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TRANSFERÊNCIA DE CALOR AULA 5 Prof. Marcos Baroncini Proença 2 CONVERSA INICIAL Vimos nas aulas anteriores que as transferências de calor por condução e convecção necessitam de uma variação de temperatura em alguma matéria ou fluido, seja em repouso ou em movimento, para que se processem. Em contraste, a radiação térmica não precisa de um meio para a transmissão, podendo inclusive ser transmitida no vácuo. É um mecanismo relevante em equipamentos como fornos e geradores de vapor e processos como combustão e secagem, além de geração de energia por células fotovoltaicas. Figura 1 – Radiação em painéis solares Fonte: <shutterstock.com> Vídeo Assista ao vídeo <https://www.youtube.com/watch?v=oXECwlnJWSo> para visualizar como se processa a radiação térmica. Um exemplo de aplicação que vem sendo usada de modo crescente é a câmera térmica, que permite a inspeção preditiva de manutenção de instalações e equipamentos pela captação da radiação térmica emitida por eles. 3 Figura 2 – Radiação Fonte: <shutterstock.com> Trataremos, então, nesta aula desse tipo de transferência de calor, da sua absorção e emissão, bem como das teorias e aplicações na engenharia. TEMA 1 – CONCEITOS FUNDAMENTAIS Considere um sólido inicialmente a Tsuperfície > Tvizinhança, mas em torno do qual há vácuo (evitando os mecanismos de condução e convecção). É intuitivo que o sólido perderá calor e, ao final da troca térmica, entrará em equilíbrio com a vizinhança. Esse resfriamento está associado a uma redução na energia interna armazenada pelo sólido e é uma consequência direta da emissão de radiação térmica pela sua superfície, sendo que essa superfície também absorverá radiação emitida por uma fonte próxima. Figura 3 – Princípio Radiação Fonte: Incropera, F. P. et al., 2008. 4 Assim, a radiação térmica é a energia emitida pela matéria como resultado da sua temperatura. O mecanismo da emissão está relacionado à energia liberada pela oscilação dos elétrons presentes nas ligações que formam os materiais de engenharia. Essas oscilações estão ligadas à energia interna, ou, em termos mais simples, à temperatura. Portanto, a radiação é um fenômeno de superfície de toda a matéria. A natureza do transporte é por fótons ou ondas eletromagnéticas. Figura 4 – Espectro eletromagnético Fonte: Incropera, F. P. et al., 2008. A Figura 4 apresenta o espectro eletromagnético em função do comprimento de onda e da frequência. A porção intermediária do espectro, que se estende aproximadamente de 0,1 até 100 μm e que inclui uma fração da UV e todo o visível e o infravermelho (IV), é chamada de radiação térmica, porque é causada pelo estado térmico e afeta a temperatura da matéria. Por essa razão, a radiação térmica é pertinente à transferência de calor. Essa radiação térmica emitida é uma distribuição contínua e não uniforme de comprimentos de onda simples cuja amplitude e distribuição no espectro eletromagnético variam com o tipo de material e a temperatura da superfície que a está emitindo. O espectro relaciona o comprimento de onda com a radiação. Tanto a radiação emitida quanto a radiação incidente se propagam ou têm origem em todas as direções que compõem o espaço. A maneira com que a superfície de um sólido irá responder à radiação incidente ou a maneira com que a radiação emitida se propagará dependerão da distribuição dessas direções radiantes. 5 Aprofunde os conhecimentos sobre as equações envolvendo a radiação emitida no Anexo 1. A intensidade de radiação está relacionada a vários fluxos de radiação. O conceito de poder emissivo é a quantidade de radiação emitida por unidade de área. O poder emissivo espectral E é a taxa na qual a radiação de comprimento é emitida em todas as direções de uma superfície por unidade de comprimento de onda e por unidade de área: 2 0 2/ 0 ...cos. ddsenIE (1) O poder emissivo total é: 0 dEE (2) Quando a intensidade da radiação independer da direção, a superfície emissora é chamada difusa. IE . (3) Embora até agora o foco tenha sido a radiação emitente, os conceitos podem ser extrapolados para a radiação incidente. Tal radiação pode ser originada da emissão e reflexão que ocorrem nas outras superfícies. Aprofunde os conhecimentos sobre as equações envolvendo a radiação incidente no Anexo 2. TEMA 2 – RADIAÇÃO DO CORPO NEGRO Conforme se pode observar da Figura 6, o corpo negro caracteriza-se pela completa absorção da radiação incidente. O corpo negro é, portanto, uma superfície ideal na transferência de calor por radiação, possuindo absortividade igual a 1. Essa absortividade independe do comprimento de onda e da direção de incidência. O corpo negro também emite a máxima energia a uma dada temperatura, independentemente do comprimento de onda. 6 Figura 6 – Características de uma cavidade isotérmica, comportando-se como um corpo negro. (a) Absorção completa. (b) Emissão difusa a partir de uma abertura. (c) Irradiação difusa das superfícies interiores. Fonte: Incropera, F. P. et al., 2008. Portanto, pode-se afirmar que: 1. O corpo negro é o absorvedor ideal de radiação térmica, independentemente do comprimento de onda e de direção. 2. O corpo negro é o emissor ideal de radiação térmica a uma dada temperatura, para um comprimento de onda, independentemente da direção. 3. O corpo negro emite radiação térmica por difusão, ou seja, para o meio em todas as direções. Como o absorvedor e o emissor ideal, o corpo negro é adotado como um padrão para comparar as propriedades radiantes de superfícies reais, chamadas de corpos cinzentos. O poder emissivo do corpo negro é dado por: TEb 4 (4) Sendo σ a constante de Stefan-Boltzmann = 5,6677.10-8 W/(m2.K) É importante notar que nenhuma superfície é um corpo negro. É o padrão de comparação para superfícies reais. É o absorvedor e emissor perfeito. Uma superfície real tem poder emissivo menor que o do corpo negro. A relação entre o poder emissivo real e o do corpo negro é a emissividade, . A emissividade varia de 0 (corpo branco) a 1 (corpo negro). A lei de Kirchhoff para a radiação estabelece que a absortividade de um material é igual à emissividade. 7 Veja a lei de Kirchhoff para radiação no Anexo 3. A quantidade de calor trocada por dois corpos negros é dada por: 𝑞1,2 = 𝐹1,2𝐴1,2𝜎(𝑇1 4 − 𝑇2 4) (5) 𝑞2,1 = 𝐹2,1𝐴2,1𝜎(𝑇2 4 − 𝑇1 4) (6) Em que: q1,2 = quantidade de calor transferida por radiação pelo corpo negro 1 para o corpo negro dois (W) F1,2 = fator de forma relativo à radiação térmica do corpo negro 1 para o corpo negro 2 A1,2 = área de exposição para radiação térmica do corpo negro 1 para o corpo negro 2 (m2) σ = constante de Stefan-Boltzmann = 5,6697.10-8 (W/m2.K) T1 = temperatura do corpo negro 1 (K) T2 = temperatura do corpo negro 2 (K) Obs.: na equação (6), aplica-se a mesma definição das variáveis, porém agora tomando como referência a radiação térmica do corpo negro 2 para o corpo negro 1. O calor líquido trocado por radiação térmica (q) entre as superfícies 1 (T1) e 2 (T2) depende: das temperaturas T1 e T2; das áreas A1 e A2; das propriedades radiativas das superfícies; de outras superfícies adicionais no ambiente,as quais possam refletir a radiação para 1 e 2; orientação relativa das superfícies, representada pelo fator de forma. 8 O fator de forma F1,2 é definido como a fração da radiação que deixa a superfície 1 e é interceptada pela superfície 2. Considerando que a radiação é emitida em todas as direções por uma superfície difusa e só uma fração dela atinge a outra superfície, quando os corpos negros atingirem o equilíbrio em termos de radiação térmica, teremos: q1,2 = q2,1 (7) 𝐹1,2𝐴1,2𝜎(𝑇1 4 − 𝑇2 4) = 𝐹2,1𝐴2,1𝜎(𝑇2 4 − 𝑇1 4) (8) Considerando a variação das temperaturas em módulo, ficaremos então com: 𝐹1,2𝐴1,2 = 𝐹2,1𝐴2,1 (9) Essa equação é a relação que indica a composição de área de exposição e fator de forma que delimitam a radiação térmica entre dois corpos negros no espaço. Há diversas expressões para determinação dos fatores de forma desenvolvidas para geometrias distintas, tanto bidimensionais quanto tridimensionais. Esses valores também podem ser obtidos graficamente. Tabelas para essas expressões são apresentadas no Anexo 4, ao passo que no Anexo 5 são apresentados gráficos para obtenção dos fatores de forma. TEMA 3 – RADIAÇÃO DE CORPOS CINZENTOS A abordagem até agora estava limitada a corpos negros. Para superfícies cinzentas, a reflexão deve ser considerada. Também devemos considerar dois fatores ainda não abordados: balanço envolvendo a radiação térmica e radiosidade. Abordaremos, então, conceitos de balanço envolvendo radiação térmica e de radiosidade para, em seguida, tratarmos da radiação térmica em corpos cinzentos. 9 Figura 8 – Radiação térmica corpo cinzento Fonte: <shutterstock.com> Balanço da radiação térmica Sempre que a radiação incidir sobre a superfície de um corpo cinzento, sendo essa radiação denominada irradiação (G), parte dela pode ser absorvida (representada pela absortividade, , multiplicada por G = G), parte refletida (refletividade, , multiplicada por G = G) e parte transmitida (transmissividade, , multiplicada por G = G). Figura 9 – Reflexão, absorção e transmissão da irradiação em um corpo cinzento Fonte: Incropera, F. P. et al., 2008. Somando-se as contribuições: + + = 1 Radiosidade A radiosidade de uma superfície consiste na taxa que a energia térmica a deixa (Cárdenas e Tsukada, 2011, p. 7). A radiosidade de uma superfície, portanto, é resultante de toda a radiação térmica que sai da superfície, somando a energia refletida da irradiação e a energia emitida. J = G+E (10) Em que: 10 J = radiosidade (W/m2) ρ = refletividade G = irradiação (W/m2) ε = emissividade E = poder emissivo (W/m2) Figura 10 – A radiosidade de um meio opaco Fonte: Incropera, F. P. et al., 2008. Quantidade de calor transferida por radiação em corpos cinzentos Para tratar do corpo cinzento, temos de levar em consideração, como já dito, a reflexão. Figura 10 – Balanço envolvendo radiação térmica em corpo cinzento Para tanto, devemos levar em consideração as seguintes simplificações: Cada superfície é isotérmica e caracterizada pela irradiação e radiosidade. As superfícies são cinzentas, opacas (=0 ; + = 1) e difusas. O calor líquido trocado em uma direção qualquer i (qi) que deixa a superfície é: 11 qi = Ai (Ji – Gi) (11) Em que: Ji = Ei + iGi (radiosidade na direção vetorial i) Gi = irradiação (radiação incidente na direção vetorial i) Substituindo na equação anterior: qi = Ai (Ei + iGi – Gi) = Ai [Ebi – G (1-i)] = Ai {Ebi - (1-i)[( Ji-Ebi)/ i]} (12) Rearranjando e considerando que = 1 - = : i i i ii i ibi i i TTFA q A JEq 11 4 2 4 1 (13) O termo Aii i 1 define a resistência térmica por radiação. A irradiação da superfície pode ser avaliada pelas radiosidades de todas as superfícies do invólucro, em função da área na direção vetorial i (Ai) e dos fatores de forma nas direções vetoriais i e j (Fij): n j jij n j jjjiii JAFiJAFGA 11 (14) A quantidade de calor transferida por radiação em corpos cinzentos fica: n j jiji n j jij n j iiji n j jijiiiiii JJ iFAJFJFAJFJAGJAq 1111 )( (15) Veja a tabela para todos os fluxos radiantes apresentada no Anexo 6. TEMA 4 – BLINDAGEM POR RADIAÇÃO E SUPERFÍCIES REIRRADIANTES Trataremos neste tema de duas aplicações envolvendo radiação térmica de grande utilização em engenharia. São os conceitos de blindagem por radiação e de superfícies reirradiantes. Esses conceitos aplicados geram revestimentos isolantes de alumínio, para silos e galpões industriais, roupas termorresistentes, protetores solares e diversas outras aplicações, em cujos processos de fabricação ou uso o engenheiro de produção está diretamente envolvido. 12 Figura 10 – Roupa isolante térmica Fonte: <shutterstock.com> Blindagem por Radiação Ocorre devido a materiais de baixa emissividade e alta refletividade, e serve para reduzir a transferência líquida por radiação. Normalmente a blindagem é posicionada entre as duas fontes de radiação. Podemos citar como aplicações importantes a proteção de termopares usados para medir a temperatura de gás escoando numa tubulação, cafeteiras, mantas isolantes térmicas para galpões e silos, óculos de sol, películas de proteção, dentre outras. Figura 11 – Mantas de isolamento térmico Fonte: <shutterstock.com> O calor líquido trocado entre as superfícies 1 e 2, sem a blindagem, é: 1 11 21 4 2 4 11 4 2 4 11 12 TTAq R TTσA (16) 13 Ao adicionar a blindagem, fica: 1,3 2,3 1,3 1,3 21 4 3 4 21 4 3 4 21 12 1111 TTAq R TTσA (17) Em que: (T24-T34)= (T14-T34)/2 Observe que: as resistências aumentam se 3,1 e 3,2 forem pequenas; T1 e T2 são conhecidas; a Temperatura da blindagem T3 pode ser determinada em função de T1 e de T2, fazendo q23 = q12; Figura 12 – Superfície com blindagem Superfícies Reirradiantes Paredes adiabáticas são frequentes na prática de engenharia. Tal superfície deve refletir e/ou reemitir toda a energia radiante que incide sobre ela, e sua temperatura de equilíbrio depende da absortividade e da emissividade, além das temperaturas das demais superfícies envolvidas. São caracterizadas pela transferência líquida de radiação igual a zero. Se qi = 0 Gi = Ji = Ebi. 14 Para um invólucro com 3 superfícies, para a qual a superfície R é a reirradiante: A FAFA FA A EE qq RR bb 22 2 2211 1 121 11 1 21 21 1 11 11 (18) 0 11 22 2 11 21 FA JJ FA JJ R R R (19) A temperatura TR sai de JR = .TR4. NA PRÁTICA 1. Dois retângulos negros de 0,6 m por 1,2 m são paralelos e diretamente opostos. O retângulo inferior está a T1 = 500K e o superior está a T2 = 900K. A distância entre osretângulos é de 1,2 m. Determinar (a) o calor transferido por radiação entre as duas superfícies considerando ambos como corpos negros; (b) considerando ambos como corpos cinzentos com ε1 = ε2 = 0,7 e sem nenhuma outra radiação presente. Resolução: a. Ambos são corpos negros, então: q12 = q21 = F.A.σ.(T14- T24) 15 F é obtido do Anexo 5 , Figura 1: 𝑋 𝐿 = 1,2 1,2 = 1 𝑌 𝐿 = 0,6 1,2 = 0,5 F = 0,12 Área: A = 1,2 . 0,6 = 0,72m2 σ = 5,6697.10-8 W/m2K T14 = 6,25 . 1010K T24 = 65,61 . 1010K Substituindo na expressão, teremos: q12 = q21= F.A.σ.(T14- T24) q12 = q21= 0,12.0,72.5,6697.10-8.(6,25.1010- 65,61.1010) q12 = q21= -2907,82W b. Ambos corpos cinzentos com ε1 = ε2 = 0,7: Para o corpo 1, teremos: 1 1 4 2 4 11 1 TTFA q i 7,0 7,01 10.61,6510.25,610.6697,5.12,0.72,0 10108 q i = - 6784,92 W 16 Obs.: Como o corpo 2 tem a mesma área e a mesma emissividade do corpo 1, teremos também q12 = q21. 2. Duas paredes metálicas paralelas interna e externa de um forno de cozinha têm temperaturas T1 = 230°C e T3 = 25°C, tendo emissividades ε1 = ε3 = 0,30. O espaço interno entre as paredes é preenchido com lã de rocha. Considerando que a lã de rocha seja transparente à radiação térmica, calcular o fluxo de calor transferido por radiação (a) sem blindagem de radiação; (b) com blindagem de uma folha de alumínio com ε2 = 0,09. Resolução: a. Sem blindagem: 1 11 21 4 3 4 1 4 3 4 1 1 12 TTq R TTσ A 2 10108 1 12 3,561 1 1 3,0 1 10.79,010.4,610.6697,5 3,0 m W A q b. Com blindagem: 1,3 2,3 1,3 1,3 21 4 3 4 1 4 3 4 2 1 13 1111 2/ TTq R TTσ A 2 10108 1 13 2,80 3,0 09,01 3,0 3,01 09,0 1 3,0 1 2/10.79,010.4,610.6697,5 m W A q Observe como o fluxo de calor diminui com a blindagem. SÍNTESE Após esta aula, você adquiriu conhecimentos gerais sobre transferência de calor envolvendo radiação. Também viu aplicações de expressões para corpo negro, corpo cinzento, blindagem e superfícies reirradiantes. Expanda seus conhecimentos lendo os anexos das rotas de aprendizagem, assim como pesquisando sobre o assunto em outras literaturas. 17 REFERÊNCIAS BIRD, R. B.; STEWART, W. E.; LIGHTFOOT, E. N. Fenômenos de transporte. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2004. CÁRDENAS, M. A.; TSUKADA, R. S. Radiosidade. Campinas, 2011. 22f. Trabalho acadêmico para disciplina de computação gráfica – Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, DCA, UNICAMP, 2011. INCROPERA, F. P. et al. Fundamentos da transferência de calor e massa. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2008. MORAN, M. J.; SHAPIRO, H. N. Princípios da termodinâmica para engenharia. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2009. SISSON, L. E.; PITTS, D. R. Fenômenos de transporte. Rio de Janeiro: Guanabara Dois, 1996.
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