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Objeto e métodos da Sociologia Jurídica Alexandre Carneiro de Souza Tendo considerado o processo histórico que deu ocasião ao surgimento da ordem jurídica, partindo da primeira apropriação de um sentido de norma através do rito religioso, passando pela concepção sobre o fundamento da lei na filosofia grega com a instituição da pólis e concluindo com a secularização promovida pela ascenção do saber racional na modernidade, a partir do século XVI, dever-se-á, com base nas discussões até aqui levantadas, analisar os aspectos básicos da constituição interna da sociologia jurídica. A homogeneidade e a heterogeneidade dos fenômenos sociais Antes de adentrar nas questões particulares da sociologia jurídica deve-se lembrar que o campo da sociologia é vasto, diversificado e complexo. Os acontecimentos sociais, a despeito de homogêneos quanto à natureza (social) são heterogêneos nas formas e nas finalidades. Em vista disto, o estudo total da realidade social tornou-se uma pretensão impossível aos estudiosos pioneiros devido a grande abrangência dos fatos e dos acontecimentos. A grande amplitude da totalidade dos eventos sociais impeliu as análises científicas em sociologia, e não apenas nelas, mas também nas demais ciências, no rumo da especialização. O caráter científico especializado do estudo sociológico A sociologia do direito como os demais campos específicos estudados pelas diversas disciplinas sociológicas (político, econômico, urbano, rural, conhecimento, jurídico, moral, organizações, desenvolvimento, religião, trabalho, relações de gênero, movimentos sociais, educação etc) vieram, com o passar do tempo a se constituir especializações com o propósito de conferir um maior aprofundamento das análises e de propiciar melhores resultados à pesquisa social. O campo jurídico como objeto do interesse sociológico No campo vasto dos estudos sociológicos, a sociologia jurídica é uma subdisciplina e se distiingue das demais análises sociológicas por causa do objeto específico do interesse de sua análise. Indo nesta direção, indaga-se: Quais as razões pelas quais o jurídico se institui como subcampo da ciência da sociedade? Indagando de outra forma: Em que se fundamenta a sociologia ao eleger o fato jurídico como um dos seus objetos de investigação? O direito, antes de qualquer outra designação, tem o seu aparecimento, sua estruturação e seu desempenho estreitamente relacionado a existência social dos seres humanos. É bom que se diga acerca da palavra “direito”, que ela procede do termo latino “directus” e significa “o que é reto”. O sentido do termo incorpora a idéia de valor socialmente atribuído a uma tipo ideal de conduta, partindo de um lugar cultural no qual se convenciona o que seja certo ou errado. A idéia de direito está necessariamente relacionada com a instituição de leis que normatizam a conduta tida socialmente como correta. O direito visa legislar a conduta dos indivíduos no ambiente social. Só existe sentido na nomeação e na prática do direito por causa da vida social. Dito de outra maneira, antes de qualquer outra característica que se atribua ao direito, ele é essencialmente um fato social. Ou seja não haveria necessidade de noções ou instituição do direito caso o ser humano não existisse em sociedade. Porque os seres humanos vivem em grupos sociais, partilhando o mesmo ambiente e sofrendo uns o impacto das ações dos outros, requer-se o estabelecimento de normas e regras de conduta que determinem a vida coletiva, de maneira que as condutas individuais não se desviem das normas estabelecidas em função do bem-comum e assim comprometam os fins coletivos. Acerca do direito como um fenômeno social, Durkheim assevera: Quanto mais os membros de uma sociedade são solidários, mais eles mantêm relações diversas, quer uns com os outros, quer com o grupo tomado coletivamente: porque, se os seus encontros fossem raros, eles não dependeriam uns dos outros senão de uma maneira intermitente e fraca. Por outro lado, o número destas relações é necessariamente proporcional ao das normas jurídicas que as determinam. Com efeito, a vida social, por todo o lado onde ela existe de uma maneira durável, tende inevitavelmente a tomar uma forma definida e a organizar-se, e o direito não é outra coisa senão esta mesma organização, naquilo que ela tem de mais estável e de mais preciso. A vida em geral da sociedade não pode estender-se num certo sentido sem que a vida jurídica para aí se estenda ao mesmo tempo e na mesma proporção (1989:80,81). Como se pode ver, a dimensão jurídica exerce um papel fundamental na estruturação das formas de convivência humana. Não é possível viver coletivamente sem normas mínimas. A vida coletiva impõe regulamentação da liberdade individual como possibilidade de efetivação do interesse coletivo. È exatamente aí que prevalesce o papel do jurídico, das leis, do direito. O direito poderia ser entendido como um ordenamento compulsório das obrigações de um indivíduo como membro de uma comunidade com base em princípios e regras reconhecidos coletivamente como elementos básico para a preservação da existência social. Dito de um outro modo, o sentido da palavra direito sugere um ordenamento jurídico vigente em determinado lugar ou época, por meio do qual as atitudes individuais são submetivas ao controle legal. Sendo a função do direito realizar a normatização das condutas oficiais de uma coletividade, a sua importância reside sobretudo em sua relação com os poderes constituídos e no caráter impositivo na forma em que se molda a sociedade. Ou seja, embora o direito não se limite ao âmbito oficial, pois ele pode migrar para áres sobre as quais não pesam o rigor da lei, como por exemplo a fidelidade conjugal, o seu maior rigor dar-se-á em direção aquilo que é juridicamente regulamentado, como por exemplo o casamento monogâmico. O fato é que existem duas forças que alimentam a autoridade da ordem jurídica: a) O seu caráter arbitrário; b) A existência de uma instância de poder social que zela ideológica ou repressivamente pelo cumprimento da lei. Desta forma, vê-se que o fenômeno jurídico atua preponderantemente no cerceamento das liberdades quer individuais quer coletivas. Nesse sentido, o direito busca orientar a gestão da liberdade humana, medianta a criação e a aplicação das leis. Sendo o direito aplicado em benefício da ordem social, ele não se estabelece senão pela coersão. Nisto reside a posição antagônica que as leis exercem em relação à liberdade. Sociologia jurídica Por sociologia jurídica compreende-se uma disciplina do estudo sociológico que investiga o direito no seu aspecto estritamente social, tendo em vista elucidar a mútua influência entre a realidade social e o direito no processo de construção da organização social. O estudo social do direito vai caminhar em duas direções: as questõe gerais e as questões aplicadas. Sociologia geral do direito No âmbito da sociologia geral do direito, os estudos sobre a ordem jurídica irão lidar com questões acerca da composição do direito, as espécies, e os mecanismos da justiça e da equidade, e as relações entre direito, coerção, controle, mudança e realidade social ampla. Em resumo, na sociologia geral do direito os interesses procurarão contemplar os problemas teóricos do conhecimento. Sociologia aplicada ao direito No âmbito da sociologia aplicada ao direito, os estudos irão lidar com conteúdos especificamente jurídicos correlacionado à realidade social total. Nesse caso, as análises voltar-se-ão para as leis, os decretos, os regulamentos, os costumes, as decisões judiciais, a doutrina dos juristas, os tratados, as convençõescoletivas. Em resumo, na sociologia aplicada ao direito o interesse estará voltado para os problemas práticos da legislação e da jurisprudência. O estudo empírico do direitoA sociologia é uma ciência essencialmente empírica, cujo saber se constrói a partir da observação dos fatos sociais, a sistematização destes e sua fundamentação teórica. Esses fatos não devem submeter-se ao pensamento apriorístico da ciência, mas devem ser interpretados com base nos moldes como estes se expressam no mundo. Com a sociologia jurídica não é diferente. O objetivo de suas análises é estudar a realidade dos fatos sócio-jurídicos a partir deles mesmos, possibilitando, mediante a aplicação das técnicas de pesquisas, que que estes fatos falem por si mesmos. Métodos do estudo sociológico do direito Acerca do método em sociologia jurídica presume-se a possibilidade de diversas formas de procedimentos. Deve-se considerar que cada pesquisa no campo jurídico levanta problematizações específicas, mesmo quando abordam temáticas semelhantes. Isto porque a eleboração de uma teoria com base no fenômeno empírico do direito revelará sempre especificidades ímpares, em função de que os pesquisadores são diferentes, as problemáticas variam e os objetos podem ser apreendidos sob diferentes ângulos. De acordo com os procedimentos gerais, um fenômeno sociológico pode ser estudado quantitativa ou qualitativamente. Pesquisa quantitativa: Prevêem a mensuração de variáveis prestabelecidas, procurando verificar e explicar sua influência sobre outras variáveis, mediante a análise da freqüência de incidência e de correlações estatísticas. O pesquisador descreve, explica e prediz (Chizzotti, 1998, 52). Pesquisa qualitativa: Fundamentam-se em dados coligados nas interações interpessoais, na co-participação das situações dos informantes, analisados a partir da significação que estes dão aos seus atos. O pesquisador participa, compreende e interpreta (Chizzotti, 1998:52). Pode-se tomar por exemplo a ilustração na qual Becker (1997:14) distingue um do outro: um pesquisador que descobre que a população de uma área é menor do que gostariam de fazer crer os seus campeões locais; e um pesquisador que revela fatos embaraçosos sobre alguma estrutura social local. Os procedimentos metodológicos podem ser, também, descritivos ou analíticos: Os estudos descritivos foram os precursores da análise sociológica. A pura descrição técnica constitui-se a primeira e mais primitivva forma de texto metodológico em sociologia (Becker, 1997:23). Para Seltiz et al (1965:75) a pesquisa social descritiva estuda as características de um fenômeno social. Os estudos analíticos procuram descobrir a lógica inerente à prática convencional, a fim de reduzir aquela prática a um conjunto defensável de regras de procedimento (Becker, 1997:24). As inferências em sociologia jurídica podem ser dedutivas ou indutivas. Na elaboração do conhecimenbto por dedução, a consideração parte da realidade geral para interpretar a particular. Na elaboração do conhecimento por indução, a consideração parte do particular para o geral (Souto, 1997: 50). Bibliografia Becker, Howard. Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais, São Paulo, Editora HUCITEC, 1997. Chizzotti, Antonio. Pesquisas em Ciências Humanas, São Paulo, Cortez, 1998. Durkheim, Émile. A Divisão do Trabalho Social –Vol. 1, Lisboa, Editorial Presença, 1989. Selltiz, Claire, et al. Método de Pesquisa nas Relações Sociais, São Paulo, E.P.U, 1965. Souto, Cláudio. Souto, Solange. Sociologia do Direito: Uma Visão Substantiva, Porto Alegre, Fabris, 1997. Souto, Cláudio. Falcão, Joaquim. Sociologia e Direito. São Paulo, Editora Souto,
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