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Carl Rogers e a Perspectiva Centrada no Cliente FADIMAN, James, FRAGER, Robert, Teoria da Personalidade. São Paulo: Editora Harbra Ltda., Ed. 2002. Introdução Carl Rogers foi um dos mais eminentes psicólogos americanos de sua geração. Tinha uma concepção pouco comum da natureza humana, a partir da qual elaborou uma psicoterapia original, que lhe proporcionou uma visão muito própria da educação. Seu método correspondia à ideia que ele tinha da natureza humana. Considerava que cada pessoa possui a capacidade de se auto atualizar, a qual, uma vez liberada, lhe permitiria resolver seus problemas. O terapeuta, segundo ele, mais do que agir como um especialista que compreende o problema e decide sobre a maneira de resolvê-lo, deve liberar o potencial que o paciente possui para resolver, por si mesmo, seus problemas. Rogers prefere utilizar a palavra “cliente”, em vez de paciente. História Pessoal Vindo de uma família muito religiosa e extremamente rígida, Carl Rogers inicialmente, viveu muito isolado do restante das pessoas, em favor das crenças e atitudes estabelecidas por seus pais durante um grande período de sua vida. Dedicou seus estudos ao ministério religioso, quando logo em seguida, começou uma graduação em Teologia no Union Theological Seminary, mas optou por terminar um trabalho já iniciado em Psicologia no Teachers Seminary, na Universidade da Colúmbia. Mais tarde, durante um curso de Psicologia, Rogers ficou bastante surpreso ao perceber que uma pessoa também poderia ter sucesso “fora” da igreja, trabalhando em favor de pessoas que precisavam de ajuda. Seu primeiro emprego foi em Rochester, Nova Iorque, num centro de aconselhamento infantil. A partir de sua experiência adquirida nesse centro durante doze anos de trabalho, começou a formular seu próprio processo psicoterapêutico, ao qual o denominou mais tarde de terapia centrada no cliente, ou seja, trabalho cuja maior força orientadora da relação terapêutica deve ser o cliente, não o terapeuta (aconselhamento não- diretivo). A teoria de Rogers desenvolveu-se essencialmente da própria experiência clínica, evitando qualquer influência de alguma escola ou tradição especifica. Principais Conceitos O campo da Experiência A partir de um trabalho teórico elaborado em 1959, Rogers definiu os principais conceitos da terapia centrada no cliente, o campo de experiência é um deles. Esse conceito é considerado por Rogers como o organismo do sujeito como um todo, ou seja, suas singularidades, eventos acontecidos, as sensações sentidas, experiências vividas, que poderão ser acessadas quando o sujeito precisar. O campo de experiência é limitado por restrições psicológicas e limitações biológicos, temos tendência a dirigir nossa a atenção para perigosos imediatos, assim como para experiências seguras ou agradáveis, ao invés de aceitar todos os estímulos que nos rodeiam. Self O Self é outra ideia trazida por Rogers em sua abordagem, ao qual pode ser entendida como a maneira como o sujeito se vê, ou seja, o que ele consegue ver dele mesmo como um todo. O self possui uma estrutura móvel e constitui-se através do campo de experiência de cada indivíduo. Self ideal Tomando como base o conceito de Self, Rogers formula o conceito de Self ideal, que significa uma visão “ideal” de si própria, a partir dos desejos e das vontades dos indivíduos de quererem ser e atingirem um ideal. Congruência e Incongruência Outra ideia bastante interessante é a definição de congruência, que de maneira simplificada pode ser entendida como uma sintonia existente entre os atos de “sentir, pensar e agir”. Crianças exibem alto grau de congruência, expressam seus sentimentos logo que seja possível com o seu ser total. Quando uma criança sente amor ou raiva, ela expressa plenamente essas emoções. Isso pode justificar a rapidez com que a criança substitui um estado emocional por outro. A expressão total de seus sentimentos permite que elas liquidem a bagagem emocional que não foi expressa em experiências anteriores. Em oposição a esse conceito, existe a incongruência, que é quando ocorre uma medida desigual entre algum desses elementos citados acima (pensar de uma maneira e agir em oposição a ela, por exemplo). Quando a incongruência esta entre a tomada de consciência e a experiência, é chamada repressão. A pessoa simplesmente não tem consciência do que está fazendo. Quando a incongruência é uma discrepância entre a tomada de consciência e a comunicação a pessoa não expressa o que está realmente sentindo, pensando ou experienciando. Este tipo de incongruência é muitas vezes percebido como mentiroso ou desonesto. Embora tais comportamentos pareçam ser realizados com malícia, terapeutas relatam que a ausência de congruência social é com frequência uma falta de autocontrole e consciência pessoal. A pessoa não é capaz de expressar sua emoções e percepções reais em virtude do medo e de velhos hábitos de encobrimento difíceis de superar, ou é possível que a pessoa tenha dificuldade em compreender o que os outros esperam dela. A incongruência pode ser sentida como tensão, ansiedade ou como confusão interna. Para Rogers, a forma particular de distúrbio é menos critica do que o reconhecimento de que há uma incongruência que exige uma solução. É visível em observações como “não sou capaz de tomar decisões”, “não sei o que quero”, a confusão aparece quando não se é capaz de escolher entre os diferentes estímulos aos quais se acha exposto. Tendência a Auto Atualização Por fim, a tendência a auto atualização, considerada por Carl Rogers como uma busca pelas congruências do sujeito, podendo ser compreendida também como uma tendência comum do organismo para funcionar de maneira saudável. Rogers sugere em que cada um de nós há um impulso inerente em direção a sermos competentes e capazes quanto o que estamos aptos a ser biologicamente. Assim como uma planta tenta tornar-se saudável, como uma semente contém dentro de si impulso para se tornar uma árvore, também uma pessoa é impedida a se tornar uma pessoa total, completa e auto atualizada. O impulso em direção à saúde não é uma força esmagadora que supera obstáculos ao longo da vida, pelo contrário, é facilmente distorcido e reprimido, Rogers o vê como a força motivadora dominante numa pessoa que não está paralisada por eventos passados ou por crenças correntes que mantém a incongruência. Crescimento Psicológico As forças positivas em direção à saúde e ao crescimento são naturais e inerentes ao organismo. Baseado em sua própria experiência clínica, Rogers conclui que os indivíduos têm a capacidade de experienciar e de se tomarem conscientes de seus desajustamentos. Isto é, você pode experienciar as incoerências entre seu auto-conceito e suas experiências reais. Esta capacidade que reside em nós é associada a uma tendência subjacente à modificação do auto- conceito, no sentido de estar realmente de acordo com a realidade. Rogers postula, portanto, um movimento natural para a resolução e distante do conflito. Vê o ajustamento não como um estado estático, mas como um processo no qual novas aprendizagens e novas experiências são cuidadosamente assimiladas. Rogersestá convencido de que estas tendências em direção à saúde são facilitadas por qualquer relação interpessoal na qual um dos membros esteja livre o bastante da incongruência para estar em contato com seu próprio centro de auto-correção. Aceitar-se a si mesmo é um pré-requisito para uma aceitação mais fácil e genuína dos outros. Em compensação, ser aceito por outro conduz a uma vontade cada vez maior de aceitar-se a si próprio. Este ciclo de auto-correção e auto- incentivo é a forma principal pela qual se minimiza os obstáculos ao crescimento psicológico. Obstáculos ao Crescimento Rogers sugere que os obstáculos aparecem na infância e são aspectos normais do desenvolvimento. O que a criança aprende em um estágio como benéfico deve ser reavaliado nos estágios posteriores: Motivos que predominam na primeira infância mais tarde podem inibir o desenvolvimento da personalidade. Quando a criança começa a tomar consciência do Self, desenvolve uma necessidade de amor ou de consideração positiva. Esta necessidade é universal, considerando- se que ela existe em todo ser humano e que se faz sentir de uma maneira contínua e penetrante. O amor é tão importante para a criança que ela acaba por ser guiada, não pelo caráter agradável ou desagradável de suas experiências e comportamentos, mas pela promessa de afeição que elas encerram. A criança começa a agir da forma que lhe garante amor ou aprovação. Comportamentos ou atitudes que negam algum aspecto do Self são chamados de condições de valor. Quando uma experiência relativa ao eu é procurada ou evitada unicamente porque é percebida como mais ou menos digna de consideração de si, diz Rogers que o indivíduo adquiriu um modo de avaliação condicional. Condições de valor são os obstáculos básicos à exatidão da percepção e à tomada de consciência realista. O Corpo Embora Rogers defina a personalidade e a identidade como uma gestalt contínua, não dá ao papel do corpo uma atenção especial. Mesmo no seu trabalho com encontros ele não promove ou facilita o contato físico nem trabalha diretamente com gestos físicos. Relacionamento Social O valor dos relacionamentos é de interesse central nas obras de Rogers. Os relacionamentos mais precoces podem ser congruentes ou podem servir como foco de condições de valor. Relações posteriores são capazes de restaurar a congruência ou retardá-la. Rogers acredita que a interação com o outro capacita um indivíduo a descobrir, encobrir, experienciar ou encontrar seu Self real de forma direta. Nossa personalidade torna-se visível a nós através do relacionamento com os outros. Para Rogers, os relacionamentos oferecem a melhor oportunidade para estar "funcionando por inteiro", para estar em harmonia consigo mesmo, com os outros e com o meio ambiente. Através dos relacionamentos, as necessidades organistas básicas do indivíduo podem ser satisfeitas. O Casamento É um relacionamento não usual, é potencialmente de longo prazo, intensivo, e carrega dentro de si a possibilidade de manutenção do crescimento e do desenvolvimento. Os melhores casamentos ocorrem com parceiros que são congruentes consigo mesmos, que têm poucas condições de valor como empecilho e que são capazes de genuína aceitação dos outros. Quando o casamento é usado para manter uma incongruência ou para reforçar tendências defensivas existentes, é menos satisfatório e é menos provável que se mantenha. As conclusões de Rogers sobre qualquer relação íntima a longo prazo, tal como o casamento, são focalizadas sobre quatro elementos básicos: compromisso contínuo, expressão de sentimentos, não-aceitação de papéis específicos e capacidade de compartilhar a vida íntima. Emoções O indivíduo saudável toma consciência de suas emoções, sejam ou não expressas. Sentimentos negados à consciência distorcem a percepção e a reação às experiências que os desencadearam. Um caso específico é sentir ansiedade sem tomar conhecimento da causa. A ansiedade aparece quando uma experiência que ocorreu, se admitida na consciência, poderia ameaçar a auto-imagem. Intelecto Se o intelecto, como outras funções, ao operar de forma livre, tende a dirigir o organismo à tomada de consciência mais congruente, então forçar o intelecto por vias específicas pode não ser benéfico. O ponto de vista de Rogers é de que as pessoas estão em melhor situação decidindo o que fazer por si mesmas, com o apoio de outros, do que fazendo o que os outros decidem por elas. Self Rogers está mais interessado na percepção, na tomada de consciência e na experiência do que num construto hipotético, o Self. A personalidade que funciona plenamente é uma personalidade em contínuo estado de fluxo, uma personalidade constantemente mutável. A pessoa de funcionamento integral tem diversas características distintas, a primeira das quais é uma abertura à experiência. A pessoa está mais aberta a seus sentimentos de receio, de desânimo e de desgosto. Fica igualmente mais aberto aos seus sentimentos de coragem, de ternura e de fervor. Torna- se mais capaz de viver completamente a experiência do seu organismo, em vez de a impedir de atingir a consciência. Viver no presente, realizar-se completamente cada momento. Este engajamento contínuo e direto com a realidade permite dizer que o eu (Self) e a personalidade emergem da experiência. Uma pessoa é capaz de reestruturar suas respostas à medida que a experiência permite ou sugere novas possibilidades. Outra característica é a confiança nas exigências internas e no julgamento intuitivo, uma confiança sempre crescente na capacidade de tomar decisões. Quando uma pessoa está melhor capacitada para coletar e utilizar dados, é mais provável que ela valorize sua capacidade de resumir esses dados e de responder. Esta não é uma atividade apenas intelectual, mas uma função da pessoa inteira. Terapia Centrada no Cliente Rogers foi um terapeuta praticante durante toda sua carreira profissional. Sua teoria da personalidade emerge de seus métodos e ideias sobre terapia e é integrada a eles. A teoria psicoterápica de Rogers passou por diversas fases de desenvolvimento e mudanças de ênfase, e ainda assim há alguns pontos básicos que se mantiveram inalterados. Rogers trocou o termo “paciente” pela palavra "cliente". Um paciente é em geral alguém que está doente, precisa de ajuda e vai ser ajudado por profissionais formados. Um cliente é alguém que deseja um serviço e que pensa não poder realizá-lo sozinho. O cliente, portanto, embora possa ter muitos problemas, é ainda visto como uma pessoa inerentemente capaz de entender sua própria situação. Há uma igualdade implícita no modela do cliente, que não está presente no relacionamento médico-paciente. A terapia é dirigida pelo cliente ou centrada no cliente, uma vez que é quem assume toda direção que for necessária. A terapia centrada no cliente, a pessoa dirigi e modificar as metas da terapia e iniciar as mudanças comportamentais (ou outras) que deseja que ocorram. Terapeuta Centrado no Cliente O cliente tem a chave de sua recuperação, mas o terapeuta deveria ter determinadas qualidades pessoais que ajudam o cliente a aprender como usar tais chaves. Estes poderesdentro do cliente, tornar-se-ão efetivos se o terapeuta puder estabelecer com o cliente um relacionamento de aceitação e compreensão suficientemente caloroso. Antes do terapeuta ser qualquer coisa para o cliente, ele deve ser autêntico, genuíno, e não estar desempenhando um papel, especialmente o de um terapeuta, quando está com o cliente. Um bom terapeuta deve possuir a habilidade para comunicar esta compreensão ao cliente. O cliente precisa saber que o terapeuta é autêntico, preocupa-se, ouve e compreende de fato. Grupos de encontro A contribuição de Rogers e seu trabalho contínuo com grupos de encontro são aplicações de sua teoria. Em Grupos de Encontro ele descreve os principais fenômenos que ocorrem nos grupos que se prolongam por vários dias. Embora haja muitos períodos de insatisfação, incerteza e ansiedade na descrição de encontros que se segue, cada um desses períodos conduz a um clima mais aberto, menos defensivo, mais exposto e mais confiante. A intensidade emocional e a capacidade de tolerar a intensidade parecem aumentar à medida que o grupo prossegue. Processo de encontro Um grupo começa andando à volta, esperando que lhe seja dito como se comportar, o que esperar, como trabalhar com as expectativas sobre o grupo. Há uma resistência inicial à expressão ou exploração pessoais. À medida que as pessoas continuam a interagir elas compartilham sentimentos passados associados a pessoas ausentes no grupo. Quando as pessoas começam a expressar seus sentimentos presentes, o mais frequente é serem as primeiras expressões negativas. Os sentimentos profundos positivos são muito mais difíceis e perigosos de exprimir que os negativos. Se digo que te amo fico vulnerável e exposto à mais terrível rejeição. Mas se digo que te detesto, fico quando muito sujeito a um ataque de que posso defender-me. Quanto mais expressões emocionais vêm à tona e sofrem as reações do grupo, Rogers nota o desenvolvimento de uma capacidade terapêutica no mesmo. As pessoas começam a fazer coisas que parecem ser de grande auxílio, que ajudam os outros a tomar consciência de sua própria experiência de uma forma sem ameaça. Um dos efeitos da disposição do grupo para a aceitação e feedback é que as pessoas podem aceitar a si mesmas. CONCLUSÃO As ideias de Rogers destacam que não há uma conceituação da subjetividade, e sim o foco é o sujeito individual, onde o ser humano possui em sua essência a busca para o crescimento e a realização pessoal. Ser aceito pelo outro, é um auto-incentivo para o crescimento psicológico, porém Rogers enfatiza a importância de aceitar-se a si mesmo para conquistar essa realização. Para Rogers o homem não é apenas uma relação de estímulo- resposta, e nem que o homem funcionava apenas em resposta a experiências da infância e reagia as influências do meio. A psicoterapia de Rogers, buscou a transformação da figura do terapeuta, que antes tinha uma certa superioridade, para uma situação de igualdade perante ao “cliente”, assim chamado por ele. A psicoterapia de Rogers estabelece uma relação de qualidade, ele enfatiza a importância da mudança de atitude do terapeuta, sua sugestão foi que a maior força orientadora de uma relação terapêutica deveria ser o cliente não o terapeuta, uma visão humanista. O papel do Terapeuta seria então, desenvolver o potencial que o cliente possui para resolver, por si mesmo, seus problemas. Para se estabelecer uma relação acolhedora, se faz necessário que o cliente se sinta seguro e sem barreiras, e isso tem mais chances de acontecer quando ele perceber que o terapeuta compreende e realmente preocupa-se. A psicoterapia de Rogers é dinâmico e aberto a novas possibilidades.
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