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Parasitologia 3ª Fase – Fernando Netto Zanette – Med. UFSC 13.2 Malária Definição A malária – também conhecida como maleita, febre palustre ou impaludismo – caracteriza-se como uma parasitose de grande importância devido à sua alta letalidade – principalmente em gestantes e crianças -, sendo grave problema para aqueles que adquirem a doença pela primeira vez pela ausência de anticorpos protetores. A enfermidade se encontra majoritariamente em áreas tropicais e subtropicais do planeta, com África, Ásia, Oceania e Américas enquadrando-se como os continentes mais afetados, e sendo que cerca de 85% dos casos localizam-se no continente africano. Em solo brasileiro, as principais áreas endêmicas estão na Amazônia Legal, que comporta mais de 90% dos casos do País. Das inúmeras espécies de Plasmodium, apenas cinco se mostram capazes de parasitar o ser humano, listadas abaixo em ordem decrescente de ocorrência. Plasmodium vivax – terçã benigna, ciclos febris de 48 horas. Período de incubação de 14 dias; Plasmodium falciparum – terçã maligna, acessos febris cíclicos de 36 a 48 horas. Período de incu- bação de 12 dias; Plasmodium malariae – quartã, acessos febris a cada 72 horas. Período de incubação de 30 dias; Plasmodium ovale – terçã benigna, ciclos febris de 48 horas. Período de incubação de 14 dias; Plasmodium knowlesi – febre cotidiana; O P. falciparum se mostra predominante na região da África, sendo seguido pelo P. malariae e, mais raramen- te, pelos P. ovale e P. vivax. Este – embora incomum na África – tornou-se a espécie predominante nas Américas, responsabilizando-se pelo maior número de casos da doença no Brasil, em contraste com o maior número de óbitos provocado pelo P. falciparum. Os plasmódios que infectam humanos diferem em características clínicas e epidemiológicas, sendo o P. falciparum o mais virulento e o responsável por produzir uma doença potencialmente mais grave. Os insetos vetores da malária pertencem à ordem Diptera, família Culicidae e gênero Anopheles, o qual abrange cerca de 300 espécies. O Anopheles gambiae se mostra o vetor maior predominância na África, ao passo que o Anopheles darlingi se demonstra a espécie mais comum no Brasil. Morfologia Os plasmódios apresentam características morfológicas variadas de acordo com o estágio de desenvolvimento em que se encontram. As formas evolutivas extracelulares – capazes de invadir as células do hospedeiro – qualificam-se como esporozoítos, merozoítos (no homem) e oocineto. Todas elas possuem um complexo apical formado por roptrias e micronemas, ambas envolvidas no processo de interiorização nas células. As formas intracelulares dos plasmódios, por outro lado, compreendem os trofozoítos, os esquizontes e os gametócitos. Classificação científica Filo Apicomplexa Classe Aconoidasida Ordem Haemosporida Família Plasmodiidae Gênero Plasmodium Espécie Plasmodium spp. Esporozoítos Os esporozoítos possuem forma alongada com extremidades afiladas. Eles apresentam uma membrana externa revestida por um material proteico contendo a proteína circunsporozoíta, importante na composição antigênica do plasmódio. O complexo apical, no terço anterior do esporozoíto, apresenta três formações anulares, com um par de roptrias e incontáveis micronemas centrais. Os esporozoítos dispõem da capacidade de permanecer viáveis nas glândulas salivares do inseto vetor por até dois meses. Trofozoíto O trofozoíto – na sua forma exoeritrocítica/pré- eritrocítica, ou seja, fora dos eritrócitos – desfruta de uma morfologia arredondada, formado a partir da perda de organelas do complexo apical dos esporozoítos no momento em que estes penetram no hepatócito. Após inúmeras divisões, os trofozoítos originam o criptozoíto ou esquizonte tissular, composto por uma massa citoplasmática e incontáveis núcleos. A forma eritrocítica inclui os trofozoítos jovens, os maduros ou esquizontes e os gametócitos. Merozoítos Essa forma do parasita – que possui capacidade de invadir os eritrócitos - é menor e mais arredondada, embora ainda seja muito semelhante aos esporozoítos. Eles se recobrem por uma capsula pilosa contendo glicoproteínas e muitas moléculas de adesão que auxiliam na invasão do eritrócito. À medida que o parasita cresce, processa-se um aumento do seu conteúdo citoplasmático, principalmente do número de ribossomos. Ao fim da esquizogonia eritrocitária, ocorre a formação do complexo apical e de microesferas. No interior do citoplasma do eritrócito, dá-se a formação de uma estrutura denominada rosácea, com o pigmento malárico concentrado em uma porção do citoplasma. Após o rompimento da hemácia, o pigmento malárico sofre fagocitose pelas células de Kupffer no fígado ou pelos macrófagos do baço ou de outros órgãos. Os trofozoítos sanguíneos originam os gametócitos. O microgameta, como de costume, constitui o gameta masculino, uma célula flagelada originada do processo de exflagelação e formada no estômago do mosquito. O macrogameta – ou gameta feminino – possui um clone atrativo na sua superfície, local onde ocorrerá a penetração do microgameta. Após a fecundação, um zigoto será formado. Este Morfologia dos três principais estágios de P. falciparum Morfologia dos três principais estágios de P. malarie sofrerá um processo de alongamento e adquirirá motilidade, transformando-se na forma móvel e alongada do parasita denominada oocineto. O oocineto se envolve em uma cápsula espessa e dá origem ao oocisto, uma estrutura esférica que apresenta em seu interior grânulos contendo pigmentos. Nas infecções mais brandas, todos os oocistos possuem, de forma geral, o mesmo tamanho. Nas infecções mais intensas, todavia, eles podem apresentar dimensões variadas. Cada oocisto dispõe da capacidade de originar em torno de 1000 esporozoítos. Ciclo biológico O parasita apresenta um ciclo digenético ou heteroxênico, sendo o homem o hospedeiro intermediário e o mosquito Anopheles o definitivo. O ciclo, de maneira didática, pode se dividir em três estágios. Estágio hepático Esse estágio, caracterizado pelo ciclo exoeritrocítico, tem local de ocorrência no fígado do homem. A fêmea do mosquito, durante sua alimentação hematófaga, inocula esporozoítos na corrente sanguínea do hospedeiro intermediário – o ser humano. O parasita possui tropismo pelo tecido hepático e, da corrente sanguínea, migra para o fígado. Aqui, os esporozoítos penetram nos hepatócitos e, por meio de divisões nucleares assexuadas, transformam-se em células multinucleadas denominadas esquizontes. Cada esquizonte, posteriormente à ruptura do hepatócito, origina milhares de merozoítos. O estágio hepático do ciclo tende a durar, em média, 14 dias, correspondendo ao período de incubação da doença. Nas espécies P. vivax e P. ovale, durante essa esquizogonia hepática, ocorre a formação de estruturas que ficam dormentes no fígado, denominadas de hipnozoítos, os quais podem se reativar meses ou anos depois, levando o paciente a apresentar recaídas da malária mesmo fora de área endêmica. Estágio sanguíneo Nesse estágio, há a ocorrência do ciclo eritrocítico, com a infestação de hemácias pelo parasita. Após o período de latência no tecido hepático, os merozoítos rompem os hepatócitos, atingem os sinusóides hepáticos e retornam para a corrente sanguínea, o que lhes permite a invasão dos eritrócitos. No interior dos eritrócitos, os merozoítos podem seguir dois caminhos: Originar os trofozoítos que, por reprodução assexuada, formam os esquizontes; Transformarem-se em gametócitos, a forma sexuada capaz de infectar o vetor da doença – fêmeas anó- feles;A fragmentação dos esquizontes no interior das hemácias culmina com a hemólise e a liberação de novos merozoítos na circulação, processo desencadeador do paroxismo febril – picos febris característicos da doença. Esquematização do ciclo biológico de Plasmodium spp Estágio no mosquito No hospedeiro invertebrado, terá origem o ciclo sexuado ou ciclo esporogônico do parasita. Durante a alimen- tação hematófaga, somente na fêmea do mosquito os gametócitos realizam a reprodução sexuada, dando origem ao zigoto que, até o amadurecimento, passa pelas fases de oocineto, oocisto e esporozoíto. Este migra para as glândulas salivares do mosquito, capacitando-o para a transmissão da doença a outro hospedeiro intermediário. O amadurecimento nas glândulas salivares dos mosquitos dura entre 10 e 18 dias. Diferentemente ao hospedeiro humano, o mosquito não sofre dos sintomas da malária. Diversas espécies e cepas distintas podem ser inoculadas em uma picada. Transmissão A malária se propaga ao homem no momento em que fêmeas do mosquito de gênero Anopheles inoculam esporozoítos infectantes durante sua alimentação hematófaga. Os mosquitos se contaminam ao picarem indivíduos infectados – sintomáticos ou assintomáticos – que apresentam as formas sexuadas do parasita. Outras formas de transmissão menos frequentes incluem a transfusão sanguínea e o compartilhamento de seringas contaminadas. Patogenia O P. falciparum apresenta maior virulência devido ao fato de possuir capacidade de invadir eritrócitos em qualquer estágio e produzir parasitemia de grande magnitude. Por outro lado, o P. vivax e o P. ovale invadem apenas eritrócitos jovens (reticulócitos), ao passo que o P. malariae invade somente eritrócitos envelhecidos, o que torna a parasitemia dessas espécies mais limitada. A resposta imune à infecção natural do parasita se mostra inadequada. Os moradores de regiões endêmicas, entretanto, podem desenvolver uma semiimunidade. Esses indivíduos não se encontram protegidos contra casos de reinfecção, mas apresentam menor probabilidade de desenvolver a forma grave da doença. Os eritrócitos parasitados por P. falciparum desenvolvem protuberâncias conhecidas como knobs, as quais são formadas pela PfEM-1 (proteína da membrana do eritrócito 1). Tais protuberâncias possibilitam a formação de rosetas a partir da adesão entre hemácias parasitadas e não parasitadas. Juntamente a isso, os knobs permitem a adesão do eritrócito ao endotélio a partir da ligação das PfEM-1 aos receptores ICAm-1, trombospondina e CD36. A citoaderência gera duas consequências importantes: exacerba o dano microvascular causado pelo parasita, e remove o P. falciparum maduro da circulação. Pode ocorrer, devido a isso, uma obstrução de pequenos vasos com consequente hipóxia tecidual, acarretando, em casos graves, isquemias, como a cerebral. Mosquito Anopheles darlingi, a espécie mais comum no Brasil Esquematização da patogenia por trás dos efeitos da malária severa. Toda a cascata de reações e ativações leucocitárias promove uma disfunção endotelial, levando a sangra- mento, trombose, hipóxia e danos celulares, em especial - nesse caso - ao parênquima e axônios cerebrais Diferença morfológica entre eritrócito infectado por P. falciparum com knobs e sem knobs Moléculas do parasita – como o glicosilfosfatidilinositol (GPI) – sofrem liberação após a esquizogonia eritrocitária e estimulam a produção de citocinas. A formação dessas citocinas se mostra fator central da patogenia da malária severa. O fator de necrose tumoral (TNF) e outras citocinas estimulam a expressão de moléculas de adesão pelo endotélio vascular. Dessa maneira, a citoaderência se torna facilitada, o que promove as alterações na microvasculatura, obstrução, hipóxia tecidual e acidose lática. A ruptura dos esquizontes e a inibição da eritropoiese medular pelo TFN favorecem, por sua vez, o desenvolvimento da anemia. Além disso, a quantidade elevada de TNF se encontra associada à febre e hipoglicemia. O metabolismo do parasita também contribui para a hipoglicemia e acidose. Assim, o acometimento do cérebro, pulmão, rins e outros órgãos na malária grave se mostra relacionado com a obstrução microvascular, bem como com as alterações metabólicas e inflamatórias. Sintomatologia Malária não complicada A primeira infecção se caracteriza pela ocorrência de paroxismos febris. Os paroxismos se iniciam com calafrios, acompanhados de mal-estar, cefaleia e dores musculares e articulares. Náuseas e vômitos se mostram achados frequentes, podendo ocorrer também dor abdominal intensa. Em algumas horas, inicia a febre alta que produz adinamia e prostração. A essa fase se segue um período de sudorese profusa, com melhora progressiva do estado geral. Usualmente, os pacientes com infecção por P. falciparum, P. vivax e P. ovale apresentam paroxismos febris a cada 48 horas (febre terçã), ao passo que os infectados por P.malariae manifestam paroxismos a cada 72 horas (febre quartã). Em indivíduos que povoam regiões endêmicas, tal quadro de paroxismo de febres (paludismo) não se processa devido à formação de anticorpos contra o parasita, sendo mais comum a ocorrência de um ou poucos dos sintomas descritos (assintomáticos ou oligossintomáticos). Sinais clínicos de anemia, esplenomegalia e hepatomegalia normalmente se mostram presentes. Malária complicada ou severa De maneira geral, a malária se classifica como não complicada, assim como descrito acima. Todavia, nos casos graves, a doença tende a expressar complicações em diversos órgãos, sendo reconhecida por alguns sinais e sintomas clínicos. A malária causada por P. falciparum pode acometer vários órgãos, como no caso da malária cerebral, caracterizando sintomas de encefalite (sonolência, prostração intensa, convulsões, alteração do nível de consciência e até o coma). De acordo com a OMS, a definição de malária cerebral exige presença de coma profundo (escala de coma de Glasgow < 9). O comprometimento renal se caracteriza por oligúria e urina escura. A malária pulmonar pode variar desde taquipneia e dispneia com alterações discretas na ausculta (sons crepitantes) até edema pulmonar e franca insuficiência respiratória. A hemólise intravascular e as alterações funcionais dos hepatócitos acarretam aumento nos níveis de bilirrubina indireta e direta que se manifesta clinicamente na forma de icterícia, sinal de gravidade da doença, não sendo comum nos casos leves a moderados da afecção. Pacientes com malária podem manifestar desidratação e hipotensão que refletem na redução da perfusão renal. Tal processo favorece o desenvolvimento de insuficiência renal, que se agrava pela hemólise intravascular e consequente lesão tubular. A diarreia salienta-se como um achado comum em crianças infectadas por P. falciparum. Na malária, podem se manifestar distúrbios da hemostasia como consequência da trombocitopenia, muitas vezes associada à coagulação intravascular disseminada. As hemorragias na retina se demonstram comuns e servem como indicador de prognóstico. A ruptura do baço se qualifica como uma complicação rara da malária. Diagnósticos Diagnóstico clínico Como regra geral, todo viajante que retorna de uma área endêmica dentro de três meses do início da febre deve ser considerado como portador de malária até que se prove o contrário. Ataques tardios podem ocorrer nos casos de recrudescência devido à presença de hipnozoítos (P. vivax e P. ovale) dentro de três anos da infecção inicial. A malária deve ser diferenciada dos quadros virais respiratórios, incluindo a gripe. A febre tifoide e algumas doenças bacterianas também podem seassemelhar ao paroxismo da malária. Outras doenças tropicais precisam ser diferenciadas, como dengue, febre de Katayama (esquistossomose aguda), leptospirose, e febre amarela. Na malária grave, as manifestações mais frequentes são insuficiência renal aguda e a colestase hepática. Em crianças, por outro lado, a forma mais comum é a anemia grave. A malária grave por P. vivax, apesar de mais rara, segue o mesmo padrão clínico descrito para as formas graves de infeção pelo P. falciparum. Diagnóstico laboratorial A anemia se mostra um achado constante na malária e progride com a evolução da doença. O leucograma é variado, não sendo característico. Outros exames se tornam alterados à medida que aumenta o comprometimento sistêmico e a intensidade do órgão acometido. Pode ocorrer hiperbilirrubinemia – com predomínio da forma indireta -, e, nas formas mais graves, hipoalbuminemia. O exame de urina pode revelar hemoglobinúria e alterações indiretas do acometimento renal. O exame radiológico do tórax pode mostrar infiltrado alveolar nos casos de malária pulmonar. Nos exames específicos, o diagnóstico laboratorial da malária se baseia no achado do parasita em amostras de sangue periférico. Os exames sorológicos não conseguem distinguir infecções atuais de pregressas, podendo ser usados para pacientes que nunca viajaram anteriormente a uma área endêmica. Gota espessa: baseia-se no achado de estágios intraeritrocitários do parasita no sangue periférico analisado à microscopia, permitindo a diferenciação dos parasitas a partir da análise de sua morfologia, e pelos estágios de desenvolvimento do parasita encontrado no sangue periférico. É o exame direto mais utilizado nas áreas endêmicas devido à alta sensibilidade, embora seja necessário profissionais treinados para realizá-lo. Esfregaço: permite melhor diferenciação entre as espécies de plas- módios; Testes rápidos: fitas diagnósticas impregnadas com anticorpos para a detecção de antígenos do parasita. Não se necessita de pessoas especializadas nem de equipamento sofisticado, todavia apresenta elevado custo, baixa sensibilidade e dificuldade de diferenciação das espécies; Quantitative buffy coat technique (QBC): teste rápido que associa a coloração do sangue com o corante laranja de acridina e hemocentrifugação. Possibilita rápida detecção do parasita usando número mínimo de equipamento. Exame de gota espessa, muito utilizado pela sua alta sensibilidade Exame de QBC para detecção de malária. Após a centrifugação, a amostra é colocada em microscopia de fluorescência para observação do parasita Possui elevado custo e maior sensibilidade quando comparado ao esfregaço sanguíneo. Sorologia: imunofluorescência e ELISA. PCR: possui elevada sensibilidade e, conforme a técnica, permite a distinção das espécies. Todavia, seu alto custo e grande complexidade não contribuem para aplicação em larga escala. Tratamento Os fármacos escolhidos para o tratamento da malária dependem da espécie do Plasmodium, da gravidade da doença e da resistência regional aos antimaláricos. O objetivo primário do tratamento visa à erradicação dos estágios assexuados sanguíneos do parasita. O objetivo secundário é eliminar os hipnozoítos (no caso de P. vivax e P. ovale) e os gametócitos, interrompendo a transmissão vetorial. Malária não complicada por P. vivax Essa malária no Brasil pode ser tratada com medicação oral, sem necessidade de internação, devendo ser observado o aparecimento de sinais de gravidade no momento do diagnóstico e tratamento. Orienta-se, nesses casos, o controle de cura com teste direto (gota espessa) após duas, seis, dez e quinze semanas. O fármaco escolhido é a cloroquina por três dias em tomada diária, associada com a primaquina durante 14 dias. A primeira droga se utiliza como esquizonticida sanguíneo; a segunda, como gametocida, além de destruir as formas hipnozoítas. Os casos de malária grave por P. vivax são tratados como malária grave por P. falciparum. Esse esquema é contraindicado para gestantes e menores de seis meses. Malária não complicada por P. falciparum Trata-se com um esquema que associa o artemeter e a lumefantrina (Coartem®). Em locais sem a droga, pode-se utilizar o quinino a cada 12 horas por três dias (esquizonticida rápido), associado com doxiciclina a cada 12 horas por 5 a 7 dias (esquizonticida lento). Esse esquema não se recomenda para menores de oito anos. O controle da cura é feito com gota espessa realizada no 3º dia do tratamento, após um, duas, quatro e seis semanas do início do tratamento. Outra opção de tratamento é a mefloquina, utilizada em dose única, contraindicada no 1º trimestre de gestação. Malária complicada por P. falciparum Essa malária exige administração parental de drogas esquizonticidas (rápidas e lentas). No Brasil, utiliza-se o artesunato intravenoso (esquizonticida rápido) após 4, 24 e 48 horas da primeira dose. Associa-se a clindamicina (esquizonticida lento) a cada 12 horas por 5 a 7 dias. O artemeter é um derivado de artemisina equivalente ao artesunato, no entanto disposto na apresentação para aplicação intramuscular. Profilaxia A profilaxia da malária consiste na utilização de estratégias que visam a reduzir a transmissão da parasitose, essencialmente em áreas endêmicas, devido a características epidemiológicas peculiares. Quanto maior for o conhecimento da distribuição da enfermidade na população, melhores poderão ser os métodos envolvidos para evitá-la. Medidas de controle do vetor adulto podem ser aplicadas por meio da borrifação das paredes das casas com inseticidas, ou a aplicação destes nas áreas ao redor dos domicílios. O combate às larvas do mosquito se mostra outra forma interessante, e tem sido feito principalmente por meio do controle biológico, utilizando-se Bacillus thuringiensis e B. sphaericus. Essas medidas são preferíveis à utilização de larvicidas, visto que não prejudicam a biodiversidade local. Medidas educativas, bem como a implantação de um saneamento básico adequado, são importantes Epidemiologia da malária no Brasil. Fonte Anvisa 2007 para evitar a formação de criadouros de mosquitos a partir de água das chuvas ou outras fontes. Resistência à malária Alguns indivíduos apresentam certa resistência ao protozoário causador da malária, podendo a resistência ser adquirida ou inata da pessoa. Podemos citar como fatores genéticos favoráveis à resistência à malária: talassemia, anemia falciforme e deficiência de G6PD; como fatores adquiridos, exposições anteriores, imunidade por exposição repetida e residir em áreas endêmicas. Malária em Santa Catarina No início da década de 1940, no litoral do Brasil e, particularmente, no litoral de Santa Catarina, foi descoberto o chamado complexo bromélia-malária, caracterizado pela existência, nas florestas, das bromélias como criadouros dos mosquitos do subgênero Kertszia, únicos vetores da malária na região. A área correspondente ao complexo bromélia-malária, em Santa Catarina, estende-se, no sentido norte-sul, da divisa do Paraná à divisa com o Rio Grande do Sul, numa faixa compreendida entre as serras Geral e do Mar ao oceano. Com essa descoberta, os métodos para eliminar a malária passaram a ser radicalmente diferentes e consistiam na destruição das bromélias, no combate às larvas de Kerteszia, no tratamento de pacientes com antimaláricos e no combate aos mosquitos alados com inseticidas de efeito residual. A interrupção da transmissão foi conseguida em 1986, quando ocorreram os últimos casos autóctones da doença. Toxoplasmose Definição A toxoplasmose – conhecida popularmente como a doença do gato – caracteri- za-se como uma antropozoonose cosmopolita causada pelo protozoário Toxoplasmagondii, parasita intracelular obrigatório pertencente à classe dos esporozoários. O nome genérico toxoplasma (toxon = arco, e plasma = forma) decorre de sua morfologia em forma crescente ou em arco da fase mais comumente observada (taquizoíto). O gato e outros felídeos se classificam como hospedeiros definitivos do parasita, ao passo que o homem e os outros animais participam como hospedeiros intermediários ou acidentais. A doença apresenta quadro clínico variado, desde infecção assintomática a manifestações sistêmicas extremamente graves, como toxoplasmose febril aguda, ocular, neonatal e linfadenite toxoplasmática. Podemos encontrar tais formas mais severas em pacientes imunocomprometidos, como recém- nascidos, crianças, receptores de órgãos durante imunossupressão, indivíduos em tratamento quimioterápico e pacientes infectados por HIV, além do fato de a toxoplasmose assumir maior relevância no período gestacional. Morfologia O parasita apresenta, dependendo do habitat e estágio evolutivo, morfologia variada. Podemos destacar, como formas infectantes do toxoplasma, os taquizoítos, os bradizoítos e os esporozoítos. Todas essas formas apresentam organelas citoplasmáticas típicas do filo Apicomplexa, que incluem o aparelho apical – o qual possui uma estrutura denominada Classificação científica Filo Apicomplexa Classe Sporozoae Ordem Eucoccidia Família Sarcocystidae Gênero Toxoplasma Espécie T. gondii Ilustração da morfologia de taquizoíto T. gondii conoide (em forma de cone), dois anéis polares e organelas secretoras, como roptrias e micronemas -, microtúbulos subpericulares e grânulos densos. Recentemente, uma organela envolvida na biossíntese de aminoácidos e ácidos graxos, denominada apicoplasto, foi descoberta. Taquizoíto O taquizoíto – chamado também de trofozoíto ou forma livre – classifica-se como a forma proliferativa encontrada na fase aguda da infecção. Apresenta-se na forma de arco ou meia-lua, com uma extremidade arredondada e outra afilada. Quando corado pelo método de Giemsa, torna-se possível observar um núcleo central arredondado, de cor avermelhada e citoplasma azulado. Os taquizoítos se demonstram uma forma móvel, metabolicamente ativa e de multiplica- ção rápida (tachos = rápido) – por um processo conhecido como endodiogenia, uma espécie de “divisão trinária”, com formação de três parasitas a partir de um -, podendo ser encontrado em proliferação dentro do vacúolo parasitóforo em diversas células do organismo, como hepáticas, pulmonares, nervosas, musculares e da submucosa. Multiplicações sucessivas originam cistos celulares, e a infecção torna-se latente. Os taquizoítos constituem o estágio patogênico do Toxoplasma gondii. Na fase aguda da infecção, os taquizoítos se multiplicam nos vacúolos parasitóforos de quatro em quatro ou de seis em seis horas, originando rosetas. A grande quantidade de taquizoítos no citoplasma promove o rompimento da célula com consequente liberação do parasita, o qual sofre fagocitose ou acaba por invadir outras células, dando continuidade ao processo. Os taquizoítos – por não se manifestarem como a forma resistente do parasita – acabam por sofrer facilmente destruição pelo suco gástrico. Bradizoíto O bradizoíto – conhecido também como cistozoíto – identifica-se como a forma encontrada em vários tecidos durante a fase crônica da infecção, podendo existir em pequenas quantidades, também, na fase aguda. Localizados no interior do vacúolo parasitóforo de uma célula, centenas de bradizoíto estão presentes dentro de um cisto, o qual se forma a partir da secreção de uma espessa membrana própria ao redor do parasita em resposta à imunidade do hospedeiro e outros fatores. Os bradizoítos apresentam um metabolismo lento ou basal, multiplicando-se lenta- mente (brady = lento) dentro do cisto, por endodiogenia ou endopoligenia, o que mantém a latência da infecção. Essa forma possui uma resistência muito superior não somente à reação imunológica do organismo, mas também à ação de enzimas destrutivas – como tripsina e pepsina -, podendo permanecer viável no interior dos tecidos por vários anos. O tamanho e a forma dos cistos formados dependem da célula infectada e do número de bradizoítos em seu interior, no entanto geralmente são arredondados e podem atingir de dez a 200 µm. Oocisto O oocisto designa-se como a forma de resistência que possui uma parede dupla bastante durável e protetora contra as condições do ambiente, com tamanho em torno de 11 a 12,5 µm. Essa forma sofre produção nas células intestinais de felinos não imunizados e eliminação, ainda imaturos, junto às fezes desses animais. No meio ambiente, após a esporulação, os oocistos contêm dois esporocistos como quatro esporozoítos cada. Cisto preenchido por incontá- veis bradizoítos de T. gondii Microscopia de formas taquizoítas de T. gondii Oocisto esporulado de T. gondii Transmissão A transmissão da toxoplasmose pode se processar a partir das variadas formas do parasita: Por meio das fezes de gatos contaminados, contendo os oocistos; Por meio da ingestão de carnes cruas ou mal cozidas contendo oocistos; Por meio da ingestão de água contaminada pelos oocistos; Pela transmissão vertical, quando os taquizoítos no sangue materno atingem a placenta e infectam o feto, dando origem à toxoplasmose congênita; Os hospedeiros definitivos do T. gondii, como dito, são os felídeos selvagens ou domésticos, principalmente o gato. Os oocistos eliminados juntos às fezes do gato contaminam o solo, o meio ambiente, a água e os alimentos, além de apresentarem a capacidade de disseminação via moscas e baratas. Essa se trata da forma de transmissão mais comum devido à alta resistência contra fatores ambientais. A ingestão de oocistos em carnes mal cozidas ou cruas – principalmente de carneio e porco – mostra-se um foco importante de contaminação pelo T. gondii. Os leites de vaca e de cabra, além disso, podem agir como fonte secundária de infecção, embora seja mais raro. Os cistos do parasita possuem elevada resistência e podem permanecer viáveis em carnes congeladas a aproximadamente 4ºC por até 30 dias, não obstante o aquecimento acima de 67ºC seja capaz de eliminá-los. A transmissão congênita ou transplacentária – forma mais grave - transcorre somente quando a gestante sofre infecção primária pelo T. gondii durante a gravidez. Caso a gestante já tenha sido infectada pelo protozoário cerca de oito ou mais semanas antes da concepção, o risco de contaminação fetal se mostra extremamente baixo. Isso significa que mulheres com sorologia positiva para toxoplasmose antes de engravidarem apresentam uma probabilidade menor de contaminação fetal do que aquelas infectadas durante a gravidez. Sabe-se que o risco de transmissão aumenta ao longo da gravidez, passando de 15% nos primeiros três meses para 60% no último trimestre. De modo contrário, em casos de infecção fetal, o risco de morte do feto por aborto espontâneo ou de lesões graves se demonstra inversamente proporcional à idade gestacional. Caso a fase aguda da infecção ocorra durante a gravidez, a transmissão poderá se processar quando os taquizoítos atingirem a circulação placentária, caracterizando a transmissão transplacentária. Caso a gestante apresente a fase crônica, por outro lado, em raras situações pode ocorrer o rompimento dos cistos no endométrio, com liberação de bradizoítos que contaminarão o feto. Esporadicamente, a transmissão pode ocorrer a partir da ingestão das formas de taquizoítos na saliva ou em transplantes de órgão infectados. A transmissão inter-humana, por meio das fezes, não se processa. Ciclo biológico O Toxoplasma gondiipossui um ciclo biológico heteroxênico, com duas fases distintas: a fase assexuada e a fase sexuada ou coccidiana. Ambas as fases se processam no gato ou em outros felídeos que agem como Ilustração gráfica das principais formas de transmissão da toxoplasmose hospedeiros definitivos. Em outros animais e no homem ocorre somente o ciclo assexuado, enquadrando esses receptores como hospedeiros intermediários ou acidentais. Tais animais transmitem a infecção apenas quando sua carne contaminada serve de alimento para outras criaturas ou por meio da via congênita. Fase assexuada Na fase assexuada, o homem ou outro hospedeiro susceptível ingere água ou alimentos contaminados com oocistos maduros – os quais contêm esporozoítos -, cistos – contendo bradizoítos -, ou (mais raramente) taquizoítos eliminados no leite. Estes, como dito, não possuem membrana resistente contra o meio, podendo ser facilmente destruídos pela ação do suco gástrico, todavia, caso consigam penetrar a mucosa oral ou serem inalados, manifestam a mesma evolução que as outras formas do parasita, fala a seguir. Ao atingirem a luz do tubo gastrintestinal e atravessarem a mucosa, os esporozoítos, bradizoítos ou taquizoí- tos sofrem diferenciação para taquizoítos e multiplicam-se rapidamente no meio intracelular como taquizoítos. Após tal evento, estes invadem inúmeros tipos celulares do organismo e formam os vacúolos parasitóforos, no interior dos quais se dividem por endodiogenia. Esse processo dá origem a novos taquizoítos, os quais promoverão a lise da célula infectada e invadirão novas células, continuando a infecção. Os taquizoítos se disseminam no organismo por meio da linfa ou do sangue, podendo desencadear um leque muito grande de sintomas dependendo da virulência do parasita, da quantidade de formas infectantes adquiridas e da susceptibilidade do hospedeiro. Essa fase inicial da doença – conhecida como proliferativa – compõe a forma aguda da toxoplasmose. Em decorrência da resposta imune do hospedeiro, há uma diminuição do parasitismo, com o desaparecimento dos parasitas extracelulares do sangue, linfa e órgãos viscerais. Pode, ainda, ocorrer a formação de cistos, que – juntamente à diminuição dos sintomas - caracteriza a fase crônica da infecção, a qual tende a permanecer por longo período no hospedeiro e ser, ocasionalmente, agudizada. Fase coccidia- na A fase coccidiana – também chamada de sexuada – verifica-se nas células epiteliais do intestino delgado do gato e outros felídeos somente. Nesse ciclo, o parasita apresenta uma fase assexuada (por merogonia) e outra sexuada, por fecundação de gametas. Após a ingestão de cistos, oocistos ou taquizoítos, os parasitos liberados no estômago do felino penetram nas células do epitélio intestinal e sofrem um processo de multiplicação por merogonia (esquizogonia), dando origem a inúmeros merozoítos. Os merozoítos formados no interior dos vacúolos parasitóforos rompem a célula infectada e penetram em novas células epiteliais, onde se transformarão em formas sexuadas masculinas ou femininas imaturas. Essas sofrem maturação e originam gametas masculinos móveis – os microgametas -, os quais abandonam a célula de origem e fecundam gametas femininos imóveis – os macrogametas – no interior de uma célula epitelial, dando origem ao zigoto. O zigoto ou ovo forma uma parede externa dupla e evolui para oocisto ainda no epitélio. Esse oocisto imaturo – liberado com o rompimento da célula epitelial – sofre excreção juntamente às fezes do gato. No meio ambiente, ele participa de um processo de maturação – conhecido como esporogonia -, o qual dura cerca de dois a cinco dias, e Esquematização do ciclo biológico de T. gondii em mamíferos e felídeos produz em seu interior dois esporocistos, cada um contendo quatro esporozoítos e uma massa residual de citoplasma. No momento em que se torna maduro, o oocisto adquire sua capacidade infectante, caso seja ingerido por algum animal não imune. O oocisto apresenta o poder de se manter infectante e viável no meio ambiente por até 18 meses, se mantido em condições adequadas de temperatura e umidade. Patogenia A patogenia o T. gondii na espécie humano se influencia por diversos fatores, como a cepa do parasita, a imunidade do hospedeiro e a maneira pela qual ele se infecta. Linhagens do T. gondii Cerca de três linhagens do T. gondii foram identificadas, denominadas tipos I, II e III. A linhagem tipo I apresenta uma maior patogenicidade, embora seja a mais rara das três. A linhagem tipo II – mais comum de todas – associa-se frequentemente às manifestações da doença, como lesões oculares e a reagudização da toxoplasmose em casos de AIDS. A linhagem do tipo III, finalmente, processa-se em animais. Linhagens mistas também podem ser encontradas em vários casos da doença, sendo que a infecção provocada por linhagens virulenta de T. gondii caracteriza um quadro agudo. O protozoário invade, por endocitose, vários tipos celulares, com uma afinidade maior para células do sistema fagocítico mononuclear, leucócitos e células parenquimatosas. No interior dessas células, ele multiplica-se rapidamente, de forma que o número de parasita em uma célula infectada pode chegar a centenas, fazendo com que se processe a distensão da célula e o núcleo seja afastado para a periferia. O agrupamento tecidual desse grande número de parasitas forma o pseudocisto, que acaba por se romper e liberar incontáveis parasitas para a invasão de novas células. A destruição das células infectadas gera áreas focais de necrose, cercadas por monócitos, linfócitos e plasmó- citos. Essa destruição celular é, provavelmente, o ponto principal dos mecanismos patogênicos, de tal maneira que o abalo severo das defesas orgânicas do hospedeiro – como nos casos avançados de HIV – poderia provocar a morte em pouco tempo. Linhagens não virulentas de T. gondii inoculadas em animais de laboratório mostraram que a multiplicação intracelular, nesse caso, ocorre em ritmo mais lento, e que o número de parasitas decresce em um período mais curto. Nas células parasitadas, cerca de oito dias após a infecção, torna-se possível a observação de uma parede cística, resistente e elástica. Em quatro meses, os cistos alcançam uma dimensão máxima, contendo um número elevado de bradizoítos em seu interior. Em oposição ao observado na fase aguda, nos tecidos observados ao redor dos cistos não ocorre nenhuma reação imunológica, muito menos são encontrados parasitas isolados ou pseudocisto. Deve-se destacar como fator importante para a patogenia da toxoplasmose – principalmente em indivíduos imunodeprimidos – a interconversão que se processa entre taquizoítos e bradizoítos. Ao invadirem as células do hospedeiro, os taquizoítos alteram a parede do vacúolo por meio da troca de proteínas normais por outras que induzem o vacúolo a evoluir para uma parede cística, dentro da qual se diferenciam os bradizoítos. A conversão de taquizoítos em bradizoítos corresponde ao estabelecimento de uma imunidade que tende a durar longos períodos. Imunidade celular Em indivíduos infectados por T. gondii, a resposta imunológica demonstra-se complexa e envolve mecanis- mos celulares e humorais. A imunidade humoral se encontra envolvida na resistência a infecções agudas e se ativa pelo sistema complemento. Inicialmente, processa-se a produção de IgM, em geral de curta duração. Em torno de dois a nove meses, os títulos séricos de IgM já não são mais detectáveis, podendo, todavia, serem medidos em níveis reduzidos durante um ano ou mais. Em caso de infecção via oral pela ingestão de oocistos maduros, há a formação de anticorpos IgA, os quais permanecem no sangue, em média, por doze meses. Esse tipo de imunoglobulina possui maior sensibilidadedo que IgM para diagnosticar toxoplasmose no feto e em recém-nascidos, apesar de a IgA aparecer mais tarde no sangue. Em torno de três a quatro semanas após a infecção, os níveis de anticorpos IgG no soro do hospedeiro alcan- çam altas concentrações, e tendem a diminuir progressivamente para títulos mais baixos, permanecendo, entretanto, durante toda a vida. Embora os títulos de imunoglobulinas se mantenham elevados durante a infecção aguda e eles possuam boa capacidade de lise – via complemento – de taquizoítos extracelulares, a imunidade humoral se mostra ineficaz no combate às formas de bradizoíto e taquizoíto intracelular. A imunidade celular, por outro lado, desempenha um papel de maior destaque na toxoplasmose, assim como em diversas parasitoses. Podemos citar, aqui, duas citocinas de imensa importância no combate ao parasita: Interferon-gama (IFN-gama): suprime a conversão de bradizoítos em taquizoítos durante a fase crônica da infecção, impedindo, assim, a reativação da toxoplasmose; Interleucina-12 (IL-12): induz a secreção de IFN-gama pelas células NK e por células Th1; Ao invadirem células de defesa, como macrófagos, os taquizoí- tos induzem a produção de IL-12, promovendo a produção de IFN- gama. A combinação deste com o fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa) resulta em uma grande produção de óxido nítrico, o que leva à morte do parasita intracelular. No processo de imunidade celular, além disso, as células TCD8 + citotóxicas se mostram as mais efetoras na destruição dos parasitas intracelulares – bem como criando a memória de longa duração -, ao passo que as células TCD4 + auxiliares atuam em combinação com aquelas. Por fim, a infecção oportunista por T. gondii em pacientes imunodeprimidos – como os que fazem uso de imunossupressores ou os portadores da AIDS – tende a desencadear um quadro patológico grave, afetando, principalmente, o sistema nervoso central. Sintomatologia As infecções causadas por T. gondii em humanos se manifestam, geralmente, de forma assintomática. Por outro lado, as principais apresentações sintomáticas da toxoplasmose se listam como: toxoplasmose primária em imunocompetentes; toxoplasmose progressiva em imunocomprometidos; toxoplasmose congênita; e toxoplasmose ocular. Toxoplasmose adquirida em imunocompetentes Cerca de 90% dos indivíduos imunocompetentes infectados por T. gondii se encontram na forma assintomática da toxoplasmose, sendo que a forma clínica mais frequente nos imunocompetentes é a linfoglandular. Esta se demonstra como benigna e autolimitada, acometendo, na maioria dos casos, os linfonodos da cadeia cervical posterior, os quais se tornam hipertrofiados. No entanto, outros linfonodos do corpo – como axilares, retroauriculares, suboccipitais, submandibulares e, mais raramente, mediastinais – podem ser acometidos. Esses linfonodos hipertrofiados medem de poucos milímetros até 3 cm de diâmetro e se mostram, usualmente, numerosos, bilaterais, simétricos, lisos, firmes ou elásticos, indolores ou sensíveis à palpação, não-coalescentes e não-aderidos a planos profundos. Juntamente a isso, Mecanismos celulares por trás da resposta imunológica à infecção por T. gondii raramente ulceram ou supuram, podendo, em alguns casos, encontrarem-se amolecidos e/ou confluentes, induzindo à suspeita de doença maligna. Na toxoplasmose linfoglandular, além da hipertrofia dos linfonodos, pode ocorrer febre – em 40% a 70% dos casos -, com intensidade variável, porém geralmente baixa. Outros sinais e sintomas também se manifestam, como cefaleia, astenia, anorexia, mal-estar geral, hepatoesplenomegalia (em 1/3 dos casos), mialgias, artralgias, odinofagia, sudorese noturna e erupção cutânea. Não obstante incomum, indivíduos imunocompetentes que apresentam a forma linfoglandular podem, eventu- almente, evoluir com complicações como pneumonia, miocardite, pericardite, encefalite ou coriorretinite. Toxoplasmose em imunocomprometidos Várias situações podem gerar imunodepressão, como imunodeficiências congênitas, neoplasias malignas, transplantes de órgãos, medicamentos imunossupressores e AIDS. Na Europa, África e América Latina o índice de soropositivos para toxoplasmose em adultos com AIDS varia entre 75% e 90%. A manifestação clínica causada pela toxoplasmose em pacientes com AIDS é a encefalite, geralmente resultante da reativação de infecção latente no encéfalo que se estabeleceu anos antes de forma congênita ou adquirida. A encefalite tende a se processar em até 40% dos pacientes com toxoplasmose e AIDS com menos de 100 linfócitos TCD4 + /mm 3 . A sintomatologia da encefalite surge, em geral, de modo progressivo, embora possa também ocorrer de forma abrupta. O quadro clínico se mostra grave, caracterizando-se pela presença de distúrbios de comportamento, confusão mental, torpor, convulsões, delírio, ataxia, coma e déficits neurológicos focais, às vezes acompanhados de rigidez nucal. Pode se processar disfunções urinária e intestinal em conta de lesões medulares. Além da encefalite, a toxoplasmose pode se manifestar na forma de pneumonia com instalação progressiva. Os principais sinais e sintomas, nesse caso, são febre, tosse, dispneia, taquipneia e estertores à ausculta. Alterações mais raras – como hepatite, miocardite, orquite e pancreatite – podem ocorrer. Neurotoxoplasmose A neurotoxoplasmose se qualifica como uma infecção cerebral causada pelo T. gondii. A doença resulta da reativação de uma infecção latente, com o estado de imunodepressão de pacientes facilitando essa reativação. A afecção pode acometer o cérebro difusamente ou formar abcessos discretos. A neurotoxoplasmose é considerada uma das principais causas de encefalite focal em pacientes com AIDS, demonstrando uma alta taxa de morbi-mortalidade se não for diagnosticada e tratada precocemente. A doença é uma das manifestações clínicas menos comuns da infecção pelo T. gondii, no entanto se manifesta como importante infecção neurológica oportunista entre pacientes infectados com o HIV. O achado tomográfico mais comum da doença se caracteriza como múltiplas lesões com realce anelar, geralmente próximas aos gânglios basais. Em casos de suspeita da neurotoxoplasmose, necessita-se realizar diagnósticos diferenciais para casos de tumor, neurocriptococose e abcesso bacteriano cerebral. Tomografia cerebral, demonstrando inúmeras lesões nodulares córtico- subcorticais, com edema leve a moderado da substância branca do centro semioval. Toxoplasmose congênita Esta se processa, de modo geral, quando a mãe sofre infecção primária durante a gravidez, sendo que, nestes casos, entre 80% e 90% das vezes resultam em aborto espontâneo. O risco de infecção fetal, todavia, mostra-se mínimo quando a mãe se infecta três meses ou mais anteriores à concepção. Dessa maneira, mulheres com infecção crônica pelo T. gondii, normalmente, não transmitem a doença a seus filhos durante o desenvolvimento intrauterino. Mais da metade dos recém-nascidos infectados pelo parasita durante a gravidez se apresentarão assintomáticos. No entanto, de 80% a 90% dessas crianças assintomáticas demonstrarão complicações tardias – como coriorretinite, distúrbios auditivos, convulsões ou déficit intelectual – meses ou anos após o nascimento. O tratamento específico no primeiro ano de vida tende a reduzir a intensidade ou prevenir o aparecimento dessas manifestações clínicas tardia. A síndrome mais característica da toxoplasmose congênita recebe a denominação de tétrade de Sabin: coriorretinite (em 90% dos casos) bilateral, macular ou perimacular e simétrica; calcificações cerebrais (em 69%); hidrocefaleia ou microcefaleia (em 50%); e déficit intelectual.A coriorretinite associada à toxoplasmose congênita pode se apresentar precocemente ou tardia. Em grande maioria dos casos, resulta da reativação – após meses ou anos – de focos latentes de infecção que se instalaram no período de infecção primária. Na congênita, usualmente a reativação se processa em adolescentes ou adultos jovens. As lesões cerebrais podem se calcificar, aparecendo ao exame radiológico como manchas arredondadas, faixas ou grãos disseminados. As calcificações cerebrais processam-se, usualmente, no córtex, núcleos da base e tálamo. Grávidas com AIDS podem ter uma reativação da infecção latente por T. gondii, tornando-a transmissível ao feto. A cidade de Erechim, no Rio Grande do Sul, demonstra-se como um dos maiores centros de casos de toxo- plasmose congênita do sul do Brasil. Toxoplasmose ocular A coriorretinite em indivíduos imunocompetentes com toxoplasmose adquirida se mostra pouco frequente e, quando se manifeste, normalmente se apresenta unilateralmente. Por outro lado, na toxoplasmose congênita, a coriorretinite geralmente surge tardiamente na adolescência ou na vida adulta devido à reativação de foco ocular latente, sendo, nesse caso, uma coriorretinite bilateral, além de poder ocorrer uma perda progressiva da visão. Os principais sintomas da coriorretinite listam-se como visão borrada, escotomas – pontos brilhantes na visão -, fotofobia, dor e lacrimejamento. O acometimento da mácula densa acarreta perda parcial ou total da visão. Diagnóstico Diagnóstico clínico O diagnóstico clínico se demonstra especialmente trabalhoso devido ao fato de que inúmeros casos agudos se manifestam de maneira assintomática ou oligossintomática, apenas com febre, cansaço e linfadenopatia – podendo Sintomatologia mais frequente Coriorretinite; Cegueira; Convulsões; Déficit intelectual; Microcefalia ou hidrocefalia; Abaulamento de fontanela; Meningoencefalia; Hepatoesplenomegalia; Erupção cutânea, petéquias ou icterícia; Coriorretinite macular devido à infecção por T. gondii se assemelhar a outras doenças -, evoluindo para a forma crônica. A suspeita clínica deve, portanto, ser confirmado por meio do exame laboratorial. Diagnóstico laboratorial Aqui, temos duas opções básicas: demonstração do parasito e testes sorológicos ou imunológicos. Demonstração do parasita Utilizado em raras situações durante a fase aguda ou reagudização, tem por objetivo buscar as formas taquizo- ítas do parasita presentes em amostras de líquido amniótico, líquor, lavado brônquio-alveolar. Faz-se um esfregaço do material colhido (e centrifugado) e se cora pelo método de Giemsa. Pode-se, nesse método, utilizar também a pesquisa de DNA do parasito pela PCR. Testes sorológicos ou imunológicos Reação de imunofluorescência indireta (RIFI): teste de referência para toxoplasmose, sensível e se- guro para o diagnóstico da infecção, podendo ser utilizado tanto para fase aguda (pesquisa de IgM) como para a fase crônica (pesquisa de IgG). Hemaglutinação direta (HAI): alta sensibilidade e simplicidade de execução. Inadequado para diag- nóstico precoce ou para toxoplasmose congênita. Método adequado para levantamentos epidemiológicos. Imunoensaio enzimático ou teste ELISA: alta sensibilidade, muito utilizado atualmente, no entanto pode apresentar resultados falso-positivos. É capaz de detectar anticorpos IgM, IgG e IgA, além de permitir a análise de variações nos índices de avidez de IgG. Tratamento Os medicamentos utilizados visam apenas a eliminar as formas proliferativas (taquizoítos) do parasita. Reco- menda-se o tratamento apenas em casos agudos sintomáticos, de gestantes em fase aguda, de toxoplasmose ocular ativa e de indivíduos imunodeficientes com toxoplasmose sintomática. Os medicamentos usados se listam abaixo. Toxoplasmose aguda sintomática: associação de pirimetamina com a sulfadiazina ou a sulfadoxina (Fandisar®), juntamente a ácido fólico para diminuir a toxicidade prolongada a pirimetamina. Toxoplasmose aguda em gestante: no primeiro trimestre, usa-se espiramicina; no terceiro trimestre, sulfadiazina + pirimetamina + ácido fólico. O uso de pirimetamina está contraindicado no primeiro trimestre devido aos efeitos teratogênicos desse medicamento. Essa drogas, devido aos efeitos nocivos de uso continuo, devem apensar ser utilizadas em gestantes com diagnóstico fetal confirmado. Toxoplasmose ocular ativa: administração de antiinflamatórios (prednisona) e antiparasitários. As associações mais usadas são cloridrato de clindamicina, sulfadiazina e prednisona e pirimetamina, sulfadiazina e prednisona. Encefalite em imunodeficientes: associação de pirimetamina e sulfadiazina ou pirimetamina e clindamicina. Esquema terapêutico para toxoplasmose adquirida na gestação para pacientes com infecção aguda (REMINGTON et al., 2006). Profilaxia Devido aos inúmeros hospedeiros e maneiras de infecção pelo T. gondii, as medidas profiláticas se tornam de difícil aplicação, embora ainda com enorme importância epidemiológica. O consumo de carnes cruas e mal cozidas – bem como a ingestão de leite de cabra ou de vaca não fervido – deve ser evitado. Os cistos na carne morrem em temperatura superior a 65ºC por cinco minutos, e, caso haja contado direto com a carne crua, deve-se higienizar as mãos antes do manuseio de outros alimentos. O controle da população de gatos e sua alimentação adequada com carne cozida ou seca se mostram medidas relevantes, assim como a incineração das fezes de gatos a fim de evitar o contato direto de crianças com elas em, por exemplo, caixas de areia. Mulheres grávidas e/ou sexualmente ativas em idade fértil e imunodeprimidos merecem destaque na profilaxia de toxoplasmose. A melhor forma de prevenção da toxoplasmose congênita reside na utilização de medidas de prevenção primária e educação sanitária. Juntamente a isso, o teste sorológico para toxoplasmose deve ser realizado em mulheres em idade fértil e no pré-natal. Atualmente não há vacinas para a prevenção da toxoplasmose. Esquistossomose A esquistossomose – também conhecida pelos nomes de xistose, barriga d’água e doença do caramujo – caracteriza-se como uma infecção provocada pelo helminto da classe Trematoda e da família Schistosomatidae. Falaremos aqui sobre os vermes enquadrados na subfamília Schistosomatinae e gênero Schistosoma, os quais englobam os parasitos que apresentam nítido dimorfismo sexual, com espécies parasitando humanos e animais. As espécies com importância médica e epidemiológica se listam abaixo. Schistosoma haematobium: responsável pela esquistossomose vesical ou hematúria do Egito, sendo endemicamente encontrado em grande parte da África, Oriente Próximo e Médio. Schistosoma japonicum: causador da esquistossomose japônica ou mo- léstia de Katayama. Apresenta distribuição geográfica na China, Japão, Filipinas e Sudeste Asiático. Schistosoma mekongi: muito semelhante ao S. japonicum, pode ser encontrado no Camboja parasitando o sistema porta de humanos e animais. Schistosoma intercalatum: agente causador da esquistossomose intestinal, encontrado no interior da África Central. Schistosoma mansoni: verme responsável pela esquistossomose mansoni intestinal – também chamada de moléstia de Pirajá da Silva -, ocorrendo na África, Antilhas e América do Sul. Em decorrência do fato de essa ser a única espécie do Brasil, daremos enfoque a ela nesse arquivo. Morfologia O S. mansoni apresenta diversas fases em seu ciclo evolutivo (adulto, ovo, miracídio, esporocisto e cercária), além, claro, do dimorfismo sexual característico. Classificação científica Filo Platyhelminthes Classe Trematoda Subclasse DigeneaOrdem Strigeiformes Família Schistosomatidae Gênero Schistosoma Espécie Schistosoma spp. Macho O macho de S. mansoni mede aproximadamente 1 cm de comprimento, tem cor esbranquiçada, com tegumento recoberto por minúsculas projeções – os tubérculos, que permitem a aderência ao endotélio dos vasos sanguíneos. Apresenta o corpo dividido em duas porções: uma anterior - onde encontramos a ventosa oral e a ventosa ventral (acetábulo) – e uma posterior – em que se localiza o canal ginecóforo, sítio para abrigar a fêmea e realizar a cópula. Possui, juntamente a isso, ainda, um esôfago bifurcado ao nível do acetábulo, com um ceco terminando na extremidade posterior. O verme não dispõe de órgão copulador, apenas de sete a nove massas testiculares que se abrem no canal ginecóforo para fecundar a fêmea. Fêmea A fêmea do S. mansoni mede por volta de 1,5cm de comprimento, com uma coloração mais escurecida devido à presença de sangue semi-digerido em seu ceco, além de um tegumento liso. A porção anterior se assemelha à do macho, ao passo que a posterior se preenche pelas glândulas vitelogênicas e o ceco. Temos ainda, após a porção anterior, a vulva, o útero (com um ou dois ovos) e o ovário. Ovo Mede aproximadamente 150 µm de comprimento por 60 µm de largura, possui formato oval e um espículo voltado para trás. O ovo maduro – forma usualmente encontrado nas fezes - apresenta um miracídio formado, visível devido à transparência da cápsula protetora. Miracídio Dispõe de uma forma cilíndrica, com células epidérmicas, onde se implantas os cílios, os quais permitem sua movimentação no meio aquático. A extremidade anterior do miracídio possui o uma papila apical – ou terebratorium -, que pode se moldar em forma de uma ventosa. Na papila encontramos terminações de glândulas adesivas e de glândulas de penetração, bem como cílios maiores e espículos anteriores, estruturas importante para a penetração nos moluscos. Cercária A forma infectante para o homem, as cercarias apresentam cauda bifurcada (usada para locomoção), corpo cercariano e duas ventosas – oral e ventral ou acetábulo. Este se responsabiliza por permitir que a cercária se fixe na pele do hospedeiro durante o processo de penetração. Imagem ilustrativa das formas adultas e S. mansoni. Notar o canal ginecóforo do macho – este mais alargado - que abriga, em seu interior, a fêmea. Ao lado, a comparação com uma imagem real dos dois vermes adultos Ovo de S. mansoni. Atentar à presença do espículo voltado para trás Miracídio de S. mansoni nadando na água fresca Cercária de S. mansoni Transmissão A transmissão de S. mansoni hospedeiro definitivo – ser humano, roedores, marsupiais – dá-se por meio da penetração ativa das cercárias na pele e mucosas, sendo os pés e as pernas os sítios mais frequentemente utilizados pelo fato de se encontrarem em contato com águas contaminadas. O horário em que se localizam em maior quantidade na água e com maior atividade gira entre as 10 e 16 horas, quando a luz solar e o calor estão mais intensos. Enquadram-se nos locais de transmissão mais comuns os focos peridomiciliares: valas de irrigação de horta, açudes e pequenos córregos. Por outro lado, a transmissão ao hospedeiro intermediário - o caramujo do gênero Biomphalaria e espécie glabrata, tenagophila ou straminea, os dois últimos presentes em SC – processa-se pela penetração de miracídios em seus tecidos, com posterior desenvolvimento para cercárias, o que será mais bem explicado a seguir. Ciclo biológico O S. mansoni, ao atingir a fase adulta no sistema vascular de humanos e outros mamíferos, alcança as veias mesentéricas – em especial a veia mesentérica inferior -, migrando contra a corrente circulatória. As fêmeas depositam ovos contendo miracídios no nível da submucosa, sendo que a idade do parasita interfere na desova – a expectativa de vida média do S. mansoni ronda cinco anos, embora alguns casais possam permanecer vivos e reprodutivos por mais de trinta anos eliminando ovos. Os ovos depositados levam cerca de uma semana para se tornarem maduros (miracídio formado), e da submucosa atingem a luz intestinal. Tal migração – a partir da deposição dos ovos – leva, pelo menos, seis dias para se completar, período necessário para a maturação do ovo. Os ovos que conseguirem atingir a luz intestinal sofrerão excreção para o exterior juntamente às fezes do hospedeiro, e, no ambiente, os ovos possuem uma expectativa de vida de 24 horas (fezes líquidas) a cinco dias (fezes sólidas). Alcançando a água, os ovos liberam o miracídio, estimulados pelos fatores temperaturas mais altas, luz intensa e oxigenação da água. Após liberado, o miracídio dispõe de cerca de oito horas para realizar a penetração em caramujos do gênero Biomphalaria para continuar seu ciclo reprodutivo. Assim que o miracídio localiza o caramujo e atravessa seu epitélio, a larva se estabelece no tecido subcutâneo. Esse processo de penetração leva por volta de 10 a 15 minutos, e apenas 1/3 dos miracídios dispõem da capacidade de penetrar e se desenvolver no interior dos caramujos B. glabrata. No interior do caramujo, em um processo que pode levar até dois dias, o miracídio transforma-se em um saco com paredes cuticulares, contendo a geração das células germinativas ou reprodutivas que recebe o nome de esporocisto. Os esporocistos sofrem modificações moleculares e estruturais e, por meio de um Principal transmissor da esquistossomo- se, o caramujo B. glabrata se qualifica como um hospedeiro intermediário do parasita Esquematização do ciclo biológico da esquistossomose intenso processo de multiplicação celular – chamado poliembrionia – transforam-se sequencialmente em esporocistos I e esporocistos II. Estes migram para as glândulas digestivas do caramujo, onde poderão dar origem a células embrionárias e cercárias desenvolvidas ou em desenvolvimento. As cercárias desenvolvidas, então, emergem do caramujo e nadam ativamente na água. Embora as cercárias disponham a capacidade de viver por 36 a 48 horas, sua maior atividade e capacidade infectiva ocorrem nas primeiras oito horas de vida. Ao alcançarem a pele dos humanos, processa-se a penetração – que dura de 5 a 15 minutos – e a migração para dentro dos tecidos. Cercárias ingeridas com água contaminada sofrem destruição pelo suco gástrico, todavia aquelas que penetrarem na mucosa oral conseguirão se desenvolver normalmente. Após a penetração, as larvas resultantes – denominadas esquistossômulos – penetram em um vaso e são levadas passivamente até os pulmões, pelo sistema vascular sanguíneo, via coração direto. Dos pulmões, os esquistossômulos se dirigem para o sistema porta-hepático por duas vias: uma via sanguínea (mais importante) e outra transtissular. Uma vez no sistema porta intra-hepático, os esquistossômulos se alimentam e se desenvolvem, transformando-se em machos e fêmeas entre 25 e 28 dias após a penetração. Daqui migram, já acasalados, para o território da veia mesentérica inferior onde farão a oviposição. Os ovos são depositados nos tecidos em torno do 35º dia da infecção, imaturos, e a formação do miracídio leva seis dias. Os primeiros ovos podem ser encontrados nas fezes em torno de 42 dias após a infecção do hospedeiro. Patogenia Dentre os inúmeros fatores ligados à patogenia da esquistossomose – como cepa do parasito, idade e estado nutricional -, os dois mais importantes se mostram a carga parasitária (ovos por grama de fezes) e a resposta imunológica do indivíduo. Listaremos, agora, a ação das cercárias, dos esquistossômulos, dos vermes adultos e dos ovos no indivíduo. Cercária Ao penetrar na pele do homem, as cercáriaspodem desencadear um processo imunoinflamatório denominado dermatite cercariana ou dermatite do nadador (hipersensibilidade de tipo IV), o qual se caracteriza por sensação de comichão, erupção urticariforme, eritema, edema, pequenas pápulas e dor, podendo perdurar por até cinco dias após a infecção. Mostra-se mais intenso em reinfecções (hipersensibilidade), onde há participação de mastócitos, complemento, eosinófilos e IgE. Esquistossômulos Na transição dessa forma do parasito dos pulmões aos vasos do fígado e, posteriormente, ao sistema porta intra- hepático pode haver linfadenia generalizada, febre, esplenomegalia e sintomas pulmonares. Vermes adultos Os vermes vivos permanecem no sistema porta por longos anos e, usualmente, não acarretam lesões ao hospe- deiro. No momento em que eles morrem, todavia, podem ocorrer lesões extensas, embora circunscritas. Esses danos tendem a acometer frequentemente o fígado, pelo fato de os vermes serem arrastados a esse órgão pela circulação porta. Juntamente a isso, os vermes adultos afetam o hospedeiro ao consumir por volta de 2,5mg de Fe por dia, além de 1/5 de seu peso seco em glicose. Ovos Principais responsáveis pela patogenia de esquistossomose, os ovos que atingem o fígado permanecem nesse órgão e provocam as alterações mais importantes da doença. No órgão, os ovos excretam um antígeno solúvel que desencadeia uma reação inflamatória granulomatosa. Isso será o evento fundamental para a formação do granuloma (ovo mais reação Imagem ilustrativa de dermatite cercariana Processo de formação de granuloma hepático. Notar as centenas de células TCD4+ aglomerando-se em volta do ovo de S. mansoni granulomatosa que o envolve). O desenvolvimento do granuloma hepático promoverá uma diminuição na capacidade de perfusão do órgão, um aumento da pressão da veia porta, com concomitante dilatação desta. Isso desencadeará, inicialmente, um quadro de ascite (fígado cirrótico com granulomas hepáticos) e, posteriormente, uma esplenomegalia devido ao desvio de circulação para o baço. Os ovos podem ainda, futuramente, alojarem-se no sistema nervoso central, causando a neuroesquistossomose. Sintomatologia Esquistossomose Aguda Nos estágios iniciais (fase pré-postural), entre 10 a 35 dias após a infecção, há sintomatologia variada, podendo se apresentar de forma assintomática até oligossintomática, manifestando mal-estar, febre, tosse, mialgia, desconforto abdominal e hepatite aguda. Na fase aguda, que engloba em torno dos 50 dias e pode perdurar até 120 dias (fase aguda toxêmica), tende a ocorrer a disseminação miliar de ovos, levando a uma enterocolite aguda e formação de granulomas, além de quadros febris acompanhados de sudorese, calafrios, emagrecimento, fenômenos alérgicos, diarreia, disenteria, cólicas tenesmo, hepatoesplenomegalia discreta, linfadenia, leucocitose com eosinofilia, aumento das globulinas e alterações discretas das funções hepáticas (transaminases). A fase toxêmica, em alguns casos, demonstra grande letalidade. Por outro lado, a fase aguda, na maioria dos casos, apresenta manifestações clínicas pouco intensas e evolui, em um período de 4 a 6 meses, para a fase crônica. Esquistossomose crônica A esquistossomose crônica se inicia a partir do sexto mês após a infecção, podendo durar por vários anos. Ela costuma apresentar grandes variações clínicas, dependendo os órgãos afetados, da carga parasitária, do sistema imune do indivíduo e do tratamento instituído. A doença pode atingir graus extremos de severidade como hipertensão pulmonar e portal, ascite e ruptura de varizes do esôfago. A esquistossomose crônica se apresenta por qualquer uma das seguintes formas: Tipo I ou Forma Intestinal: caracteriza-se por diarreias repetidas que podem se demonstrar mucos- sanguinolentas, com dor e/ou desconforto abdominal e tenesmo. Nos casos crônicos graves, pode haver fibrose da alça retossingmoide, levando à diminuição do peristaltismo e constipação constante. A maioria dos casos, no entanto, possui caráter benigno. A diarreia mucossanguinolenta se deve à passagem simultânea de vários ovos para a luz intestinal, ocasionando pequenas e numerosas hemorragias e edemas. Tipo II ou Forma Hepatointestinal: qualifica-se pela presença de diarreias e epigastralgia. Com as lesões provocadas pelos ovos e a formação de granulomas, o fígado, inicialmente, sofre um aumento de volume (hepatomegalia) e se mostra bastante doloroso à palpação. À medida que os granulomas se intensificam – na fase mais avançada dessa forma clínica -, há diminuição do tamanho do fígado devido à fibrose do tecido. Aparece aqui um quadro conhecido como fibrose de Symmers, caracterizada por nodulações palpáveis que Complicações crônicas da esquistossomose. Ocorre, por meio da hipertensão portal, o desenvolvi- mento da hepatoesplenomegalia, da ascite e das varizes esofágicas correspondem a áreas de fibrose decorrentes da granulomatose periportal. Isso provoca a obstrução dos ramos intra- hepáticos da veia porta com formação de pequenos trombos. Essa obstrução trará como consequência a hipertensão portal, manifestação mais típica e mais grave da doença. Tipo III ou Forma Hepatoesplênica Compensada: caracte- rizada pela presença de hepatoesplenomegalia. As lesões perivasculares intra-hepáticas são em quantidade suficiente para gerar transtornos na circulação portal – como dito acima -, com certo grau de hipertensão que provoca congestão passiva do baço pelo ramo esplênico (veia esplênica do sistema porta) com distensão dos sinusoides. Nessa fase se inicia a formação de circulação colateral e de varizes do esôfago, com comprometimento do estado geral do paciente. Tipo IV ou Forma Hepatoesplênica Descompensada: in- clui as formas mais graves de esquistossomose mansônica, responsáveis por levar o paciente a óbito. Caracteriza-se por hepatomegalia ou fígado contraído pela fibrose perivascular, esplenomegalia avançada, ascite, circulação colateral, varizes do esôfago, hematêmese, anemia acentuada, desnutrição e quadro de hiperesplenismo. Podemos considerar ainda, como formas particulares, as formas pulmonar e cárdio-pulmonar, verificadas em estágios avançados da doença. Alguns ovos passariam à circulação venosa e ficariam retidos nos pulmões. Nos capilares desse órgão, os ovos originam granulomas pulmonares, que podem levar a duas consequências: primeira, dificultar a pequena circulação e causar um aumento no esforço cardíaco, que pode evoluir até uma insuficiência cardíaca, tipo cor pulmonale; segunda, passagem dos ovos para circulação geral e encistamento deles em vários órgãos, com formação de granulomas (inclusive no sistema nervoso central). Diagnóstico Clínico No diagnóstico clínico, deve-se levar em conta a fase da doença (pré-postural, aguda ou crônica), além de uma boa anamnese detalhada do caso do paciente (origem, hábitos, contato com água). Laboratorial Exame de fezes: usam-se métodos de sedimentação ou centrifugação ou de concentração por tamiza- ção (Kato e Kato-Katz). O exame se fezes se mostra satisfatório quando a carga parasitária se apresenta média ou alta, demonstrando, contudo, necessidade de repetição em cargas parasitária baixas. O método de Kato-Katz tem bastante destaque para o rastreamento epidemiológico da doença; Biópsia ou raspagem da mucosa retal: método que exige pessoal treinado e resulta em inegável desconforto ao paciente, não obstante demonstra alta sensibilidade; Ultrassonografia: técnica que diagnostica as alterações hepáticas determinando com precisão grau de fibrose, útil para os casos crônicos. Quando a fibrose é pouco extensa, todavia, pode ser confundidacom outras etiologias; Fibrose hepática na esquistossomose Ressonância magnética de tumor cerebral (seta branca) de paciente com esquistossomose mansônica antes do tratamento (à esquerda) e um ano após o tratamento (à direita, com a seta escura apontando o buraco deixado pela biópsia) Método de Kato-Katz Reação intradérmica ou Intradermorreação: teste alérgico (hipersensibilidade do tipo I) que se baseia na medida da pápula formada 15 minutos após a inoculação intradérmica de antígeno de verme adulto. Apresenta alta sensibilidade em homens (95%) e média em mulheres (65%), com especificidade boa na maioria dos casos. Útil para rastreamentos epidemiológicos; Reação de fixação de complemento: alta sensibilidade em casos com exames de fezes positivos, com especificidade muito boa, embora a técnica esteja em desuso atualmente devido à complexidade do método; Reação de hemaglutinação direta: sensibilidade e especificidades boas; pouco usada devido a pro- blemas logísticos; Método imunoenzimático ou ELISA; Reação em cadeia de Polimerase (PCR); Eletroforese de proteínas; Diagnóstico diferencial: a forma intestinal pode ser confundida com amebíase, gastroenterite ou ou- tras causas de diarreia. As formas mais graves devem ser diferenciadas de leishmaniose visceral, febre tifoide, linfoma e hepatoma; Tratamento O tratamento quimioterápico da esquistossomose através das drogas mais modernas – oxamniquina e pra- ziquantel – deve ser preconizado para a maioria dos pacientes com presença de ovos viáveis nas fezes ou na mucosa. Os efeitos colaterais mais evidentes são alucinações e tonteiras, excitação e até mesmo mudanças de comportamento, que só permanecem num período de 6 a 8 horas. Deve-se, dessa maneira, tratar com muito critério ou mesmo trocar de droga em pacientes com manifestações neuropsíquicas. Profilaxia Devido ao fato de os focos de transmissão da doença estarem intrinsicamente relacionados às condições inadequadas de saneamento básico, a esquistossomose se qualifica como uma afecção tipicamente condicionada pelo padrão socioeconômico precário que atinge a maioria da população brasileira. Dentre as principais medidas profiláticas, podemos citar o tratamento em massa da população infectada, a melhoria do saneamento básico – com construção de rede de esgotos e tratamento de água -, o combate aos caramujos transmissores da doença, a educação da população e a aplicação de produtos cercaricidas de uso tópico – que impedem a penetração da larva – em indivíduos de risco, como, por exemplo, operários que fazem limpezas em canais de caramujos infectados. Teníase A teníase – também conhecida como solitária – caracteriza-se como uma parasitose causada pelos vermes adultos de platelmintos cestoides do gênero Taenia. Os parasitas desse gênero se classificam como heteroxênicos – possuindo um hospedeiro intermediário (animais) e um hospedeiro definitivo (homem). Falaremos, aqui, dos dois tipos principais de importância médica: a Taenia saginata e a Taenia solium. A ingestão do cisticerco de qualquer uma dessas espécies provocará o desenvolvimento da teníase no intestino delgado do ser humano, ao passo que a ingestão dos ovos apenas da Taenia solium predispõem o desenvolvimento de outra afecção muito importante denominada cisticercose humana, a qual será mais bem abordada no próximo capítulo. Classificação científica Filo Platyhelminthes Classe Cestoda Ordem Cyclophyllidea Família Taeniidae Gênero Taenia Espécie Taenia spp. A Taenia solium – na sua forma de larva ou cisticerco – encontra-se em órgãos ou tecidos de suínos, seus hospedeiros intermediários. A Taenia saginata, por outro lado, apresenta como hospedeiros intermediários os bovinos. Os quadros mais observados nos casos de infecções sintomáticas de teníase incluem manifestações generalizadas do aparelho digestório (deficiências nutricionais) e nervoso (algumas vezes, mudanças comportamen- tais). As teníases e cisticercoses constituem sérios problemas de saúde pública em diversos países, essencialmente naqueles com condições inadequadas de saneamento básico na América, África e Ásia. Juntamente a isso, podem, ainda, acarretar sérios prejuízos econômicos em áreas de produção bovina e suína. Morfologia Verme adulto As tênias se mostram como grandes parasitas de corpos achatados dorsalmente, em forma de fita de cor branca ou amarelada. Ambas as espécies citadas são hermafroditas, e seus corpos se dividem em três porções: Escólex ou cabeça: localizado na porção anterior, funciona como órgão de fixação do cestoide à mucosa do intestino delgado humano; Colo ou pescoço: porção mais delgada do corpo onde as células do parênquima estão em intensa multiplicação, qualificando-se como a zona de crescimento do parasita ou de formação das proglotes; Estróbilo ou corpo: mostra-se o restante do corpo do parasita. Ca- da segmento aqui presente recebe a denominação de proglotes ou anel, onde há a presença de órgãos sexuais masculino e feminino, compondo o hermafroditismo das tênias; A T. solium apresenta menor tamanho, podendo atingir até cinco metros de comprimento, enquanto que a T. saginata, por sua vez, apresenta a capacidade de alcançar 12 metros. As larvas das tênias recebem o nome de cisticercos, podendo atingir até 12 mm de comprimento. O corpo dos cestódeos adultos se reveste por um tegumento de natureza sincicial, sem núcleos, com mitocôndrias e pequenos vacúolos. Esse revestimento possui microvilosidades especializadas – denominadas microtríquias -, responsáveis por aumentar a área de contato do parasita com o meio exterior. A membrana que reveste externamente o tegumento do parasita apresenta glicocálice, o qual constitui a face de comunicação entre parasita e hospedeiro, além de ser o local por onde se processam as trocas nutritivas e excreção dos resíduos. Em outras palavras, a alimentação e excreção do verme se fazem por sua “pele” (excreção de amônia pelas células-flama ou protonefrídios), já que as tênias não dispõem de cavidades gerais nem de sistema digestório completo. Ilustração morfológica das principais porções da T. solium. A principal diferença morfológica entre essa espécie e a T. saginata reside no escólex Diferenciação morfológica do escólex das T. solium e saginata. Note a existência dos ganchos na solium, os quais auxiliam sua fixação Ovos Esféricos, morfologicamente indistinguíveis, constituídos por uma casca protetora – o embrióforo – de quitina que lhe confere proteção contra fatores ambientais. Internamente, encontra-se o embrião hexacanto ou oncosfera, provido de três pares de acúleos e membrana dupla. Cisticerco O cisticerco da T. solium se constitui de uma vesícula translúcida com líquido claro, contendo invaginado em seu interior um escólex com quatros ventosas, rostelo e colo. O cisticerco da T. saginata apresenta a mesma morfologia diferindo apenas pela ausência do rostelo. A parede da vesícula do cisticerco é composta por três membranas: cuticular ou externa, uma celular ou intermediária e uma reticular ou interna. No sistema nervoso central, o cisticerco pode se manter viável por vários anos. Transmissão A transmissão da teníase ocorre por meio da ingestão de carne crua ou mal cozida – de origem suína ou bovina – contaminada com cisticercos de cada espécie de tênia. As tênias apresentam alta longevidade, podendo sobreviver cerca de dez anos, fator que – associado à grande produção de ovos e à resistência destes no ambiente – possui relevante importância para a imensa capacidade transmissiva dessa enteroparasitose. Ciclo biológico Após serem liberadas por um indivíduo infectado
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