248 pág.

Pré-visualização | Página 31 de 47
whether Brazil was governed by an Emperor at Rio or by a Cortes at Lisbon75. E Temperley mais adiante acrescenta, reportando-se ao desinteresse de Metternich pelos direitos da Coroa portuguesa uma vez que no Brasil se mantinha firme um Império, que “tais conceitos mostram o seu regalismo cínico”. No ambiente favorável da mediação inglesa e austríaca era que Barbacena, na companhia de Gameiro, iria desenvolver enorme atividade com o fito de obter o reconhecimento do Império. As perspectivas não apareciam muito sorridentes apesar da parcialidade pouco velada dos mediadores, tanto que Barbacena lutou em Londres dois anos sem cantar vitória. A própria mediação foi de início ameaçada, porque o ministro de Portugal, o Conde de Vila Real, deu início às negociações, exigindo da Grã-Bretanha o compromisso de nunca reconhecer o Brasil por sua iniciativa nem D. Pedro com o título de imperador. Diante de tais condições, Canning recusou-se a prosseguir. Vila Real então alega que as demais Potências Aliadas, França, Rússia e Prússia poderiam também servir de mediadores. Canning investe contra a Santa Aliança com uma de suas tiradas definitivas: “A Inglaterra jamais reconheceria o direito das Potências Aliadas de se intrometerem nos negócios das Colônias”76. Afastada tal esperança, Vila Real teve de conformar-se com a mediação de Canning e Neuman, encarregado de negócios da Áustria em Londres. 75 Harold Temperley. The foreign policy of Canning (1822-1827), Londres, 1925, p. 214. 76 H. Temperley. Obra cit., p. 214. 161 O Marquês de Barbacena e a diplomacia do Império. O liberalismo econômico de Canning e a Missão Stuart Dentro em pouco, saltava aos olhos a conciliação impossível dos pontos de vistas dos países em choque: Barbacena a exigir o reconhecimento de Portugal para entabular qualquer negociação; Vila Real a não querer ouvir falar em Independência ou Império do Brasil. A mediação chegaria a um jogo de silêncio, a pôr em contato “diplomatas que queriam ouvir e se não animavam a falar...”77. Por outro lado, os sucessos da Confederação do Equador, ensaio republicano que vencera no norte do Brasil, animava a resistência dos portugueses, que chegavam a contar com o desmembramento para, em último caso, conservarem o Amazonas e o Grão-Pará. A atitude de D. Pedro dissolvendo a Constituinte sofria, outrossim, má interpretação em Lisboa para as veleidades da Colônia rebelada. A consequência é que o tempo passou em vão, no meio de pourparlers inúteis. O impasse sobreveio. Aqui inegavelmente a atuação de Canning faria uma falta igual ao fracasso porque ele mesmo traça de seu punho um projeto apresentado na reunião de 12 de agosto de 1824 às partes baseado em linhas gerais nas propostas de Barbacena e Gameiro. Vila Real, para ganhar tempo ou por insensatez o que é mais aceitável, recusa-se a enviar a Lisboa o projeto de Canning. Canning dá outra cartada e chama a si a remessa do projeto de tratado ao governo da Bemposta. O gabinete do gorduroso D. João VI sofria, porém, um trabalho de socapa e intriga, muito propício a vencer numa Corte decrépita. 77 Calógeras. O Marquês de Barbacena, p. 78. 162 História da política exterior do Brasil Renato Mendonça Palmela declarava-se simpático aos ingleses o que lhe valeu depois a Embaixada em Londres. Subserra jogava-se nos braços amorosos da França – o que lhe proporcionou a Embaixada em Paris. Um fato banal, como a concessão de uma condecoração, define o já decadente D. João VI. A corrida de agrados e favores do representante inglês e do francês junto ao gabinete da Bemposta, decorrente embora da séria luta do embaixador Hyde de Neuville contra o prestígio britânico, oferecia por vezes ensejo a desses casos divertidos! Mal tinha sido D. João VI condecorado pelo governo da França, um vaso de guerra britânico singrava reto a Lisboa com a Ordem da Jarreteira. E o monarca, com a perna gorda tomada pela erisipela, dava o desespero com os “physicos” reais, por não poder exibir a liga simbólica... A nau do Estado andava sujeita a dessas tempestades de copo d’água, que desviavam a atenção dos homens públicos. O projeto Canning não fora aceito por D. João VI, que exclamava: “Vejo que os aliados seriam capazes de me privarem do poder, ao mesmo tempo em que a Inglaterra me persuadiria a abdicar minha Coroa brasileira”78. Em resultado, um contraprojeto foi trazido à discussão por Vila Real na sexta conferência realizada em Londres, em 11 de novembro de 1824, onde se insistia que o rei de Portugal fosse considerado Imperador Senhor do Brasil. Barbacena e Gameiro rejeitaram o contraprojeto, mas o remeteram para o Rio de Janeiro, a conselho de Canning. 78 Harold Temperley. Obra cit., p. 278. 163 O Marquês de Barbacena e a diplomacia do Império. O liberalismo econômico de Canning e a Missão Stuart Mas as manobras escusas e pouco hábeis da diplomacia lusitana começavam a vir à tona. Esquecido do fracasso da missão Rio Maior – Luís Paulino, que viera ao Brasil negociar com D. Pedro, de novo o governo português enviava outro emissário, José Soares Leal clandestinamente e com mera carta de apresentação. Se a expedição Rio Maior fora em 1823 uma falta de habilidade política, a viagem de Soares Leal representava um desacato aos mediadores. D. Pedro soube repelir ambas. Canning, porém, não podia perdoar essa duplicidade de conduta, suspendendo as conferências dos mediadores e tomando a peito negociar diretamente com o Brasil. Barbacena exultava afinal com a missão de Sir Charles Stuart, que Canning enviaria ao Rio para concluir o Tratado de 29 de agosto de 1825, com o qual a Metrópole reconhecia a independência de sua antiga colônia, já um vigoroso Império. E logo embarcava para o Brasil, a fim de chegar antes de Stuart, visando aplainar o terreno e as dificuldades que se levantassem na fase nova do reconhecimento. A Barbacena se deve incontestavelmente ter cultivado sempre as predisposições de Canning para com a nossa causa. Ao embarcar de Londres, recebia do notável estadista uma carta honrosa por que se pode medir o alto apreço de Barbacena junto ao gabinete inglês. E terminada a missão Stuart, ainda haveria Barbacena de sustentar os ônus de dívida de Portugal assumida pelo Brasil, justificando esse meio incriminado injustamente de ter sido uma “compra da Independência...”. 164 História da política exterior do Brasil Renato Mendonça Não teve a glória do reconhecimento e sofreu as críticas ao tratado adicional, que estipulou a indenização dos dois milhões de libras pagos pelo Brasil a Portugal. Não teve a sorte de Gameiro que terminou ministro pleni- potenciário do Brasil em Londres. Não teve o valimento do imperador que, num gesto brusco e estúpido, o demitiu de ministro da Fazenda para dar balanço em contas mortas há muito apresentadas. O que Barbacena teve foi luta e trabalho, obscuro e paciente, tenacidade de judeu e calma nas resoluções, junto ao seu ar franco e maneiroso. Por isso Barbacena ficará como figura central do reconheci- mento do Império brasileiro. Bibliografia 167 A relação seguinte inclui obras citadas no texto e outras consultadas, embora não mencionadas. Fontes Documentos sobre o Tratado de 1750, Anais da Biblioteca Nacional, volumes LII e LIII, publicados por Rodolfo Garcia, Rio de Janeiro, 1938. Coleção de vários Escritos inéditos Políticos e Literários de Alexandre de Gusmão, Porto, 1841. Arquivo Diplomático da Independência, 6 volumes, Rio de Janeiro, 1922. BORGES DE CASTRO, José Ferreira. Coleção dos Tratados, Convenções, contratos e atos públicos celebrados entre a Coroa de Portugal e as mais potências, desde 1640 até ao presente, Lisboa, 1856. 168 História da política