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Introdução à História das RI

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1 
RELAÇÕES INTERNACIONAIS 
 
WILLIAMS GONÇALVES 
Professor dos PPGs. Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do 
Sul e da Universidade Federal Fluminense 
 
 
1 Introdução 
 
 
A análise das relações internacionais passou a ter sua importância reconhecida no 
início do século XX. Até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, o estudo das relações 
internacionais estivera a cargo de diplomatas, historiadores e juristas. A partir dessa data a 
situação mudou: notáveis esforços passaram a ser realizados no sentido de fazer, das 
Relações Internacionais, um campo de estudo específico e autônomo. Na prática, isso tem 
se traduzido no trabalho de definir, com alguma precisão, os limites da realidade das 
relações internacionais, bem como de produzir um dispositivo conceptual que resulte em 
análises integradas, as quais, por sua vez, possam permitir ir além das análises parciais 
produzidas pela Economia Internacional, pelo Direito Internacional, pela História 
Diplomática e pela Política Internacional. É cada vez maior o reconhecimento que as 
relações internacionais são extremamente complexas e abrangentes para serem submetidas 
às estreitas medidas estabelecidas por essas disciplinas. Ainda que cada uma delas possa 
iluminar aspectos relevantes da realidade, somente uma análise que combine, de modo 
articulado, conceitos elaborados por esses campos específicos poderá compreender sua 
extensão e sua densidade. Em outras palavras, o grande desafio enfrentado pelas Relações 
Internacionais é o de assumir sua indispensável multidisciplinaridade. 
Pode-se dizer, no entanto, que esse desafio tem sido enfrentado e vencido, 
exclusivamente, pelos acadêmicos do mundo anglo -saxão. Não obstante o conhecimento 
das Relações Internacionais interessar, em toda parte, àqueles que, de alguma forma, 
participam das relações internacionais (nomeadamente estadistas, diplomatas, militares e 
acadêmicos), o fato é que a produção acadêmica do mundo anglo-saxão neste campo, é 
 
 
2 
esmagadoramente superior à produção dos demais centros acadêmicos do mundo, juntos, 
incluindo os países nos quais há tradição de pesquisa universitário -acadêmica na área das 
Ciências Sociais. 
As razões determinantes dessa primazia anglo-saxônica no domínio dos estudos de 
Relações Internacionais são largamente conhecidas e podem ser decompostas, para fins 
analíticos, em três ordens, a saber: econômicas, acadêmicas e de poder. 
Inicialmente, as instituições dos Estados Unidos e da Inglaterra nunca pouparam 
recursos para apoiar a pesquisa e o ensino das Relações Internacionais. A primeira cátedra 
universitária dedicada a este campo de estudo, a Woodrow Wilson, financiada pelo cidadão 
inglês David Davies, foi criada em 1919, na Universidade de Gales. Mais tarde, logo após a 
Segunda Guerra Mundial, o Estado norte-americano, por meio de suas diversas agências 
governamentais, destinou somas fabulosas à pesquisa sobre os mais diversos aspectos das 
relações internacionais. Isso fez com que um grande número de acadêmicos talentosos se 
sentissem motivados a trilhar o caminho do estudo das Relações Internacionais. 
Em segundo lugar, apesar das diferenças existentes entre os mundos acadêmicos 
norte-americano e inglês, ambos assumiram o desafio tanto de definir o objeto específico 
das Relações Internacionais, como o de trabalhá-lo cientificamente. Nos Estados Unidos, a 
ciência das Relações Internacionais nasceu a partir dos estudos de Ciência Política; isso 
significa dizer que ela assumiu, desde o seu nascimento, um caráter eminentemente prático. 
Em sintonia com a tradição acadêmica desse país, na área da Ciência Política, as Relações 
Internacionais foram pensadas para resolver problemas concretos enfrentados pelo Estado, 
em detrimento da especulação puramente teórica. 
Na Inglaterra, por seu turno, o percurso foi diferente. Lá, as Relações Internac ionais 
nasceram da cooperação acadêmica entre os diferentes segmentos universitários e a 
diplomacia. Dessa experiência, formou-se uma tradição de estudo das Relações 
Internacionais que, muito antes de se resumir à defesa dos interesses nacionais britânicos, 
atribuiu significativa importância aos fatores culturais como relevantes aspectos 
componentes das Relações Internacionais. 
Em terceiro e último lugar, estão as razões de poder. Não é por mero acaso que as 
Relações Internacionais tenham se desenvolvido como estudo moderno tanto na Inglaterra 
(potência que exerceu o papel hegemônico durante o século XIX e início do século XX), 
 
 
3 
como nos Estados Unidos, que despontaram como a grande potência no início do século 
XX, vindo a se transformar em superpotência logo depois da Segunda Guerra Mundial. 
Pelo contrário, o estudo moderno das Relações Internacionais afigurou-se, às elites norte-
americanas e inglesas, como tarefa indispensável ao entendimento do mundo em mudança 
e, desse modo, à manutenção do poder que detinham. Essa conclusão de que o mundo havia 
mudado, fazendo-se necessário conhecê- lo melhor para continuar a exercer o poder e 
realizar seus respectivos interesses nacionais, levou as delegações diplomáticas dos Estados 
Unidos e da Inglaterra, presentes na Conferência de Paz de Paris, a assumirem a 
responsabilidade de criar centros de pesquisa neste campo. Tal compromisso foi honrado 
logo no ano seguinte (1920): foram criados, na Inglaterra, o Royal Institute of International 
Affairs, e, nos Estados Unidos, o Council of Foreign Relations. 
Dessa primazia anglo-saxã, nas Relações Internacionais , decorrem alguns efeitos 
acadêmicos e políticos extraordinariamente importantes, que podem ser sintetizados nas 
idéias de acúmulo de poder e de luta pela conservação da posição hegemônica. Ao se 
dedicar, com grande afinco, ao estudo das Relações Internacionais, os anglo-saxãos 
elaboraram hipóteses, formularam teorias e definiram os conceitos que se universalizaram, 
tais como aqueles que lhe são específicos, ou seja, criaram o léxico das Relações 
Internacionais. Qualquer pessoa que se interesse por este campo de estudo, em qualquer 
parte do mundo, deve, obrigatoriamente, exercer algum domínio sobre esse léxico ; caso 
contrário, não conseguirá estabelecer diálogo com os que se dedicam à pesquisa nessa área. 
Por assim dizer, o conhecimento tanto da língua inglesa, como da produção acadêmica 
norte-americana e inglesa nas Relações Internacionais constitui condição indispensáve l 
para iniciar toda espécie de debate acadêmico. Por outro lado, justamente por terem criado 
o léxico das Relações Internacionais e por reunirem o maior número de centros de pesquisa, 
os acadêmicos anglo-saxãos definem o nível de excelência da análise e impõem os termos 
do debate. Isso significa, enfim, que não dispõem unicamente do poder político para 
satisfazer seus respectivos interesses nacionais, como também, do poder sobre o próprio 
discurso das Relações Internacionais. 
Esse poder de determinar o que é relevante e, assim, impor a direção a ser dada à 
pesquisa, torna-se muito mais visível nos momentos nos quais ocorrem grandes mudanças 
no sistema internacional, tal como aconteceu no início da década de noventa, quando 
 
 
4 
terminou a Guerra Fria e o sistema internacional, de bipolar, passou a ser unipolar. A 
vitória estratégica dos Estados Unidos sobre a União Soviética (e sobre o mundo por ela 
comandado) levou não apenas à mudança da “agenda política internacional”, como 
também, correlativamente, à mudança de enfoque do mundo acadêmico sobre as questões 
internacionais. Imediatamente, por não se ter previsto as grandes modificações ocorridas no 
sistema internacional, passou-se a considerar a teoria Realista como imprestável paraa 
análise. Segundo o novo enfoque dominante, para empreender análises válidas, era 
necessário recuperar o instrumental liberal, com ênfase no livre-comércio, na generalização 
dos princípios liberal-democráticos e no esvaziamento do Estado-providência. Além da 
óbvia idéia de obsolescência do projeto socialista, passou-se, também, a entender que as 
questões de defesa da soberania e de segurança haviam dado lugar às questões econômicas 
globais ; isto é, a problemática geopolítica teria sido substituída pela problemática 
geoeconômica. Considerou-se, igualmente, que o problema das relações econômicas 
assimétricas entre as grandes potências capitalistas e os pequenos Estados, bem como o 
fenômeno da dependência econômica, na verdade, não tinham existência real, uma vez que 
se constituíam em mera manifestação ideológica do tempo da Guerra Fria. Desse modo, por 
considerar que o fim dessa guerra havia apagado todas as diferenças entre os Estados que 
comp unham o sistema internacional, decidiu-se que não havia mais porque falar de 
Terceiro Mundo, de luta pelo desenvolvimento, tampouco de reforma das instituições 
econômicas internacionais. Enfim, em consonância com os novos interesses demonstrados 
pelas grandes potências, especialmente pelos Estados Unidos, o mundo acadêmico desses 
Estados redirecionou a curiosidade intelectual, com vistas a melhor servir a esses novos 
interesses. Ao mesmo tempo, pelo efeito hegemônico, passou a pautar as linhas de pesquisa 
do restante do mundo, especialmente dos países da periferia. 
Isso posto, conscientes dos interesses que cercam o estudo das Relações 
Internacionais, obje tivamos, neste texto, introduzir algumas questões que possam, de 
alguma maneira, contribuir para o melhor entendimento da questão. Pretendemos, pois, 
apresentar a origem e a evolução das Relações Internacionais, o perfil das suas correntes 
teóricas mais importantes, além de discutir os conceitos mais correntes na bibliografia 
especializada. 
 
 
 
5 
 
 
 
2 Definição 
 
Recorrer às definições, não é a melhor forma de apresentar uma disciplina. Além de 
ser difícil encontrar uma que seja capaz de exprimir o conteúdo da disciplina com a 
objetividade e a abrangência necessárias, qualquer uma das definições que venha a ser 
escolhida será, inevitavelmente, alvo das mais diversas contestações. Isso porque as 
definições não são (e jamais poderão ser) neutras. Quem se propõe a definir, o faz à luz de 
alguma teoria. O resultado, desse modo, sempre deverá exprimir uma determinada 
concepção teórica, mesmo que não a explicite. Apesar disso, não se pode deixar de 
apresentá- las, mesmo que seja somente para contestá-las mais adiante. Nesse sentido, o 
objetivo a cumprir, com as definições, a seguir transcritas, não é exatamente o de dizer o 
que são as Relações Internacionais na verdade, mas sim, o de tentar desfazer algumas 
dúvidas que surgem com certa freqüência, quando o assunto envolve questões 
internacionais. Por essa razão, buscar-se-á distinguir Relações Internacionais das outras 
disciplinas que apresentam uma dimensão internacional, tais como a Política Internacional 
e a Política Externa. 
Para iniciar, serão apresentadas determinadas definições, cujos autores são 
conhecidos estudiosos das Relações Internacionais. 
Iniciamos com Phillipe Braillard e Mohamma-Reza Djalili, que afirma que “as 
relações internacionais podem ser definidas como o conjunto de relações e comunicações 
que os grupos sociais estabelecem através das fronteiras.”1 
Para Michael Nicholson, 
amplamente, relações internacionais concerne a relacionamentos e 
interações que não podem ser observados exclusivamente no contexto de 
um Estado tal como Inglaterra ou China. Estritamente, relações 
internacionais estuda interações sociais em contextos onde não existe 
 
1 BRAILLARD, Philippe; DJALILI , Mohammad-Reza. Relations Internationales : Que sais -je? Paris : PUF, 
1988. p. 5. 
 
 
6 
poder soberano para intrometer-se ou mediar e que está fora de qualquer 
jurisdição governamental.2 
Daniel Colard, por sua vez, afirma que “o estudo das relações internacionais 
engloba as relações pacíficas ou belicosas entre Estados, o papel das organizações 
internacionais, a influência das forças transnacionais e o conjunto das trocas ou das 
atividades que cruzam as fronteiras dos Estados.”3 
Joshua Goldstein, por fim, diz que, 
estritamente definido, o campo das relações internacionais concerne aos 
relacionamentos entre aqueles governos do mundo, que são Estados-
membro da ONU. Mas esses relacionamentos não podem ser entendidos 
isoladamente. Eles estão fortemente conectados com outros atores (como 
as organizações internacionais, corporações multinacionais, e indivíduos); 
com outras estruturas sociais (incluindo economia, cultura e política 
doméstica); e com as influências históricas e geográficas.4 
Pode-se constatar que as definições diferem umas das outras; e, justamente por esse 
motivo nem todas contêm os mesmos elementos. Alguns aspectos presentes em uma 
definição já não aparecem em outras. Contudo, é possível perceber que todas têm o mesmo 
sentido o qual é conferido pela idéia de relacionamentos múltiplos. Todos os autores 
citados, de um modo ou de outro, transmitem a idéia de que as relações internacionais 
envolvem numerosos e variados atores atuando em todo o mundo. Vistas dessa forma, as 
Relações Internacionais supõe o estudo do conjunto de interações. É evidente que a melhor 
maneira de decompor o conjunto para proceder à análise, é tarefa que depende do 
instrumental teórico a serviço do analista. A cada dispositivo teórico corresponde uma 
diferente maneira de perceber as relações internacionais. É aqui que reside a importância 
da teoria, qual seja: distinguir o principal do acessório, revelando o que é significativo para, 
assim, conduzir o analista a mais correta interpretação, mediante tal procedimento, produzir 
o esperado conhecimento da realidade das relações internacionais. 
No entanto, antes de seguir adiante, com a apresentação das definições oriundas 
dessas disciplinas aparentadas, seria interessante desfazer, o quanto antes, uma certa 
ambigüidade que, não raro, confunde quem se inicia no estudo das Relações Internacionais. 
 
2 NICHOLSON, Michael. International Relations: A Concise Introduction. London: MacMillan Press, 1998. 
p. 2. 
3 COLARD, Daniel. Les Relations Internationales de 1945 à nos jours . Paris : Armand Colin, 1999. p. 5. 
 
4 GOLDSTEIN, Joshua S. International Relations . New York: Longman, 1999. p. 3. 
 
 
7 
A ambigüidade é que as Relações Internacionais estudam as relações internacionais. Isto é, 
a disciplina e a realidade que essa disciplina busca conhecer têm o mesmo nome. Para 
contornar essa ambigüidade e, dessa forma, possibilitar o entendimento do discurso, os 
estudiosos convencionaram diferenciar o nome da disciplina do nome do objeto mediante o 
uso de iniciais maiúsculas para a primeira (Relações Internacionais) e de iniciais 
minúsculas para o objeto do conhecimento (relações internacionais). 
No próximo passo, para a definição de Política Internacional, surgem problemas de 
outro tipo: verifica-se, neste caso, a existência de evidentes imprecisões. 
Em primeiro lugar, é possível considerar a Política Internacional como o estudo da 
estrutura e funcionamento dos sistemas políticos estrangeiros. Pode-se citar, como 
exemplo , o caso do cientista político brasileiro que se dedica ao estudo da estrutura e do 
funcionamento do sistema político dos Estados Unidos ou, conforme o interesse, de 
qualquer outropaís. Segundo essa idéia a respeito do que é Política Internacional, os 
exemplos podem se multiplicar; porém, o sentido será sempre o mesmo, qual seja, como 
agem e reagem politicamente outros povos diante dos novos desafios que a realidade vai 
apresentando. 
A segunda possibilidade de definição de Política Internacional, abre-se no sentido 
de entendê- la como o estudo da lógica interna e da prática das ideologias políticas. Neste 
caso, podem servir de exemplo os estudos que se fazem sobre formações ideológicas como 
socialismo, neoliberalismo, terceira via, populismo e a aplicação prática dessas ideologias 
sob a forma de programas políticos e regimes políticos em todos os Estados do mundo. 
Desse tipo de estudo de Política Internacional, derivam os estudos comparados, que 
propiciam, ao pesquisador, a oportunidade de refletir sobre a coerência e os efeitos 
produzidos pela prática política. 
As duas definições acima, na verdade, não oferecem problemas de entendimento. 
Os problemas surgem quando determinados autores passam a falar de Política 
Internacional, atribuindo, a esses estudos, o sentido de Relações Internacionais. Essa 
assimilação de uma definição pela outra costuma ser feita, na maior parte das vezes, por 
autores que se apóiam na teoria Realista para analisar as relações internacionais. Tal 
confusão é comum entre esses autores, porque, na concepção deles, o que de fato interessa 
conhecer sobre o meio internacional são as relações políticas que os Estados entretêm. Para 
 
 
8 
eles, embora as relações entre os Estados comportem interesses muito diversificados 
(econômicos, sociais e culturais), a linguagem que exprime os interesses do Estado é 
sempre a política. Isto é, a política é a linguagem própria do Estado. Conquanto sempre 
esteja se manifestando a respeito dos seus interesses econômicos, sociais e culturais, o 
Estado o faz mediante o uso de políticas orientadas para cada um desses interesses. Nesse 
sentido, todos os interesses estão embutidos nas relações políticas que o Estado sustenta 
com os demais. Assim, de acordo com essa interpretação, Política Internacional nada mais é 
do que as próprias Relações Internacionais. 
Por fim, resta definir Política Externa, a qual, para P. A. Reynolds, pode ser definida 
“como o conjunto de ações de um Estado em suas relações com outras entidades que 
também atuam no cenário internacional, com o objetivo, a princípio, de promover o 
interesse nacional.”5 
Para Marcel Merle, “a Política Externa é [...] a parte da atividade do Estado que é 
voltada para fora, isto é, que trata, em oposição à política interna, dos problemas que 
existem além das fronteiras.”6 
Como o próprio nome indica, de maneira inequívoca, a Política Externa constitui 
um dos fatores que compõem as relações internacionais. É mediante a sua formulação, que 
o Estado define as prioridades, expectativas e alianças para atuar no quadro das relações 
internacionais. 
Ainda que não seja propósito deste texto entrar na discussão sobre o conceito de 
Política Externa, vale assinalar que as definições acima contêm duas questões polêmicas. A 
primeira delas, formulada por P. A. Reynolds, diz respeito à idéia de interesse nacional. 
Esse conceito, exaustivamente examinado por Joseph Frankel7, ocupa posição central na 
teoria Realista de Hans J. Morgenthau8. De maneira simplificada, pode-se dizer que a mais 
séria objeção a esse conceito é a de que as decisões de política externa , tomadas pelos 
governantes, são resultado de um processo decisório do qual participam diversos grupos, os 
quais, por sua vez, procuram fazer com que a sua visão particular dos problemas se 
 
5 REYNOLDS, P. A. Introduccion al Estudio de las Relaciones Internacionales. Madrid : Tecnos, 1977. p. 
46. 
6 MERLE, Marcel. La Politique Étrangère. Paris: Presses Universitaire de France, 1984. p. 7. 
7 FRANKEL, Joseph. National Interest. London: Pall Mall Press, 1970. 
8 MORGENTHAU, Hans J. Politics Among Nations : The Struggle for Power and Peace. New York: Alfred 
A. Knopf, 1985. 
 
 
9 
sobreponha à dos demais grupos que competem no processo de formulação de políticas. 
Isso significa dizer que há rejeição à idéia realista, segundo a qual o Estado funciona no 
meio externo conforme uma racionalidade situada acima das contradições que agitam a 
nação. 
A segunda questão polêmica, contida na definição de Marcel Merle, refere-se à relação 
externo/interno. Neste caso, a discussão gira em torno do tema relativ o à existência de dois 
campos distintos, ou seja, as políticas interna e externa têm autonomia uma face à outra, ou 
uma constitui a simples extensão da outra? Resta, ainda, o questionamento acerca da 
predominância de uma sobre a outra, ou seja, a política externa determina a política interna, 
ou é por ela determinada? 9 
 
3 Relações internacionais como objeto de estudo 
 
Como ocorre em todas as demais Ciências Sociais, parte dos estudiosos das 
Relações Internacionais está permanentemente envolvida na reflexão epistemológica sobre 
a definição do seu objeto de estudo, num exercício absolutamente necessário , uma vez que 
a realidade está em permanente mutação. 
A dinâmica das relações internacionais, constantemente determinando o surgimento de 
novos atores e a abertura da discussão de novas questões internacionais, representa 
contínuo desafio à capacidade analítica das teorias estabelecidas. Daí a razão porque se 
apresenta, como absolutamente necessária, a tarefa de rever os pressupostos e os 
instrumentos conceituais da disciplina, pois, do êxito de la, depende o avanço da ciência e a 
conseqüente elevação do nível de conhecimento sobre a realidade estudada. E o principal 
desafio que se oferece àqueles que se dedicam a esse trabalho, é justamente responder, com 
precisão, à seguinte pergunta: o que é a realidade das relações internacionais? 
Todos aqueles que têm investido nessa reflexão sabem o quanto uma resposta 
categórica e definitiva a essa pergunta é difícil. Difícil, antes de tudo, em virtude da 
imaterialidade do objeto que se deseja conhecer. Ao contrário do que é comum no âmbito 
das ciências naturais, as relações internacionais não tem existência física; elas são, por 
assim dizer, uma abstração; uma vez que só existe como produto do pensamento. Desse 
 
9 MERLE, op. cit. 
 
 
10 
modo, por não constituírem uma realidade sensível, sua definição acaba por ser arbitrária, 
tendo em vista que, cada qual se julga capaz de determinar, com maior correção, os 
contornos das relações internacionais como objeto de conhecimento. 
Convém, no entanto, ter cautela. Afirmar que a definição de relações internacionais, 
como objeto de conhecimento, é arbitrária, não significa dizer que ela é aleatória. A 
definição é arbitrária, porque o objeto não se auto-evidencia. Ele requer que se o destaque e 
o separe de tudo o mais que o cerca e possa, com ele, se confundir. Nesse aspecto, a 
situação do estudioso das relações internacionais não é confortável como a do biólogo 
dedicado ao estudo dos seres marinhos: este não precisa dispender muito esforço para 
apresentar o peixe como seu objeto de conhecimento. Porque, apesar dessa denominação 
ter- lhe sido atribuída pelos homens e não por eles próprios, os peixes são imediatamente 
reconhecidos, sem suscitar controvérsias. Por mais que o tamanho, a forma e a cor possam 
variar, o fato é que as características básicas identificadoras do animal como peixe , estão 
sempre evidentes. 
Por outro lado, a definição das relações internacionais como objeto de estudo não é 
aleatória porque, independentementeda orientação seguida, alguns elementos 
característicos impõem-se como obrigatórios a qualquer uma das definições que venha a ser 
elaborada. Por essa razão, elas guardam muitas semelhanças entre si e, no mais das vezes, 
apresentam distinções sutis. Por exemplo, por mais ampla e inclusivamente que se queira 
definir o objeto das relações internacionais, não há como deixar de considerar as relações 
políticas entre os Estados como seu componente importante. Entretanto, a afirmação que o 
cidadão comum, não investido de qualquer função oficial de seu Estado, possa ser ator das 
relações internacionais, já não goza mais da mesma aceitação entre as linhas teóricas que 
compõem o universo da disciplina. 
Essas variadas definições da realidade das relações internacionais podem ser 
sintetizadas em dois grandes grupos: o primeiro deles é aquele cujas definições 
compreendem os fenômenos paz e guerra; armas nucleares e desarmamento; imperialismo e 
nacionalismo; as relações assimétricas entre sociedades ricas e sociedades pobres; 
preservação do meio ambiente; combate ao narcotráfico; combate ao terrorismo 
internacional; defesa dos direitos humanos; influência das instituições religiosas; 
organizações internacionais, processos de integração regional; formação e fragmentação 
 
 
11 
dos Estados; comércio e ação das corporações multinacionais; raça e gênero em todo o 
mundo; desenvolvimento e transferência de tecnologia; globalização. 
O segundo grupo apresenta as relações internacionais como o resultado das relações 
entre os Estados. Enquanto, no primeiro grupo de definições, a realidade das relações 
internacionais é apresentada como extremamente ampla, incluindo fenômenos que dizem 
respeito a diversos domínios da vida em sociedade e relativos a situações tanto de conflito 
como de cooperação, no segundo grupo, essa realidade é apresentada como, 
fundamentalmente, constituída por conflitos entre os interesses respectivos a cada Estado. 
No primeiro grupo, qualquer um dos fenômenos citados pode assumir a condição de objeto 
de análise das Relações Internacionais; no segundo, por sua vez, tais fenômenos são 
concebidos como produto das relações diplomáticas, militares e estratégicas que os Estados 
(China, Bélgica, Venezuela, Alemanha, Japão, Estados Unidos, p. e.) estabelecem entre si. 
As disparidades apresentadas por esses conjuntos das possíveis características das 
definições possíveis de relações internacionais são, contudo, mais aparentes do que reais. E 
o que faz com que as diferenças sejam apenas aparentes é a idéia de anarquia – a qual, de 
fato, passa a ser o elemento unificador de todas as variadas concepções da realidade das 
relações internacionais. Para esse efeito, anarquia significa a inexistência de uma 
autoridade central, com legitimidade para criar leis e dispor de poder para fazer com que 
essas leis sejam obedecidas. Em virtude dessa ausência de algo como um governo mundial, 
que centralize as decisões, as relações e interações internacionais assumem uma 
importância fundamental para o conhecimento da realidade internacional. Embora, como 
será visto mais adiante, haja dive rgências entre as correntes teóricas, o aspecto mais 
importante é que as principais delas encaram a figura jurídico-política do Estado como a 
referência principal. A ausência de um poder que desempenhe, em escala internacional, o 
papel que o Estado desempenha em escala nacional constitui, para as diversas orientações 
teóricas, a pedra angular das Relações Internacionais. Essa característica específica permite 
afirmar não só a existência do objeto de conhecimento denominado relações internacionais, 
mas, também, que esse objeto não se confunde com outros objetos de conhecimento que 
contêm algumas características iguais. 
As possibilidades de uso de diversas definições da realidade das relações 
internacionais, entretanto, não se apresentam, para o estudioso da matéria, como mera 
 
 
12 
questão de conveniência. Pelo contrário, a opção por qualquer uma das definições 
determina um correspondente conjunto de conseqüências, as quais, vale dizer, são de ordem 
teórica e metodológica, pois a maneira como definimos a realidade é a mesma maneira 
como a entendemos, de tal modo que, entre a realidade e sua definição, encontra-se sempre 
presente a teoria. 
 
4 Relações Internacionais como disciplina 
 
A disciplina Relações Internacionais é jovem, tendo em vista que o seu nascimento 
se deu logo após a Primeira Guerra Mundial,** um acontecimento que constituiu a razão 
fundamental para o seu surgimento. Em virtude do novo caráter industrial e tecnológico, 
que a revestia, a Primeira Guerra Mundial foi a primeira guerra total, onde já não distinguia 
mais, com clareza, frente e retaguarda, combatentes e civis. Ao findar, deixou um rastro de 
devastação sem precedentes. Enquanto todas as guerras européias, entre 1802 e 1913, 
haviam produzido o total de 4,5 milhões de mortos, a Primeira Guerra Mundial, sozinha, foi 
responsável por cerca de 10 milhões de homens mortos, a maioria com menos de 40 anos 
de idade; 10 milhões de refugiados; 5 milhões de viúvas; e 9 milhões de órfãos. Somente na 
famosa batalha do Somme, franceses, ingleses e alemães perderam, juntos, quase um 
milhão de homens. No plano material, a destruição resultou, em 1920, numa significativa 
redução da produção industrial (de 1/4 ), em relação a 1913.10 Por essa razão, quando o 
conflito chegou ao fim, os líderes das potências vencedoras foram fortemente pressionados, 
pela opinião pública de seus respectivos países, para punir, duramente, os responsáveis pela 
guerra e, também, para tomar as providências necessárias a fim de que outra guerra como 
aquela não voltasse a acontecer. Assim, em função da enorme capacidade bélica decorrente 
das conquistas tecnológicas do capitalismo oligopolista, como também o alcance 
geográfico mundial do conflito, percebeu-se a necessidade de ser promovido o 
 
** Essa data de nascimento é contestada por Brian C. Schmidt (The Political Discourse of Anarchy: A 
Disciplinary History of International Relations. Albany: State University of New York Press, 1998), Esse 
autor considera que a disciplina nasceu bem antes da Primeira Guerra, como derivação da discussão 
acadêmica dos cientistas políticos norte-americanos sobre a Teoria do Estado. 
10 LOWE, Norman.Guía Ilustrada de la Historia Moderna.Mexico: Fondo de Cultura Económica, 1995. p. 
44. 
 
 
 
 
13 
conhecimento da realidade das relações internacionais, particularmente dos mecanismos 
que engendram as guerras. 
Para cumprir essa finalidade, como já foi dito nas linhas iniciais do presente texto, 
foi criada, em 1919, na Universidade de Gales (Aberyswyth), a Cátedra Woodrow Wilson 
de Política Internacional, a primeira cátedra de Relações Internacionais do mundo, a qual 
foi financiada pelo filantropo David Davies e ocupada por Alfred Zimmern (1879 – 1957) 
e, mais tarde, em 1936, por Edward Hallett Carr (1892 – 1982). No ano seguinte (1920), 
cumprindo compromisso assumido pelas duas delegações presentes à Conferência de Paz 
de Paris de “levar a efeito o estudo sistemático das relações internacionais”, foram criados, 
na Inglaterra, o Royal Institute of International Affairs e, nos Estados Unidos, o Council of 
Foreign Relations.11 
As relações internacionais, na verdade, sempre foram estudadas. Melhor dizendo, 
desde que o sistema europeu de Estados formou-se, a partir da Paz de Westphalia (1648), 
estadistas e intelectuais em geral passaram a se dedicar à reflexão sobre os fenômenos da 
paz e da guerra entre os Estados. 
Pensadores da estatura intelectual de Nicolau Maquiavel,Immanuel Kant, Jean-Jacques 
Rousseau, como tantos outros mais, demonstraram a grande importância desses fenômenos 
para a definição das instit uições políticas. Portanto, o fato para o qual se procura, aqui, 
chamar a atenção, é o de que a decisão das elites intelectuais européia e norte-americana de 
fazer, ao fim da Primeira Guerra Mundial, das relações internacionais, um objeto de 
ciência, não constituiu algo rigorosamente inovador. O que se considera digno de registro é 
a nova maneira como estudiosos e estadistas passaram a encarar o estudo das relações 
internacionais. Antes da guerra, as respostas para os problemas internacionais eram 
elaboradas segundo a ótica do Direito Internacional, da Diplomacia e da História 
Diplomática. A Primeira Guerra Mundial, em virtude de sua abrangência, serviu para 
mostrar que essas abordagens estavam inteiramente superadas, uma vez que já não eram 
mais capazes de produzir respostas satisfatórias. Para dar conta dos novos problemas 
internacionais, suscitados pela expansão da rede de trocas e de fluxos de capitais da 
economia internacional, bem como pelo surgimento de novas potências, fora do perímetro 
europeu, com ambições de virem a desempenhar papel de destaque no cenário 
 
11 BROWN, Chris . Understanding International Relations . London: MacMillan Press, 1997. p. 24. 
 
 
14 
internacional, fazia-se, então, necessária a criação de nova disciplina, a qual deveria, por 
assim dizer, exprimir, em sua abordagem, a amplitude que passara a caracterizar a nova 
realidade das re lações internacionais. 
Desde que o projeto de construção da disciplina de Relações Internacionais foi 
lançado, os estudiosos têm procurado definir, com o maior rigor possível, os limites de seu 
objeto de estudo. Além disso, têm procurado elaborar os instrumentos teórico-conceituais 
que tornem possível a análise desse mesmo objeto. Não há dúvida de que a grande 
dificuldade enfrentada nessa tarefa de configuração da nova disciplina é assegurar- lhe o 
indispensável caráter interdisciplinar. Ou seja, definir os contornos de uma disciplina capaz 
de produzir uma visão integrada do meio internacional; uma disciplina cujo alcance vá 
além das visões parciais da Economia Internacional, do Direito Internacional, da História 
Internacional e da Política Internacional. Es se desafio, vale assinalar, tem se renovado à 
medida que as relações internacionais têm evoluído, tornando-se a cada dia mais 
complexas. Assim o foi, depois da Segunda Guerra Mundial, ocasião em que os estudiosos 
tiveram que passar a levar em conta o advento das armas nucleares e a luta iniciada pelos 
povos colonizados em favor de sua independência face às metrópoles européias. Assim tem 
sido, a partir da última década do século XX, com os estudiosos tentando elucidar a nova 
estrutura do sistema internacional e, ao mesmo tempo, decifrar o fenômeno da globalização 
e de seus surpreendentes efeitos gerais. 
Essa procura do perfil teórico-conceitual ideal das Relações Internacionais, com 
vistas à obtenção das mais confiáveis análises da realidade, tem ocasionado grande disputa 
intelectual que, por sua vez, tem levado o campo teórico da disciplina à situação de 
fragmentação. Tantas são as propostas teóricas que vêm sendo apresentadas, que se torna 
até difícil classificá-las. A maneira que aqueles dedicados ao estudo da evolução teórica da 
disciplina, encontraram para mapear esse campo teórico, foi utilizar o conceito de 
paradigma. Tomado de empréstimo do filósofo da ciência Thomas Kuhn12, esse conceito 
tem servido para classificar as teorias segundo seu vínculo a determinados modos de 
perceber a constituição e a dinâmica do meio internacional.*** 
 
12 KUHN, Thomas S . A Estrutura das Revoluções Científicas . São Paulo: Perspectiva, 1982. 
*** Barry Buzan, p. e., assim define paradigma: “Paradigmas são escolas de pensamento que têm sido 
constituídas mediante abordagens no estudo das relações internacionais que exploram alguns níveis, setores e 
normas em detrimento de outros. Cada paradigma é um tipo de lente compósita, que possibilita uma visão 
 
 
15 
Apesar das dúvidas a respeito da adequação do conceito à realidade teórica das 
Relações Internacionais, uma vez que foi elaborado em função de outra realidade científica, 
seu uso, segundo alguns autores13, estaria plenamente justificado face à 
incomensurabilidade de cada uma das diferentes correntes teóricas. Isto é, se cada corrente 
teórica delimita o objeto ‘relações internacionais ’ de maneira a valorizar certos 
componentes, os quais, por seu turno, são desvalorizados por outra corrente, que dá 
prioridade a outros componentes, as análises resultantes do uso dessas teorias serão 
diferentes uma das outras e, enfim, não haverá como compará-las em sua validade, tendo 
em vista o fato de os focos da análise não terem sido os mesmos. Para simplificar: 
diferentes teorias produzem diferentes análises e, como não existe linguagem neutra para 
julgar a superioridade de uma teoria sobre a outra, a escolha da melhor só pode ser 
determinada pelo livre arbítrio do analista. Assim, conquanto Thomas Kuhn tenha 
formulado o conceito paradigma para explicar a ascensão e queda das grandes formulações 
teóricas, seu uso, no âmbito das Relações Internacionais, estaria justificado em função 
dessa realidade de fragmentada constituição. 
O uso do conceito paradigma não é suficiente, contudo, para resolver a questão do 
mapeamento do campo teórico das Relações Internacionais: se, de um lado, o conceito 
ajuda, ao agrupar as teorias assemelhadas, de outro, cria algumas dificuldades, à medida 
que há muitas divergências quanto aos próprios paradigmas. Por exemplo, Ole Waever14 
considera a existência de três paradigmas: Realismo, Pluralismo/Interdependência e 
Marxismo/Radicalismo. Graham Evans e Jeffrey Newham15 consideram os sete paradigmas 
seguintes: Realismo, Behaviorismo, Neorealismo, Neoliberalismo, Teoria do Sistema 
Mundial, Teoria Crítica e Pós-Modernismo. Charles W. Kegley, Jr. e Eugene R. Wittkopf16 
enumeram seis paradigmas: História Imediata (Current History), Liberal Idealismo, 
Realismo, Behaviorismo, Neorealismo e Neoliberalismo. Robert Jackson e Georg 
 
seletiva das relações internacionais. Igual a qualquer outra lente, a leitura através dela permite que 
determinadas características apareçam mais fortemente, enquanto outras características quase desapareçam”. 
13 WAEVER, Ole . The rise and fall of the inter-paradigm debate. In: SMITH, Steve; BOOTH, Ken; 
ZALEWSKI, Marysia (Eds.).Interntional theory: positivism & beyond. Cambridge: Cambridge University 
Press, 1996. p. 149-185. 
14 Ibidem. 
15 EVANS, Graham ; NEWHAM, Jeffrey.The Penguin Dictionary of International Relations .London: 
Penguin Books, 1998. p. 275. 
16 KEGLEY, Charles W. ; WITTKOPF, Eugene R. World Politics : Trend and Transformation. New York: 
St. Martin’s Press, 1997. p. 18. 
 
 
16 
Sorensen17 destacam quatro paradigmas: Realismo, Liberalismo, Sociedade Internacional e 
Economia Política Internacional. E, por último, Hedley Bull18 indica apenas três 
paradigmas: Hobbesiano ou Realista, Kantiano ou Universalista e Grotiano ou 
Internacionalista. 
Como a classificação desses autores deixa transparecer, há paradigmas cuja 
nomeação é unânime, como é o caso do Realismo; há outros que recebem nomes diferentes, 
tais como Liberalismo/Liberal Idealismo/Pluralismo/Interdependência; e, ainda,há aqueles 
que só aparecem em uma classificação, como são os casos de Teoria do Sistema Mundial, 
de Sociedade Internacional e de Economia Política Internacional. Vale observar, enfim, que 
essa lista poderia ser aumentada e tornada ainda mais confusa, se outros autores fossem 
arrolados. 
Ainda que haja um interesse crescente, por toda a parte, em relação às Relações 
Internacionais, a discussão teórica, tal como o quadro acima revela, permanece como uma 
discussão entre acadêmicos norte-americanos e ingleses, confirmando as palavras de 
Stanley Hoffmann, no sentido de que Relações Internacionais é uma disciplina norte-
americana .19 
Como já foi visto, esse interesse dedicado, pela academia norte-americana, às 
Relações Internacionais deve-se, em grande medida, aos esforços iniciados depois da 
Primeira Guerra Mundial e, sobretudo, ao assombroso investimento realizado pelo Governo 
dos EUA em pesquisas, publicações e viagens, logo depois da Segunda Guerra Mundial.20 
Na ocasião, aquele governo buscou estimular a formação de especialistas em todas as áreas 
(conhecimento de regiões, de países e de questões internacionais), de modo que o 
conhecimento, por eles produzido, se configurasse na base para a ação externa e, 
naturalmente, para a execução do projeto hegemônico do Estado. Nesse sentido, a 
discussão teórica na qual estão envolvidos os estudiosos norte-americanos não deve ser 
 
17 JACKSON , Robert; SORENSEN, Georg. Introduction to International Relations .Oxford: Oxford 
University Press, 1999. p. 34. 
18 BULL, Hedley. The Anarchical Society: A Study of Order in World Politics. London: MacMillan Press, 
1977. p. 24. 
19 HOFFMANN, Stanley. An American Social Science: International Relations. In: DER DERIAN, James 
(Eds.). International Theory: Critical Investigations. London: MacMillan Press, 1995. p. 212-241. 
20 PLATIG, E. Raymond. International Relations as a Field of Inquiry. In: ROSENAU, James N. (Ed.). 
International Politics and Foreign Policy: a reader in research and theory. New York: The Free Press, 1969. 
p. 6-19. Neste artigo, o autor apresenta o volume de recursos investidos e discrimina as áreas de pesquisa 
beneficiadas. 
 
 
17 
interpretada como mera disputa de preferências pessoais e de rivalidades de grupos 
universitários. Essa contenda, na verdade, tem um pano-de-fundo político: o trabalho de 
preservação do status quo internacional. Subjacente à polêmica sobre os paradigmas e 
sobre a validade do uso de conceitos como equilíbrio de poder, governabilidade 
internacional e globalização, encontra-se a questão fundamental, relativa ao substantivo 
apoio da Academia à luta pela conservação da posição hegemônica por parte do Estado 
norte-americano. 
Por tais motivos, a primazia norte-americana , no estudo das Relações 
Internacionais, faz com que a história da disciplina coincida com sua história no ambiente 
acadêmico norte-americano. 
 
5 A evolução teórica das Relações Internacionais 
 
A evolução teórica das Relações Internacionais tem sido marcada por “Grandes 
Debates”21 – os quais registram o confronto das teorias emergentes com as teorias 
dominantes. Não por coincidência, o confronto entre novas e antigas teorias tem se seguido 
a mudanças significativas na estrutura e no funcionamento do sistema internacional. Por 
entender que a teoria dominante não é capaz de dar conta de elementos novos, que se 
destacam no curso das relações internacionais, os pesquisadores buscam aprofundar suas 
reflexões com a finalidade de obter formulações teóricas mais ricas, que abram o caminho 
para o conhecimento mais verdadeiro da realidade das relações internacionais. 
O primeiro desses “Grandes Debates” aconteceu ao longo da década de 1930, 
opondo a corrente dominante Liberal- idealista à corrente emergente do Realismo. A 
primeira corrente acredita na perfectibilidade humana, no Direito Internacional e nas 
possibilidades de haver paz entre os Estados. Para os Idealistas, a realização desses ideais 
depende do aperfeiçoamento das instituições internacionais, o qual, por sua vez, deve 
resultar da cooperação entre os estadistas. Para a corrente Realista, por outro lado, as 
 
21 GROOM, A. J. R.; LIGHT, Margot. Contemporary International Relations : A Guide of Theory. London: 
Pinter Publishers, 1994. 
 DEL ARENAL, Celestino. Introducción a las Relaciones Internacionales . Madrid: Tecnos, 1990. 
 MERLE, Marcel. Sociologia das Relações Internacionais . Brasilia, UNB, 1981. 
 BRAILLARD, Philippe. Teoria das Relações Internacionais . Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 
1990. 
 
 
18 
relações internacionais são determinadas pelas relações de poder. Os Realistas desdenham 
do Direito Internacional, por considerarem que o direito prevalece somente enquanto não 
colidir com os interesses daqueles Estados que dispõem de recursos para impor seus 
interesses aos demais. Na realidade, acreditam que o direito e a ordem internacional 
decorrem diretamente, da correlação de forças entre aqueles que detêm maior poder. 
As mudanças ocorridas na estrutura do sistema internacional após a Segunda Guerra 
Mundial pareciam, assim, confirmar a validade dessas teses realistas. A formação dos dois 
blocos de poder antagônicos e a rivalidade das duas superpotências (norte-americana e 
soviética), hegemônicas em seus respectivos blocos, ameaçando, a qualquer pretexto, 
iniciar uma guerra atômica, não davam margem a dúvidas de que as possibilidades de se 
alcançar a paz mundial, tal como o pensavam os Idea listas, não passavam de uma grande 
ilusão.**** 
O segundo “Grande Debate” aconteceu no final dos anos 1950, numa polêmica que 
marcou a maior participação do mundo acadêmico norte-americano na discussão teórica 
das Relações Internacionais. O conteúdo desse debate foi, fundamentalmente, de ordem 
metodológica, opondo Behavioristas a Tradicionalistas. O interesse dos críticos 
Behavioristas não era demonstrar a ineficácia da teoria Realista, mas sim, elevar sua 
credibilidade, por meio da introdução de metodologias científicas. 
Para os críticos, a teoria Realista, tal como desenvolvida por estudiosos como Hans 
Morgenthau, principalmente, formava-se por conceitos excessivamente gerais, os quais 
eram apresentados, equivocadamente como leis universais da política. Os Behavioristas não 
duvidavam da possibilidade de prever o comportamento dos Estados. Porém, consideravam 
que isso somente poderia ser feito mediante o uso de metodologias adequadas, tais como os 
modelos matemáticos. De acordo com a nova metodologia proposta, os dados considerados 
importantes para a formação do poder do Estado deviam ser mensurados. A partir daí, as 
 
****“The Great Illusion” foi o título dado por Norman Angell a seu livro, publicado em 1909 (London, 
Weidenfeld & Nicolson) . Nele, o autor defendeu a tese segundo a qual não havia possibilidades de guerra no 
mundo. No seu entendimento, o capitalismo internacionalizara -se de tal modo que a guerra seria uma 
demonstração de desvairada irracionalidade. Acreditava Angell, que os grandes grupos econômicos não 
permitiriam a destruição de seu capital físico, espalhado pelos diferentes países da Europa, nem tampouco das 
redes de comercialização de mercadorias e investimentos. Contudo, a guerra aconteceu. 
Como observa Chris Brown ( Understanding International Relations), a racionalização do processo realizada 
por N. Angell procedia. O problema, no entanto, é que N. Angell acreditava no comportamento humano 
pautado exclusivamente pela razão. 
 
 
 
19 
variações eas simulações de variações constituiriam o material da análise do especialista.22 
Em sua perspectiva, era essa incorporação de conceitos e modelos, advindos de outras 
ciências, que garantiria, às Relações Internacionais, seu caráter científico. 
Ao invés, portanto, de procurar formular teorias que pudessem dar conta das 
relações internacionais em toda sua abrangência, tal como o faziam os Realistas 
Tradicionalistas, os Behavioristas defendiam a tese segundo a qual seria a partir de modelos 
explicativos limitados (tais como a Teoria dos Jogos e o Modelo de Comunicação) que 
seria possível, chegar das partes, ao todo e, consequentemente, a uma visão mais precisa 
das relações internacionais.23 
No contexto desse mesmo “Segundo Debate”, ao lado da corrente Behaviorista, veio 
à tona o Modelo Sistêmico. Diretamente inspirada no modelo formulado por David Easton, 
cujo objetivo era analisar a vida política interna dos Estados,24 a denominada corrente 
Funcionalista introduziu e consolidou o uso do conceito de sistema nas Relações 
Internacionais. Embora, em sua concepção original, a idéia de sistema esteja voltada para a 
análise de ambientes políticos restritos, dada a necessidade de controlar as variáveis 
passíveis de influenciar o comportamento dos atores e do sistema como um todo, 
estudiosos, como Morton Kaplan, deram, ao conceito de sistema internacional, caráter 
heurístico, o qual deveria conduzir o analista, mediante o uso de sistemas possíveis, ao 
conhecimento geral da realidade das relações internacionais.25 
O terceiro “Grande Debate”, conhecido como o “Debate dos Paradigmas”, 
transcorreu ao longo dos anos 1970. Os estudiosos norte-americanos Robert Keohane e 
Joseph Nye foram seus principais protagonistas. Contra as teses centrais da corrente 
Realista, ambos co-editaram as duas principais obras em defesa das teses da 
 
22 Para se obter uma visão geral sobre a intervenção teórica dos Behavioristas, ver: Merle, Marcel. Sociologia 
das Relações internacionais. Brasília: UNB, 1981. 
23 RAPOPORT, Anatol. Lutas, Jogos e Debates . Brasília, UNB, 1980. 
 FRANKEL, Joseph. Contemporary International Theory and the Behaviour of States . Oxford: Oxford 
University Press, 1973. 
 DEUTSCH, Karl. Análise das Relações Internacionais . Brasília: UNB, 1978. 
 HOFFMANN, Stanley . Teorias Contemporaneas sobre las Relaciones Internacionales . Madrid: Tecnos, 
1963. 
24 EASTON, David . Uma Teoria de Análise Política. Rio de Janeiro: Zahar, 1968. 
25 KAPLAN, Morton. System and Process in International Politics . New York: J. Wiley, 1964. 
Os sistemas internacionais possíveis, propostos pelo autor, são os seguintes: 1) Sistema de Equilíbrio; 2) 
Sistema Bipolar Flexível; 3) Sistema Bipolar Rígido; 4) Sistema Internacional Universal; 5) Sistema 
Internacional Hierárquico; 6) Sistema Unit Veto. 
 
 
20 
Interdependência Complexa, Transnational Relations and World Politics (1971) e Power 
and Interdependence: World Politics in Transition (1977).26 
As reflexões desses autores tinham, como base empírica, algumas significativas mudanças, 
que ocorriam no sistema internacional, dentre as quais, destacavam-se o abandono do 
padrão-ouro de Bretton Woods ; o primeiro choque do petróleo; o fim da Guerra do Vietnã; 
e o início das tensões comerciais entre os Estados Unidos e o Japão. Devido ao impacto 
produzido por esses acontecimentos, denotadores da perda relativa do poder dos Estados 
Unidos e, simultaneamente, da importância crescente dos fatores econômicos nas relações 
internacionais, ambos argumentavam que já não era mais possível pensar o sistema 
internacional exclusivamente do ângulo da segurança, como o faziam os Realistas. A 
economia internacional havia evoluído para uma etapa em que o poder passava a ser 
exercido mediante o uso exclusivo dos mecanismos financeiros e comerciais, sem haver a 
necessidade do uso ostensivo da força militar. Tornava-se necessário , então, diziam esses 
Pluralistas, reformular a teoria das Relações Internacionais, de modo a absorver esses novos 
fatores de mudança da realidade. 
Assim, em oposição ao Realismo, os Pluralistas afirmavam que o Estado não podia 
mais ser considerado como o único ator válido das relações internacionais; era hora de se 
reconhecer a existência e a influência de outros importantes atores, tais como as próprias 
diferentes instâncias do aparato burocrático estatal, como também as organizações não-
governamentais, especialmente representadas pela corporação multinacional. 
Afirmavam, igualmente, a crescente importância das relações de cooperação, as 
quais tendiam a sobrepujar as relações de poder entre os Estados. Finalmente, contra a tese 
Realista da hierarquia das questões internacionais encimada pelas questões de segurança, 
insistiam na importância relativa das questões internacionais, cuja proeminência variava 
segundo a conjuntura e os diferentes foros de atuação dos atores. 
A crítica Pluralista ao Realismo, vale dizer, produziu reação da parte da corrente 
Realista, da mesma forma que levou os Pluralistas a se situarem melhor no contexto da 
polêmica por eles criada. E o resultado desse processo acabou por desenhar o quadro das 
 
26 KEOHANE, Robert; NYE, Joseph. Transnational Relations and World Politics . Cambridge: Harvard 
University Press, 1971. 
 ______. Power and Interdependence: World Politics in Transition. Boston: Little Brown, 1977. 
 
 
 
21 
opções teóricas atuais. Isso porque, de um lado, o Realismo, ao promover alguns ajustes em 
seu corpo teórico, se fez neo-realismo. De outro lado, o Pluralismo, para responder às 
críticas dos teóricos da Dependência (os quais não podiam admitir a idéia de 
interdependência complexa com assimetria ), assumiu seu caráter abertamente liberal, 
convertendo-se, então, em Neoliberal. 
A visão panorâmica das Relações Internacionais ficaria incompleta, no entanto, se 
não fosse feita referência à “Escola Inglesa” e ao “Debate Pós-Positivista”. 
Também conhecida como corrente teórica da “Sociedade Internacional”, a “Escola 
Inglesa” é uma das poucas correntes de grande prestígio , que se desenvolveu fora do 
ambiente acadêmico norte americano. A essa corrente, pertencem nomes expressivos como 
Martin Wight,27 Adam Watson,28 Terry Nardin ,29 John Vincent,30 Michael Walzer31 e 
James Mayall.32 Todavia, o nome mais conhecido é o do australiano Hedley Bull (1932 – 
1985), que desenvolveu a carreira acadêmica na London School of Economics, e em 
Oxford. 
A particularidade da “Escola Inglesa” está no fato de ter proposto a análise das 
Relações Internacionais a partir do marco filosófico fixado por Hugo Grotius 33 (1583 – 
1645), nascido na Holanda e conhecido por muitos juristas como o “pai do Direito 
Internacional”. Em Do Direito da Guerra e da Paz (1625), esse hola ndês defendia a 
necessidade de se estabelecer normas de comportamento para os Estados da Europa, 
 
27 WIGHT, Martin . Systems of States . London: Leicester University Press, 1977; 
 ______. A Política do Poder. Brasilia: UNB, 1978. 
 ______. International Theory: The Three Traditions. London: Leicester University Press, 1991. 
28 BULL, Hedley; WATSON, Adam (Ed s.). The Expansion of International Society. Oxford: Clarendon 
Press, 1984. 
 WATSON , Adam. The Evolution of International Society. London: Routledge, 1992. 
29 NARDIM, Terry . Law, Morality and the Relations of States. New Jersey: Princeton University Press, 
1983. 
 NARDIM, Terry; MAPEL, David R. (Eds.). Traditions of Internati onal Ethics. Cambridge: Cambridge 
UniversityPress, 1993. 
30 VINCENT, John. Nonintervention and International Order. New Jersey: Princeton University Press, 
1974. 
 ______. Human Rights and International Relations. Cambridge: Cambridge University Press, 1986. 
31 WALZER, Michael. Just and Unjust Wars: A Moral Argument with Historical Illustrations. New York: 
Basic Books, 1992 . 
 ______.Thick and Thin: Moral Argument at Home and Abroad. Notre Dame : University of Notre Dame 
Press, 1984. 
32 MAYALL, James. Nationalism and International Society . Cambridge: Cambridge University press, 
1989. 
 ______. The New Interventionism: 1991 – 1994. Cambridge: Cambridge University Press, 1996. 
33 GROCIO, Hugo . Del Derecho de la Guerra y de la Paz. Madrid : Editorial Reus, 1925. 
 
 
22 
mesmo sob condições de guerra. Para ele, o fato de os Estados europeus pertencerem à 
mesma civilização cristã, estando todos submetidos ao mesmo direito natural, distinguia-os 
como partes integrantes da sociedade internacional. Por isso, os príncipes europeus deviam, 
quando em guerra, respeitar tanto os direitos dos neutros, quanto respeitar o direito ao livre 
uso dos mares, e não se conduzir tal como estivessem em guerra contra não-cristãos, uma 
circunstância na qual tudo era permitido. De certa forma, esses princípios defendidos por 
Grotius acabaram por formar a substância dos Tratados de Westphalia (1648), os quais 
foram assinados horas depois da sua morte e encerraram as Guerras de Religião.34 
Ao seguir o caminho apontado por Grotius, Hedley Bull argumentou em favor da 
existência da “sociedade internacional”, um conceito que, pode-se dizer, forma o eixo 
central da “Escola Inglesa”. O uso desse conceito preenche o espaço que separa, segundo 
Martin Wight,35 a tradição Hobbesiana da tradição Kantiana. Para Bull, o fato de, no meio 
internacional, não existir governo central com capacidade de fazer respeitar as leis, não 
impede de se falar da existência da sociedade internacional. Apenas pondera que tal 
sociedade é de tipo diferente das sociedades nacionais, sendo a sua principal diferença, o 
caráter anárquico da sociedade internacional. Contra a posição dos Realistas, que não 
admitem a idéia de sociedade internacional justamente devido à inexistência de governo 
central, Bull chama a atenção para o fato de as relações internacionais não se resumirem às 
decisões que dizem respeito à segurança do Estado, mas sim, por formarem uma densa teia 
de relações que supõem alta dosagem de cooperação e, também, a partilha de valores 
culturais comuns. Uma partilha que se tornou historicamente possível em virtude da 
ocidentalização do mundo promovida pelos povos europeus, a partir da idade Moderna. 
Por fim, chegamos ao derradeiro Grande Debate, que é, também, o mais difícil de 
ser resumido, tendo em vista sua amplitude e a ambigüidade conceptual que o cerca. O alvo 
da crítica é o Realismo, ou melhor, são o Positivismo e o Empirismo, que constituiriam a 
base da formulação teórica Realista. 
As posições críticas, por sua vez, têm por origem a “Teoria Crítica”, o “Pós-Modernismo” e 
o “Feminismo”, este não deixando de ser, também, parte do “Pós-Modernismo.”36 
 
34 BULL, Hedley; KINGSBURY, Benedict; ROBERTS, Adam (Eds.). Hugo Grotius and International 
Relations . Oxford : Clarendon Press, 1992. 
35 WIGHT, M. International Theory: The Three Tradiditions, Leicester: Leicester University Press, 1991. 
36 HALLIDAY, Fred. Rethinking International Relations. London: MacMillan Press, 1994. 
 
 
23 
Ainda que os críticos em geral identifiquem os mesmos problemas quanto à 
composição teórica do Realismo, aqueles integrados à perspectiva da Teoria Crítica 
conferem maior importância à dimensão política da questão. Avançando pelo caminho 
aberto pela Escola de Frankfurt e, mais particularmente, pelo filósofo Jurgen Habermas,37 
os críticos trabalham imbuídos do ideal Iluminista, segundo o qual a teoria deve servir, 
primordialmente, à finalidade racional de promover a liberdade e a emancipação contra a 
dominação e a tutela. Essa linha teórica trabalha no sentido de recuperar a teoria Marxista 
como ponto de apoio da reflexão. Esta é a razão das críticas dessa corrente estarem 
dirigidas contra três postulados principais do Realismo: a existência de uma realidade 
externa objetiva; a formal distinção entre sujeito e objeto; e a convicção da existência de 
uma ciência livre de valores. 
A Teoria Crítica rejeita a idéia realista da existência do sistema de Estados, que 
funciona segundo leis imutáveis e universais. Para essa escola teórica, a tese realista não 
passa de um discurso formulado pelas grandes potências para eternizar a dominação que 
exercem em nível mundial. O que os Realistas denominam sistema internacional, para os 
críticos, na verdade, constitui uma construção histórica dirigida pelas grandes potências e 
determinada pelo desenvolvimento do capitalismo. Como não admitem que a ciência seja 
livre de valores, por conseguinte, afirmam que toda a teoria deve, não apenas produzir 
análises, como também funcionar como alavanca para a mudança das relações sociais em 
todo o mundo, liberando os homens das estruturas opressivas criadas pelo capitalismo e 
mantidas pelas grandes potências. 
A chamada crítica Pós-Modernista, por sua vez, caracteriza-se por um radicalismo 
filosófico que não poupa nenhuma das teorias das Relações Internacionais, por considerá-
 
 BOOTH, Ken; SMITH, Steve (Eds.). International Relations Theory Today. Pennsylvania: The 
Pennsylvania State University Press, 1995. 
 GRIFFITHS, Martin. Realismo, Idealism & In ternational Politics: a reinterpretation. London: Routledge, 
1992. 
 NICHOLSON, Michael. International Relations : A Concise Introduction. London : MacMillan Press, 
1998. 
 SPEGELE Roger D. Political Realism in International Theory. Cambridge: Cambridge University Press, 
1996. 
37 HABERMAS, Jurgem. Knowledge and Human Interests . Boston: Beacon Press, 1972 . 
 ______. Communication and the Evolution of Society. London: Heinemann, 1979. 
 ______. Theory of Communicative Action. Boston: Veacon Press, 1984. v.1. 
 ______. Theory of Communicative Action. Boston: Beacon Press, 1988. v.2. 
 ______. La lógica de las ciencias sociales . Madrid, Tecnos, 1990. 
 
 
24 
las, todas, partes da mesma metanarrativa. Para os críticos pós-modernos, as teorias das 
Relações Internacionais, assim como todas as demais teorias sociais e a literatura, são 
prisioneiras das mesmas armadilhas filosóficas Iluministas, segundo as quais a ciência tem 
um superior e inigualável lugar na ordem do saber, por proporcionar conhecimento 
objetivo, e a modernização conduzir ao progresso e ao maior bem estar para todos. 
Não há teoria das Relações Internacionais que escape de tão abrangente arco crítico; 
todavia, por ser a teoria mais influente no campo das Relações Internacionais, a Teoria 
Realista é a mais visada pelos críticos pós-modernos.38 Para Jim George 39 e., mesmo em 
sua forma mais sofisticada, o Realismo representa um anacrônico resíduo do Iluminismo 
europeu, totalmente incompatível com a realidade do mundo pós-moderno. A idéia desse 
autor, tanto quanto de outros críticos da mesma linha, é a de que não é possível existir 
ciência das Relações Internacionais, mesmo porque não há realidade internacional objetiva. 
O que se denomina ciência das Relações Internacionais é apenas uma narrativa, que se 
impôs sobre todas as demais possíveis, em virtude do poder detido por aqueles que aelaboraram. Nesse sentido, a ciência das Relações Internacionais é tão-somente a expressão 
discursiva dos que exercem o poder. 
A ação crítica dos pós-modernistas trabalha com vistas a promover a 
“desconstrução” da narrativa Realista. Seu alvo central é o conceito de Estado como ator 
fundamental das relações internaciona is, que age de modo racional para realizar seus 
interesses e maximizar seu poder. Para os pós-modernistas, o Estado, como realidade 
objetiva, simplesmente não existe ; trata-se de mera ficção construída por acadêmicos e 
cidadãos, com a finalidade de dar significado as ações sociais que empreendem entre si. 
Desse modo, a ação do Estado, no sistema internacional de Estados, não passa de uma 
forma de construir uma narrativa sobre a relação entre indivíduos: uma história que, na 
 
38 WENDT, Alexander. Anarchy is What States Make of it: The Social Construction of Power Politics. In: 
DER DERIAN, James. (Ed.). International Theory: Critical Investigations. London: MacMillan Press, 1995. 
p. 129 -177. 
 CAMPBELL, David. Politics Without Principle: Sovereignty, Ethics, and the Narratives of the Gulf War. 
Boulder: Lynne Rienner, 1993. 
 ASHLEY, Richard K. The Poverty of Neorealism. In: KEOHANE, Robert (Ed.). Neorealism and its 
Critics . New York: Columbia University Press, 1986. p. 255 -300. 
 ______.The Pwers of Anarchy: Theory, Sovereignty, and the Domestication of Global Life . In: DER 
DERIAN, James. (Ed.). International Theory: Critical Investigations. London: MacMillan Press, 1995. p. 
94-128. 
39 GEORGE, Jim. Discourses of Global Politics: A Critical (Re)Introduction to International Relations. 
Colorado:Lynne Rienner Publishers, 1994. p. 12. 
 
 
25 
verdade, pode ser criada e contada de várias outras formas, as quais dependerão, sempre, da 
posição e dos interesses do indivíduo ou dos grupos que se proponham a construí- la. 
Para finalizar este mapeamento dos Debates na área das Relações Internacionais, é 
necessário trazer algumas palavras a respeito da questão do Gênero. 
Por incrível que pareça, o questionamento das Ciências Sociais, a partir do ângulo 
do Gênero, é um processo que data dos últimos vinte anos. No âmbito das Relações 
Internacionais, no entanto, o processo é muito mais recente. Tal desinteresse pelas Relações 
Internacionais, por parte dessa linha crítica seria decorrente, segundo Margot Light e Fred 
Halliday,40 em primeiro lugar, da idéia de que as Relações Internacionais não têm limites 
precisos, configurando-se apenas em uma extensão das questões nacionais. Em segundo 
lugar, de que as Relações Internacionais tratam de questões de “alta política”, tais como 
problemas de segurança e de diplomacia; ao passo que as questões de Gênero estariam 
diretamente relacionadas à “baixa política”, como o são as políticas públicas. 
Nas Relações Internacionais, a questão do Gênero pode apresentar-se de duas 
maneiras, denominadas, pelos acima citados autores, como “mulher como categoria” e 
“gênero como epistemologia”: Michael Nicholson41 denomina “empírica” e “teórica”. A 
primeira forma de apresentar a questão é a daqueles que elaboram a narrativa das Relações 
Internacionais que reclama da omissão do relato dos papéis desempenhados pelas mulheres 
no processo histórico. Assim, mesmo tendo cumprido papéis altamente relevantes em 
processos de luta pela independência, em movimentos de libertação nacional, em guerras e 
em outras conjunturas marcadas pela tensão e pela tomada de decisões nos planos social e 
nacional, as mulheres são praticamente ignoradas pelos homens, quando chega o momento 
de elaborar a história de tais processos. Na segunda forma de apresentar a questão do 
Gênero, a crítica destaca o fato de as teorias das Relações Internacionais serem elaboradas a 
partir de um ponto de vista exclusivamente masculino. Tomando o Realismo como a 
principal teoria das Relações Internacionais, argumenta que a definição do Estado, como 
ator central, bem como a luta pelo poder, representando a grande motivação e a guerra, a 
 
40 LIGHT, Margot; HALLIDA Y, Fred. Gender and International Relations. In: GROOM, A . J. R.; LIGHT, 
Margot (Eds.). Contemporary International Relations: A Guide of Theory. London: Pinter Publishers, 
1994. p. 45-55. 
41 NICHOLSON, Michael. International Relations : A Concise Introduction. London: MacMillan Press, 
1998. p. 113. 
 
 
 
26 
ocasião para a definição de um novo sistema internacional de poder exprimem tão-somente 
o universo dos valores masculinos e jamais a verdade das relações internacionais; daí, pois, 
a necessidade de se empreender uma abordagem que subverta tal situação e dê conta do 
papel exercido pelas mulheres, como também a percepção que elas têm da realidade das 
relações internacionais. 
 
6 O Liberal Internacionalismo 
 
A disciplina Relações Internacionais nasceu, na década de 1920, sob o signo 
político- ideológico do Liberalismo. Isso significa que as teses centrais do pensamento 
liberal, tal como as formularam John Locke,42 Montresquieu,43 Adam Smith44 e Immanuel 
Kant,45 passaram a constituir as vigas mestras da teoria das Relações Internacionais. 
Os teóricos liberais, por nutrir total confiança na capacidade normativa de seus 
postulados, acreditavam que as idéias de livre-comércio, democracia e regulação jurídica 
seriam suficientemente capazes de garantir a prosperidade e a paz no mundo. 
O livre-comércio produziria esses efeitos pelo fato de aproximar os indivíduos 
integrados a meios culturais diferentes. O comércio, nessa ótica, faria com que os povos se 
tornassem mais flexíveis e compreensivos para com os usos e os costumes dos outros 
povos. Além disso, o comércio cria ria inter-relacionamentos econômicos entre os Estados, 
comprometendo-os na busca de vantagens mútuas que, enfim, leva riam à prosperidade 
geral, restando remotas, as possibilidades de guerra. 
Governos democráticos, por sua vez, têm inclinação natural para a cooperação e 
repudiam a guerra como recurso para a solução de controvérsias. Nos governos autoritários, 
em que poucos decidem em nome de todos, existe uma tendência natural para as soluções 
de força; por seu turno, nos governos nos quais muitos participam das decisões, tende a 
predominar a prudência e a solução via diálogo e negociação. 
 
 
42 LOCKE, John. Dois Tratados Sobre o Governo (1690). São Paulo: Martins Fontes, 1998. 
43 MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis (1748). São Paulo: Abril Cultural, 1979. (Os Pensadores). 
44 SMITH, Adam. A Riqueza das Nações (1776). São Paulo: Abril Cultural, 1983. (Os Economistas). 
45 KANT, Immanuel. A Paz Perpétua: u m pojeto filosófico (1795/1796). In: KANT, Immanuel. A Paz 
Perpétua e Outros Opúsculos . Lisboa: Edições 70, 1988. 
 
 
27 
O respeito ao Direito Internacional complementa essas idéias, porque o Direito age 
no sentido de proporcionar alguma ordem na natural anarquia internacional. Por meio das 
organizações internacionais, os liberais crêem ser possível estabelecer algum equilíbrio 
entre os Estados e, assim, garantir segurança para os Estados mais fracos. 
Essas idéias, profundamente enraizadas na cultura anglo-americana, foram 
fortalecidas, ao fim da Primeira Guerra Mundial, em virtude, sobretudo, da intervenção do 
Presidente norte-americano, Woodrow Wilson (1856-1923) na política internacional. Para 
os governantes franceses e ingleses, a aquela Guerra havia resultado de algumafalha 
existente no tradicional sistema de equilíbrio de poder, que regulava as relações entre as 
grandes potências. Na concepção de Wilson, porém, o próprio sistema (fundado em 
Westphalia), é que era incapaz de produzir paz durável, a qual, para ser alcançada, exigia, 
segundo Wilson, uma intervenção enérgica, que fosse além do simples reajuste do sistema 
de equilíbrio de poder. Ele considerava necessário , assim inaugurar um novo modo de 
pensar as relações internacionais. 
Essa sua intervenção aconteceu mediante a apresentação, em 8 de janeiro de 1918, 
do documento que se tornou conhecido como os ‘Quatorze Pontos de Wilson’. Inicialmente 
apresentado aos alemães como ponto de partida para a negociação do fim da guerra, esse 
documento devia cumprir a finalidade de orientar o trabalho diplomático na Conferência de 
Versalhes, sinalizando novos rumos para as relações entre os Estados. Em seus seis pontos 
doutrinários, Wilson preconizava: 
1) Convenções de paz abertas, abertamente concluídas, sem acordos secretos ulteriores; 
2) Liberdade de navegação fora das águas territoriais; 
3) Remoção de todas as barreiras comerciais; 
4) Redução dos armamentos nacionais ao mínimo necessário à segurança dos Estados; 
5) Atendimento das reivindicações de independência nacional das colônias; e 
[...] 
14) Formação de uma associação geral de nações, de acordo com convenções específicas, 
com vistas a dar garantias mútuas de independência política e de integridade territorial aos 
grandes e pequenos Estados46. 
 
46 MOREIRA, Adriano; BUGALLO, Alejandro; ALBUQUERQUE, Celso (Coords.) Legado Político do 
Ocidente : o homem e o Estado. Rio de Janeiro: DIFEL, 1978. p. 212-213. 
 
 
28 
Ao se assinalar a importância da intervenção de Woodrow Wilson para a criação da 
disciplina Relações Internacionais, não se deve perder de vista que ela teve caráter 
marcadamente normativo e, por outro lado, muito pouco científico. Como afirma Edward 
Carr,47 é comum que a ciência, em seus inícios, esteja muito mais voltada para solucionar 
os problemas próprios ao seu objeto, do que para o lento e difícil trabalho de lapidação 
conceptual e de definição metodológica. Por seguir esse padrão, típico de toda ciência em 
fase inicial, as Relações Internacionais sucumbiram à tentação utópica de promover a paz 
mundial antes de conseguir formar um corpo teórico sólido, capaz de contribuir para a 
produção de conhecimento confiável sobre a realidade internacional. Esse caráter utópico 
evidencia-se nos títulos das obras publicadas. Em sua grande maioria, os livros apresentam, 
em seus títulos, as palavras “paz” e “direito,” como se a vontade (por si só), pudesse mudar 
a realidade.48 
Esse estilo de comportamento acadêmico correspondeu a igual estilo de 
comportamento diplomático. Na diplomacia, preponderou a idéia de que os conflitos 
poderiam ser evitados recorrendo-se aos processos jurídicos de mediação e arbitragem. 
Nesse sentido, são bem representativas as Conferências navais de Washington, mediante as 
quais os Estados Unidos, o Reino Unido e o Japão tentaram exercer controle sobre o uso de 
armamentos no Oceano Pacífico. Também foram representativas, a criação da Corte 
Internacional de Justiça, em 1921, e a assinatura do Pacto Briand-Kellogg, em 1928, pelo 
qual os signatários comprometiam-se a apelar para a arbitragem da Sociedade das Nações 
como forma de resolver eventuais pendências, renunciando, portanto, ao emprego da força. 
Enfim, seja no plano diplomático, seja no acadêmico, a visão liberal está sempre assentada 
nas idéias de que a natureza humana é essencialmente boa e que o mau comportamento dos 
homens decorre dos defeitos das instituições. Por essa razão, para os liberais, a reforma das 
 
47 CARR, Edward H. Vinte Anos de Crise: 1919 – 1939. Brasília: UNB, 1981. p. 17. 
48 Segue-se alguns importantes títulos como exemplos: 
ZIMMERN, Alfred E. The League of Nations and the Rule of Law 1918-35. London: Macmillan, 1936. 
SUTTNER, B. von. Lay Down Your Arms!. New YorK: Longmans, Green, 1914. 
EAGLETON, C. International Government . New York: Ronald Press, 1932. 
YORK, E. Leagues of Nations . New York:, Swarthmore University Press, 1919. 
LAUTERPACHT, H. The Function of Law in International Community. New York : Oxford University 
Press, 1933. 
SCOTT J. B. The Proceedings of the Hague Peace Conference. New York:Oxford Universwity Press, 
1920. L. F. L. Oppenheim. International Law. London: Longmans, Green, 1937. 
BRIERLY, L. J. The Law of Nations . New York: Oxford University Press, 1928. 
 
 
 
29 
instituições pode, perfeitamente, resultar na prevalência da cooperação e na redução dos 
conflitos.***** 
A crise dos anos 1930, a Segunda Guerra Mundial e a subsequente bipolarização do 
sistema internacional em torno dos dispositivos nucleares dos Estados Unidos e da União 
Soviética desacreditaram essas teses liberais das Relações Internacionais. A 
desconsideração dos liberais para com a luta pelo poder teria demonstrado a enorme 
distância existente entre o desejo de paz e prosperidade e a realidade conflituosa das 
relações internacionais. Consequentemente, ao longo dos anos marcados pela Guerra Fria, a 
Teoria Realista foi considerada pela maioria dos analistas, como a única capaz de exprimir, 
com fidelidade, os aspectos fundamentais que davam sentido às relações internacionais em 
todas suas dimensões. 
No entanto, o fim da Guerra Fria levou a comunidade acadêmica à retomada das 
teses liberais. O surgimento de temas que, para sua solução ou para seu equacionamento, 
exigem a cooperação dos atores estatais e incluem atores não-governamentais (como o 
combate ao narcotráfico, a defesa do meio ambiente, o combate ao terrorismo 
internacional), bem como a maior internacionalização do capital, a globalização financeira 
e, principalmente, a incapacidade, da Teoria Realista, de prever o colapso da União 
Soviética e a dissolução do campo socialista constituem as razões freqüentemente 
apontadas para explicar o seu desprestígio e a recuperação da Teoria Liberal, com vistas a 
dar conta das relações internacionais contemporâneas. 
 
***** Kegley Jr. e Wittkopf afirmam que as idéias e as ações diplomáticas liberal-idealistas da década de 1920 
estavam baseadas nos seguintes pressupostos: 
a) a natureza humana é essencialmente “boa” ou altruística e as pessoas são, portanto, capazes de se ajudar e 
colaborar mutuamente; 
b) a fundamental preocupação humana com o bem-estar dos outros torna o progresso possível (isto é, a fé 
Iluminista na possibilidade de aperfeiçoamento da civilização foi reafirmado); 
c) o mau comportamento do homem, tal como a violência, não é resultante de sua natureza defeituosa, mas, 
sim, do mau funcionamento das instituições, que o leva a agir egoisticamente em detrimento dos demais; 
d) a guerra não é inevitável e sua freqüência pode ser reduzida mediante a eliminação dos arranjos 
institucionais que a estimulam; 
e) a guerra é um problema internacional que requer esforços coletivos ou multilaterais, mais do que 
nacionais, para controlá-la; 
f) a sociedade internacional deve reorganizar-se a fim de eliminar as instituições que possibilitam as 
guerras, e as nações devem reformar seus sistemas políticos de modo que a auto-determinação e o 
governo democrático possam ajudar pacificar as relações entre os Estados. 
(KEGLEY, Charles; W. WITTKOPF, Eugene R. World Politics : Trend and Transformation. New York: St. 
Martin’s Press, 1997. p. 20). 
 
 
 
30 
A retomada das teses liberais, na esfera das Relações Internacionais,

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