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o primeiro inoculado. Colabora ainda com Jacinto Nogueira da Gama para fundar na capitania uma filial do Banco do Brasil. Acrescendo a isso tudo, Brant age em outros setores que são menos simpáticos para nós, embora do agrado do governo de então. Reprime a insurreição dos negros havida na Bahia, em 1815, e com tanto ardor que feriu o zelo enciumado do governador, o Conde dos Arcos. 149 O Marquês de Barbacena e a diplomacia do Império. O liberalismo econômico de Canning e a Missão Stuart Monarquista por convicção, impede na medida de suas forças que a revolução pernambucana de 1817 se alastre à terra de Caramuru. Em 1819, Brant inaugura a navegação a vapor até Cachoeira, com um barco construído no Estaleiro da Preguiça (apesar do nome!) e movido por uma máquina importada por ele da Inglaterra. A fé de ofício de Caldeira Brant crescia, pois, a olhos vistos e, ainda em 1819, esse êmulo de Mauá na atividade febricitante é graduado marechal e nomeado fidalgo cavaleiro. O futuro Marquês de Barbacena levava assim para a diplomacia um passado de serviços, que não vinha do nada. E bem longe de forçar o seu ingresso na carreira diplomática por meios escusos (ainda hoje muito em voga), nela entra convidado, feito sur place encarregado de negócios, quando se achava em Londres. Com efeito, na série de motins e incidentes que precederam a Independência, o surgido na Bahia a 1o de fevereiro de 1821 foi dos mais sérios, tendo dele participado Caldeira Brant. Em consequência, Brant é obrigado a sair daquele último reduto de Portugal na Colônia, dirigindo-se ao Rio. Aí chegado é preso, mais a título, porém, de preservação de sua integridade física. Eis o que o levou a pedir licença para embarcar para Londres, onde aportou em 2 de junho de 1821. De lá é que Brant se põe em correspondência com os deputados brasileiros às Cortes lisboetas. De lá é que estabelece contato com José Bonifácio, que logo lhe enviou plenos poderes de encarregado de negócios na Inglaterra, como fizera no Prata com Correia da Câmara. 150 História da política exterior do Brasil Renato Mendonça A fortuna pessoal facilitava sobremodo o êxito e o brilho da missão do novel diplomata, principalmente diante do esquecimento (imperdoável, no entanto) de Bonifácio em remeter-lhe os recursos financeiros necessários. De início, consegue um grupo de oficiais ingleses, que trouxeram à marinha brasileira o concurso técnico indispensável. Em seguida, foi sua lembrança sugerir ao nosso patriarca que obtivesse a cooperação de Lord Cochrane, desavindo com o Chile, onde servia. Barbacena e o segundo casamento do Imperador Mas o papel de Brant na diplomacia do Império aparece destacado em duas fases nítidas: as negociações para o reconhecimento do Brasil e o agenciamento do segundo casamento de Pedro I. Se a primeira missão esteve longe de ser fácil, diante sobretudo da política de Metternich, mais difícil era a segunda. Casar um viúvo de 28 anos, exacerbado na vida sexual, famoso até pela Domitila – e isso acompanhado de uma depreciação exagerada dos cônsules estrangeiros ao informarem seus governos a respeito –, provocaria o fracasso do negociador mais ladino. Ao Marquês de Barbacena entregam por isso, com carta branca, a solução do caso. 151 O Marquês de Barbacena e a diplomacia do Império. O liberalismo econômico de Canning e a Missão Stuart Figura 3 - O imperador do Brasil, D. Pedro I D. Pedro I, imperador constitucional do Brasil. 152 História da política exterior do Brasil Renato Mendonça Figura 4 - Lord Stuart, apresentação de credenciais na Corte do Rio de Janeiro Chegada da Missão Stuart e apresentação de credenciais ao imperador do Brasil, Dom Pedro I. 153 O Marquês de Barbacena e a diplomacia do Império. O liberalismo econômico de Canning e a Missão Stuart Se a imaginação do brasileiro não fosse débil em concretizar no teatro as suas criações artísticas, a literatura nacional já possuiria de certo uma deliciosa comédia em torno às dificuldades de Brant, ao arranjar noiva para o nosso estourado rei cavaleiro. Uma noiva para Sua Majestade... – seria até no título uma peça divertida. E essas dificuldades se achavam, aliás, previstas de modo meio cômico nas instruções recebidas por Barbacena do Marquês de Queluz, redigidas a 18 de agosto de 1827: (...) estou autorizado pelo mesmo augusto senhor para declarar a Vossa Excelência que, achando dificuldade na execução literal de qualquer dos artigos destas instruções, poderá Vossa Excelência providenciar como entender, uma vez que preencha o grande fim de obter o transporte de sua majestade a imperatriz com a maior brevidade possível (...). (Apud Calógeras, O Marquês de Barbacena, p. 181). Tanto temor não era infundado. Com efeito, ao chegar a Viena em 21 de janeiro de 1828, Barbacena logo percebeu que Francisco I estava com má vontade de casar o genro enviuvado. Pedro I, de ânimo arrebatado e sem cálculo, esquecera que na corte austríaca só o interesse tinha voz alta, e este se inclinava para que o imperador do Brasil não viesse a ter mais filhos, de modo a não prejudicar a herança dos nascidos de D. Leopoldina. O resultado do mau encaminhamento das negociações não se fez esperar. A 13 de fevereiro, as recusas já eram em número de oito, concordando Metternich em suspender as diligências a fim de não melindrar a delicadeza imperial... 154 História da política exterior do Brasil Renato Mendonça O casamento com as princesas da Baviera malogrou desde logo. Eram tidas por estéreis. Além disso, uma estava noiva, e a outra, de 15 anos apenas, andava... apaixonada. Uma sobrinha de Francisco I, filha do falecido rei da Sardenha, escusava-se por achar muito longe o Brasil... A solução dada pela casa Wurtemberg, que possuía três princesas (Paulina, Isabel e Antonieta), não dizia positivamente não. Embaralhava-se numa vaga nebulosidade para disfarçar o desinteresse. Estudando esse curioso episódio da história diplomática do Brasil, escreve Heitor Lyra com certa “verve”: A resposta do rei de Wurtemberg era dúbia; mas nas suas entrelinhas descobria-se logo uma recusa antecipada. Das suas três sobrinhas, uma não havia sido consultada, sob pretexto de que recusara antes mudar de religião; a segunda estava em Dresden, isto é a poucos dias de viagem, e ainda não respondera; finalmente, quanto à terceira, Paulina, que morava em Stuttgart, na própria corte, o rei não havia nem mesmo tocado em seu nome. Em resumo: a resposta nada respondera (Ensaios Diplomáticos, p. 38). Diante de mais este fracasso, Barbacena jeitosamente conseguiu suspender as negociações até novas instruções. Tendo comunicado antes para o Rio de Janeiro as suas suspeitas em torno à traição da corte vienense, que tudo fizera para Pedro I não se casar mais, Barbacena embarca afinal para o Brasil. Chega ao Rio de Janeiro a 16 de maio de 1828 e já no mês de junho prepara a volta. Pois o imperador resolvera mandar D. Maria da Glória para Viena, a fim de educar-se junto ao avô, encarregando o marquês desta missão. 155 O Marquês de Barbacena e a diplomacia do Império. O liberalismo econômico de Canning e a Missão Stuart Dessa vez ainda, a carta branca que Barbacena recebera lhe ia fornecer uma excelente oportunidade de servir a Pedro I. Ao partir do Rio de Janeiro a esquadra que levava D. Maria da Glória, em 5 de julho de 1828, a direção era Viena. Fundeando, porém, em Gibraltar, aos 2 de setembro, Barbacena é informado do plano conjunto dos gabinetes de Londres e Viena, no sentido de subtrair, pela autoridade do avô, a jovem rainha à tutela de Pedro I. Preparavam para a herdeira do trono português o mesmo destino do infeliz duque de Reichstadt, filho