainda hegemônicas no Brasil. Muitos e bons avanços ocorreram e estes avanços possibilitaram a produção de reflexões e proposições voltadas ao enfrentamento dos nós críticos percebidos no desenvolvimento do SUS. 
Atualmente, uma nova agenda política está colocada no contexto da saúde – a da construção das Redes de Atenção. Esta proposta emerge a partir da avaliação da situação de saúde da população que configura uma nova realidade sanitária vivida por muitos países onde se entrelaçam fatores como: 1) a diminuição das taxas de fecundidade e o aumento da expectativa de vida cujo desfecho é o envelhecimento da população e o aumento dos agravos crônicos de saúde; 2) padrões de consumo e hábitos de vida não saudáveis cujo desfecho são estilos de vida que também aumentam as condições crônicas; 3) a acumulação epidemiológica caracterizada pela superposição de novas doenças infecciosas e o ressurgimento de doenças que se acreditavam superadas e, 4) crescimento acelerado da violência e causas externas31. 
Ainda, este complexo contexto de saúde tem sido definido, mais recentemente, como situação das condições de saúde caracterizada pela tripla carga de doenças que envolve, ao mesmo tempo, uma agenda ainda não concluída de problemas de saúde ainda não superados (doenças infecciosas, desnutrição e problemas de saúde materno-infantil), os desafios das doenças crônicas e de seus fatores de risco (tabagismo, alimentação inadequada, sedentarismo, outros) e o forte crescimento da violência e das causas externas (homicídios, acidentes de trânsito).
Os sistemas de saúde, como é o caso do SUS, não estão organizados para dar respostas sociais a este novo quadro sanitário que caracteriza o mundo contemporâneo. A desarticulação entre os diferentes serviços, níveis de complexidade e recursos de apoio social tem sido fator de evidência da fragmentação do cuidado e da baixa resposta aos problemas de saúde da população e do alto custo do sistema. 
O funcionamento das Redes de Atenção pressupõe uma articulação entre todos os pontos de atenção à saúde onde a Atenção Primária à Saúde ocupa papel importante na coordenação e continuidade do cuidado mediante critérios de regionalização definidos a partir dos territórios de saúde. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
 Pelo exposto acima, pode-se concluir que os modelos de atenção à saúde resultam dos diferentes contextos sociohistóricos que os determinam. Ao contrário do que se supõe, não há um modelos de saúde que suplante, isoladamente, todas as necessidades e problemas de saúde de uma determinada população. 
Por sua vez, a complexidade da realidade brasileira evidencia a necessidade de se pensar nas desigualdades e diversidades existentes entre as regiões brasileiras buscando adequar a oferta de serviços de acordo com o contexto regional.
No Brasil, o processo da Reforma Sanitária Brasileira tem avançado por meio de diferentes proposições de modelos que, embora tragam consistentes concepções teóricas, ainda se mostram insuficientes para fortalecer o SUS e, em especial, transformar a APS em efetiva ordenadora do cuidado em saúde. 
Alguns estados e municípios estão reorganizando seus serviços de saúde a partir da proposta de Redes de Atenção com resultados significativamente diferentes dos modelos anteriores. Esta nova lógica requer posicionamento de gestores, reestruturação da oferta de serviços com investimentos em resultados e agregação de valores aos usuários e, sobretudo, requer novas práticas profissionais na atenção à saúde. Embora estas experiências sejam recentes no cenário nacional, estão trazendo inquietações importantes para os gestores e profissionais do SUS. 
RESUMO
	Este capítulo trata da discussão sobre modelos de atenção à saúde no Brasil. Busca contextualizar a evolução dos modelos de acordo com os diferentes momentos políticos e econômicos antes e após a implantação do SUS. Traz termos e conceitos presentes nas diferentes instâncias de gestão do sistema que dialogam com a formulação e execução das políticas públicas evidenciando o insuficiente consenso na construção de referências sobre modelos de atenção. Finaliza apresentando o modelo de redes que propõe maior articulação entre os diferentes pontos de atenção visando à resolutividade e integralidade do cuidado em saúde. 
PROPOSTAS PARA ESTUDO
Quais são os principais modelos de atenção à saúde que antecederam o SUS?
E quais os que vieram após a criação do SUS?
Quais são as principais características que diferenciam os modelos nestes dois momentos?
Quais as contribuições que a estratégia Saúde da Família trouxe para o contexto dos modelos de atenção?
Quais são os principais desafios para a organização dos serviços de saúde no mundo contemporâneo?
Quais as possibilidades que se vislumbram para o avanço do SUS?
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