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1 Igreja, Globalização e Justiça Econômica: uma visão brasileira e evangélico-luterana Thomas Hyeono Kang1 Alexander de Bona Stahlhoefer2 05/12/2010 1. INTRODUÇÃO A globalização impõe muitos desafios à humanidade. A dependência e a interligação cada vez maiores entre pessoas e países, causadas pelo progresso tecnológico e pela redução de custos de transporte, trazem benefícios, mas também problemas que antes não eram tão significativos. As igrejas não estão alheias a esses fenômenos, uma vez que a globalização também afeta seus membros no dia-a-dia das comunidades. Além disso, quando esses fenômenos atingem negativamente a vida de pessoas, sejam elas cristãs ou não, as igrejas são desafiadas a agir, amparadas pela fé em Cristo Jesus e pelas implicações éticas que são trazidas por essa fé. A globalização econômica é resumidamente o processo de expansão mundial dos mercados. Esse fenômeno tem consequências boas e ruins. As rápidas mudanças causadas pela expansão dos mercados trazem dificuldades, requerendo respostas também rápidas daquelas pessoas que se preocupam com a dignidade humana. Mas também trazem benefícios, que precisam, no entanto, atingir a todas as pessoas. No debate sobre a globalização, diversas posições entram em conflito. Pessoas que, de forma intransigente, defendem posições pró-mercado dirão que a expansão da globalização é sempre benéfica em todos os aspectos. O mercado é então tratado quase como uma entidade divina que traz apenas benefícios. Por outro lado, os/as anti-globalizantes costumam condenar a expansão global dos mercados, não enxergando as potenciais vantagens que essa expansão pode porventura trazer. As duas posições são os extremos do espectro político. Que papel a Igreja de Jesus Cristo pode ter nesse debate? Nossa proposta é refletir acerca desse tema, chamando atenção para a necessidade do desenvolvimento econômico ser centrado nas pessoas. A globalização pode vir a ser benéfica para a vida das pessoas, desde que as pessoas tenham poder político ou voz para lutar contra as injustiças que podem surgir. Mais do que expansão do PIB per capita, uma concepção de desenvolvimento com justiça deve levar em conta as capacitações das pessoas, a qualidade dos serviços de saúde e educação fornecidos pelos governos, as liberdades políticas, o tratamento dado às pessoas com deficiência, pobres, mulheres, negros, indígenas e outros/as. A Igreja deve apontar para Cristo e para o próximo ou a próxima, que são alvos do amor de Deus. Assim, a Igreja cumpre seu papel profético na sociedade. 1.1. O papel da ética 1 Professor substituto do Departamento de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Mestre em Economia pelo Instituto de Pesquisas Econômicas da Univesidade de São Paulo (IPE-USP). Representante da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) na Comissão das Igrejas em Assuntos Internacionais (CCIA) do Conselho Mundial de Igrejas (CMI). 2 Bacharel em Teologia pela Faculdade Luterana de Teologia (FLT) da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) e Missionário da Missão Evangélica União Cristã (MEUC) em Timbó/SC. Ex- presidente do Conselho Nacional da Juventude Evangélica (CONAJE) da IECLB. 2 A Igreja, que é o Corpo de Cristo, deve se solidarizar com seus membros, mas também com toda a Criação de Deus. Embora haja polêmicas em relação ao papel da Igreja em assuntos políticos e econômicos, não podemos deixar de considerar o papel que a ética cristã teve, tem e pode ter na nossa sociedade – inclusive em assuntos políticos e econômicos. Por outro lado, muitos economistas não veem necessidade de considerações éticas no que se refere ao mercado, uma vez que, de acordo com eles, o mercado soluciona quase todos os problemas existentes. Entretanto, sabemos que sem qualquer tipo de ética, o próprio sistema de mercado não teria florescido. Muitas das instituições nasceram da necessidade de garantir que as trocas pudessem ser realizadas no mercado: a formação cultural específica que uma economia forja supõe necessariamente uma ética, a qual surge porque os próprios agentes têm incentivos individuais para desenvolver um sistema de normas que gere confiabilidade mútua. Embora possamos dizer que a confiança não é um valor em si, mas um pressuposto da mecânica econômica, é um exagero afirmar que apenas dos vícios privados advêm os benefícios públicos em um sistema de mercado, como sugeriu a famosa fábula de Mandeville e alguns trechos da obra de Adam Smith.3 A confiança entre as partes de um contrato, por exemplo, foi um aspecto ético muito importante para que os mercados pudessem florescer em um ambiente seguro. Embora a confiança, como já afirmamos, possa ser entendida como um pressuposto da mecânica econômica ao invés de um valor ético dentro de uma economia capitalista, a confiança foi um dos fatores que não estava presente durante a última crise econômica. Ou seja, o capitalismo necessita de certa ética para que progrida. Mas não precisamos somente de uma ética que permita o funcionamento do mercado. Como Igreja, nosso papel é discutirmos uma perspectiva ética distinta que leve em consideração as vidas das pessoas no processo e acreditamos que a ética cristã tem contribuições a fazer nesse tema. Guiados por nossa fé, acreditamos que a ética cristã pode contribuir principalmente no que se refere à participação das pessoas mais pobres na economia e às consequências que podem atingi-las no processo de geração e distribuição de riqueza. O clamor advindo das vítimas do processo de globalização nas últimas décadas, principalmente durante a onda daquilo que se chamou de neoliberalismo, não deve ser ignorado. Esse clamor pode ser encontrado no documento do AGAPE, que expressa com indignação as injustiças e as dores que atingiram a população mais pobre em muitos países durante as últimas décadas. Em certas partes do texto, nota-se o emocionado grito pedindo pela mudança de todo o sistema. Tais considerações devem ser respeitadas, principalmente por nós, membros de uma igreja latino-americana e de compromisso ecumênico, firmemente alicerçada em sua confessionalidade. A Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil esteve presente nos momentos de opressão política e econômica no seu próprio país e também não pode deixar de se solidarizar com seus vizinhos latino-americanos, também vítimas de pobreza e opressão. Todavia, uma nova terra ainda é um ideal a ser imaginado. Embora o capitalismo tenha causado enormes mazelas, o socialismo também não foi bem sucedido, como mostra a história do século XX. Esse é um debate polêmico, mas um sistema melhor que o socialismo e o 3 MANDEVILLE, B. (1924) The Fable of the Bees; or private vices, publick benefits (1732), Oxford: Oxford University Press; SMITH, A. (1976). An Inquiry Into the Nature and the Causes of the Wealth of Nations (1776), Oxford: Oxford University Press. Ver também uma compilação sobre o tema em GIANNETTI, E. (2007), Vícios Privados, Benefícios Públicos? A Ética na Riqueza das Nações, São Paulo: Companhia das Letras. Smith, embora chamasse atenção para o potencial benéfico do sistema impessoal de mercado, não acreditava, como popularmente se diz, que uma economia ou sociedade prescinde de ética. Ver SMITH, A. (2010), The Theory of Moral Sentiments (1759). London: Penguin. Agradecemos também às contribuições de Valério Schaper neste tema da confiança como pressuposto da mecânica do sistema. 3 capitalismo talvez ainda esteja por vir. Não obstante o que cada um pense acerca de sistemas econômicos, a urgência no combate à pobreza e à destituição que afligem milhões de pessoas no planeta não pode esperar pelodesenho de um sistema ideal. A pobreza e a fome, ao colocarem os seres humanos nus diante da natureza, passam a desencadear práticas predadoras – o desmatamento entre povos indígenas desassistidos, a prática dos carvoeiros no nordeste, a exploração dos manguezais e a pesca indiscriminada são apenas alguns exemplos do que ocorre no Brasil devido à necessidade gerada pela pobreza. A pobreza, portanto, é também uma questão ambiental e urgente.4 É preciso que medidas sejam tomadas imediatamente em relação a esse tema. Logo são necessárias, assim como defende o documento da Igreja da Noruega, mudanças de curto prazo dentro do atual sistema.5 Este documento advoga mudanças de curto prazo nas instituições que governam o sistema econômico no mundo. Defende também que o Estado tenha participação em questões relacionadas à pobreza e distribuição que o mercado não resolve por si só, mas também indica que o mecanismo de mercado pode ser usado de forma benéfica. O documento também ressalta a necessidade de maior participação dos menos favorecidos, com a expansão dos processos de escolha democráticos, buscando a maior igualdade na distribuição de poder político. Além disso, o presente documento estimula o debate sobre o papel da ética na economia e na globalização, ressaltando as contribuições que a ética cristã pode trazer à forma que vemos e avaliamos a economia e a sociedade. Os posicionamentos desse documento não têm a pretensão de ser o único posicionamento cristão de forma arrogante, como se existisse apenas uma ideologia possível para a ética cristã. Esse documento tem como objetivo incentivar o debate acerca do papel da fé e da ética cristã na globalização de um ponto de vista luterano, brasileiro e dentro do contexto ecumênico. Sobre fé e política, o teólogo luterano Dietrich Bonhoeffer, que corajosamente se posicionou contra o nazismo, escreve exatamente o que pensamos acerca de nossas opiniões nesse documento. Nossas opiniões são baseadas na ética cristã dentro de nosso contexto: "É de se perguntar, por exemplo, se o capitalismo, o socialismo ou o coletivismo, são estruturas econômicas que atrapalham a fé. Para a Igreja, aqui há uma postura dupla: por um lado, numa delimitação negativa, terá que declarar nefastas as mentalidades e sistemas econômicos que manifestamente dificultam a fé em Jesus Cristo. Por outro lado, só poderá dar colaboração positiva para uma reestruturação baseada na autoridade do conselho responsável de especialistas cristãos, não com a autoridade da Palavra de Deus. Ambas as tarefas devem ser rigorosamente distinguidas. A primeira é do ministério, a segunda a da diaconia, a primeira é divina, a segunda terrena, a primeira é a da palavra de Deus, a segunda é a da vida cristã. Aqui vale, no entanto: doctrina est coelum, vita est terra (Lutero)".6 Nesse sentido, podemos declarar como nefastos todos os sistemas econômicos existentes, uma vez que, de alguma forma, todos eles podem nos impedir de ver o/a próximo/a ao incentivar o pecado humano. Mas todas as nossas proposições e sugestões aqui expostas são apresentadas a fim de fomentar o debate dentro do movimento ecumênico, com o qual a IECLB se sente chamada a colaborar. Esse posicionamento quer motivar a discussão, não a divisão. 4 Agradecemos a Valério Schaper por esta reflexão acerca de pobreza e questão ambiental. 5 CHURCH OF NORWAY – Council on Ecumenical and International Relations - The Commission on International Affairs (2008), The Church and Economic Globalisation, Oslo. 6 BONHOEFFER, D. (2005), Ética. 7ª ed. São Leopoldo: Ed. Sinodal, p. 201 4 1.2. Objetivo e estrutura do documento Esse documento é uma resposta ao documento AGAPE (Alternative Globalization Addresssing Peoples and Earth), lançado pouco tempo antes da realização da 9ª Assembleia do Conselho Mundial de Igrejas em Porto Alegre, 2006.7 O debate sobre o papel da igreja na globalização já tinha sido iniciado na 8ª Assembleia em Harare, 1998. O documento AGAPE é fruto desse processo. A Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil sentiu-se também desafiada a contribuir para esse processo com esse documento, assim como também fizeram outras igrejas como a Igreja da Noruega, a Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos e a Conferência das Igrejas Europeias.8 A redação do documento ficou sob a responsabilidade de dois membros jovens e ativos da IECLB: Thomas Kang, economista e representante da IECLB na Comissão das Igrejas em Assuntos Internacionais do Conselho Mundial de Igrejas, e Alexander Stahlhoefer, teólogo e missionário da IECLB. Uma comissão para avaliar o documento, assim como para propor alterações, foi formada com a participação do Prof. Dr. Valério Schaper e da P. Ms. Marcia Blasi. O capítulo 2 trata da definição e histórico do que chamamos hoje de globalização. O capítulo seguinte fala dos fundamentos teológicos para avaliarmos a globalização à luz da ética cristã. Examinamos também, no capítulo 4, a relação entre globalização, desenvolvimento e justiça. Posteriormente, tratamos especificamente do papel do comércio no capítulo 5. Os mercados financeiros e os fluxos migratórios e de capitais são assuntos do capítulo 6, assim como também o papel das instituições financeiras internacionais. Discutimos a questão da dívida externa que aflige diversos países pobres no mesmo capítulo. O capítulo 7 trata de uma agenda para as igrejas frente à globalização. 7WORLD COUNCIL OF CHURCHES (2006), Alternative Globalization Addressing Peoples and Earth (AGAPE): A Background Document. Geneva: WCC Publications. 8 CHURCH OF NORWAY, op. cit.; PRESBYTERIAN CHURCH (USA) (2006), Globalization: a Call to Listen, a Challenge to Respond, March/April.; CONFERENCE OF EUROPEAN CHURCHES – Church and Society Commission (2006), European Churches Living their Faith in the Context of Globalization, Brussels. 5 2. GLOBALIZAÇÃO O termo globalização pode ser entendido de uma forma bastante ampla. Dependendo da definição empregada, ela não envolve apenas aspectos econômicos, como também sociais, políticos e culturais. Nesse documento trataremos principalmente dos aspectos econômicos da globalização, embora saibamos da importância de outros aspectos desse fenômeno. A globalização econômica pode ser definida como “a integração de economias nacionais à economia internacional através de comércio, investimento direto externo (por corporações e multinacionais), fluxos de capital de curto prazo, fluxos internacionais de trabalhadores e pessoas em geral, e fluxos de tecnologia”.9 Nesse sentido amplo, a globalização econômica não foi sempre geradora de desigualdades e pioras da situação de países pobres. Como afirma Stiglitz, um dos críticos mais contundentes e respeitados dos caminhos tomados pela globalização nos últimos anos, o problema não é a globalização em si, mas a forma como a globalização tem sido conduzida.10 Mais do que aspectos econômicos, aspectos políticos têm sido determinantes na distribuição dos ganhos advindos desse processo, uma vez que as regras do jogo da globalização têm sido decididas pelos países avançados. O problema é que a riqueza gerada pela globalização não está alcançando a todos, uma vez que os mais pobres sempre têm menos voz política. A Igreja de Jesus Cristo deve ser solidária com as pessoas empobrecidas assim como Jesus foi e, portanto, tem papel nesse debate e deve clamar por mudanças. A globalização pode vir a ser benéfica, como já foi algumas vezes em certos momentos da história, o que mostraremos a seguir na próxima seção. Após isso, discorreremos sobre os papeis de Estado e mercado no processo e as polêmicas teóricas existentes. Por fim, discutiremos a possibilidade de uma outra globalizaçãoatravés de mudanças e reformas no sistema atual, o que introduzirá assuntos de capítulos posteriores. 2.1. Histórico da Globalização Afirmam os historiadores econômicos ter havido três grandes ondas de globalização nos últimos séculos. A primeira onda iniciou por volta de 1870, em que houve grande aumento do fluxo de comércio, capital e pessoas. De 1914 a 1950, o processo de globalização se retraiu, com o aumento das barreiras comerciais em meio a guerras e crises econômicas que atingiram diversos países, principalmente após a Crise de 1929. A segunda onda começou após o pós- guerra e pode-se dizer que durou até meados da década de 1970, período que registrou grande crescimento econômico mundial. Por fim, a terceira onda ocorreu nos anos 1980 e 1990. É particularmente nessa última onda de globalização que surgem os maiores questionamentos a esse fenômeno, principalmente feitos por movimentos sociais. A globalização em fins do século XIX e início do século XX teve um caráter diverso das ondas posteriores. A integração dos mercados com o aumento do fluxo comercial e migratório teve efeitos diversificados nos países envolvidos. De acordo com a evidência apresentada pelo resumo da literatura escrito por Lindert e Williamson, em países onde a terra era um fator abundante (como Brasil e Estados Unidos), as estimativas indicam que a globalização aumentou a desigualdade, uma vez que a maior parte dos ganhos ficou com os donos de terras 9 BHAGWATI, J. (2004), In Defense of Globalization. Oxford: Oxford University Press, p. 3 10 STIGLITZ, J. (2006), Making Globalization Work. London: Penguin, p. 4; STIGLITZ, J. (2002), Globalization and Its Discontents. London: Penguin. 6 ao invés dos trabalhadores.11 Nos países em que a terra era escassa (Europa) e que adotaram políticas comerciais liberais, ocorreu o contrário: a globalização parece ter diminuído a desigualdade. Uma grande diferença nesse período é que a migração era mais fácil: não havia tantas barreiras erigidas como ocorre hoje na maioria dos países desenvolvidos. Motivados por rendas maiores no assim chamado Novo Mundo, muitos emigraram da Europa em direção às Américas. Esse fenômeno aumentou os rendimentos dos trabalhadores que ficaram nos países europeus, mas reduziu os salários nas Américas em relação ao período anterior sem migrações (embora ainda fosse vantajoso migrar, já que a terra era abundante nesses novos locais).12 Com as grandes guerras e a crise de 1929, o protecionismo voltou à agenda com força. Durante esse período de redução dos fluxos de comércio e de pessoas, houve aumento da desigualdade entre os países. As barreiras migratórias foram as principais responsáveis por esse aumento. Todavia, a desigualdade dentro dos países diminuiu em geral, embora tenha havido exceções. A partir de 1950, os fluxos voltaram a crescer, levando à chamada segunda onda da globalização. Essa nova fase teve características distintas da onda anterior. A migração de fatores diminuiu consideravelmente, embora tenha havido abertura comercial. O caso da nação mais rica do planeta, os Estados Unidos, é um exemplo claro da mudança ocorrida entre as duas ondas globalizantes: de um país protecionista que recebia imigrantes, os EUA abriram o comércio, mas restringiram a entrada de pessoas no seu país (situação que persiste até hoje). No início dessa nova fase da globalização, o mundo estava muito mais desigual do que outrora, mas o principal fator para o aumento da desigualdade não foi a diferença de renda dentro dos países, mas sim a desigualdade entre países.13 O caso do Brasil é distinto, uma vez que a desigualdade aumentou dentro do país ao longo do século XX.14 Com as crises do petróleo ocorridas durante a década de 1970 e o fenômeno da estagflação em diversos países (quando houve diminuição do ritmo do crescimento econômico acompanhado de diminuição do poder de compra das pessoas devido à inflação), ocorreu uma mudança de modelo econômico na década de 1980. Países desenvolvidos passaram então a reduzir a intervenção do Estado na economia em todas as áreas. Não apenas houve redução da participação estatal em assuntos relacionados a comércio e protecionismo, como também em diversas áreas sociais. Muitos chamam essa nova onda de redução generalizada da atividade estatal na economia e na sociedade de neoliberalismo ou globalização neoliberal. Ou seja, havia antes globalização (aumento do fluxo de mercadorias e fatores de produção), mas a partir dessa época, ela passou a apresentar novas características, como a menor participação estatal. 11 LINDERT, P. & WILLIAMSON, J. (2003), “Does Globalization Make the World More Unequal?”, In WILLIAMSON, J. & BORDO, M. (ed.), Globalization in Historical Perspective, Cambridge, MA: NBER, p. 241-6 12 A imigração alemã para o Brasil, da qual se origina a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, está profundamente relacionada com o processo de globalização do período. A IECLB é, portanto, fruto da primeira onda de globalização – que foi um processo em certos pontos distinto da atual globalização. 13 LINDERT & WILLIAMSON, op. cit., p. 248 14 Segundo o trabalho de Fishlow, com base na amostra do Censo de 1960, o índice de Gini para desigualdade de renda foi de 0,52. Com base no Censo de 1970, houve aumento na desigualdade com o índice subindo para 0,63. Os dados de Ramos e Mendonça (2005) mostram o índice de Gini subindo de 0,50 para 0,57 entre 1960 e 1970. O índice manteve-se relativamente estável de acordo com dados do IPEA (http://www.ipeadata.gov.br) na década de 1980. Em 2009, o índice registrado foi de 0,543, continuando uma tendência de queda da desigualdade nos últimos anos. Ver FISHLOW, A. (1972), “Brazilian Size Distribution of Income”. American Economic Review, v.62, n.1, p. 391-402; RAMOS, L. e MENDONÇA, R. (2005). “Pobreza e Desigualdade de Renda no Brasil”. In: GIAMBIAGI, F. et al. Economia Brasileira Contemporânea (1945-2004). Rio de Janeiro: Elsevier. 7 Os estudos comparativos entre países mostram que a liberalização pode ter efeitos diferentes na economia dependendo do contexto institucional e econômico em que o país está inserido. As diferenças salariais parecem ter caído a partir do momento em que os assim chamados Tigres Asiáticos liberalizaram sua economia entre os anos 1960 e 1970. Isso não significa que o Estado tenha deixado de ter participação no Leste Asiático, muito pelo contrário, o Estado continuou tendo papel relevante na economia desses países. No entanto, a liberalização comercial beneficiou esses países, reduzindo a desigualdade existente. Por outro lado, esse não foi o caso da América Latina, que começou a liberalizar suas economias a partir do final da década de 1970. Nos países latino-americanos em geral, a desigualdade salarial aumentou, intensificando os problemas sociais pré-existentes devido à disparidade prévia que já era significativa. Em parte, a situação política dos países latino-americanos foi responsável pelo aumento da disparidade: a liberalização comercial foi acompanhada por combate a sindicatos e flexibilização do salário mínimo promovidos pelas ditaduras militares. O arrocho salarial patrocinado por governos autoritários impediu, portanto, que a maioria da população nesses países participasse dos benefícios de globalização.15 Esse breve histórico mostra que a globalização pode provocar diversos efeitos, dependendo do contexto histórico e da situação do país. Portanto, o atual processo de globalização pode ser corrigido para beneficiar os mais pobres. Acreditamos que a questão política é fundamental para entendermos os atuais problemas da globalização. A liberalização comercial pode ter diversos efeitos, inclusive benéficos,mas não quando a maior parte da sociedade é excluída do processo. Essa é uma razão importante para o caráter concentrador da globalização dentro dos países. Por outro lado, a condução do processo por parte dos organismos internacionais tem muitas vezes beneficiado os países ricos, causando aumento da desigualdade entre países. Certamente, muitos dos protestos anti-globalizantes têm intensa relação com a forma com que a globalização foi conduzida nessa última onda, com redução da proteção social e consequente aumento da vulnerabilidade da população mais pobre. 2.2. Globalização, Mercado e Estado A globalização por si só não pode ser considerada positiva ou negativa por definição. É preciso analisá-la levando em conta todas as suas consequências, a fim de avaliá-la a luz de Cristo, o fundamento de nossa fé. Em termos teóricos, a defesa da expansão da globalização pode ser diretamente traçada da noção de eficiência de mercado. De acordo com a teoria econômica, os resultados alcançados pelo mercado são eficientes sob certas condições. Adam Smith já dizia que uma das causas da riqueza das nações é a expansão dos mercados. Por consequência lógica, a globalização, que é a expansão dos mercados em escala mundial, seria benéfica para as nações. De fato, o aumento do comércio pode ser benéfico: países integrados ao mercado mundial muitas vezes conseguiram ganhos de comércio consideráveis.16 A integração ao comércio internacional foi um dos fatores cruciais para explicar o acelerado crescimento econômico dos Tigres Asiáticos nas últimas décadas. Entretanto, há inúmeras controvérsias e respostas simples devem ser evitadas. 15 LINDERT & WILLIAMSON, op. cit., p. 254. Indícios do fenômeno no Brasil podem ser encontrados em COLISTETE, R.P. “Salários, Lucros e Produtividade na Indústria Brasileira, 1945-1978”. Revista de Economia Política, v. 29, n. 4, p. 386-405, out./dez. 2009, que mostra o aumento continuo da desigualdade funcional da renda tanto no período anterior quanto durante o regime autoritário a partir de 1964. 16 LINDERT & WILLIAMSON, op. cit. 8 Uma das objeções levantadas por críticos da globalização irrestrita advém do fato de que, muito embora possamos aceitar a noção de que o mercado é mais eficiente, a eficiência não precisa ser o único objetivo a ser almejado. Eficiência é definida como o estado em que qualquer melhoria de uma das partes na troca leva necessariamente à diminuição do bem- estar da outra parte da troca – ou seja, não há mais incentivos para a troca. Esse é o resultado natural quando o mercado é deixado a sós: as pessoas trocam mercadorias até o ponto em que não há mais interesse de uma das partes. Interferências no processo de troca poderiam trazer ineficiências e prejudicar o crescimento econômico de acordo com a teoria. Entretanto, os resultados atingidos por um mercado sem intervenção não são necessariamente equitativos. O mercado deixado a sós pode levar tanto a um resultado em que os dois participantes da troca tem metade dos recursos, quanto a um resultado em que um dos participantes tem tudo e o outro, nada.17 Se o indivíduo que possui grande parte dos recursos não vê benefícios na troca, a tendência é de que a distribuição continue desigual. A segunda objeção refere-se à diferença entre países ricos e pobres. No processo de troca, os países pobres poderiam ser prejudicados porque o comércio com os países ricos incentivaria os países pobres a permanecerem subdesenvolvidos e agrícolas. Embora hoje saibamos que a industrialização não é sinônimo de desenvolvimento equitativo e sustentável, como mostra claramente o caso do Brasil, dificilmente um país agrícola avança economicamente.18 A primeira objeção não é alvo de polêmica. A teoria econômica não prevê que os mercados promovam igualdade. Se, no entanto, é importante para as pessoas que a desigualdade seja combatida (pelo menos até certo ponto), o mercado não é a melhor ferramenta para isso. O uso do mercado pode continuar, mas é necessária a ação complementar de outra força. Geralmente essa força é o Estado. Contudo, não necessariamente a ação do Estado significa maior igualdade e combate à pobreza. O Estado pode interferir no mercado de forma a aumentar a desigualdade e a pobreza, como ocorreu no Brasil durante a maior parte de sua história. Para que a ação do Estado seja benéfica, é necessário que o poder político não esteja concentrado em uma pequena elite que direciona a ação do Estado em seu próprio favor. O fortalecimento das instituições democráticas que garantam a voz política da população é fundamental para que a ação do Estado não seja equivocada. Em termos de globalização, vale a mesma lógica. Deixar os mercados a sós geralmente não é a melhor solução em termos equitativos. A necessidade de prevenir o aumento da desigualdade exige a participação benéfica de organizações de governança internacionais. No entanto, se nessas organizações os mais ricos estão melhor representados, a tendência é que essas organizações favoreçam os mais ricos. Diante desse fato, tornam-se necessárias instituições mais democráticas e com maior participação dos países pobres nos processos decisórios. Essas razões fundamentam o clamor por reformas no Fundo Monetário Internacional, no Banco Mundial e na Organização Mundial do Comércio. 17Esse resultado é possível de acordo com a teoria econômica. O mercado é eficiente, mas não equitativo necessariamente, mesmo em condições restritas de acordo com os teoremas do bem-estar e a assim chamada Caixa de Edgeworth. Economistas podem conferir esses teoremas em MAS-COLLEL, WINSTON & GREEN (1995). Microeconomic Theory. Oxford: Oxford University Press. 18Essa ideia foi bastante debatida pela escola da CEPAL, que ganhou destaque nas décadas de 50 e 60 com os trabalhos do argentino Raúl Prebisch e outros, como o brasileiro Celso Furtado. Para os defensores cepalinos da industrialização, a proteção era necessária para redução da curva de custos no longo prazo. Mesmo fora do arcabouço teórico cepalino, todavia, a industrialização é considerada um fator importante de crescimento. Ver LINDERT & WILLIAMSON, op. cit. 9 2.3. A Possibilidade de uma Globalização Mais Justa Nas seções anteriores, mostramos que é possível que a globalização possa trazer benefícios, desde que o Estado tenha um papel benéfico no processo. Se o Estado deixar o mercado a sós, a falta de proteção social e a desigualdade podem se tornar problemas graves. Se o Estado interfere no processo de forma negativa, como exemplificado pelos casos de inúmeros países latino-americanos, a globalização adquire características ainda mais excludentes. Também no contexto internacional, se os mercados forem deixados a sós, sem instituições que possam regulá-los e garantir a equidade nos processos de troca e nos fluxos de fatores entre paises, uma situação mais justa dificilmente é alcançada. Por esse motivo, são necessárias instituições internacionais como a Organização Mundial do Comércio, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, pelo menos no curto prazo. Essas instituições, no entanto, têm muitas vezes prejudicado a situação de diversos países em desenvolvimento. Muitos protestos anti-globalizantes pedem pela extinção desses organismos. Todavia, sem eles a situação poderia ser ainda pior, como argumentaremos em capítulo posterior. Certamente, a manutenção dessas instituições requer reformas profundas, para que elas possam de fato servir para um desenvolvimento mais justo para os países pobres. Uma série de desafios é trazida pela globalização, como já afirmamos. Por exemplo, empresas têm hoje a opção de instalarem plantas em qualquer lugar do mundo. Muitas vezes as melhorias na condiçãode vida dos trabalhadores e das trabalhadoras em certos países não se sustentam, uma vez que a empresa simplesmente transfere a planta para outro país em que os salários são mais baixos. Essas realidades devem ser consideradas na hora de se pensar na criação de mecanismos que diminuam os efeitos perversos que a globalização pode trazer. Em capítulos posteriores, trataremos do papel do Estado, da relação entre globalização e desenvolvimento com justiça, do papel do comércio, das finanças e dos organismos internacionais. A globalização pode ser mais justa, desde que a ética tenha seu papel, colocando as pessoas no centro do processo de desenvolvimento. A busca pela dignidade humana deve ser nosso objetivo central. É nessa questão ética que o papel da Igreja é preponderante e profético. 10 3. A GLOBALIZAÇÃO E A NOSSA FÉ A teologia é um falar de Deus. Falamos de Deus porque cremos nele. E nossa fé é fruto da sua autorevelação em Jesus Cristo, e não dos nossos esforços intelectuais. Por isto nós somos objetos da teologia, pois primeiramente é Deus quem fala a nós e nos imputa a fé, a qual respondemos em gratidão com nosso louvor e com frutos da graça. Esta gratidão, louvor e frutos, em nós produzidos pelo agir de Deus, serão articulados em nossa realidade eclesial e social, sem com isso estar desconectada do corpo de Cristo que é universal, e justamente nisto reside o caráter global da fé cristã. Somos uma só Igreja Cristã, temos uma só fé em um só Cristo, fomos batizados num só Corpo, e um só Espírito de Deus dirige a Igreja (Ef 4.4-6). Por outro lado, a teologia precisa responder as questões colocadas pelo contexto em que está localmente inserida, percebendo as dores dos mais fracos de forma a conclamar o corpo para sofrer junto com aquele membro que está sofrendo (1Co 12). Por isto, a globalização traz um desafio ecumênico para a Igreja. Nossa proposta é refletir teologicamente, a partir da nossa realidade eclesial e social brasileira, tendo em vista a realidade global e ecumênica, a realidade da criação e a realidade do corpo universal de Cristo. 3.1 Fé que conduz à ação – Implicações da Doutrina da Justificação para nossa ação social As duas grandes tentações para as Igrejas cristãs em assuntos como política, economia e direito são o quietismo e o ativismo. O quietismo nega que a pessoa cristã tenha alguma responsabilidade em se envolver no debate que é chamado por alguns de “secular”. Esta tendência a separar a moral religiosa da moral pública, como se uma não tivesse algo a contribuir para a outra é uma herança do Iluminismo.19 Já o ativismo representa uma solução de compromisso extremo que tem a tendência de equiparar as conquistas sociais à salvação eterna. O quietismo percebe a fé como algo que só tem a contribuir no âmbito da vida interna (espiritual). O ativismo percebe o comprometimento social como a razão última da sua fé. Em Jesus Cristo, Deus nos justifica sem mérito ou obras nossas somente pela sua graça mediante a fé. A pessoa, tendo sido resgatada da sua justiça própria pela graça mediante a fé, é transportada para uma relação completamente nova com Deus, consigo mesma, e com o seu próximo. Por isto a justificação leva a pessoa cristã à obediência e consequentemente à ação concreta no mundo, pois a pessoa cristã não vive para mais si mesma (2Co 5.17, cf. tb. Confissão de Augsburgo, art. 4). A fé em Jesus Cristo se expressa como discipulado, o seguimento ao Senhor que chama para um compromisso com seu amor. O discipulado exige a fé e a obediência, ao mesmo tempo em que a fé e a obediência são graça que levam ao discipulado.20 Nossas obras, como pessoas cristãs, não são tentativas de agradar a Deus para que com isto Ele se agrade de nós e por consequência nos conceda salvação (Confissão de Augsburgo, art. 6). Nossas obras são resultado da nova vida concedida por Cristo a nós gratuitamente (Ef 2.10). Temos plena liberdade para agir em favor do próximo, pois somos servos obedientes e em tudo sujeitos a Cristo.21 19 SCHNEEWIND, J.B. (2001). A invenção da Autonomia. São Leopoldo, Unisinos. 20 BONHOEFFER, D. (1984). Discipulado. 2ª Ed. São Leopoldo, Sinodal. 21 LUTERO, M. (1998). Da Liberdade Cristã. 5ª Ed. São Leopoldo, Sinodal. 11 Assim como a fé é despertada pela promissio do Evangelho, da mesma forma a Igreja é criatura do evangelho.22 Fé em Cristo cria comunidade, cria a comunhão daqueles que professam a fé no mesmo Deus Triuno, pois a essência do Deus Trindade é a comunhão das três pessoas. Na comunhão, o discipulado (seguimento) é alimentado, e evoca o testemunho concreto do amor ao próximo, não como lei (obrigação), mas como nova obediência motivada somente por gratidão a Deus pela graça nos concedida em Cristo (Confissão de Augsburgo, art. 5). Um exemplo concreto encontra-se em Atos dos Apóstolos. A comunidade de Jerusalém reunia- se para celebrar sua fé em Cristo, para alimentar os laços de irmandade, com o objetivo de ser uma comunhão que vive na perspectiva da iminente volta de Cristo. Nesta esperança esta comunhão (comunidade) modifica as realidades onde se encontra e por este motivo também acaba por contar com apoio popular (At 2). A comunhão local em torno das dádivas de Deus (Pão e Vinho, Palavra, Oração) é fermento para ação coletiva e individual, porém também é chamada a lembrar-se que é juntamente com outras comunhões locais ao redor do globo o corpo universal de Cristo, e com isto chamada a um comprometimento maior com uma causa que é global, pois Jesus Cristo é Senhor sobre todo o cosmos. As Igrejas não devem estar sozinhas, mas lançar mão do diálogo para buscar consensos éticos amparados nas Escrituras que motivem a uma ação coletiva cristã no mundo. Da mesma forma como a teologia latino-americana sempre buscou o diálogo com as ciências sociais, neste documento continuamos nesta tradição dialogal, pois não há uma contradição inerente entre fé e a ciência. Lutero compreendia a razão como tendo “algo de divino em si”. É uma capacidade para gerenciar conhecimento humano. A razão produz ciência, e isto é fruto da graça criadora de Deus, que fez também a razão como imagem e semelhança do Criador.23 Desta forma, o diálogo com as ciências sociais, em especial com a economia, poderá trazer bons frutos para nossa reflexão como Igreja. Não cabe a teologia se colocar arrogantemente acima das ciências como a verdade última. As propostas das ciências econômicas, do direito (especialmente na área de direitos humanos) e da filosofia serão refletidas em debate com os pressupostos teológicos aqui expostos. Nossa teologia quer em humildade, conhecendo suas limitações impostas pela razão, dialogar criticamente com as ciências, questionando seus compromissos com a vida e com o direito. Por sua vez as ciências nos questionarão até que ponto nosso compromisso com o discipulado de Cristo está sendo levado a sério na prática.24 Nenhum saber, nem mesmo o teológico, poderá arrogantemente colocar-se como juíza absoluta de normas e valores, uma vez que sistemas políticos e econômicos são frutos de uma construção social permeada pelo pecado, ainda que na tentativa de sermos justos com todas as pessoas. 3.2 A Igreja e sua relação com a política e a economia Infelizmente não é possível afirmar que há consenso sobre os temas da política e da economia dentro da Igreja de Jesus Cristo, são antes questões de disputas internas. Sejam disputas motivadas por convicções político-partidárias de grupos cristãos, sejam motivadas por convicções teológicas.25 22 Cf. BAYER, O. (2007). A Teologia de Martim Lutero. São Leopoldo: Sinodal, p. 31-32; 187. 23 LUTERO, apud BAYER, op cit., p.115. 24 WESTPHAL, E. R. (2010). “Teologia como fé inteligente:Aspectos Teológico-filosóficos” in Vox Scripturae 18:1. São Bento do Sul, FLT, p. 101-108; cf. também TÖDT, H. E. (1988).“Versuch einer ‚Theorie der Urteilsfindung‘“, In: _____. Perspektiventheologischer Ethik. München, Chr. Kaiser, p. 21-48. 25 Ver seção posterior sobre as visões de justiça distributiva existentes dentro do Cristianismo 12 Entretanto a confissão de que Jesus Cristo é Senhor soberano sobre toda a criação, como fez a Igreja Confessante durante a Segunda Guerra, é completamente suficiente para manter a unidade da Igreja na sua diversidade de pensamentos.26 Portanto, nesta seção queremos apresentar alguns tópicos para auxiliar a reflexão teológica de um ponto de vista luterano e latino-americano que nos abra para o diálogo acerca das políticas sociais e econômicas. 3.2.1 A Igreja e a(s) Política(s).27 Deus age no mundo para a salvação eterna e para a manutenção da paz. O Evangelho, através do Espírito Santo, ensina cada pessoa cristã a não fazer o mal e a sofrer a injustiça quando causada pelo testemunho da verdade. O Reino de Deus é governado pelo Evangelho de Jesus Cristo e é por meio dele que Deus concede salvação. O Evangelho não é uma nova lei através da qual Deus quer que o mundo seja governado. Diante de uma realidade democrática, a distinção precisa sublinhar a ação da pessoa cristã na busca por justiça e no fazer o bem ao próximo. A palavra de Lutero incentivando as pessoas cristãs a assumirem funções nos governos pode ser aqui sublinhada.28 Como nenhum ser humano é justo por natureza, Deus instituiu a Lei para que a maldade não seja praticada conforme a natureza pecaminosa do ser humano. A autoridade civil, com a força da lei, foi constituída por Deus para coibir o mal, a injustiça e manter a paz externa. Sendo a autoridade civil constituída por causa dos desejos maus e a inclinação a devorar uns aos outros, as pessoas cristãs estão submissas à autoridade civil por amor ao próximo, pois desta forma ele fará o que é bom e proveitoso para o próximo. Como a autoridade é criação de Deus (Rm 12.1,4), a pessoa cristã pode fazer uso dela (1Tm 4.4) e, como serviço especial a Deus, ela deve também ocupar a função de autoridade, mas nunca para benefício próprio. O limite da autoridade civil é nas questões civis: ela pode cobrar impostos, estabelecer leis e julgar infratores, porém não pode exigir fé em algo ou estabelecer leis sobre assuntos de fé pessoal (At 5.29). Os dois regimentos devem, neste mundo, permanecer um ao lado do outro, pois o regimento do Evangelho cria pessoas cristãs, enquanto que o regimento da lei, por meio da autoridade civil, coíbe o mal e mantém a paz, criando cidadãos e cidadãs. O desejo de Deus é tanto a salvação em Cristo quanto a paz, e por isto é necessário que tanto um quanto outro regimento permaneçam. Os dois regimentos não são duas esferas independentes, mas são duas formas do mesmo Deus e Senhor governar este mesmo mundo, onde pessoas justas e injustas convivem lado-a-lado. A Igreja deve ser crítica em relação aos governos e políticas que não promovem a justiça e os direitos humanos, deve defender a causa das pessoas pobres e marginalizadas e com isto demonstrar que ama e que busca justiça em favor da outra pessoa. Na compreensão do uso civil ou político da Lei, fundamentamos que a pessoa cristã deve se envolver nas causas sociais e políticas através de movimentos da sociedade civil organizada que buscam justiça. A pessoa cristã também deve se candidatar a cargos públicos para que possa servir a Deus através da sua função, desempenhando-a com abnegação e amor. Também deve viver responsavelmente diante da sociedade cumprindo as leis estabelecidas, exercendo seu direito ao voto e 26 A DECLARAÇÃO TEOLÓGICA DE BARMEN (1984), in Estudos Teológicos, no. 2, ano 24. São Leopoldo: Faculdade de Teologia da IECLB, p. 95-97 27 Esta seção é um resumo de STAHLHOEFER, A. B. (2009). “A Distinção dos Dois Regimentos em Lutero: Recepção na Teologia Luterana e implicações para a Ética Política”, In: Vox Scripturae 17:1. São Bento do Sul, p. 93-131. O último parágrafo sobre a recepção do tema nos documentos emitidos pela Presidência da IECLB não consta no artigo acima referido. 28 LUTERO, M (1996). “Da autoridade Secular até que ponto se lhe deve obediência”, in OSel 6, p. 90-96 13 expressando suas convicções moldadas pela fé em Cristo. A Igreja prega a respeito das Escrituras e da vontade de Deus e cada pessoa cristã deve discernir quais projetos são coerentes com a justiça e o bem. Neste sentido, a fé cristã é crítica com as ideologias e deve cuidar para não abraçar acriticamente ideologias como se fossem cristãs. A diaconia é o meio pelo qual a Igreja age responsavelmente diante da sociedade, envolvendo-se nas áreas da educação, saúde, cidadania, segurança, ecologia e meio ambiente, cultura e esporte.29 A IECLB já em 1970, durante o regime militar no Brasil, expressou com clareza seu chamado a ser crítica ao governo (Manifesto de Curitiba).30 Apresentou seu questionamento sobre a prática de violações aos direitos humanos e suas dúvidas quanto à substituição do ensino cristão pela educação moral e cívica nas escolas. No Natal de 1978, a IECLB se colocou ao lado das pessoas que sofreram violência sob as leis de exceção. Em 1988, o então P. Presidente Brakemeier escreveu sobre a relação Estado e Igreja, conclamando as comunidades a serem críticas diante das propostas dos candidatos/as a vereador/as e prefeito/a. Recentemente o P. Presidente Walter Altmann exortou a que cada um vote de acordo com sua consciência, não se deixando levar pelas manipulações de cunho religioso veiculadas na Internet. Todos estes posicionamentos tiveram como base teológica a distinção dos dois Regimentos e são exemplos práticos de como a Igreja deve continuar sendo crítica, isto é, dialogando a partir da sua ética com as propostas e ideologias políticas. Cada pessoa cristã deverá exercitar seu arbítrio político, mantendo firme sua ética cristã e optando pelas propostas políticas que julgar adequadas. Não cabe a Igreja, nem na sua acepção comunitária, muito menos como corpo nacional ou comunhão global, abraçar ideologias, partidos ou sistemas como se fosse seu próprio modelo de atuação política. Mas no seu papel crítico-profético deve promover a discussão pública e comunitária das ideologias políticas, sociais e econômicas de forma que facilite o conhecimento, o debate e a criação de um senso crítico no seio da comunidade cristã.31 3.2.2 Justiça, misericórdia e fidelidade. A profecia no Antigo Testamento era caracterizada em primeiro lugar por uma firme consciência do profeta como pessoa chamada por Deus para uma tarefa específica. O profeta e a profetiza tinha consciência do seu dever diante de Deus. Muitas vezes, o profeta e a profetiza deixava suas garantias sociais para viver na dependência de Deus no afã de cumprir a missão a que lhe fora conferida. O foco da mensagem profética não estava no chamado a uma piedade ensimesmada, bem pelo contrário, profetas e profetizas tinham liberdade de criticar a crença nacional que afirmava estarem automaticamente sob a bênção de Deus todas aquelas pessoas que fossem descendentes de Abraão. A profecia ressalta que Deus deseja justiça, misericórdia e fidelidade (Os 6.6, Mq 6.8). O apostolo Paulo compreende o espírito da profecia quando afirma que o culto que Deus deseja é aquele no qual oferecemos nossa vida toda, sem ressalvas para a obra que Deus quer fazer neste mundo (Rm 12.1). Também com nossas ações em favor das pessoas necessitadas e excluídas cultuamos a Deus (Cl 3.17, 23).32 No pensamento ocidental, consideramos que uma pessoa justa é aquela que age de acordo com os princípios da legalidade e da justiça, ou seja, se alguém cumpre as normas29 O tema da Diaconia será tratado adiante no documento. 30http://www.luteranos.com.br/articles/8191/1/Manifesto-de-Curitiba---1970/1.html 31 A respeito da história do surgimento da consciência sócio-política na IECLB veja SCHÜNEMANN, R. (1992). Do gueto à participação. São Leopoldo: Sinodal, EST/IEPG. A respeito do uso do conceito de Dois Reinos ou Regimentos na história da Igreja Luterana veja DUCHROW, U. (1977). Zwei Reiche und Regimente. Ideologie ou evangelische Orientierung? Gütersloh: Gütersloher Verlagshaus. 32 VON RAD, G. (2006). Teologia do Antigo Testamento. 2ª Ed. São Paulo: ASTE, Targumim, p. 489ss. 14 determinadas pela sociedade, ela é justa. O pensamento hebraico ressalta a relacionalidade de Deus e do ser humano. Justiça não é definida em termos de conceitos puros, como um critério de imparcialidade medido por uma norma moral absoluta, mas em termos de fidelidade a uma pessoa. Deus é justo, pois se mantém fiel ao seu povo, com quem celebrou uma aliança. Uma pessoa é justa na medida em que se mantém fiel ao seu semelhante. É uma justiça salvífica, que se importa antes com a pessoa. Justiça é salvação, por isto Deus imputou justiça a Abraão (Gn 15.6) e imputa justiça a qualquer pessoa através da fé em Jesus Cristo (Rm 1.16-17). A justiça concedida por Deus a nós é o que nos mantém numa relação de fidelidade com Deus. Tal justiça nos leva a enxergar na pessoa desamparada alguém amada de Deus, alguém que também é imagem e semelhança do criador. A justiça de Deus também quer alcançar a pessoa desamparada nas suas necessidades básicas uma vez que Deus é fiel a sua comunidade.33 A fidelidade se mostra no conceito de solidariedade. Este conceito tem seu lugar vivencial na família, onde cada um é visto como irmão e irmã e onde, por exemplo, a cobrança de juros é proibida (Ex 22.25). Não se pode querer tirar lucro do seu irmão ou da sua irmã, pois as pessoas da família querem ajudar umas às outras sem receber algo em troca, por simples amor, por solidariedade. No nível estatal, o reino de Israel é reino de “irmãos e irmãs”, neste o rei é chamado a agir com imparcialidade. Este é o mesmo argumento de Lutero em seus escritos a respeito da economia. O Reformador utiliza o argumento filosófico da equidade.34 Entre dois extremos, deve-se escolher o mediano. Em assuntos econômicos, o rei de Israel deveria garantir a cada pessoa o que é justo, o que lhe cabe por direito por direito. Porém o rei deveria se colocar ao lado das pessoas pobres, das crianças órfãs e da viúva não por causa da solidariedade, mas por direito e justiça. É dever do rei dar a estas pessoas o que lhes cabe. O Rei deveria ser fiel às pessoas excluídas, pois são seus “irmãos e irmãs” na comunidade israelita.35 A justificação, portanto, nos compromete com o próximo. Como uma família, nos comprometemos com a solidariedade, com a ação de amor em favor da pessoa necessitada, da pobre, da excluída e da que está sem condições para ter vida digna numa sociedade que objetiva a competitividade, o desempenho e o lucro. Diante de governos e autoridades, devemos clamar por equidade, direito e justiça, dando a cada pessoa o que é devido para que tenha acesso e possibilidade de uma vida digna. Compreendemos que ser justo é ser fiel a Deus e à nossa comunidade em amor ao próximo, entendida não só num sentido de grupo eclesiástico, mas num sentido amplo, que engloba toda a pessoa humana, sem quaisquer distinções. 3.3 Graça, amor e economia O que tem graça e amor em comum com a economia? Economia tem sua raiz no grego oikos, a casa, mesma raiz das palavras ecumenismo e ecologia. Ambas as palavras tem o seu foco na relação existente dentro da casa, o habitar juntos. Habitamos este planeta chamado Terra e cremos que ele é boa criação de Deus (assim como todo o cosmos). A criação não é fruto da nossa capacidade inventiva e transformadora, é dádiva de Deus, especificamente da graça de Deus. A história da criação nos ensina que nossa tarefa neste mundo é cultivar e cuidar. Somos responsáveis conjuntamente pela administração desta casa chamada Terra. 33 VON RAD, op. cit., p. 359-372. 34 RIETH, R. (1995). Economia: Introdução ao Assunto In: OSel 5, p.367-373. 35 Cf. KLEINE, M. (2009). “Solidariedade no Antigo Testamento. Três modelos e sua relevância para a Ética Cristã” In: Vox Scripturae 17:1, São Bento do Sul: FLT, p.27-40. 15 Por um lado, o testemunho bíblico compreende este mundo como criação de Deus e, portanto, as terras como um bem universal. Por outro lado, o povo de Israel recebeu ordem de repartir a terra prometida e conquistada entre as tribos (Nm 34.18). Cria-se assim um sistema onde há propriedade privada, porém num molde coletivo: a cada 50 anos as terras vendidas deveriam voltar ao proprietário original (Lv 25.10). A terra também não pode ser explorada como uma escrava, ela merece descanso a cada sete anos (Lv 25.4). A terra de Canaã é teologicamente para Israel uma dádiva imerecida, pois sua conquista é fruto da mão do Senhor. Por vezes em Israel esta compreensão da terra como dádiva não foi levada a sério. Na época do reino dividido, os profetas e as profetizas foram por Deus chamadas a levantaram a voz contra a injustiça social. Miquéias acusa os latifundiários que roubam as propriedades do povo pobre. Como consequência, o profeta afirma que tais pessoas não participarão da promessa graciosa de uma futura divisão de terras promovida por Deus (Mq 2.1-5). Isaías igualmente proclama juízo de Deus contra os latifundiários que tomam as terras das pessoas pobres (Is 5.8s). A acusação não é contra a quantidade de terras, mas pelo meio fraudulento e injusto através da qual elas foram obtidas. A falta de amor e da compreensão de que a terra é dádiva da graça de Deus fazem com que o ser humano se entregue à ganância, e por fim à injustiça. Lutero compreendia que a ganância, a injustiça e o desamor como frutos da radicalidade do pecado humano. Sua relação de inimizade e afastamento de Deus confluem em ações de injustiça ou na passividade que não produz mudanças reais.36 Somente pela fé na graça oferecida a nós por causa da obra de Cristo na cruz é que a humanidade encontra possibilidade para perceber este mundo sob a perspectiva do amor. Quando Deus nos torna justos diante dele, por intermédio da fé somente, somos reconciliados com Deus, com nosso próximo e conosco mesmos. E pela obra reconciliadora de Cristo, no poder do Espírito Santo, podemos agir em conformidade com o amor de Deus.37 Por isto Paulo pode afirmar que a fé atua no amor (Gl 5.6). O amor de Deus é este, que seu Filho Jesus veio ao mundo para dar a sua vida em resgate de muitas pessoas, e agora nós somos chamados/as a dar a nossa vida pelo próximo (1 Jo 3.16). O princípio do Evangelho é o amor de Deus. A graça é a manifestação concreta do amor, pois dá sem esperar algo em troca. A graça é incompreensível para a mentalidade do mercado. Por isto Lutero chama de comércio maravilhoso onde Jesus “comprou” nosso pecado ao preço da sua própria vida e nos presenteou com reconciliação. Se já recebemos tudo de graça, porque não repartirmos tudo por graça? Não se trata aqui de uma obra meritória, pois não há nada que façamos que possa pagar de volta aquilo que Deus fez por nós em Cristo. Nossa resposta é apenas gratidão! Por um lado precisamos encontrar iniciativas dentro de nossas comunidades para que pratiquem o amor ao próximo, gratidão, partilha e auxílio mútuo. A comunidade cristã pode fazer diferença na comunidade civil ao seu redor. Isto é diaconia, é serviço em amor ao próximo. Por outro lado, o mundo na sua lógica antidivina não pode compreender a graça e o amor de Deus. O Evangelho não é plano de política econômica que deva ser imposto à sociedade. Entretanto as pessoas cristãsdevem levantar dentro da sociedade o questionamento sobre as estruturas econômicas que não estejam favorecendo o amor ao próximo. Na Bíblia encontramos diversas denúncias a sistemas econômicos corruptos. Em Apocalipse 6.5-6, o 36 LUTERO, M. (1993). “Da Vontade Cativa”, in OSel 4,11-216; cf. também SKINNER, Q. (1978). The Foundations of Modern Political Thought. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, p. 4-6. 37 Cf. Confissão de Augsburgo, art.4 (Da Justificação); cf. também WESTPHAL, E. R. (2003). “O significado da fórmula ‘Por causa de Cristo’”, in Estudos Teológicos, 43:1. 16 cavalo negro é a fome, que traz consigo a inflação que consome o valor do dinheiro da pessoa pobre, que precisa comer sempre algo mais barato. O mesmo sistema econômico, por outro lado, continua fartando a mesa das pessoas ricas com o melhor dos frutos da terra. Lutero conclamou pregadores e pastores para que alertassem as pessoas cristãs a respeito das estruturas econômicas injustas de sua época. Para o Reformador, há urgência escatológica em denunciar a injustiça: “Nós pregadores temos que pregar para que estejamos desculpados em seu dia derradeiro”.38 Porém não podemos ficar num denuncismo inerte, temos o direito de exigir que todas as pessoas tenham acesso igual à alimentação, habitação, saúde, educação, cultura, esporte, e com qualidade, porém devemos nos empenhar para concretizar projetos que efetivamente colaborem na mudança do cenário social. 3.4 “Cuidar e guardar” – o imperativo ecológico No primeiro relato da criação conforme o livro de Gênesis (Gn 1.1-2.4a) lemos no v.28 a seguinte ordem de Deus: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre (...)”. Este versículo favoreceu a interpretação de que a terra era objeto de domínio do ser humano, e que este teria o direito divino de explorá-la em busca, não só do próprio sustento, mas em busca de autorrealização econômica. Segundo Eugen Drewermann este seria o versículo bíblico que foi seguido mais ao pé da letra nos últimos tempos.39 E de fato, ao olharmos para a degradação do meio ambiente, para o buraco na camada de ozônio, para o aquecimento global e para as catástrofes naturais ocorridas no Brasil nos últimos dois anos (sequencias de enchentes, secas, desbarrancamentos, ciclones e vendavais, até pequenos tremores de terra), fica a pergunta: qual é a responsabilidade do ser humano diante de tudo isto? Como pessoas cristãs, ao lermos o versículo citado, acabamos legitimando a destruição da natureza como se ela fosse simplesmente nossa serva. Entretanto, no segundo relato da criação (Gn 2.4b-25) no versículo 15, lemos: “Tomou, pois, o SENHOR Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar.” Cultivar e guardar, numa primeira leitura, estão em flagrante oposição a sujeitar e dominar. O cultivo é a atividade preponderante do agricultor e da agricultora, daquela pessoa que prepara a terra. O jardim foi dado ao primeiro casal não como posse, mas como dádiva que exigia trabalho e cuidado. A tarefa do casal era cultivar e tomar conta da terra. É dada uma responsabilidade conjuntamente com a dádiva. Na narrativa javista de Gn2 os animais são chamados à presença do homem que lhes dá nomes, e assim participa no processo criacional. Os animais serão parceiros da humanidade na tarefa agrícola e de proteção da terra, ao servirem o homem e a mulher com seu trabalho.40 Por sua vez, o verbo sujeitar em hebraico tem a conotação de reduzir a escravidão, pisotear, amassar. Quem sofre a sujeição é a terra. Já o verbo dominar também pode ser traduzido por governar, exercer poder sobre. Quem sofre a ação são os animais.41 A leitura separada dos textos e individualizada, sem dúvida nos levará a uma interpretação errônea de que o governo que Deus concede a humanidade sobre a terra é arbitrário e coercitivo somente. Ao colocarmos as duas narrativas lado-a-lado queremos demonstrar que, se por um lado o meio ambiente é o local de domínio da raça humana, por outro ângulo ele também é, ao mesmo tempo, parceiro do ser humano, criatura de Deus, objeto da nossa responsabilidade. Ou seja, governar a terra (Gn 1.26) é uma tarefa que exige força, mas 38 LUTERO, M. (1995). “Aos pastores para que preguem contra a usura”, In: OSel 5, p. 491. 39 DREWERMANN, E. (2004). Religião pra quê? Buscando sentido numa época de ganância e sede de poder. São Leopoldo: Sinodal, p.7. 40 SCHMIDT, W. H. (2004). A Fé do Antigo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, p.258, 263 41 Cf. DREWERMAN, E. op cit., p. 7ss. 17 igualmente sabedoria, responsabilidade, e sobretudo, amor cristão.42 A criação aguarda a revelação dos filhos e das filhas de Deus (Rm 8.22-23) e, por enquanto, suporta angústias e geme de dores por tudo que é feito contra ela. A expectativa da nova criação é grande (Is 11.6, 65.25; Ap 21.5) porém ainda não vivemos na nova criação, por outro lado já agora experimentamos a graça de Deus. Não faremos deste mundo a nova criação, mas não podemos cruzar nossos braços e apaticamente aguardar o irromper escatológico de Deus. A esperança escatológica quer nos fazer agir já agora, pois temos no dia de hoje uma tarefa de cuidar, zelar e a amar o que Deus criou. Para Lutero, Deus na criação instituiu o estamento da casa “oikos” como espaço de vivência e obtenção do pão diário. A vivência humana exige responsabilidade, pois está diretamente ligada ao estamento “espiritual”, a relação com Deus, o criador. A partir da relação entre palavra e fé, vivemos nossa relação “ser humano um com o outro” e “ser humano com a criação”. A palavra que nos convida à fé é a mesma palavra que nos responsabiliza um com o outro e com a criação em amor.43 3.5 “A imagem de Deus os criou” – o valor da pessoa humana Vida na perspectiva biológica é simplesmente uma função bioquímica. Ao cessarem as funções bioquímicas do cérebro, o indivíduo entra em morte cerebral (ainda que as células do corpo ainda estejam vivas – o que possibilita um transplante, por exemplo). O ser humano enquanto usina bioquímica não é diferente do animal, o que o diferencia é sua consciência. Neste sentido, a partir do racionalismo o ser humano é definido enquanto ser que pensa [res cogitans] e ser material (corpo) [res extensa], levando assim à máxima de Descartes “cogito ergo sum” [penso, logo sou]. O ser humano na filosofia racionalista-cartesiana é definido pela capacidade de consciência. Teologicamente consideramos vida uma dádiva de Deus. O corpo humano é também uma usina bioquímica. Ainda que a concepção oriental (hebraica) seja pré- científica ao compreender o ser humano como moldado do barro, o compreende como feito da mesma matéria que a natureza criada. O ser humano também é transitório e “bioquímico”. O ser humano não é algo mágico. Nisto a teologia hebraico-cristã é bem realista. Porém, vida é dádiva, pois o ser humano moldado do barro, ainda sem vida, recebe-a de fora como sopro que Deus insufla nas narinas do ser humano. Este sopro de Deus promove vida no ser humano. E este passa a ser definido como “alma vivente” [ser com vida]. O relato de Genesis 1, por sua vez, atesta que o ser humano foi criado a imagem e semelhança do criador. Estes termos cognatos designam a intenção do criador em que sua criatura fosse seu representante fiel na Terra, responsável pela administração do maravilhoso empreendimento de Deus. Enquanto o pensamento racionalista considera o ser humano um ser enquanto pensa, e de acordo com o pensamento pós-moderno, enquanto é útil, a partir dos dois relatos da criação percebe-se que o ser humano é definido enquanto ser na relação com seu criador (imagem e semelhança do criador; e ser que recebe vida a partir de fora). A dignidade do ser humano nãose encontra no que faz, ou no que é em si mesmo, mas no fato de ser criado por Deus. Por isto a vida humana é algo sagrado e todo ser humano é digno por ter sido criado por Deus, e igualmente por ter sido amado por Deus, em Cristo Jesus. A vida humana não está à disposição do mercado ou do governo. Não se pode dispor da vida humana para fins de pesquisas sem um consentimento realmente livre e esclarecido.44 42 SILVA, M. (2004). “Fé Cristã e Meio Ambiente”, In: CBE. Missão Integral. Viçosa: Ultimato, Belo Horizonte: Visão Mundial, p. 91-100. 43 Cf. BAYER, O., op. cit., p.87ss. 44 Há relatos de que populações em países pobres são submetidas a experimentos científicos sem um consentimento livre, pois foram induzidos por motivos econômicos e políticos, ou mesmo coagidos a participarem das pesquisas. Nestes casos o consentimento também não é esclarecido, pois os objetivos das pesquisas não são deixados claros para quem dela participa, e não é oferecido suporte médico e 18 Igualmente a força de trabalho não está à disposição do mercado sem justa recompensa. Condena-se assim toda forma de escravagismo, inclusive aquela que é velada através do pagamento de somas irrisórias e completamente injustas, beneficiando grandes empresas em detrimento da saúde e da dignidade de vida das populações empobrecidas. Cabe aos governos, e na omissão deles ao terceiro setor, a defesa da vida humana, da sua dignidade, do direito ao trabalho com justa remuneração, da educação de qualidade, do acesso à saúde, esporte, lazer e cultura, da garantia das liberdades individuais e do respeito às suas crenças e valores individuais. Importante observar que o primeiro relato atesta que o ser humano foi criado “homem e mulher” (literalmente “macho” e “fêmea”), não diferenciando os dois gêneros como sendo um mais importante que o outro diante de Deus. O relato, pelo contrário, atesta a igualdade de ambos diante do criador. Já o segundo relato, mais polêmico, afirma que a mulher foi criada da “costela”, mais precisamente “do lado”. O vocábulo hebraico utilizado significa também coluna, viga de sustentação, o que pode indicar uma relação estrutural entre homem e mulher. Em Genesis 2.23, o homem exclama que a mulher foi feita ossos dos seus ossos e carne da sua carne. Há uma identificação profunda, relacional, e intensa entre homem e mulher. O texto não pode ser usado no sentido de menosprezar o papel da mulher, mas para demonstrar a mutualidade que pode existir entre homens e mulheres, desfazendo assim uma tradição que colocou a mulher numa posição de completa submissão à vontade masculina. Não é possível concordar com posições que inferiorizam a mulher no mercado de trabalho, no acesso à educação, à saúde, muito menos legitimar qualquer forma de violência física ou verbal. A igualdade de homem e mulher está dada na criação e igualmente em Cristo (Gl 3.28), e por isto precisamos defender o direito da mulher. A imagem de Deus não se refere somente às pessoas adultas. Já mencionamos que o paradigma racionalista considerava o ser humano apenas quanto à sua racionalidade. Esta lógica é quebrada ao considerarmos o ser humano enquanto criado à imagem e semelhança de Deus. Igualmente são imagem e semelhança de Deus crianças, idosos, povos indígenas, populações marginalizadas, encarcerados, moradores de rua, entre outros contingentes populacionais em situação de risco social, exclusão, pobreza e marginalização. Jesus Cristo disse: “deixai vir a mim as criancinhas, não as impeçam, pois delas é o Reino dos céus” (Mc 10.14). O profeta Zacarías anuncia tempos em que novamente idosos e idosas estarão nas praças. Toda a pessoa humana é amada por Deus e, portanto, precisa ter seu direito assegurando, priorizando-se aquelas que têm sofrido injustiça, pobreza, a falta de oportunidades, a exclusão. 3.6 O papel da diaconia na mudança do cenário social e economico Segundo Kjell Nordstokke “a diaconia é a ação, a partir da identidade cristã, num contexto de sofrimento e injustiça, com a finalidade de transformar”.45 Ela não é o fruto de uma reflexão ética, mas fruto do agir gracioso de Deus em Cristo que “veio para servir” (Mc 10.45) e nos chama para o serviço (Mc 10.44). Na justificação a pesoa cristã é feita nova criatura e chamada a viver em novidade de vida. Não é a nova ética que promoverá a diaconia, mas o estar em Cristo, expresso no discipulado que inclui o serviço (diaconia). Serviço que surge como gratidão, pois Deus em Cristo demonstra sua graça transformadora. justa compensação pela participação. Cf. WESTPHAL, E. R. (2004). O Oitavo Dia. Na era da seleção artificial. São Bento do Sul: União Cristã, p.39-66. 45 NORDSTOKKE, K. (1998). “Diaconia”, in SCHNEIDER-HARPPRECHT, C. (org.) Teologia Prática no Contexto da América Latina. São Leopoldo: Sinodal, ASTE, p. 268-290. Cf. também as propostas em Diaconia do Plano de Ação Missionária da IECLB: PINTO, H. (org.) (2008). Missão de Deus – nossa paixão. São Leopoldo: Sinodal, p. 46-50. 19 A justificação insere a pessoa cristã na comunhão do corpo de Cristo. Através da vívida figura do corpo, apresentada pelo Apóstolo Paulo, é demonstrado que quando um membro sofre, todo o corpo sofre. Há mutualidade na comunhão. A comunhão do corpo de Cristo possibilita rompermos as barreiras do individualismo, pois em Cristo estamos unidos àquela pessoa que sofre. Se como pessoas cristãs, pertencemos a um só corpo, e em Cristo está dada nossa comunhão, igualmente como pessoas criadas à imagem e semelhança de Deus pertencemos ao gênero humano, e no ato gracioso e de amor da criação está dada nossa comunhão com toda pessoa humana. A diaconia expressa o amor da comunidade cristã em favor de toda a comunidade humana. Porque cremos no agir transformador de Cristo através da graça de Deus, cremos que a diaconia é a expressão em ação da graça que transforma o mundo através de pessoas e igrejas cristãs. Desde a década de 1960, o conceito de diaconia passa por uma mudança. A nova consciência política desde 1970 aponta para o desenvolvimento e mudança social. A diaconia como uma assistência das Igrejas em favor dos necessitados tornou-se um conceito antiquado, assevera Nordstokke. Em 1986, o CMI organizou uma Consulta sobre Diaconia no Chipre que definiu diaconia como “expressão viva de testemunho cristão em resposta às necessidades e desafios da comunidade em que cristãos e as igrejas vivem”.46 Segundo esta Consulta, a diaconia deve responder aos dilemas da globalização através de uma “globalização de baixo”. Isto significa empoderar pessoas para responderem em ações de paz e amor, como sujeitos do desenvolvimento social, tendo uma teologia que proclame a importância e o valor da vida humana. Para o empoderamento e a transformação, a diaconia reconhece o poder dos pobres e excluídos. Poder este que é dado pelo próprio Cristo, que confere autoridades às pessoas discípulas para que possam agir em seu nome. Em 2001, a FLM organizou a Consulta sobre Diaconia Profética em Johannesburgo. Por profética a diaconia entende a luta dos profetas do Antigo Testamento pela justiça social. Enquanto ação a diaconia comunica a mensagem de que novos tempos virão e defende a justiça, desmascarando injustos e firmando um compromisso em favor do direito dos excluídos.47 Portanto, a diaconia não é como uma poderosa ação social das igrejas, mas como um empoderamento do Espírito de Deus. Reconhecemos que não somos por si mesmos os sujeitos da tranformação social, mas cremos que Deus empodera a sua Igreja, o Corpo Universal, para a transformação. Uma das possíveis maneiras de as Igrejas promoveremconcretamente o empoderamento para a transformação é através da criação de entidades do Terceiro Setor. Estas entidades terão a possibilidade de criar espaços de comunhão entre pessoas cristãs, e de outras religiões e credos, que tenham o mesmo objetivo de transformação no cenário sócio-economico. As entidades do Terceiro Setor podem manter ligação com a Igreja, e ao mesmo tempo cooperar com o poder público, empresas privadas e com a sociedade civil para a promoção das suas finalidades sociais. A partir das demandas sociais encontradas no trabalho numa entidade do Terceiro Setor, surgirão temáticas que deverão ser debatidas com a comunidade civil. A diaconia não é ação política, porém, promoverá tal debate político e a colaboração social para a construção de políticas públicas justas e que promovam a tranformação. Desta forma a diaconia pode colaborar na transformação do cenário político. 46 KLAUS, P. (Ed.) (1987), Called to be neighbours: Diaconia 2000. Official Report WCC World Consultation, Inter-church Aid, Refugee and World Service Lanarca 1986.Genebra: WCC. 47 Cf. NORDSTOKKE, K. (2005), “Diaconia – uma perspectiva ecumênica e global”. In Estudos Teológicos, vol. 45, n.1. São Lepoldo: EST, p. 13-16. 20 Como exemplos de ações diaconais que visam à transformação, podemos citar as seguintes demandas sociais: promoção da agricultura sustentável e orgânica, de melhores condições e acesso à habitação, acesso à saúde e assistência social, defesa dos direitos humanos, direitos das mulheres, crianças e idosos, superação da violência, das desigualdades econômicas e sociais, dos preconceitos, na geração de emprego e renda, na promoção de práticas comerciais justas. Exemplos de instituições e ações diaconais ligadas à IECLB (CAPA, FLD, COMIN) que já vêm atuando no contexto brasileiro podem ser encontradas adiante neste documento (Quadros 1 e 2). Quadro 1: Trabalhos Diaconais na IECLB – COMIN e FLD a. Conselho de Missão entre Índios (COMIN) O Conselho de Missão entre Índios (Comin) é um órgão da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). Foi criado em 1982, com a finalidade de assessorar e coordenar o trabalho da IECLB com os povos indígenas em todo Brasil. Para atender este objetivo, o Comin se faz presente junto a alguns povos e comunidades indígenas, criando parcerias e dando apoio nas áreas da educação, saúde, terra, organização e auto-sustentação. O Comin tem como princípio e compromisso apoiar as prioridades colocadas pelos povos e comunidades indígenas, respeitando seu jeito de ser e sua cultura, trabalhando com eles e não por eles. Os trabalhos do Comin são realizados por um grupo de profissionais nas áreas de pedagogia, teologia, pastoral, direito, enfermagem e medicina, assistência social, agronomia e outras. Em 1824 chegaram ao Brasil as primeiras famílias evangélico-luteranas. Compunham-se, na sua maior parte, de pessoas pobres, que na Alemanha não tinham chances nem espaço. Sentiram-se atraídas pela promessa de no Brasil terem terra em abundância e liberdade. Ninguém lhes disse que as terras eram habitadas por povos indígenas. Além disso, no uso da terra havia conceito e prática totalmente distintos. Para os povos indígenas, terra, rios e mata eram de uso coletivo para sua subsistência. Para os europeus, terra era propriedade particular com limites bem demarcados e escritura lavrada em cartório. Agravando ainda mais a situação, a sociedade europeia considerava-se superior e não reconhecia os índios como seres humanos plenos. Essa realidade criou duas vítimas: uma foram os imigrantes, induzidos a exercer um papel que muitas vezes não souberam avaliar. Outra foram os povos indígenas, que, pela força das armas de fogo, começaram a perder suas terras e vidas. Em meio a tudo isso, no entanto, sempre houve pessoas e grupos que tentaram ser justos com os índios e colocaram-se do lado deles. Várias e valiosas iniciativas aconteceram ao longo dos tempos. Em 1982, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) criou então o COMIN para estudar e coordenar o seu trabalho com os povos indígenas em todo o território nacional. O Evangelho de Jesus Cristo não admite violências e injustiças. Foi ele que começou a abrir os olhos das pessoas, grupos e igrejas para a história do Brasil. Dos cinco milhões de indígenas no ano 1500, existem hoje 700 mil, dos quais aproximadamente 250 mil em áreas urbanas. Os outros foram eliminados com armas, venenos e doenças. Com relação a isso: O COMIN confessa que a igreja luterana, ao mesmo tempo em que foi vítima, também participou deste pecado, e, como sinal de arrependimento, coloca-se, incumbido pela IECLB, do lado dos povos indígenas. Com eles trabalha e luta, para criar uma nova realidade onde o índio seja respeitado e amado, possa viver amparado por todos os direitos de cidadão brasileiro e tenha consideradas a sua cultura e história diferenciadas. O COMIN entende seu trabalho como participação num processo de reconciliação que leva ao diálogo e à solidariedade com os povos indígenas. (2 Co. 5.17-21) O COMIN realiza o seu trabalho na esperança da ressurreição e na disposição de colocar sinais do Reino de Deus. O COMIN confia que a fé e o amor de Jesus Cristo darão forças e mostrarão caminhos para isso. O COMIN tem como objetivo: Dar testemunho evangélico, como discípulos e discípulas de Jesus Cristo, para que os povos indígenas tenham vida plena (Jô 10.10), apoiando-os para que possam sobreviver física e culturalmente e organizar a sua vida de acordo com garantias dadas pela Constituição Federal: 21 o "São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens" (Art. 231). Dar testemunho evangélico, conscientizar e informar a sociedade envolvente, em especial às comunidades da IECLB, sobre os povos indígenas para que se solidarizem com eles e se engajem em favor dos direitos deles. Baseado na cruz e ressurreição de Jesus Cristo, o COMIN compromete-se a: Apoiar as prioridades colocadas pelos povos indígenas; Reconhecer e respeitar o seu jeito diferente de ser, a sua cultura e religiosidade; Acompanhá-los na preservação e reconstrução de sua cultura e dignidade; Procurar o diálogo com os povos indígenas, também sobre as questões relativas à fé e espiritualidade; Garantir espaços para eles em nossa sociedade; Apoiá-los em suas alianças; Trabalhar com eles e não por eles; Ajudar a sociedade envolvente e as comunidades da IECLB a entender melhor os povos indígenas e a superar os preconceitos; Refletir pastoral teologicamente sobre a nossa relação com os povos indígenas; Fomentar o diálogo entre as comunidades indígenas, as comunidades da IECLB e a sociedade envolvente; Denunciar as injustiças, o descaso e o desrespeito contra os povos indígenas. Fonte: Site do COMIN – http://www.comin.com.br b. Fundação Luterana de Diaconia (FLD) Tanto o CAPA quanto o COMIN são projetos apoiados pela Fundação Luterana de Diaconia (FLD). A FLD foi criada no dia 17 de julho de 2000 por decisão do Conselho da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). Seu trabalho se dá com grupos socialmente vulneráveis e comunidades empobrecidas, sem discriminação de etnia, gênero, convicção política ou credo religioso. A FLD é uma entidade com personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos. É herdeira do antigo Serviço de Projetos Desenvolvimento da IECLB e de sua experiência de mais de 34 anos na área de desenvolvimento comunitário. Com sede em Porto Alegre (RS), a FLD atende projetos em todo o território
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