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Vinculação dos Particulares aos Direitos Fundamentais

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1 
 
 
 
 2 
AULA 3: A VINCULAÇÃO DOS PARTICULARES AOS DIREITOS 
FUNDAMENTAIS 3 
INTRODUÇÃO 3 
CONTEÚDO 4 
CONSTITUIÇÃO E DIREITO PRIVADO: UMA INTRODUÇÃO AO TEMA DA EFICÁCIA 
HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 4 
O PARADIGMÁTICO CASO LÜTH 7 
A DOUTRINA DO STATE ACTION DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA 11 
TEORIA DUALISTA DA EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 15 
TEORIA MONISTA DA EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 19 
ATIVIDADE PROPOSTA 23 
REFERÊNCIAS 24 
EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 24 
CHAVES DE RESPOSTA 28 
ATIVIDADE PROPOSTA 28 
EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 29 
 
 
 
 
 3 
Introdução 
O tema relativo à vinculação dos particulares aos direitos fundamentais tem 
recebido grande destaque, seja na doutrina, seja na jurisprudência dos 
nossos tribunais superiores. Com efeito, o estudioso dos direitos humanos 
não pode deixar de investigar tal temática, que, induvidosamente, é fundante 
da ordem jurídica contemporânea. 
 
Portanto, o conteúdo programático desta aula está focado na questão relativa 
à eficácia dos direitos fundamentais no âmbito das relações entre 
particulares, consolidando-se a ideia-força de que direitos fundamentais 
destinam-se não apenas a garantir os direitos de liberdade em face do Estado 
(eficácia vertical), mas também a estabelecer as bases essenciais da vida 
ético-social (eficácia horizontal). 
 
Em consequência, o escopo de nossa investigação será estudar as diferentes 
teorias atinentes ao tema, desde o exame da assim chamada doutrina do 
state action nos Estados Unidos, perpassando-se pela teoria da eficácia 
mediata, até, finalmente, atingir a teoria da eficácia direta dos direitos 
fundamentais no âmbito das relações privadas. 
 
Sendo assim, esta aula tem como objetivo: 
 
 4 
1. Compreender a influência que a Constituição, como norma superior, 
exerce sobre o direito privado, bem como examinar as principais 
teorias que vinculam os particulares aos direitos fundamentais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Conteúdo 
Constituição e Direito Privado: Uma Introdução ao Tema da 
Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais 
O grande desiderato acadêmico desta aula é examinar o conceito da 
denominada eficácia horizontal dos direitos fundamentais, que se aplica nas 
relações privadas, ao qual se contrapõem de um lado a autonomia da 
vontade privada e, do outro, a efetivação dos direitos fundamentais, 
notadamente, o princípio da dignidade da pessoa humana. 
 
 5 
 
Eis que a força normativa da Constituição, sob a égide da reconstrução 
neoconstitucionalista do direito, penetra no círculo antes fechado dos 
diferentes ramos do direito privado. Supera-se o paradigma positivista e o 
antigo entendimento de que apenas o Estado estaria vinculado aos direitos 
fundamentais. Projeta-se dessarte a ideia-força de oponibilidade dos direitos 
fundamentais nas relações jurídicas privadas, invocados diretamente da 
Constituição e, não apenas contra o Estado. 
 
É certo, portanto, que os direitos fundamentais incidem sobre as relações 
jurídicas entre particulares, o que significa dizer que o direito civil encontra-se 
hoje repleto de conflitos de interesses que repercutem no âmbito dos direitos 
fundamentais. 
 
Nesse sentido, não resta mais nenhuma dúvida, doutrina e jurisprudência já 
não hesitam em reconhecer que o papel dos direitos fundamentais na ordem 
jurídica hodierna não se limita apenas a atuar como proibição de intervenção 
estatal (eficácia vertical de direitos negativos de defesa), mas, também, atuar 
como garantia de proteção no âmbito do jusprivativismo. Não se trata mais 
de vislumbrar os direitos fundamentais como instrumento de limitação de 
poder de um Estado violador de direitos civis e políticos. 
 
Ao revés, na realidade, a grande atenção que hoje se confere à efetividade 
dos direitos fundamentais prende-se à percepção de uma relação de recíproca 
interação, seja com o conceito de democracia (regra da maioria), seja com a 
ideia de constitucionalismo e Estado de Direito (limitação do poder estatal). 
 
Dessa tensão constante entre democracia e constitucionalismo surge a 
múltipla dimensão dos direitos fundamentais, cuja incidência não se limita 
mais ao direito público, mas penetra também em todos os ramos do 
jusprivativismo, chegando mesmo a ser um dos principais parâmetros de 
aferição do grau de democracia de uma sociedade, vale dizer, quanto mais 
 
 6 
democraticamente avançada for uma sociedade, maior será o respeito e a 
efetividade do rol jusfundamental de direitos do cidadão comum. Isso 
significa dizer que, mesmo em questões características de direito privado, os 
direitos fundamentais deverão ser invocados para gerar direitos subjetivos 
contra todos. 
 
Gilmar Mendes mostra que tais questões são variadas e têm sido discutidas 
nos diversos sistemas jurídicos, seja na doutrina alemã da Drittwirkung, seja 
na concepção americana da state action. Tais questões, na linha de Gilmar 
Mendes, eis que relevantes para os direitos fundamentais, v.g., a exigência 
de que um contrato de aluguel não seja celebrado com pessoas com 
determinadas características, ou, ainda, a exigência de que um sabatista 
trabalhe aos sábados. Nas palavras do autor: 
 
Seria legítimo que uma escola religiosa desse preferência, na 
contratação, a professores que adotassem aquela religião? Ou 
poderia uma dada instituição religiosa de ensino rescindir o 
contrato de um casal de professores sob a alegação de que eles 
estão vivendo maritalmente sem a celebração do matrimônio? 
 
Outras indagações são igualmente concebíveis: 
 Em que medida, por exemplo, a liberdade de expressão autorizaria 
alguém a conclamar o público a um boicote contra uma dada 
publicação ou contra uma dada produção artística (v.g., um livro ou 
filme)? 
 
 O princípio da igualdade impediria que, na adoção de critérios para 
contratação, uma empresa privilegiasse determinada categoria de 
pessoas, v.g., as adeptas de uma dada concepção filosófico-social? 
 
 A administração de uma "cidade privada" (company-town) poderia 
impedir que adeptos dos testemunhas de Jeová distribuíssem 
panfletos nas suas ruas e praças? 
 
 7 
 
 Os proprietários ou administradores de shopping centers poderiam 
impedir a distribuição de informações sobre temas de interesse 
público no seu interior sob a alegação de que se cuida de um 
espaço submetido exclusivamente ao regime de propriedade 
privada? 
 
 Quais seriam os limites da responsabilidade do Poder Público pelo 
fato de alguém, em razão de sua raça ou cor, deixar de ser 
atendido em um café ou restaurante administrado sob o regime de 
autorização ou permissão?1 
 
De tudo se vê, portanto, que os conflitos no campo jusprivatista repercutem 
induvidosamente no campo dos direitos fundamentais e, ao mesmo tempo, 
põem em evidência a importância científica da leitura das normas 
infraconstitucionais à luz da Constituição. Em consequência, não há outro 
caminho a trilhar senão o de incluir a necessária via judicial na aferição e 
proteção dos direitos fundamentais não apenas nas relações verticais, 
estabelecidas entre o Estado e os particulares, mas também nas relações 
horizontais, interprivadas, estabelecidas entre os particulares. 
O Paradigmático Caso Lüth 
O debate acerca da aplicabilidade dos direitos fundamentais às relações 
privadas começou a se desenvolver a partir do paradigmático caso Lüth, 
decidido pelo Tribunal Constitucional Federal alemão, no qual ficou 
patenteada a possibilidade de aplicar a letraconstitucional no âmbito do 
direito privado. 
Conheça o paradigmático caso Lüth, nas palavras dos ministros Gilmar 
Mendes e Luis Roberto Barroso, verbis: 
 
Em 1950, o Presidente do Clube de Imprensa de Hamburgo, Erich 
 
1 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de 
direito constitucional. 4. ed. rev. e amp. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 117. 
 
 8 
Lüth, defendeu um boicote contra o filme ‘Unsterbliche Geliebte’, de 
Veit Harlan, diretor do filme ‘Jud Süs’, produzido durante o 3. Reich. 
Harlan logrou decisão do Tribunal estadual de Hamburgo no sentido 
de determinar que Lüth se abstivesse de conclamar o boicote 
contra o referido filme com base no § 826 do Código Civil (BGB). 
Contra essa decisão foi interposto recurso constitucional 
(Verfassungsbeschwerde) perante o Bundesverfassungsgericht. A 
Corte Constitucional deu pela procedência do recurso, enfatizando 
que decisões de tribunais civis, com base em leis gerais de natureza 
privada, podem lesar o direito de livre manifestação de opinião 
consagrado no art. 5, 1, da Lei Fundamental. Os tribunais 
ordinários estariam obrigados a levar em consideração o significado 
dos direitos fundamentais em face dos bens juridicamente tutelados 
pelas leis gerais (juízo de ponderação). Na espécie, entendeu a 
Corte que, ao apreciar a conduta do recorrente, o Tribunal estadual 
teria desconsiderado (verkannt) o especial significado que se atribui 
ao direito de livre manifestação de opinião também nos casos em 
que ele se confronta com interesses privados.” 
MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de 
constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 4. ed. rev. e amp. 
São Paulo: Saraiva, 2012. p. 127. 
 
Erich Lüth, presidente do Clube de Imprensa de Hamburgo, incitava o boicote 
de um filme dirigido por Veit Harlan, cineasta que havia sido ligado ao regime 
nazista no passado. A produtora e a distribuidora do filme obtiveram, na 
jurisdição ordinária, decisão determinando a cessação de tal conduta, por 
considerá-la uma violação ao § 826 do Código Civil (BGB) (“Quem, de forma 
atentatória aos bons costumes, infligir dano a outrem, está obrigado a 
reparar os danos causados”). 
 
O Tribunal Constitucional Federal reformou a decisão, em nome do direito 
fundamental à liberdade de expressão, que deveria pautar a interpretação do 
Código Civil. 
BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização 
do Direito: O Triunfo Tardio do Direito Constitucional no Brasil, p. 20. 
 
 
 9 
Portanto, a decisão do Tribunal alemão superou incontrastavelmente a 
vetusta dicotomia direito público-direito privado, consolidando-se, na 
jurisprudência e na doutrina, a tese de que as normas constitucionais se 
aplicam, sim, às relações jurídicas entre particulares, ainda que com 
determinadas limitações. 
 
É nesse sentido que o exame da eficácia horizontal dos direitos fundamentais 
é tema fundamental no constitucionalismo contemporâneo, porque é o tema 
que provoca verdadeira revolução de ideias no que diz respeito à efetividade 
ou eficácia social de todas as dimensões de direitos, bem como projeta a 
imagem da filtragem constitucional, na qual impera a leitura do direito 
infraconstitucional à luz da Constituição. 
 
Assim, por exemplo, avançou o direito brasileiro ao, em nome do princípio 
constitucional da igualdade, conceber, por via legislativa, as mudanças 
tocantes à não discriminação entre filhos legítimos e adulterinos (que o antigo 
Código Civil de 1916 fazia), ao novo regime matrimonial e os direitos dos ex-
cônjuges após o divórcio e à evolução nos conceitos do direito de família 
(poder familiar, nome de família, paternidade biológica/afetiva, etc.) e direito 
dos contratos. Na via judicial, contata-se, facilmente, a evolução do conceito 
de família e os julgamentos favoráveis às uniões homossexuais/homoafetivas 
(verdadeira mutação constitucional do artigo 223 da Constituição de 1988). 
 
Enfim, resta patente a relevância e influência do caso Lüth no que diz 
respeito à interconexão entre a Constituição, os direitos fundamentais e as 
relações jurídicas privadas. Com efeito, situações como, por exemplo, a 
possibilidade de um diretor de clube de futebol proprietário de estádio próprio 
impedir a entrada de jornalistas ou artistas que, de modo contumaz, criticam 
abertamente as políticas adotadas pelo clube, ou, a obrigatoriedade de 
inspeção íntima de trabalhadoras de uma fábrica de lingerie por ocasião do 
fim do expediente, ou, ainda, o célebre caso da casa de espetáculos, em 
França, que realizava o lançamento de anões, não podem deixar de 
 
 10 
frequentar a aferição, via judicial, da compatibilidade de atos privados à luz 
da Constituição. 
 
Daí a importância da ponderação de valores nesta aferição da vinculação dos 
particulares aos direitos fundamentais constitucionais. No entanto, cabe aqui 
alertar, juntamente com Lenio Streck, que esse exemplo do caso Lüth não 
pode ser usado para justificar o mero decisionismo judicial, desprovido de 
limites hermenêuticos. Ou seja, ponderar princípios em colisão, sim, porém, 
escolher, a seu próprio talante, não. Nesse sentido, como bem destaca o 
autor: “que os ‘ponderadores’ não usem mais o exemplo do caso Lüth (e 
ainda dizendo Lut), sem saber do que se trata”. 2 
 
Assim sendo, é importante concluir esta segmentação temática destacando 
bem que o caso Lüth é sim um caso paradigmático e que deve ser usado para 
projetar a vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. 
 
É por tudo isso que, na sequência, vai-se abordar as três grandes correntes 
que versam sobre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, a saber: 
 
 A doutrina do state action dos Estados Unidos; 
 
 A teoria dualista ou teoria da eficácia indireta e mediata dos direitos 
fundamentais; 
 
 A teoria monista ou teoria da eficácia direta e imediata dos direitos 
fundamentais. 
 
 
2 STRECK, Lenio. Senso Incomum: Uma lista de pedidos de um jurista para o Papai Noel. Pendurando 
a meia na árvore, disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-dez-12/senso-incomum-lista-
pedidos-jurista-papai-noel>. 
 
 11 
A Doutrina do State Action dos Estados Unidos da América 
Em linhas gerais, a teoria do state action é uma concepção negadora da 
vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. Trata-se de uma 
criação do direito dos Estados Unidos da América estabelecendo que os 
direitos fundamentais não penetram nas relações entre particulares. No dizer 
de Sarmento: 
 
É praticamente um axioma do Direito Constitucional norte-
americano, quase universalmente aceito tanto pela doutrina como 
pela jurisprudência, a ideia de que os direitos fundamentais, 
previstos no Bill of Rights da Carta estadunidense, impõem 
limitações apenas para os Poderes Públicos e não atribuem aos 
particulares direitos frente a outros particulares com exceção 
apenas da 13ª Emenda, que proibiu a escravidão. Para justificar 
esta posição, a doutrina apóia-se na literalidade do texto 
constitucional, que se refere apenas aos Poderes Públicos na 
maioria das suas cláusulas consagradoras de direitos 
fundamentais.3 
 
Assim, para essa concepção, não haveria eficácia dos direitos fundamentais 
nas relações privadas, já que o Estado seria o único sujeito passivo desses 
direitos. Ou seja, os seguidores da corrente do state action entendem que os 
direitos fundamentais previstos na Constituição estadunidense só teriam 
eficácia em relação aos Poderes Públicos, já que a própriaConstituição 
admite uma única exceção, que é a escravidão. 
 
Além dessa argumentação, nitidamente, decorrente do modelo constitucional 
liberal-garantista, existe ainda a argumentação atrelada ao pacto federativo 
dos Estados Unidos, no qual se estabelece que a competência para legislar 
sobre direito privado é atribuída aos Estados-membros (e não à União), cuja 
 
3 SARMENTO, Daniel. A vinculação dos particulares aos direitos fundamentais no direito 
comparado e no Brasil. In: BARROSO, Luis Roberto. A reconstrução democrática do 
direito público no Brasil. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 298. 
 
 12 
autonomia enquanto ente federativo impediria o poder judiciário federal de 
penetrar no campo jusprivatista, salvo nas questões comerciais interestaduais 
e internacionais. 
 
Portanto, é o próprio pacto federativo imutável que afasta a atuação tanto 
das cortes quanto do legislador federais no âmbito das relações jusprivatistas, 
na medida em que a competência para gestar a ordem jurídica privatista é da 
exclusiva responsabilidade do legislador estadual, o que evidente imuniza a 
ação privada da intervenção, seja poder judiciário federal, seja do próprio 
legislador federal. 
 
Esta última argumentação encontra-se, de certo modo mitigada, a partir da 
década de 60, ocasião em que se passa a admitir a competência da União 
para legislar sobre direitos humanos como uma consequência da evolução 
jurisprudencial feita no bojo dos movimentos civis e que redundaram na 
promulgação do Civil Rights Act de 1964. 
 
Assim sendo, é importante compreender que, nos Estados Unidos, sob o 
rótulo da state action, é intenso o debate acerca da aplicação dos direitos 
fundamentais às relações privadas, cujas oscilações doutrinárias e 
jurisprudenciais levam à conclusão de que, muito embora, em regra, os 
direitos fundamentais não se apliquem às relações jurídicas privadas, a teoria 
do state action tenta definir, ainda que de forma casuística e assistemática, 
em que situações pode ocorrer a vinculação dos particulares aos direitos 
fundamentais. 
 
Diversos artifícios são usados neste mister, v.g., alegação de que a questão 
decidida demanda um conceito de função pública (public function theory) ou 
a equiparação de determinados atos privados a atos estatais (entanglement 
exception theory). 
 
 
 13 
Pela teoria da função pública, é fácil ver que a doutrina do state action cria a 
possibilidade de se aplicar a eficácia horizontal dos direitos fundamentais 
numa relação privada quando uma das partes envolvidas estiver no exercício 
de uma função pública. É bem de ver que, aqui, a Suprema Corte 
estadunidense dá nova interpretação à doutrina do state action, na medida 
em que reconhece a vinculação dos atores privados aos direitos fundamentais 
constitucionais quando promoverem atividades de natureza tipicamente 
estatal. Ou seja, a doutrina americana da state action admite a aplicação dos 
direitos fundamentais no âmbito das relações privadas quando os particulares 
assumirem funções de caráter essencialmente público. 
 
Exemplo típico e emblemático da aplicação da teoria da função pública foi o 
caso Marsh v. Alabama4, julgado em 1946. Marsh, uma testemunha de Jeová, 
foi presa por distribuir panfletos no interior de uma cidade construída por 
uma empresa para abrigar seus funcionários (cidade privada - company-
owned town). Invocou-se, à época, o direito à liberdade religiosa e a 
Suprema Corte norte-americana encampou a tese dando, portanto, eficácia 
ao direito fundamental numa relação privada. 
 
Nesse sentido, a empresa proprietária da cidade privada (ruas, residências, 
estabelecimentos comerciais, etc.) seria equivalente ao Estado e, nessa 
condição, deveria respeitar a 1ª Emenda protetora da liberdade de culto. 
Nessa mesma linha de raciocínio, o caso Evas v. Newton, agora referente ao 
acesso de um negro a um parque privado, porém de acesso público. Nesse 
 
4 U.S. Supreme Court Marsh v. Alabama, 326 U.S. 501 (1946). Syllabus: A state can not, 
consistently with the freedom of religion and the press guaranteed by the First and 
Fourteenth Amendments, impose criminal punishment on a person for distributing religious 
literature on the sidewalk of a company-owned town contrary to regulations of the town's 
management, where the town and its shopping district are freely accessible to and freely 
used by the public in general, even though the punishment is attempted under a state statute 
making it a crime for anyone to enter or remain on the premises of another after having been 
warned not to do so. 
 
 14 
caso, a Suprema Corte estadunidense decidiu pela ilicitude do ato denegador 
de acesso aos negros a um parque privado, mas aberto ao público em geral. 
 
Outro exemplo ocorreu no caso Burton v. Wilmington Parking Authority, 365 
U.S. 715 (1961) em que um restaurante, situado em local público, recusou-se 
a servir comida a um negro. A Suprema Corte norte-americana, com base no 
princípio da isonomia, proibiu o restaurante de discriminar por motivos 
raciais. 5 
 
Entretanto, em sentido contrário, vale trazer a lume o caso Moose v. Irvis, no 
qual um cidadão negro chamado Irvis deixou de ser atendido pelos 
funcionários de um restaurante por causa de sua cor. Na ação movida, Irvis 
argumentou que o alvará de funcionamento que o próprio Estado da 
Pensilvânia expediu autorizando o funcionamento de um restaurante 
exclusivo para brancos caracterizava discriminação patrocinada, ainda que 
indiretamente, por ação do Estado, com nítida violação da cláusula de 
igualdade (equal protection clause) prevista na 14ª Emenda da Constituição 
norte-americana. 
 
 
5 U.S. Supreme Court Burton v. Wilmington Parking Authority, 365 U.S. 715 (1961). 
Syllabus: a restaurant located in a publicly owned and operated automobile parking building 
refused to serve appellant food or drink solely because he was a Negro. The building had 
been built with public funds for public purposes, and it was owned and operated by an 
agency of the State of Delaware, from which the private operator of the restaurant leased its 
premises. Claiming that refusal to serve him abridged his rights under the Equal Protection 
Clause of the Fourteenth Amendment, appellant sued in a state court for declaratory and 
injunctive relief against the restaurant and the state agency. The Supreme Court of Delaware 
held that he was not entitled to relief, on the ground that the restaurant's action was not 
state action within the meaning of the Fourteenth Amendment and that the restaurant was 
not required by a Delaware statute to serve all persons entering its place of business. An 
appeal was taken to this Court on the ground that the state statute had been construed 
unconstitutionally. 
 
 15 
No entanto, a Suprema Corte não reconheceu nenhuma violação da cláusula 
da equal protection, por se tratar de agente privado que apenas recebeu 
licença de funcionamento por ato estatal, não figurando, portanto, a teoria da 
public function e equiparação de agente privado a ente estatal. 
 
De tudo se vê, por conseguinte, que a aplicação da doutrina do state action 
sobre a aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas ainda está 
muito longe de assumir fronteiras exegéticas bem definidas, fórmulas 
dogmáticas claras, mas, que, no entanto, não retira a perspectiva dogmática 
de sua aplicação em determinadas situações, notadamente nas hipóteses que 
envolvem a violação de diretos civis (The civil rights cases) ou a alegação do 
conceitode função pública (exercício de atividade de natureza tipicamente 
estatal pelo agente privado). 
 
Uma vez analisada a doutrina do state action estadunidense, importa agora 
investigar as duas teorias que reconhecem a eficácia horizontal dos direitos 
fundamentais, bem como a jurisprudência do STF sobre tal temática. 
 
Teoria Dualista da Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais 
Também chamada de teoria da eficácia indireta ou mediata dos direitos 
fundamentais, esta concepção foi desenvolvida pelo doutrinador alemão 
Günter Dürig, em 1956, sendo atualmente a posição adotada pelo Tribunal 
Constitucional alemão, como bem destaca Gilmar Mendes: 
 
Em verdade, ensina Dürig que uma aplicação direta dos direitos 
fundamentais às relações privadas poderia suprimir ou restringir em 
demasia o princípio da autonomia privada. Portanto, é o próprio 
sistema de direitos fundamentais, ensina o notável 
constitucionalista tedesco, que autoriza e legitima que os indivíduos 
confiram aos negócios de direito privado conformação não 
coincidente com tais direitos. (...) Não se pode olvidar, por outro 
lado, que as controvérsias entre particulares com base no direito 
privado hão de ser decididas pelo Judiciário. 
 
 16 
 
Estando a jurisdição vinculada aos direitos fundamentais, parece 
inevitável que o tema constitucional assuma relevo tanto na decisão 
dos tribunais ordinários, como no caso de eventual pronunciamento 
da Corte Constitucional.6 
 
A teoria mediata ou dualista ou indireta assume uma posição intermediária 
entre a doutrina do state action e a teoria da eficácia direta, uma vez que, 
muito embora rejeite a possibilidade de aplicação imediata dos direitos 
fundamentais nas relações jurídicas privadas, não chega a negar a vinculação 
dos particulares aos direitos fundamentais, pois reconhece que a ordem de 
valores formulada por tais direitos deve, sim, ser levada em consideração no 
campo do direito privado. 
 
Para tal teoria, os direitos fundamentais não são direitos subjetivos 
diretamente sindicáveis perante o poder judiciário, isto é, não são direitos 
destinados a resolver diretamente os conflitos jusprivatistas, na medida em 
que sua aplicação deve ser realizada por intermédio do próprio sistema 
jurídico. 
 
Em consequência, é o legislador democrático que tem a missão de realizar ou 
concretizar os direitos fundamentais na esfera das relações entre particulares, 
sempre tendo presente a intelecção de que as cláusulas gerais e os conceitos 
jurídicos indeterminados (abertos) simbolizam a “porta de entrada” dos 
direitos fundamentais no campo privatista. Tais cláusulas e conceitos são os 
vetores de irradiação dos direitos fundamentais para as relações privadas. 
 
Eis aqui o ponto nodal da teoria indireta ou mediata dos direitos 
fundamentais: a aplicação das normas constitucionais no âmbito das relações 
privadas se dá mediante dois modos principais, a saber: 
 
 
6 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de 
direito constitucional. 4. ed. rev. e amp. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 126. 
 
 17 
 Pela intervenção do poder legislativo através de sua competência 
constitucional de elaborar as leis infraconstitucionais (na tarefa de 
regular a Constituição) e as emendas constitucionais (na tarefa de 
atualizar o catálogo de direitos fundamentais); 
 
 Pelo intérprete na atribuição de sentido às cláusulas gerais e conceitos 
jurídicos abertos e indeterminados. 
 
Assim, na visão da teoria indireta, ainda que se não possa desfigurar a ideia 
de liberdade individual, é preciso concordar que os direitos fundamentais 
legitimam limitações à tal liberdade, seja no plano da legislação, seja no 
plano da interpretação. 
 
É nesse sentido que a teoria mediata afasta a aplicação direta dos direitos 
fundamentais, uma vez que isso implicaria em atribuir poder demasiado aos 
juízes e tribunais, tendo em conta a abertura terminológica e a baixa 
densidade normativa dos princípios constitucionais que asseguram direitos 
fundamentais. Portanto, a teoria da eficácia mediata dos direitos 
fundamentais limita-se precipuamente a uma interpretação limitada pelas 
cláusulas abertas e conceitos jurídicos indeterminados, tendo em conta a 
visão de que o reconhecimento do direito de alguém implica o sacrifício de 
outros reconhecidos a outrem pela ordem constitucional como um todo. 
 
Assim, os defensores da teoria dualista entendem que os direitos 
fundamentais devem ser garantidos no campo do próprio direito privado 
(legislado pelo detentor do mandato político) e não na esfera do direito 
constitucional com a intervenção do juiz ou intérprete, aplicando diretamente 
a Constituição na esfera privada. Por isso a supremacia da liberdade 
contratual entre as partes não pode ser exterminada nem pela legislação nem 
pela interpretação. Em consequência, a incidência das normas constitucionais 
na órbita privada se dá apenas de forma mediata, ou seja, as normas de 
direito fundamental desenvolvidas pelo legislador só indiretamente se 
 
 18 
projetam sobre o espaço jurídico privado (pessoas físicas e jurídicas em suas 
relações contratuais). 
 
Em essência, a doutrina da eficácia indireta propugna pela autonomia das 
relações jurídicas privadas ante as normas jusfundamentais e assim o faz com 
espeque na crença inabalável de que a liberdade contratual é mandamento 
de estirpe constitucional e não pode ser limitada a talante do juiz ou exegeta 
constitucional. Em outras palavras, a Constituição também protege a 
autonomia da vontade e, nesse sentido, é perfeitamente possível reconhecer 
o não exercício de certos direitos fundamentais, em nome da manutenção do 
núcleo essencial intangível dessa própria autonomia da vontade. 
 
Cabe ao legislador democrático, e não ao magistrado (por ser carecedor de 
legitimidade democrática), a tarefa medianeira de determinar a incidência dos 
direitos fundamentais nas relações entre particulares, pois se assim não 
fosse, haveria um espaço enorme de discricionariedade pelos juízes na 
solução do caso concreto. Portanto, em eventual conflito entre a liberdade 
individual (autonomia da vontade) e o direito fundamental, cabe ao legislador 
solucioná-lo sem, por óbvio, abandonar os valores constitucionais aplicáveis. 
Ao magistrado caberia tão somente em casos excepcionais, quando diante de 
conceitos jurídicos indeterminados ou cláusulas abertas, a missão 
hermenêutica de suprir as lacunas deixadas pelo legislador aplicando os 
direitos fundamentais na relação entre particulares. 
 
Com a visão de que a decisão final do juiz/intérprete é o resultado final da 
compilação de todos os elementos envolvidos na solução do caso decidendo, 
semânticos e extrassemânticos, jurídicos e extrajurídicos, a teoria da eficácia 
mediata tem como fundamento a ideia-força de que a incidência direta das 
normas constitucionais sobre a esfera privada esvaziaria por completo a 
autonomia privada, daí, portanto, a limitação de aplicar indiretamente a 
incidência dos direitos fundamentais na área privada contratual. 
 
 
 19 
A aplicação dos direitos fundamentais na esfera privada encontra-se na 
fronteira entre o público e o privado, ou seja, não se pode confundir a 
eficácia horizontal dos direitos fundamentais com a obrigação constitucional 
imposta ao legislador para regular as normas constitucionais abertas e ao 
magistrado quando concretiza o direito nos casos de conceitos 
indeterminados e cláusulas gerais e abertas. 
 
O aluno deve compreender que a eficácia horizontal (vinculação dos 
particularesaos direitos fundamentais) é bem diferente da eficácia vertical 
que atrela os poderes estatais aos direitos fundamentais. 
 
Teoria Monista da Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais 
Também chamada de teoria da eficácia direta ou imediata dos direitos 
fundamentais, esta concepção foi desenvolvida pelo doutrinador alemão Hans 
Carl Nipperdey, no início da década de 50, sendo atualmente a posição 
adotada pelo nosso Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, a lição de 
Gilmar Mendes: 
 
Sob o império da Lei Fundamental de Bonn engajou-se Hans Carl 
Nipperdey em favor da aplicação direta dos direitos fundamentais 
no âmbito das relações privadas, o que acabou por provocar um 
claro posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho em favor 
dessa orientação (unmittelbare Drittwirkung). 
 
O Tribunal do Trabalho assim justificou o seu entendimento: 
 
Em verdade, nem todos, mas uma série de direitos fundamentais 
destina-se não apenas a garantir os direitos de liberdade em face 
do Estado, mas também a estabelecer as bases essenciais da vida 
social. Isso significa que disposições relacionadas com os direitos 
fundamentais devem ter aplicação direta nas relações privadas 
entre os indivíduos. Assim, os acordos de direito privado, os 
 
 20 
negócios e atos jurídicos não podem contrariar aquilo que se 
convencionou chamar ordem básica ou ordem pública. 7 
 
A teoria direta ou imediata ou monista assume uma posição de vanguarda no 
âmbito da reconstrução neoconstitucionalista do direito, uma vez que projeta 
a oponibilidade erga omnes, mitigando dessarte as ameaças aos direitos 
fundamentais advindas não somente do Estado, mas de direção 
multidimensional, como, por exemplo, os poderes sociais de conglomerados 
multinacionais, empregadores, detentores do poder econômico, sindicatos, 
associações patronais, clubes, etc. 
 
Deve-se compreender, portanto, que a eficácia horizontal (vinculação dos 
particulares aos direitos fundamentais) é bem diferente da eficácia vertical 
que atrela os poderes estatais aos direitos fundamentais. Não se há de 
confundir os destinatários de uma e de outra modalidade de eficácia. O 
próprio §1º do art. 5º, que garante aplicação imediata para as normas 
definidoras dos direitos e garantias fundamentais, nada sentenciou sobre a 
quem se destinam tais normas, ou seja, as normas definidoras dos direitos e 
garantias fundamentais devem ser exigidas só contra os agentes estatais, ou, 
não vinculam também os particulares? 
 
É claro que as relações entre pessoas privadas são marcadas, 
fundamentalmente, pela ideia de desigualdade, desigualdade esta que deriva 
exatamente dessa assimetria de poder social e econômico entre os agentes 
privados, daí a importância da vinculação direta dos entes privados aos 
direitos fundamentais. Nesse sentido, não se pode dissociar a ordem jurídica 
infraconstitucional privada e a Constituição, como se fossem mundos 
apartados, sem nenhum acoplamento jurídico-normativo-ético. Tal relação 
deve ser profunda, pois se fosse o contrário, nada garantiria que os direitos 
 
7 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de 
direito constitucional. 4. ed. rev. e amp. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 124. 
 
 21 
fundamentais operariam a favor dos dois partícipes da relação de direito 
privado. 
 
De outra banda, muito embora rejeite o mero decisionismo judicial, a doutrina 
da eficácia horizontal direta sofre pesadas críticas no sentido de que despreza 
a liberdade individual e a autonomia privada em detrimento de outros valores 
que não penetram diretamente no campo jurídico-privado. Isso significa dizer 
que a aplicação imediata dos direitos fundamentais nas relações entre os 
cidadãos implica na ponderação entre o direito fundamental em jogo e a 
autonomia privada dos particulares. Na lição de Vieira de Andrade, citado por 
Daniel Sarmento, na ponderação a ser feita pelo juiz/exegeta constitucional, a 
balança deve pender, em princípio, para o lado da autonomia privada, desde 
que com a solução não se prejudique intoleravelmente a ideia de dignidade 
da pessoa humana. 8 
 
Com efeito, a teoria da eficácia imediata dos direitos fundamentais tem por 
espeque a aplicação da eficácia horizontal mediante um processo de 
ponderação de valores, que coloca de um lado a liberdade individual e a 
autonomia da vontade, e, do outro, o direito fundamental em tensão. 
 
Em essência, a doutrina da eficácia horizontal direta advoga a tese da 
verticalidade imposta pela supremacia constitucional, o que evidentemente 
implica na aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais na órbita privada. 
Em outras palavras, os direitos fundamentais – além de vincular diretamente 
o Poder Legislativo na sua função constitucional de construtor da ordem 
infraconstitucional e o Poder Judiciário na sua função constitucional de 
entregar a prestação jurisdicional necessária a solução da lide – vinculam 
também as relações entre particulares. 
 
8 SARMENTO, Daniel. A vinculação dos particulares aos direitos fundamentais no direito 
comparado e no Brasil. In: BARROSO, Luis Roberto. A reconstrução democrática do 
direito público no Brasil. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 322. 
 
 22 
 
Em suma, a teoria monista busca valorizar a supremacia das normas 
constitucionais, cuja aplicabilidade imediata se dará a partir do caso concreto 
e mediante um critério de ponderação de princípios constitucionais. 
 
Nesse mister, Luis Roberto Barroso mostra que: 
 
Na ponderação a ser empreendida, como na ponderação em geral, 
deverão ser levados em conta os elementos do caso concreto. Para 
esta específica ponderação entre autonomia da vontade versus 
outro direito fundamental em questão, merecem relevo os 
seguintes fatores: 
 A igualdade ou desigualdade material entre as partes (e.g., 
se uma multinacional renuncia contratualmente a um direito, tal 
situação é diversa daquela em que um trabalhador humilde faça o 
mesmo); 
 A manifesta injustiça ou falta de razoabilidade do critério 
(e.g., escola que não admite filhos de pais divorciados); 
 Preferência para valores existenciais sobre os patrimoniais; 
 Risco para a dignidade da pessoa humana (e.g., ninguém 
pode se sujeitar a sanções corporais). 9 
 
Enfim, sem embargo da relevância das controvérsias entre as teorias da 
eficácia horizontal, o fato é que, nas relações entre particulares, o conflito 
aparente entre direitos fundamentais só vai ganhar solução jurídico-científica 
consistente quando passar por processo de ponderação dos valores em 
tensão que leve em consideração esses elementos apontados acima. 
 
De toda sorte, o que importa destacar neste momento é que o conceito de 
eficácia horizontal consolida a evolução histórica dos direitos fundamentais, 
na medida em que demonstra que os mesmos não se prestam apenas para 
 
9 BARROSO, Luis Roberto. Temas de direito constitucional. Tomo III, São Paulo: Saraiva, 2006. p. 
530. Idem, p. 35). 
 
 23 
defesa da liberdade perante o Estado, mas, também, para a valorização da 
dignidade da pessoa humana nas relações entre os próprios particulares. 
 
A questão que se impõe é fixar os limites, ou melhor, as fronteirais entre o 
público e o privado para determinar até que ponto deve reinar a autonomia 
contratual em detrimento de direitos fundamentais. 
 
É por tudo isso que vamos, em seguida, examinar cada uma das três grandes 
fases de evolução do fenômeno da constitucionalização do direito, vale dizer,desde a fase de predominância cêntrica do Código Civil até a atual fase de 
filtragem constitucional, perpassando-se antes por etapa intermediária 
denominada fase de fragmentação do direito infraconstitucional. 
 
Atividade Proposta 
Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: 
 
I. A teoria do state action é uma concepção afirmativa da vinculação dos 
particulares aos direitos fundamentais. Trata-se de uma criação do 
direito dos Estados Unidos da América estabelecendo que os direitos 
fundamentais penetram diretamente nas relações entre particulares. 
II. Já os defensores da teoria monista entendem que os direitos 
fundamentais devem ser garantidos no campo do próprio direito 
privado (legislado pelo detentor do mandato político) e não na esfera 
do direito constitucional com a intervenção do juiz ou intérprete, 
aplicando diretamente a Constituição na esfera privada. 
 
a) As duas assertivas são falsas; 
b) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; 
c) Ambas as assertivas são verdadeiras; 
d) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. 
 
 
 24 
Referências 
MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de 
constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 4. ed. rev. e amp. 
São Paulo: Saraiva, 2012. 
 
SARMENTO, Daniel. A vinculação dos particulares aos direitos fundamentais 
no direito comparado e no Brasil. In: BARROSO, Luis Roberto. A 
reconstrução democrática do direito público no Brasil. Rio de Janeiro: 
Renovar, 2007. 
 
STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso. Constituição, hermenêutica e 
teorias discursivas. Da possibilidade à necessidade de respostas corretas em 
direito. 3. ed., rev, atual. Rio de Janeir0000o: Lumen Juris, 2009. 
 
TAVARES, André Ramos. Paradigmas do judicialismo constitucional. 
São Paulo: Saraiva, 2012. 
 
 
 
 
 
 
 
Exercícios de Fixação 
Questão 1 
A jurisprudência e a doutrina brasileiras tendem a acompanhar a tese da 
aplicabilidade direta e imediata dos direitos fundamentais nas relações 
privadas, razão pela qual reconhecemos apenas dois modos para sua 
aplicação: através da intervenção do poder legislativo ordinário e por meio da 
atribuição de sentido, pelos aplicadores da norma, às cláusulas abertas. 
 
 
 25 
A proposição acima possui duas assertivas, sendo correto afirmar que: 
 
a) Ambas estão erradas; 
b) Ambas estão corretas e a segunda complementa a primeira; 
c) Ambas estão corretas e as ideias não se relacionam; 
d) Apenas a segunda está errada; 
e) Apenas a primeira está errada. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Questão 2 
Veja o que diz o art. 18º (1) da Constituição de Portugal, de 1976: 
 
Art.18º-1: “Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, 
liberdades e garantias são diretamente aplicáveis e vinculam as 
entidades públicas e privadas.” 
 
 
 26 
Baseado no dispositivo acima, e comparando com o texto constitucional 
brasileiro de 1988, pode-se dizer que: 
a) Tanto em Portugal como no Brasil existe previsão expressa da “eficácia 
horizontal” dos direitos fundamentais; 
b) Apenas em Portugal pode-se reconhecer a “eficácia horizontal” dos 
direitos fundamentais; 
c) Enquanto o constituinte português estabeleceu expressamente a 
“eficácia horizontal” dos direitos fundamentais, o brasileiro nada falou 
sobre o tema. 
d) Por não haver previsão expressa a respeito da “eficácia horizontal” dos 
direitos fundamentais na Constituição de 1988, entende-se, 
majoritariamente, impossível sua aplicação no direito brasileiro; 
e) Em nenhum dos dois ordenamentos existe “eficácia horizontal” dos 
direitos fundamentais, haja vista o respeito ao princípio da autonomia 
da vontade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Questão 3 
Ao se deparar com um caso que envolva dois particulares e no qual exista 
uma disputa acerca da aplicação de um determinado direito fundamental 
àquela relação jurídica, deverá o intérprete: 
 
a) Fazer valer sempre o direito fundamental contraposto, dada sua 
magnitude constitucional; 
 
 27 
b) Respeitar a autonomia da vontade das partes, dado ser o valor 
fundamental do direito privado; 
c) Realizar uma ponderação entre o direito fundamental em questão e a 
autonomia da vontade, tendo em vista tratar-se de dois preceitos 
constitucionais; 
d) Abster-se de decidir o conflito; 
e) Todas as alternativas acima estão erradas. 
 
Questão 4 
Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: 
Pela teoria monista da eficácia horizontal, a aplicação das normas 
constitucionais no âmbito das relações privadas se dá mediante dois modos 
principais: 
I. A intervenção do poder legislativo através de sua competência 
constitucional de elaborar as leis infraconstitucionais e pelo intérprete 
na atribuição de sentido às cláusulas abertas; 
II. Já pela teoria dualista, a aplicação da eficácia horizontal se dá 
mediante um processo de ponderação de valores, que coloca de um 
lado a livre iniciativa e a autonomia da vontade, e, do outro, o direito 
fundamental em tensão. 
 
a) As duas assertivas são falsas; 
b) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; 
c) Ambas as assertivas são verdadeiras; 
d) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. 
Questão 5 
Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: 
I. Entre outros, merecem destaque na específica ponderação entre 
“autonomia da vontade” versus “outro direito fundamental em 
questão”, os seguintes fatores: a preferência para valores existenciais 
sobre os patrimoniais e o risco para a dignidade da pessoa humana; 
 
 28 
II. Na aplicação da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, é 
irrelevante a “igualdade ou desigualdade material entre as partes”, ou 
seja, é irrelevante, por exemplo, se uma renúncia a um direito foi feita 
contratualmente por uma grande empresa multinacional ou se foi feita 
por um trabalhador humilde. Os dois atos têm absolutamente o mesmo 
valor na aplicação da eficácia horizontal dos direitos fundamentais. 
 
a) As duas assertivas são falsas; 
b) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; 
c) Ambas as assertivas são verdadeiras; 
d) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Atividade Proposta 
Resposta A 
 
 
 29 
Exercícios de fixação 
Questão 1 - D 
Justificativa: A primeira assertiva está correta, pois a jurisprudência e a 
doutrina brasileiras defendem a tese da aplicabilidade direta e imediata dos 
direitos fundamentais nas relações privadas, já a segunda assertiva está 
errada, porque os dois modos indicados são usados na teoria da eficácia 
mediata ou indireta dos direitos fundamentais. Ou seja, a aplicação através 
da intervenção do poder legislativo ordinário e por meio da atribuição de 
sentido, pelos aplicadores da norma, às cláusulas abertas não são 
características da teoria imediata. 
 
Questão 2 - C 
Justificativa: Com efeito, é certo afirmar que o poder constituinte português 
estabeleceu expressamente a “eficácia horizontal” dos direitos fundamentais, 
enquanto que a Constituição brasileira de 1988 é silente, cabendo, pois, à 
doutrina e à jurisprudência, consolidar a posição da aplicação da teoria direta 
e imediata dos direitos fundamentais nas relações privadas. 
Questão 3 - C 
Justificativa: É de sabença geral que a jurisprudência e a doutrina brasileiras 
defendem a tese da aplicabilidade direta e imediata dos direitos fundamentais 
nas relações privadas,portanto a resposta C é correta, pois estabelece que, 
no caso concreto e após a incidência dos elementos fáticos e jurídicos, a 
solução virá da ponderação entre o direito fundamental em questão e a 
autonomia da vontade. 
 
Questão 4 - A 
Justificativa: As duas assertivas são falsas, os modos de aplicação estão 
invertidos. Ou seja, na primeira assertiva é certo afirmar que, pela teoria 
monista da eficácia horizontal, a aplicação das normas constitucionais no 
âmbito das relações privadas se dá mediante um processo de ponderação de 
valores, que coloca de um lado a livre iniciativa e a autonomia da vontade, e, 
do outro, o direito fundamental em tensão, já pela teoria dualista a aplicação 
 
 30 
da eficácia horizontal se dá mediante dois modos principais: a) a intervenção 
do poder legislativo através de sua competência constitucional de elaborar as 
leis infraconstitucionais; e b) pelo intérprete na atribuição de sentido às 
cláusulas abertas. 
 
Questão 5 - B 
Justificativa: Somente a assertiva I está correta. Com efeito, na ponderação 
entre “autonomia da vontade” versus “outro direito fundamental em 
questão”, a preferência para valores existenciais sobre os patrimoniais e o 
risco para a dignidade da pessoa humana, entre outros fatores, devem ser 
levados em consideração. Já a assertiva II está errada exatamente porque a 
renúncia a um direito foi feita contratualmente por um trabalhador humilde, 
fator que deve ser considerado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Atualizado em: 22 jun. 2014

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