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#Revista Carta Capital Edição 1008 (21 Junho 2018)

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Diretor de redação: Mino Carta 
Redator-chefe: Nirlando Beirão
Consultor editorial: Luiz Gonzaga Belluzzo
Editor especial: Mauricio Dias
Editores: Antonio Luiz Monteiro Coelho da Costa, Carlos Drummond e Rodrigo
Martins
Repórteres: André Barrocal (Brasília) e Gianni Carta (Paris) 
Secretária de redação: Mara Lúcia da Silva
Diretora de arte: Pilar Velloso 
Chefes de arte: Daniele Doneda, George B. J. Duque Estrada (Fundador),
Mariana Ochs (Projeto Original)
Designer: Milena Branco
Fotografia: Wanezza Soares (Produtora Editorial) 
Revisores: Áli Onaissi (coordenador) e Hassan Ayoub
Colaboradores: Afonsinho, Antonio Delfim Netto, Carlos Leonam, Claudio
Bernabucci (Roma), Djamila Ribeiro, Drauzio Varella, Eduardo Graça,
Eduardo Nunomura, Gabriel Galípolo, Guilherme Boulos, Hélio de Almeida,
José Genulino Moura Ribeiro, Jotabê Medeiros, Luiz Roberto Mendes
Gonçalves (Tradução), Marcos Coimbra, Nivaldo de Souza, Oliviero Pluviano,
Paulo Nogueira Batista Jr., Pedro Alexandre Sanches, René Ruschel, Riad
Younes, Rogério Tuma, Rodrigo Casarin, Thomaz Wood Jr. e Ubirajara
Correia 
Ilustradores: Eduardo Baptistão e Venes Caitano
Secretária: Ingrid Sabino
Carta on-line
Editor executivo: Miguel Martins
Editores: Dimalice Nunes e Tatiana Merlino
Editor de vídeo: Cauê Gomes
Repórteres:Ana Luiza Rodrigues Basilio (CartaEducação), Carolina Servio
Scorce, 
Gabriel Bonis e Marina Gama Cubas
Analista de mídias sociais: Julio Simões
Estagiários: Ana Carolina Pinheiro, Giovanna Costanti e Laura Castanho
Cerqueira 
Coordenadora de projetos digitais: Daniela Neiva
Designers: Lidiane Siqueira e Regina de Assis
Site: www.cartacapital.com.br
Publisher: Manuela Carta
Diretor executivo: Sergio Lirio
Diretora de publicidade: Simone Puglisi
Estagiária de publicidade: Leticia Leite Freitas
Gerente de marketing e relacionamento: Leticia Terumi Kita
Estagiária de marketing e relacionamento: Gabriela Lira Bertolo
Coordenador administrativo e financeiro: Mario Yamanaka
Equipe administrativa e financeira: Fabiana Lopes Santos e Rita de Cássia Silva
Paiva 
Analista de RH: Claudinéia da Cruz
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CartaCapital é uma publicação semanal da Editora Confiança Ltda.
Carta­Capital não se responsabiliza pelos conceitos emitidos nos artigos
assinados. As pessoas que não
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CartaCapital
ou para retirar qualquer tipo de material se não possuírem em seu poder carta
em papel timbrado assinada por qualquer pessoa que conste do expediente.
Registro nº 179.584 De 23/8/94, modificado pelo registro nº 219.316 De
30/4/2002 no 1º Cartório, de acordo
com a Lei de Imprensa. 
Impressão: Plural Industria Gráfica - São Paulo - SP 
Distribuição: Dinap S/A – Distribuidora Nacional de Publicações, Rua Dr.
Kenkiti
Shimomoto, nº 1678, CEP 06045-390 – São Paulo – SP Assinantes: 
Treelog S.A. Logística e Distribuição. 
ÍNDICE
20 de Junho de 2018 - Ano XXIII - Nº 1008 
Cartas Capitais
O "novo" vem da esquerda
Russa
Guerra e paz?
Rosa dos ventos
Vão privatizar o Brasil?
Editorial
A Medusa
A Semana
Outra vitória feminina
Reportagem de capa
Nas barbas do guru
Seu País 2018
Mesmo preso, Lula decide
Marcos Coimbra
Antipetistas de velas na mão
Seu País Saúde
Os frutos da reforma agrária
Seu País Diálogos Capitais
O horizonte das cidades
Economia Petrobras
O País entregue ao deus-dará
Antonio Delfim Netto
Dois problemas, mas só um sucesso
Luiz Gonzaga Belluzzo
Editoriais do desastre
Nosso Mundo G-7
Assustador mundo novo
Nosso Mundo The Observer
Adeus à hegemonia digital
Nosso Mundo The Observer
Pacto de mão única
Plural Música Clássica
O esqueleto de sal
Bravo!
Para ler, ver e ouvir
QI A torcida dos outros
Ninguém me ama
QI Estilo
Nossa ideia de elegância
QI Saúde
Não jogue fora a camisinha
Afonsinho
Chegou!
Vara
Por Venes Caitano
BOLSONARO, NOVA VERSÃO
 Tínhamos a cantada, hoje temos o assédio acompanhado pela apologia do
estupro promovido por um parlamentar. Alguns o querem candidato. Como
assim? Se a prática estava um pouco contida, agora se espalha com a
aprovação de acólitos a consagrar a corrupção moral, encorajando a
violência duplicada contra a mulher: física e moral. Mesmo réu pelo
Supremo Tribunal Federal, Bolsonaro repetiu a dose, com ofensas verbais
preconceituosas a negros e gays. A turma da molecagem o aplaude
mesmo com tantos deslizes, os quais consideram pequenos. E quantos,
literalmente, vestem e passeiam pelo parque com a camisa da triste figura?
Por nossas bandas, o machismo não dá sinais de arrefecer. Ao contrário,
parece ter voltado com mais vigor. Agora, alguns até conseguem apoiar
quem faz apologia do estupro como candidato à Presidência do País.
Estamos mesmo numa época estranha, deveras atrapalhada e confusa.
Este nosso país é quase um encanto. 
Celito M. Brugnara 
Porto Alegre, RS 
(Enviado via carta)
 Temer vai de mal a pior. O programa derrotado de Aécio, hoje implantado
por Temer, não beneficiou a classe média, como se esperava. O dólar
continua altíssimo. O desemprego, aterrorizante. O PMDB congelou o
investimento em saúde e educação dos pobres, enquanto tenta vender
estatais para qualquer grupo estrangeiro que possa pagar. O Brasil está
fraco. Os patos amarelos estão murchos. Não acreditam mais em Alckmin.
Estão desconfiados do PSDB, dos escândalos de Aécio, do elitismo que
enriquece os banqueiros e deixa o povo cada vez mais pobre. Boa parte do
eleitorado está disposta a apelar, radicalizar, flertar com o absurdo,
cristalizado na candidatura de Bolsonaro. A novidade agora é apostar na
extrema-direita. Bolsonaro é apenas um personagem inventado, um mito
brasileiro, é só a máscara de mais uma mentira fascista. Suas falas
absurdas começarão a cansar mesmo os seus antigos eleitores. São
mentiras vazias. Não há milagre em política. Não há intervenção militar que
salve. O PCC continuará poderoso no Brasil. O desemprego, alto. Os
escândalos, diários. Depois da ditadura, do fascismo, de Bolsonaros, quem
sabe o nosso povo se afaste por um tempo dos mitos, dos falsos heróis e
dos salvadores da pátria. 
Wellington Anselmo Martins 
Bauru, SP 
(Enviado via carta)
 O site oficial de Bolsonaro não tem nenhuma proposta. Achei que, pelo
menos, iria encontrar algumas bobagens genéricas e preconceituosas, mas
nem isso eles tiveram a capacidade de escrever. 
Rodrigo N. Matsui 
(Enviado via Facebook)
O PIANISTA DO SAMBALANÇOMuito bacana a matéria sobre Antonio Adolfo. Principalmente, por trazer
informações preciosas para as novas gerações sobre o momento após o
AI-5, quando a ditadura assumiu um caráter bastante repressivo. As
violações daquela época só vieram a público depois, por meio de matérias
como essa. Apenas senti falta de uma referência ao disco Feito em Casa,
marco da produção independente de música no Brasil. 
Orlando Oliveira São Paulo, SP 
(Enviado via carta)
O
SERVIÇAL CERCADO
 Temer é de uma inteligência sem tamanho: enganou até os caminhoneiros,
visto que o desconto do diesel não vai aparecer na bomba. Os postos dão
um jeitinho de disfarçar e embolsar a diferença. Não satisfeito, sabotou a
greve dos petroleiros, colocando o povo contra os únicos com coragem de
lutar por um Brasil melhor. Faz o povo pensar que vive em uma
democracia. Nunca mais alguém vai conseguir mentir, manipular, enganar
tanto quanto ele e seus aliados e mesmo assim sair lucrando. Mas não se
preocupem: nós temos gasolina. 
Drica Serato 
(Enviado via Facebook)
 Temer enfiou uma estaca no coração de um governo democrático. Pelo
andar do jogo eleitoral, não há sinais de melhora no futuro. 
Anice Rocha 
(Enviado via Facebook)
 Todo mês Michel Temer reduz algum benefício. Está se aproveitando disso
para acabar de vez com o “colchão de segurança” garantido aos pobres
pelos governos anteriores. 
Suayne Suzi 
(Enviado via Facebook)
MAIS PRODUÇÃO, MENOS ESPECULAÇÃO
 Do ponto de vista econômico, não está “na hora de Ciro”, questionamento
levantado por CartaCapital em edições recentes. Entre os pré-candidatos à
Presidência, ele é quem mais causa desconfiança nesse campo, mesmo
com experiência em cargos públicos. Seu economista, Nelson Marconi,
também não parece ter autonomia suficiente para quitar o saldo negativo
da era Temer e reformar a indústria do País. O desenvolvimentismo que ele
prega não é tão novo assim. 
João Pedro Marques Cardoso 
São Paulo, SP 
(Enviado via carta)
 Vemos a nação mergulhar no caos, como consequência de um conluio
jurídico-parlamentar de alta traição, em que, acintosamente, se conspurcou
a democracia. No cenário de 2018, cabe ao PT e ao PDT recorrerem,
possivelmente, a uma aliança ou a um gesto de grandeza. Há uma nítida
linha que vai de Getúlio Vargas a Luiz Inácio Lula da Silva, passando pela
página de bronze escrita por Leonel Brizola em 1961. A esquerda precisa
se entender. 
Ilma Cecília Leite 
Rio de Janeiro, RJ 
(Enviado via carta)
DÁ PARA TORCER?
 O Brasil que eu quero não tem a Rede Globo. Quanto à Seleção, está
difícil vestir a camisa verde-amarela. Que seja eliminada bem depressa. 
Airton Brisolla 
Curitiba, PR 
(Enviado via carta)
O
“NOVO” VEM DA ESQUERDA
 É disso que as elites têm medo: da massa culta e esclarecida. Eles não
conseguem comprar a ignorância de um país inteiro. 
Rogério Ferreira
(Enviado via Facebook)
ÍNDICE
 CRÉDITO DA PÁGINA: Reprodução Mídia Social
CAPA: Ilustração: Daniele Doneda. Fotos: iStockphoto
ANIAMÇÃO: Regina Assis
Marivaldo luta para acabar com a exclusão social e a manutenção de privilégios
Guerra e paz?
Uma guia turística no Expresso Transiberiano, um pregador nas ruas de Moscou e a
revisão histórica na Rússia de Vladimir Putin
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Em
Por Flávio Ricardo Vassoler*
Na moda. Depois do fim da União Soviética, os Romanov foram reabilitados. De assassinos
viraram santos
agosto de 2017, ministrei um curso de história e literatura russa a bordo do Grande
Expresso Transiberiano. O trem partiu de Ulan-Bator, capital da Mongólia, entrou
em território russo pela cidade de Ulan-Ude, capital da República da Buriátia,
singrou a imensidão da Sibéria por mais de 5 mil quilômetros, cruzou a fronteira
eurasiana na cidade de Ekaterimburgo e, ao fim e ao cabo, chegou em Moscou.
Nestas duas últimas cidades – 24 horas distantes uma da outra a bordo do trem –,
vivenciei os fragmentos narrativos relatados a seguir.
Ninguém governa sem culpa?
Com gestos vivazes, a guia turística Natália Radtchenko me explica que a Catedral
do Sangue Derramado, no coração de Ekaterimburgo, foi erigida, após o fim da
União Soviética, “sobre as ruínas da casa do comerciante Ipatiev, onde, em julho de
1918, os algozes bolcheviques fuzilaram o czar Nicolau II e sua família. Assim, a
Igreja Ortodoxa Russa batizou essa catedral com o sangue inocente dos Romanov.
Ademais, Nicolau II e seu filho Alexei foram canonizados após o fim do ateísmo
soviético”. 
– Natália, posso lhe fazer umas perguntas? 
– Pois não.
– Com o atraso e a fome que devastavam a Rússia antes da Revolução de 1917,
será que os Romanov eram tão inocentes quanto reza a hagiografia histórica pós-
soviética? 
(Natália faz um Pelo-Sinal da Santa Cruz, à maneira ortodoxa, para iniciar o meu
processo de excomunhão.)
– De fato, Natália, o fuzilamento dos Romanov foi uma ação bastante questionável
capitaneada por Lenin. Mas, ora, quando é que transformações históricas radicais
não ceifaram vidas humanas? A república moderna não foi disseminada com a
guilhotina dos franceses? A abolição da escravatura não se viu profundamente
municiada pela guerra civil nos Estados Unidos? Ora, ainda que discordemos
visceralmente de Lenin, é preciso dizer que há pressupostos históricos para sua
medida draconiana: se as tropas monarquistas resgatassem os Romanov em meio
à guerra civil que as contrapunha aos bolcheviques, os czaristas teriam uma
bandeira e tanto para impulsionar a reação à Revolução de Outubro, não? É por
isso, Natália, que o revolucionário francês Saint-Just sentenciou que “ninguém
governa sem culpa”. 
(Natália beija um ícone com a imagem do Cristo Ortodoxo junto à lapela de sua
blusa, para prosseguir com meu processo de excomunhão.)
– Uma última pergunta, Natália: será que, a exemplo do que ocorreu com São
Nicolau II, a Igreja Ortodoxa Russa canonizará Vladimir Putin, quando o novo czar
deixar o trono da Presidência após a morte?
(Natália me fulmina com os mesmos olhos que fuzilaram os Romanov.) 
Estátuas equestres dos antigos czares cerram fileiras com os bustos
de Marx e Lenin
Bode expiatório
Morei em Moscou entre 2008 e 2009, para fazer um curso de língua russa na
RUDN, a Universidade Russa da Amizade dos Povos, e para realizar parte de
minha pesquisa de mestrado sobre a obra de Fiodor Dostoievski. De volta à cidade,
Moscou me parece bem mais capitalista. Há oito anos se discutia a remoção da
múmia de Lenin do mausoléu na Praça Vermelha, mas ainda não havia rumores
sobre a construção de um centro empresarial a meros 2 quilômetros do Kremlin,
com arranha-céus que destoam radicalmente do estilo dos prédios aristocráticos na
área histórica da capital. (Será possível imaginar Moscou como uma sucursal
eslava de Chicago?) Há oito anos não havia estátuas equestres dos czares
Alexandre III e São Nicolau II cerrando fileiras com os bustos de Karl Marx e Lenin.
E eis que, nas imediações do agourento prédio da KGB, ao lado de um busto de
São Alexei Romanov, filho de Nicolau II, vejo uma roda ao redor de um velho de
barba bíblica. Os fiéis parecem hipnotizados pela pregação eslavófila a clamar pela
“Grande Rússia comandada por Putin! Sim, agora voltamos a ter orgulho da nossa
pátria! E em verdade lhes digo que a União Soviética só caiu porque seus líderes
não eram russos autênticos: Lenin era judeu, Kruchev, ucraniano, e que dizer do
georgiano Stalin?”
Entorpecido pela pregação eslavófila, não consigo deixar de levantar a mão para
pedir a palavra. Contrariado, o velho me olha com desconfiança e apruma o ouvido
com a mão direita em concha. 
– Senhor pregador, o que o senhor disse sobre os líderes soviéticos forasteiros (e
potencialmente traidores) me deixou pasmo e me lembrou de algo... Uma vez, em
Berlim, eu ouvi um bêbado nazista latir que Hitler só não conseguira exterminar
todos os judeus porque ele próprio era... judeu.(O velho pregador me fulmina com olhos de inquisidor.)
– E mais: há pouco, eu ouvi algo de um mendigo, senhor pregador, algo que me fez
pensar sobre a sua Grande Rússia... A algumas quadras daqui o pobre diabo
gritava que, na época da União Soviética, todos tinham dinheiro, mas não havia
nada nas lojas. Agora há de tudo nas lojas, mas ninguém tem dinheiro... 
(O velho e os fiéis me fulminam com olhos de quem, enfim, encontrou um bode
expiatório.) •
*Flávio Ricardo Vassoler é doutor em Letras pela USP, com pós-doutorado em
Literatura Russa pela Northwestern University (EUA). Traçará um retrato da Rússia
moderna durante a Copa do Mundo 
Vão privatizar o Brasil?
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A
sanha privatizante no Brasil, a de ontem, a de hoje ou a de amanhã, tem sido tão
somente, muitas vezes, serviço patrocinado vindo d’além-mar. Lá de fora sempre se
ganha mais do que se perde. Assim vão comendo o País em fatias. 
Comeram a Companhia Siderúrgica Nacional. A Companhia Vale do Rio Doce, uma
das maiores mineradoras do mundo, criada pelos ingleses, foi estatizada por
Getúlio Vargas, em 1942, e tornou-se uma das maiores mineradoras do mundo. Foi
privatizada em 1997, vendida a preço de banana. 
Michel Temer trilhou esse caminho. Chegou a anunciar um pacote de 25
concessões e privatizações. Não foi tão longe. Enfrentou resistência interna e luta,
com poucas chances, para privatizar a Eletrobras. Antes dele, Fernando Henrique
Cardoso assumiu o poder e prometeu acabar com a “Era Vargas”. 
Por Mauricio Dias
A ameaça mais tenebrosa feita por FHC foi a de privatizar a Petrobras. Privatizada
passaria a se chamar Petrobrax. Um jeitinho de o governo atrair interesse externo.
Como acontece ainda agora com a fabulosa descoberta do pré-sal. 
Shell, ExxonMobil, Chevron, BP Energy, Petrogal e Statoil foram vencedoras da
quarta rodada de licitação do pré-sal. A Petrobras foi derrotada no leilão de duas
áreas. Levantou 3,15 bilhões de reais abaixo do valor mínimo estipulado pelo
governo Temer. 
O estado de exceção gerado pelo golpe caminha neste sentido. Se
os empresários brasileiros fossem aqueles de quatro décadas atrás,
não permitiriam
Mas o Brasil apoia a privatização do País? Há sintomas diferentes. E não é de
agora. Em 1978, o Ibope ouviu cem empresários do Rio de Janeiro para uma
avaliação a respeito do governo do general Ernesto Geisel, o penúltimo da ditadura.
Duas respostas da pesquisa (ver tabela) surpreendem, caso os empresários não
tenham mudado radicalmente de opinião. Eles consideravam necessária a presença
do Estado na economia. 
Surpreendente é a resposta relativa a empresas como a Petrobras, Vale do Rio
Doce e Companhia Siderúrgica Nacional. Elas deviam continuar “controladas pelo
Estado”. Das três indicadas só resta a Petrobras. Mesmo assim, embora controlada
pelo governo, já está dividida com a iniciativa privada. 
A criação da Petrobras, em 1952, com apoio popular, impulsionada pelo lema “O
petróleo é nosso”, por décadas não foi objeto de suspeitas nem de ladroagem, a
não ser durante o governo Geisel, quando presidida por Shigeaki Ueki. Estranha
coincidência. Ao contrário do que o acontece hoje com o pré-sal, não duvidavam
que o Brasil tivesse recursos financeiros e capacidade técnica para sustentar a
empresa. Hoje, se possível fosse, privatizariam até os postes das ruas. • 
ANDANTE MOSSO
Eleição reforçará o PT 
Apenas 8 dos atuais 61 deputados da bancada do PT, a maior na Câmara dos
Deputados, não vão disputar a reeleição. Dois deles vão para a disputa ao Senado,
um a governador, outro para deputado estadual. Os demais trocam o Parlamento
por projetos pessoais. A campanha será curta. Terá menos de quatro meses. Com
teto de gastos, quem tem mandato fica com mais chance de se reeleger. Com Lula
ou sem Lula, mas pelo impacto da liderança dele, é muito provável que os petistas
saiam das urnas em maior número do que agora. Será um reforço poderoso para
uma legenda que perdeu fôlego. Na eleição de 2002, a primeira vencida por Lula, o
PT elegeu 90 deputados federais. 
Bola murcha
Há um desânimo visível no “país do futebol”, impulsionado pelo governo ilegítimo de
Michel Temer. A falta de enfeites nas ruas para saudar a Seleção, como em épocas
passadas, tem sido notada. Nem mesmo sob a botina dos militares, no
tricampeonato de 1970, o brasileiro deixou de torcer. É possível admitir, pois, que a
bola do Brasil murchou. 
Cabo eleitoral irresistível
Um dígito
Geraldo Alckmin é um exemplo da vida dura de um candidato à Presidência pela
segunda vez. É possível que, a quatro meses da eleição, o tucano não resista à
próxima pesquisa. Principalmente se ele permanecer com o porcentual de intenção
de voto com um só dígito.
Como sofre este senhor
Pulo do gato
O empresário João Doria Junior saltou dos 15 meses da prefeitura de São Paulo,
antecipadamente, para ser candidato ao governo do estado. Nos primeiros dias,
entretanto, ele tentou projetar-se como uma possibilidade para a Presidência da
República. Foi enxotado. Mas é um gato à espreita. Caso Alckmin desista, o que
farão os tucanos? Vão recolher-se ao ninho ou, constrangidos, baterão à porta de
Doria? 
O romântico do Planalto
Em cerimônia no Palácio do Planalto, onde lançou o Sistema Único de Segurança
Pública (Susp), o suposto poeta atropelou o coração do suposto presidente. Foi
assim: “Não se pode tratar a criminalidade com rosas na mão”. Arrancou discretos
sorrisos irônicos. 
ÍNDICE
 CRÉDITOS DA PÁGINA: Mauro Pimentel/AFP, Benedikt Von Loebell/AFP e Alexandre Carvalho/A2img
O lustroso cavalheiro está sempre de prontidão
A Medusa
Se Caravaggio conhecesse a ministra Cármen Lúcia, creio que a escolheria como
modelo de uma de suas obras
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Caravaggio escolhia seus modelos nas ruas, desde um grupo de jogadores de
baralho reunidos à volta da mesa de uma estalagem do arrabalde até a cortesã
Fillide Melandroni, iguaria de príncipes e cardeais, personagem de várias telas,
entre elas Judite e Olofernes. De outro nível era a prostituta com a qual viveu por
dois anos, modelo para duas Madonne, a dos palafreneiros e a dos peregrinos.
Formosa de traços mediterrâneos, tinha um filho dos seus 5 ou 6 anos, em nada
parecido com o icônico Menino Jesus e, no entanto, designado para o papel pelo
pintor. Não sei da modelo da Medusa conservada em Florença nos Uffizi, mas ouso
supor que a presidente do Supremo Tribunal Federal funcionaria a contento. 
A ministra Cármen Lúcia de tudo faz para me espantar. Na segunda 11, no
seminário “Trinta anos sem censura: a Constituição de 1988 e a liberdade de
Por Mino Carta
Durma-se com um pesadelo destes...
imprensa”, disse impávida que “sem imprensa livre a Justiça não funciona bem, o
Estado não funciona bem”. Com candura, perguntei aos meus atônitos botões se
porventura, em um repente de sinceridade e insólita sabedoria, teria apresentado as
razões da tragédia em que o Brasil precipita como em um abismo sem fundo. Quem
se faz de bobo, resmungaram os meus soturnos interlocutores, você ou ela? 
A mídia nativa, é do conhecimento até do mundo mineral, defende os interesses da
casa-grande, mesmo porque seus patrões são inquilinos da mansão. Esta não é
liberdade de imprensa, e sim a obrigação de informar da maneira mais conveniente
aos donos do poder. Certo é que no momento a Justiça e o Estado de fato não
funcionam. Melhor, foram demolidos pelo estado de exceção gerado pelo golpe de
2016. 
A ministra Cármen Lúcia, que preside também o CNJ, promotor do seminário, deita
falação sobre um Constituição enxovalhada faz mais de dois anos, brutalmente
rasgada, a turvar o sono eterno de Ulysses Guimarães. Há momentos em que a
argumentação dos meus botões me soa de total coerência. A presidente do STF
acredita realmente que o Brasil vive hoje uma “democracia plena”, onde cada
cidadão exerce “sua liberdade de forma crítica e bem informada?”Trata-se de um
bestialógico arrepiante, de sorte a justificar sérias dúvidas em relação à saúde
mental de quem o desenrola de cara lavada. 
Em artigo recente, publicado na Época, Conrado Hubner Mendes, professor de
Direito da USP, escreve com rara felicidade: “O estilo de Cármen Lúcia escancarou
um costume perverso do STF: a total arbitrariedade do que entra e do que sai da
pauta (...) A agenda constitucional do País tornou-se agenda do STF, e quem
manda nela é uma única pessoa”. O professor refere-se explicitamente, entre outras
situações, ao caso da execução da pena em segunda instância cuja ação deixou de
pautar para que a questão viesse à tona “por ocasião do habeas corpus de Lula”.
Agora, a ministra Cármen Lúcia aventa a necessidade de uma reinterpretação da
Constituição para adequar-se “às transformações vividas nas últimas décadas”.
Quem sabe cogite de uma reformulação capaz de consagrar o estado de exceção,
o impeachmentconforme a vontade da casa-grande, as condenações sem prova, o
loteamento do País para entregá-lo ao capital estrangeiro. 
A Medusa transformava em pedra quem a encarasse, mas Perseu soube como
enfrentá-la instruído por Palas Atena, deusa da sabedoria, que cuidou de
presenteá-lo com uma espada e um escudo destinado a refletir o olhar funesto da
criatura monstruosa. Protegido desta forma, Perseu em segurança avançou contra
ela e cortou-lhe a cabeça. Um herói mitológico, mais Hércules do que Perseu, talvez
pudesse enfrentar a enésima fadiga para consertar o Brasil reduzido a escombros
política, econômica e moralmente. Mas, se viesse Perseu, Sergio Moro já o teria
condenado e encarcerado antes que ele recebesse os presentes da deusa da
sabedoria. • 
Nas barbas do guru
A acusação contra uma quadrilha de doleiros chamusca um sócio de Paulo Guedes,
conselheiro econômico de Bolsonaro, e expõe pecados do “mercado”, berço da
teoria de que privatizar não é bom somente para a economia, mas também na luta
contra a corrupção
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Por André Barrocal
Bolsonaro prepara-se a combinar sua plataforma reacionária com...
 
O “mercado”, essa abstração formada por bancos, fundos, corretoras de valores e
especuladores em geral, está tenso com o hoje imprevisível resultado da eleição.
Seus presidenciáveis prediletos, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles e companhia,
fazem feio nas pesquisas. A aflição tem se revelado na alta do dólar, firme rumo aos
4 reais, apesar de o Banco Central ultimamente atuar de forma pesada no câmbio.
Se a situação está assim agora, espere-se até passar a eleição no México, em 1o
de julho, quando toda a atenção da turma se voltará para cá, comenta um analista
do mercado. Sem opção, parte da banca inclina-se na direção do pré-candidato da
extrema-direita, Jair Bolsonaro, seduzida pelo economista que o deputado escolheu
como guru, Paulo Guedes. Este ajuda a preparar a plataforma bolsonarista com a
paixão neoliberal do Chicago Boy que é. Quer privatizar tudo, pois a mão invisível
do mercado seria não só mais virtuosa na economia, como também na luta contra a
corrupção, um antídoto contra o uso de estatais em negociatas. 
Essa mão aí pode ser leve também. É o que se constata em uma acusação à
Justiça que acaba de sair do forno. Uma história cheia de dólares também e com
dois personagens da órbita de Guedes. A denúncia do Ministério Público Federal
(MPF) atinge 62 pessoas apontadas como integrantes de uma rede doleira. Foi
fechada em 6 de junho, após uma longa investigação sobre 1,6 bilhão de dólares
movimentados por 52 países e 3 mil offshores, empresas em geral abertas em
paraísos fiscais. Os acusados serão processados pelos crimes de formação de
quadrilha, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e corrupção. Vários deles tinham
sido presos preventivamente, no início de maio, por ordem do juiz federal Marcelo
... a paixão neoliberal do Chicago Boy Paulo Guedes
Bretas, da 7a Vara do Rio de Janeiro, quando a Operação Câmbio, Desligo foi às
ruas. Um deles era um executivo do Grupo Bozano, Oswaldo Prado Sanches. Ele
teve um pedido de habeas corpus negado na segunda e na terceira instâncias, mas
vai responder a Bretas em liberdade. No dia 1o, conseguiu um HC no Supremo
Tribunal Federal, de Gilmar Mendes. 
Prado caiu na tarrafa graças às delações de dois doleiros, Vinicius Claret, o Juca
Bala, e Claudio Barboza, o Tony. Com a ajuda dos alcaguetes, os investigadores
descobriram um verdadeiro sistema financeiro clandestino existente desde os anos
1990, conforme CartaCapital contou há um mês. A dupla gerenciava as transações
a partir do Uruguai, para onde havia se mudado por volta de 2003, após o caso
Banestado, um escândalo a botar em cena vários dos mesmos doleiros e
endinheirados de agora. Para controlar os negócios, Juca e Tony tinham um
sistema contábil eletrônico. Sanches era chamado no sistema de “Barbear”, um
trocadilho com o nome do patrão dele, o Grupo Bozano. O codinome foi cadastrado
no sistema em maio de 2006. O registro da última transação com “Barbear” é de,
exatamente, uma década depois. A função principal de “Barbear” na rede
clandestina, segundo os delatores, era providenciar dólares. De 2011 a 2016, teria
arranjado 15,5 milhões. 
A grana, ao que parece, saía do Bozano. Em sua deduragem, Juca diz que o
relacionamento com o grupo começou nos anos 1990, e que o grupo “sempre
vendeu dólares” para o esquema, “através de depósitos em contas bancárias
indicadas” por ele e por Tony. O dinheiro fornecido por Sanches saía às vezes de
uma conta bancária mantida em uma agência do Morgan Stanley em Nova York. É
possível que seja uma conta pessoal do octogenário líder do grupo, o gaúcho Julio
Bozano, uma das maiores fortunas do Brasil, estimada em 1,8 bilhão de dólares
pela Forbes em janeiro. Durante as investigações, Bretas autorizou a quebra de
sigilo de Sanches, e o MPF descobriu um sugestivo e-mail de Sanches para o chefe
com data de 26 de abril de 2017. “Dr. Julio, segue abaixo o e-mail que enviei ao
Luis Romero falando que não será mais necessário ele enviar o relatório sobre a
Juca Bala , um dos alcaguetes, revelou a ligação entre Bozano e Guedes
conta do Sr. junto ao Morgan Stanley.” Pelo que se vê na mensagem encaminhada
no e-mail, Sanches tinha falado com Romero na véspera. Contava ter conversado
naquele dia com Julio sobre a conta nova-iorquina e que não era necessário que o
Morgan Stanley preparasse um relatório a respeito dela. Pelo que Sanches
escreveu, o relatório teria utilidade em uma declaração de Imposto de Renda.
Na
denúncia contra Sanches, o MPF lista alguns negócios feitos pela rede doleira com
a ajuda de “Barbear”. Há, por exemplo, um caso de parceria com o doleiro Rony
Hamoui, codinome “Jacinto”, outro denunciado. Jacinto acionou a rede doleira em
busca de 250 mil dólares para uso no exterior. “Barbear” fez duas transferências em
agosto de 2013, uma de 100 mil dólares, a partir de uma conta no J.P. Morgan em
Nova York, outra de 150 mil de uma agência nova-iorquina do HSBC para a Índia.
Por aqueles dias, “Jacinto” entregou dois cheques ao esquema dos doleiros, em
montante aproximado ao equivalente em reais às 250 mil verdinhas. Esse tipo de
operação é o que se chama de dólar-cabo, uma forma de driblar as autoridades.
Uma compra de dólares sem que haja movimento físico dentro do País. Em uma
das pontas há um interessado em esconder dinheiro no exterior. Na outra, alguém
que precisa de reais aqui. Nos dois casos há crimes por trás. Uma pessoa a
esconder dólares no exterior para não pagar IR, por exemplo. A ponta interna podia
ser pagamento de propina a corruptos. Essa era a essência do serviço prestado
pela rede doleira: unir as duas pontas – em troca de comissão, claro. 
De 2012 a 2015, “Zorro” foi decisivo na evasão de cerca de 13
O bilionário Julio Bozano vai sofrer a revisitação de um escândalo de quase 20 anos atrás
milhões de dólares do Liechtenstein que reaparecem naLava Jato
A denúncia contra “Bar-bear” mostra que, em janeiro de 2014, ele ajudou a rede a
evadir, via dólar-cabo, 143 mil dólares, para ajudar Henri Joseph Tabet, codinome
“Fofinho”, mais um denunciado à Justiça. Essa grana foi de Nova York para a
China. Entre agosto de 2015 e maio de 2016, a evasão da qual “Barbear” fez parte
foi de 730 mil dólares, em negócios que tinham na ponta oposta outro acusado, Wu
Yu Sheng, codinome “Molleja”. Foram cinco transferências. O dinheiro saiu de uma
agência do Citibank em Wall Street, a rua nova-iorquina que é a meca do
financismo global, e foi para Hong Kong, um paraíso fiscal. O Grupo Bozano
também se valia de paraísos, como se pode deduzir do sistema eletrônico de Juca
Bala e Tony. O sistema permitia trocas de mensagens entre os doleiros. Em 21 de
maio de 2014, há uma conversa em que “Barbear” pede para mudar o endereço da
Bozano Limited para outro nas Bahamas. “Fui informado que esse é o novo
endereço da empresa”, escreveu. 
Em
troca dos serviços prestados ao esquema, Sanches recebia cash. Carlos José Alves
Rigaud, colaborador de Juca e Tony na condição de “carregador de mala”, também
se tornou delator e contou que “sempre fazia entregas” para Sanches, “em torno de
150 mil reais por semana”. A grana era deixada na sede do Banco Bozano,
Simonsen, uma instituição que não existe mais, na Avenida Rio Branco, no Centro
do Rio. Ou, então, na Rua 2 de dezembro, número 78, no bairro do Catete, também
no Rio. Este último endereço é o de uma empresa de Sanches, a DH4S. Diante de
todas as descobertas, o MPF diz na denúncia que “resta cristalinamente claro” que
“Oswaldo era um alto executivo do Grupo Bozano”, “tinha amplo acesso às contas
do Grupo Bozano em Nova York”, e que “operava criminosamente” com a rede
doleira para “ocultar movimentação de vultosas quantias, das quais as imputadas
nesta denúncia são apenas parte da operação criminosa”. 
Sanches é homem de confiança de Julio Bozano há muito tempo. Trabalhava no
grupo desde os anos 1980. Após sua prisão preventiva em maio, o Grupo Bozano
passou a dizer que o executivo deixara a empresa no mês anterior. Versão
conveniente, mas esquisita. No registro da Companhia Bozano junto à Receita
“Fofinho”, “Jacinto” e “Molleja”, figuras eméritas de uma quadrilha
Federal, Sanches era apontado ainda em 11 de junho como “presidente”. A história
do “Barbear” permite revisitar um escândalo de quase 20 anos a envolver o
bilionário Julio Bozano. 
Em
1999, havia uma CPI dos Bancos no Senado. Em setembro, a comissão tomou
sigilosamente o depoimento de um empresário que tinha trabalhado no Bozano,
Simonsen, que ainda existia na ocasião. Yssuyuki Nakano disse que operava caixa
2 de Julio e do banco, que administrava uma conta pessoal do magnata em Nova
York. Apresentou, inclusive, uma declaração registrada em cartório, na qual um ex-
gerente-geral do Bozano, Simonsen em Campinas (SP), José Carlos Franz,
afirmava que recebia ordens diretas da presidência do banco para atender a todos
Dario Messer, personagem do escândalo do Banestado, deu uma força ao...
... banqueiro Daniel Dantas com remessas de 3 milhões de dólares para o Opportunity nas Ilhas
Cayman
os pedidos de Nakano, como descontar cheques dele e suas empresas. Segundo
Nakano, de 1990 a 1993, suas empresas tomaram 50 milhões de dólares no banco,
sem sequer ter de apresentar garantias. Parte da bolada teria servido para compras
ilegais de dólares. O depoimento levou a CPI a convocar Julio, que alegou estar no
exterior e mandou dois prepostos no lugar. Levou também o Banco Central a botar
lupa no Bozano, Simonsen. 
Nakano contou sua versão publicamente em maio de 2000 à Folha, com uma frase
forte: “Eu era testa de ferro de Julio Bozano”. Tinha resolvido abrir o bico, pois era
alvo de outra CPI, sobre o narcotráfico, e não queria que sua riqueza fosse
confundida com tráfico – aparentemente, era melhor ser confundido com crime do
colarinho-branco, mais chique. A fiscalização do BC descobriu que, mesmo na pior,
o banco praticara evasão de divisas, ao mandar dólares, em 1998, para os paraísos
fiscais das Ilhas Cayman e das Ilhas Virgens. Em dezembro de 1999, Julio foi
convocado ao BC e teve de assinar um termo de ajustamento de conduta. Em maio
de 2000, conforme o noticiário da época, o BC estava decidido a proibir o
empresário de ter ou de dirigir instituições financeiras. Foi aí que o gaúcho retomou
e concluiu negociações para vender seu banco. Selou o negócio no fim de 2000,
com o Santander. Era o fim do Bozano, Simonsen, fundado nos anos 1960 como o
primeiro banco de investimentos do País, aquele tipo de negócios que não trabalha
com correntistas comuns, mas com grandes transações e clientes ricos. 
Velha imagem do Bozano Simonsen, fundado nos anos 1960 e vendido ao Santander em 2000
Julio voltou ao mercado financeiro em 2013. Fez uma sociedade com Paulo Guedes
na empresa Bozano Investimentos. Esta foi registrada na Receita Federal em 19 de
agosto de 2013 e tem como sócios Guedes, a Companhia Bozano e a Bozano
Partners, entre outros. Sanches, o “Barbear”, participa do arranjo societário. Ele é,
ou era, presidente da Companhia Bozano, como visto anteriormente. A Bozano
Partners foi criada em 11 de julho de 2013, tendo ele como um dos diretores-
executivos. Desde o surgimento da Bozano Investimentos, administradora de 3,5
bilhões de reais em dinheiro de terceiros, Guedes é seu principal dirigente e
estrategista. Comanda o conselho de administração. Guedes disse
a CartaCapital que não sabia das atividades de Sanches com doleiros e que não
comentaria a acusação contra o executivo. Julio e o Grupo Bozano não
responderam ao pedido de informações da reportagem. 
Guedes ganhou holofotes de uns tempos para cá, por ter entrado no time de Jair
Bolsonaro, escolhido para ajudar o presidenciável a ser aceito no “mercado”. É
neoliberal da gema, um Chicago Boy com Ph.D. pela universidade veneradora do
austríaco Friedrich Hayek e do norte-americano Milton Friedman. Como estes,
Guedes acha que o governo só atrapalha a economia. É essa a filosofia do
programa econômico que prepara para o deputado da extrema-direita. Bolsonaro
até já declarou: se vencer, Guedes será seu ministro da Fazenda. Um dos
fundadores do Instituto Millenium, think tank direitista do qual fazem parte o
economista Pedro Malan, o empresário Josué Gomes da Silva, da Coteminas, e
alguns globais, entre outros, Guedes tem difundido a ideia de que “Bolsonaro é o
fenômeno eleitoral da direita” contra “um sistema político degenerado pelo dirigismo
Zelada preso por lavar dinheiro em Mônaco, aprazível recanto também visitado por Sergio
Moro, como será provado nas páginas seguintes
na economia”. Em abril, disse ao Estadão que a “velha política está morrendo em
praça pública, devido à degeneração da política” por causa desse “modelo dirigista,
onde as estatais são os braços usados para fazer governabilidade”. Ou seja, bom
seria deixar tudo com a mão invisível do mercado. 
Fica bem que um juiz de uma vara especializada em crimes
financeiros aceite receber prêmio em um paraíso fiscal?
O que dizer, então, da mão leve do mercado vista no escândalo dos doleiros?
Sanches e o Grupo Bozano não são os únicos representantes do mercado, esse
virtuoso, no esquema. Um dos denunciados é Chaaya Moghrabi, codinome
“Monza”. Sua função na rede clandestina era similar à de “Barbear”, providenciar
dólares e fazê-los chegar a algum ponto no exterior. Onde ele arrumava dólares?
Em sua delação, Tony afirmou que Moghrabi “já trabalhou no Banco Safra, onde
conseguiu uma grande carteira de clientes”. “Monza” foi cadastrado no sistema
contábil eletrônico de Tony e Juca Bala em 2006 e fez o último negócio no ano
passado. De 2011 a 2017, teria ajudado a evadir 239 milhões de dólares. 
Outro egresso do reino da virtude é Diego Renzo Candolo, o “Zorro”, igualmente
denunciado como membro da rede doleira. Tonyafirma tê-lo conhecido entre 2002
e 2003, através de uma pessoa “de quem Zorro tinha sido chefe no Credit Suisse”.
Já Juca Bala diz tê-lo conhecido nos anos 1990, “quando Candolo era
representante do Deutsche Bank”, e que o know-how de “Zorro” era valioso. “Ele
era responsável pela abertura de contas no exterior para serem utilizadas no
exterior, haja vista seu relacionamento com instituições financeiras”, contou o
doleiro. Um exemplo desse know-how posto a serviço da rede é uma conta no
Banco Valartis, no paraíso fiscal de Liechtenstein. De 2012 a 2015, “Zorro” ajudou a
evadir 12,9 milhões de dólares, pelo menos, conforme a contabilidade dos
delatores. Uma parte dos dólares movimentados lá fora com a ajuda dele virava
propina em reais aqui dentro, subornos pagos, por exemplo, pela Odebrecht. “Zorro”
era sócio no exterior de Fernando Baiano, lobista conhecido na Operação Lava Jato
por ajudar negociatas do MDB. 
A
propósito de paraísos fiscais, doleiros e Lava Jato, o juiz Sergio Moro recebeu em 2
de junho um prêmio em Mônaco. O galardão partiu de uma ONG, a Projeto Brasil
Mônaco, criada pela brasileira Luciana Paulina Montigny, esposa do cônsul
honorário do Brasil no principado, o canadense André de Montigny. A entidade tenta
estreitar laços de amizade e culturais entre os dois países. Mônaco é o segundo
Paulo Pimenta lidera a proposta na Câmara de uma CPI das Delações. Conta, obviamente, com a
resistência de Rodrigo Maia
Basto foi aquinhoado por uma mesada de 50 mil dólares por oito anos
menor país do mundo, mas um enorme paraíso fiscal. Ninguém paga Imposto de
Renda, razão para atrair ricaços do planeta. Para obter um golden visa e morar
sossegado, basta prometer investir lá, motivo de os imóveis custarem fábulas. O IR
das empresas é mínimo. Por muito tempo, Mônaco esteve na lista negra de
paraísos fiscais da OCDE. Aí vem a dúvida: pega bem o juiz titular de uma vara
especializada em crimes financeiros aceitar ir a um paraíso fiscal para receber
prêmio? Não deveria ao menos ter aproveitado a chance para dizer ao mundo que
nações mais humildes, como o Brasil, precisam de ajuda para caçar sonegador? E
olha que na Lava Jato condenou um ex-diretor da Petrobras, Jorge Zelada, por usar
um banco em Mônaco para esconder e lavar dinheiro da corrupção. No discurso,
Moro limitou-se a agradecer a colaboração das autoridades locais com a Lava Jato. 
Estranhezas à parte, a denúncia contra a rede de doleiros aponta um como líder da
quadrilha, o sujeito que ficava com 60% dos lucros, um velho conhecido de Moro,
Dario Messer. Hoje foragido, Messer era um dos personagens do escândalo do
Banestado, o caso que primeiro tornou o juiz de Curitiba famoso nacionalmente, no
início do século. Foi graças a esse caso que Messer e seus sócios Juca Bala e
Tony passaram a controlar as operações a partir do Uruguai, ali por volta de 2003,
para ficar longe das autoridades brasileiras. A CPI do Banestado descobriu, entre
outras, que Messer deu uma força ao banqueiro Daniel Dantas, com remessas de 3
milhões de dólares, em 1997, para o Banco Opportunity nas Ilhas Cayman. A
bolada saiu de uma offshore controlada pelo doleiro, a Depolo Corporation. Até
2012, 2013, Messer tinha um banco, o EVG, em Antígua e Barbuda, outro paraíso
fiscal, através do qual fazia negócios para uma clientela de gente fina, como o
empresário Alexandre Accioly, dono de uma rede de academias no Rio investigado
hoje como prestador de serviços clandestinos ao senador Aécio Neves, tucano
enrascado na Justiça. 
Ao
menos até 2009, Accioly era sócio de outros dois recém-denunciados integrantes da
megarrede de doleiros, os irmãos Roberto e Marcelo Rzezinski. Até aquele ano pelo
menos, os três estavam unidos na Empresa Brasileira de Distribuição de Ingressos.
Um quarto sócio era o apresentador Luciano Huck, que era o presidenciável dos
sonhos de Fernando Henrique Cardoso e com quem Paulo Guedes, agora com
Bolsonaro, chegou a conversar para ver se colaboraria de alguma forma, caso o
global se candidatasse. Segundo a denúncia que vão encarar, Roberto e Marcelo
tinham como papel principal na rede doleira ajudar a arrumar a moeda norte-
americana em espécie. Em troca, recebiam pagamentos em reais em um shopping
e um hotel na Barra da Tijuca, no Rio, dinheiro que depois colocariam à disposição
de corruptos do MDB. E assim funciona a relação entre doleiros e endinheirados no
Brasil, um escândalo tratado por aqui com aparente naturalidade. 
Das delações de Juca Bala e Tony, origem das revelações atuais, saiu uma espécie
de bala perdida contra o advogado Antonio Figueiredo Basto, especializado em
delações e bastante atuante na Lava Jato em Curitiba, outra história contada
recentemente por CartaCapital. Segundo os alcaguetes, Basto teria recebido uma
mesada de 50 mil dólares entre 2005/2006 e 2013 para proteger das autoridades as
pessoas que lhe pagavam. Da vaquinha, participariam outros dois doleiros, Richard
Otterloo e um chamado Matalon. Tanto Otterloo quanto a família Matalon acabam
de ser denunciados juntamente com Messer, “Barbear” e companhia. A acusação
de mesada a Basto levou vários partidos, o líder petista Paulo Pimenta à frente, a
propor na Câmara uma CPI das Delações. O pedido reuniu 190 assinaturas válidas,
19 acima do mínimo necessário. O PT vê uma chance de prensar Moro e a
Vejam só o nosso inquisidor em companhia do príncipe de Mônaco
República de Curitiba. O plano parece, porém, ter encontrado um obstáculo
inesperado. Após ter, segundo petistas, se comprometido a instalar a CPI, o
presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do DEM, anda meio contrariado com a ideia. 
Maia, outro neoliberal, é ex-funcionário dos bancos BMG e Icatu. O deputado diz
que a agenda da Casa que preside “tem como foco o mercado”, esse virtuoso da
mão invisível e da mão leve. • 
ÍNDICE
 CRÉDITOS DA PÁGINA: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr, Silvia Constanti/Ag. O Globo, Reprodução, Tv
Globo, Glaucio Dettmar, Paulo Lisboa/Brazil Photo Press/Ag. O Globo, Lula Marques/Ag. PT e Jefferson Rudy/Ag.
Senado
Argentina/ Outra vitória feminista
Em votação apertada, a Câmara aprova a descriminalização do aborto
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Na
manhã da quinta-feira 14, apesar das pressões em contrário do papa e da Igreja
Católica, a Argentina ficou a um passo de se tornar o terceiro país latino-americano
a descriminalizar o aborto, depois de Cuba e Uruguai. Após 22 horas de debates, a
mudança na lei foi aprovada por 129 votos – um a mais do que o necessário – a
125, para a alegria da grande concentração feminista que atravessou a madrugada
gelada às portas do Congresso, enquanto o pequeno grupo antiaborto rezava sobre
o asfalto. Falta a votação no Senado, que deve acontecer em até três semanas,
mas os líderes dos principais blocos dizem que a iniciativa conta com votos
suficientes e o presidente Mauricio Macri prometeu respeitar a decisão do
Congresso. Era uma questão de saúde pública inadiável em um país onde a cada
ano há estimados 450 mil abortos clandestinos, dezenas dos quais (55 em 2015, 43
em 2016) terminam em morte. Que o exemplo sirva ao vizinho do Norte, onde os
números são muito semelhantes.
Devastação no Iêmen
Com apoio aéreo saudita, tropas dos Emirados Árabes Unidos vindas de uma base
na Eritreia lançaram, na quarta-feira 13, um ataque ao porto iemenita de Hodeida, o
mais importante nas mãos das forças houthi que os enfrentam na guerra pelo
controle do Iêmen. Para além da violência no esforço pela conquista da cidade, que
já incluiu o bombardeio e a destruição de um Centro de Controle do Cólera dos
Médicos sem Fronteiras, a operação ameaça estrangular a ajuda humanitária ao
interior do Iêmen, que, devastado pela fome e pela epidemia de cólera, tem esse
porto como único e precário acesso a alimentos e medicamentos.
Europa/ Nau dos aflitos
Resgate de refugiados causa crise diplomática na Europa
Após resgatar 629 refugiadosameaçados de afogamento no Mediterrâneo, inclusive
doentes, feridos e grávidas, o navio Aquarius, operado pelas ONGs francesas
Médicos sem Fronteira e SOS Mediterrâneo, teve o desembarque vetado em Malta
pelo governo do primeiro-ministro Joseph Muscat, e na Itália pelo declaradamente
xenófobo ministro do Interior, Matteo Salvini. Após um longo impasse, o recém-
empossado chefe do governo espanhol, Pedro Sánchez, aceitou recebê-los e a
França prometeu asilo aos que atenderem a seus requisitos. Não é ainda um final
feliz. O navio sobrecarregado enfrenta uma viagem de 750 milhas até o Porto de
Valência com mau tempo, enquanto Roma digladia com Paris e Madri, que a
acusam de cinismo e irresponsabilidade. O governo de Giuseppe Conte os acusa
O Aquarius, mais um pomo de discórdia de uma Europa cada vez mais dividida
de hipocrisia e exige desculpas. Esses países deveriam se unir por um novo modelo
para a União Europeia contra a rigidez alemã, mas a questão migratória envenena
suas relações tanto quanto a política de toda a Europa. 
Coreias/ O amor venceu?
Trump e Kim fazem as pazes no encontro de 12 de junho em Cingapura
Antes a hipocrisia do que a catástrofe. Os dois líderes – ou “dois ditadores”, como
deixou escapar a Fox News em um significativo ato falho – abraçaram-se como
grandes amigos, como se há poucos meses não chamassem um ao outro de
“homenzinho foguete” e “velho caduco de mente transtornada”. Não será surpresa
se Kim Jong-un e Donald Trump forem indicados para o Nobel da Paz, por aliviar o
mundo das tensões por eles mesmos criadas no ano passado, quando pareciam
levar o planeta à beira da guerra nuclear. 
Ambos voltam para casa como vitoriosos aos olhos dos seguidores, mas Kim tem
mais motivos para comemorar. Pôde negociar de igual para igual com uma
superpotência e obteve a suspensão imediata dos exercícios militares conjuntos do
Pentágono e de Seul, oferecendo em troca apenas uma promessa de
desnuclearização, válida apenas se os EUA também retirarem suas armas da
Península. Vale a pena, é preciso concluir, desafiar Washington para obter armas
nucleares e mísseis intercontinentais. 
Nem parece que há pouco se ameaçavam com ogivas nucleares
Justiça/ Suprema hipocrisia
Agora, e só agora, o STF considera ilegais as conduções coercitivas
para interrogatório
A
condução coercitiva para interrogatório, procedimento-padrão na Operação Lava
Jato, é inconstitucional e fere o direito do investigado de não produzir provas contra
si mesmo, decidiu a maioria do Supremo Tribunal Federal na quinta-feira 14. O
instrumento estava suspenso desde dezembro, em razão de uma liminar de Gilmar
Mendes. Além do ministro, votaram contra esse tipo de prática Rosa Weber, Dias
Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e o decano Celso de Mello.A
condução coercitiva foi autorizada pelo juiz Sergio Moro em mais de 50
oportunidades. Em 2016, o magistrado responsável pela Lava Jato na primeira
instância determinou que Lula fosse levado à força para depor sobre supostos
favorecimentos de empreiteiras e do pecuarista José Carlos Bumlai ao petista.
Embora o ex-presidente jamais tenha se recusado a prestar depoimento de forma
espontânea, foi conduzido de forma espalhafatosa por agentes armados até a
unidade da Polícia Federal no Aeroporto de Congonhas. À época, o Supremo
omitiu-se diante da flagrante ilegalidade. 
Quando Lula foi conduzido à força, Mendes fez galhofa. Depois mudou o entendimento e proibiu
a prática por meio de liminar
O interventor perde o seu “braço direito”
O general Mauro Sinott deixou o cargo de secretário do Gabinete de Intervenção
Federal, órgão que assumiu o comando das forças policiais do Rio de Janeiro por
determinação de Michel Temer. A saída ocorreu no dia 6 de junho, mas só foi
confirmada na quinta-feira 14. Comandante da 1ª Divisão do Exército no Rio, Sinott
foi destacado para assumir a 3ª Divisão, no Rio Grande do Sul. Segundo o
Comando Militar do Leste, a mudança já estava prevista desde março, e foi adiada
em razão da crise de segurança no estado. Ele era considerado o braço direito do
interventor Walter Braga Netto, que continua no cargo. 
Marielle/ Três meses sem respostas
A versão apresentada por testemunha-chave é alvo de variadas
suspeitas
Ex-
deputado estadual pelo MDB e conselheiro afastado do Tribunal de Contas do
Estado do Rio de Janeiro, Domingos Brazão foi intimado pela Divisão de Homicídios
da capital a prestar esclarecimentos no inquérito que apura o assassinato da
vereadora Marielle Franco, do PSOL. Os investigadores querem saber se existe
alguma ligação do conselheiro com uma testemunha do caso, que afirmou ter visto
o chefe de uma mílicia da Zona Oeste, Orlando Araújo, e o vereador Marcelo
Siciliano, do PHS, tramando a morte de Marielle. 
A polícia quer saber se Domingos Brazão (detalhe), do MDB, tem ligações com o delator
Há tempos os investigadores desconfiam da versão apresentada pelo delator, um
ex-miliciano cuja identidade permanece sob sigilo. Ao contrário do que disse em
depoimento, Marielle tinha pouca presença no reduto eleitoral do vereador do PHS
e nas áreas controladas pelo grupo de Orlando. Além disso, a testemunha teria
ligação com o agente federal aposentado Gilberto Ribeiro, funcionário do gabinete
de Domingos Brazão. As suspeitas são reforçadas pelo fato de o conselheiro do
TCE ser irmão do vereador Chiquinho Brazão (Avante), um conhecido desafeto de
Siciliano. Todos os envolvidos negam qualquer participação no crime.Em meio à
reviravolta nas investigações, a bárbara execução de Marielle completou três meses
sem respostas. 
“É fundamental que continuemos cobrando justiça, ainda mais em um país com
memória tão curta”, disse Monica Benício, viúva da vereadora, em recente ato
promovido pela Anistia Internacional em frente ao Ministério Público no Rio de
Janeiro. 
“A possível participação de políticos nesse caso não é algo que nos surpreenda. No
entanto, antes de qualquer coisa, prefiro esperar a conclusão das investigações”,
emendou, em entrevista ao jornal O Globo, o deputado estadual Marcelo Freixo,
amigo e padrinho de Marielle na política. 
ÍNDICE
 CRÉDITOS DA PÁGINA: Eitan Abramovich/AFP, Louisa Gouliamaki/AFP, Kevin Lim/AFP, Tania Rego/Abr,
Reprodução Mídia Social e Carlos Moura/STF
Mesmo preso, Lula decide
2018 Com desfecho imprevisível, as eleições seguem atreladas ao futuro do ex-
presidente
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Por Rodrigo Martins
Cabo eleitoral. Fernando Haddad quase quadruplica as intenções de voto quando é apresentado
como o candidato de Lula
 
Preso há mais de dois meses em Curitiba, Lula segue na liderança da corrida
presidencial, com 30% das intenções de voto, além de bater qualquer adversário no
segundo turno, atesta a mais recente rodada de pesquisas do Datafolha, divulgada
no domingo 10. Diante da quase certa interdição judicial de sua candidatura, o
indicador mais relevante da sondagem é, porém, outro. De acordo com o instituto,
30% dos eleitores disseram que votariam com certeza num candidato apontado
pelo ex-presidente e outros 17% talvez trilhem o mesmo caminho. Na verdade, o
potencial de transferência de votos até aumentou. O total de brasileiros com mais
de 16 anos inclinados a seguir a orientação do líder petista passou de 44%, no fim
de janeiro, para 47% em junho. Incapazes de considerar essa variável, as
sondagens eleitorais limitam-se a esboçar cenários inverossímeis.
Com Lula excluído do questionário, Jair Bolsonaro assume a liderança, com 19%.
Marina Silva ocupa o segundo lugar, com porcentuais que variam entre 14% e 15%.
Ciro Gomes é o que mais se beneficia com a interdição do ex-presidente: ganha ao
menos 4 pontos e se consolida na terceira posição, com até 11%. O tucano Geraldo
Alckmin, por sua vez, continua patinando, com 7% das intenções de voto. Quando
incluídos na disputa, os petistas Fernando Haddad e Jaques Wagner figuram com
1%,o mesmo porcentual de Henrique Meirelles, ex-ministro de Michel Temer. Esse
cenário pode, no entanto, ser tão ilusório quanto as predições de uma cartomante.
O que aconteceria se Lula declarasse apoio a um candidato, dentro ou fora do PT?
47% dos brasileiros estão inclinados a votar em candidato indicado
pelo ex-presidente, atesta o Datafolha
Uma pesquisa encomendada pela XP Investimentos buscou testar o talento de Lula
como cabo eleitoral. Quando os pesquisadores apenas mencionavam o nome de
Haddad, o ex-prefeito paulistano figurava com 3% das intenções de voto. Ao
apresentá-lo em outro contexto, com o apoio explícito do ex-presidente, o
porcentual quase quadruplicou. Chegou a 11%, o suficiente para Haddad assumir o
segundo lugar da corrida eleitoral, atrás de Bolsonaro (21%) e empatado com
Marina. A sondagem consultou mil eleitores por telefone de 4 a 6 de junho e tem
margem de erro de 3,2 pontos porcentuais.
Especialistas criticam a metodologia usada pelos pesquisadores. Sondagens por
telefone não são as mais indicadas para traçar cenários eleitorais, e a inclusão da
informação “apoiado por Lula” é controversa. “Isso é uma forma de induzir a
resposta do entrevistado. É mais um aspecto de curiosidade e ansiedade de quem
contrata a pesquisa, para consumo próprio, do que um método científico sério”,
pondera Humberto Dantas, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política
de São Paulo. De acordo com o cientista político, também seria um desequilíbrio em
relação às demais candidaturas apresentar Meirelles como candidato de Temer.
“Faria a sua intenção de voto cair de 1% para 0%”, especula, ironicamente.
Apesar das limitações metodológicas, o estudo tem a sua relevância, por dar pistas
do potencial de transferência de votos do ex-presidente logo de largada e para um
nome concreto. “Não há dúvidas de que Lula é um grande cabo eleitoral. A maior
incerteza é saber até quando o PT vai manter a estratégia de apresentá-lo como
candidato, porque os eleitores começam a perceber que esse cenário não é real. Se
esticar demais o anúncio de um ‘plano B’, fica mais complicado para o partido
viabilizar uma candidatura própria”, avalia o cientista político Cláudio Couto, da
Fundação Getulio Vargas. “Nas eleições, o timing é importante. Se esperar uma
decisão do TSE, que pode ser anunciada a poucas semanas do primeiro turno, o
postulante petista entraria nas eleições atrasado, com a campanha dos adversários
a pleno vapor nas ruas e na televisão. Nesse caso, o apoio de Lula poderia cair no
colo de Ciro Gomes, do PDT.”
Aventura. Com a “âncora presidencial” e o desemprego em alta, Meirelles figura com mísero 1%
das intenções de voto
Para o consórcio político que derrubou Dilma Rousseff, as adversidades avolumam-
se. Apesar da crescente simpatia do setor financeiro, Bolsonaro segue uma
incógnita para os donos do poder. No último Datafolha, cresceu 2 pontos
porcentuais, ainda que dentro da margem de erro da pesquisa. De toda forma,
reduziu-se o ritmo de expansão verificado em sondagens anteriores, observa Couto.
“É provável que esteja se aproximando do teto. Embora tenha uma competente
equipe mobilizando militantes pelas redes sociais, ele terá pouquíssimo tempo na
tevê e seu discurso agressivo, que lhe garante muita visibilidade agora, tende a
prejudicá-lo no debate público.”
Em 2010 e 2014, Marina Silva também iniciou a campanha com um porcentual
elevado de votos, e mesmo assim não chegou ao segundo turno, emenda o
especialista. Diante da dificuldade da Rede em ampliar o leque de alianças e
garantir maior tempo de exposição na tevê, é improvável que se mantenha no
segundo lugar. Alckmin, por sua vez, há meses oscila entre 5% e 7% das intenções
de voto e continua a ser alvo de pressões dentro do PSDB. Os rumores de que o
ex-governador anda inusualmente destemperado, discutindo com correligionários
em restaurantes, alimentam as especulações sobre uma possível substituição do
candidato tucano. O partido não tem, contudo, muitas alternativas.
“João Doria não conta com um porcentual de votos superior e, na atual conjuntura,
dificilmente trocaria o certo pelo duvidoso, uma vez que lidera as intenções de voto
para o governo de São Paulo. Que outro nome o PSDB poderia apresentar?”,
indaga Couto. Alckmin confia que o início da campanha na tevê o fará crescer nas
pesquisas, o que parece crível pelo tempo reservado ao seu partido. Seu maior
desafio será descolar a imagem do PSDB de Temer, uma âncora que arrastará para
o fundo todos os que estiverem em sua volta. “Meirelles, com seu proverbial
carisma, ainda não percebeu isso. Parece viver um devaneio.”
Os candidatos com imagem associada a Temer sofrem nas
pesquisas eleitorais
Na última rodada do Datafolha, Temer conseguiu bater o próprio recorde de
impopularidade. Agora é rejeitado por 82% dos brasileiros e aprovado por míseros
3%. O pessimismo em relação ao futuro do País está escancarado. Para 32%, a
situação econômica vai piorar e outros 38% acreditam que ficará do jeito que está.
A maioria dos entrevistados tampouco acredita que o desemprego vai cair, como
tem propagandeado o governo. Sobram razões para desconfiar da promessa. No
primeiro trimestre de 2018, a taxa de desocupação voltou a crescer, atingindo
13,1% da população, um contingente de 13,7 milhões de desempregados, segundo
a Pnad Contínua, do IBGE.
Não é tudo. Após a draconiana reforma trabalhista imposta pela equipe de Temer,
os empregos com carteira assinada continuam em queda. No último trimestre,
caíram 1,2%. O número absoluto é o menor da série histórica, iniciada em 2012.
Além disso, o atual titular da Fazenda, Eduardo Guardia, admite que o governo terá
de revisar para baixo as projeções de crescimento do PIB. Atualmente, o Planalto
prevê uma alta de 2,5% em 2018. Segundo o boletim Focus, do Banco Central, os
analistas do mercado já reduziram suas previsões de 2,18% para 1,94%.
O
Fervura. Estagnado nas pesquisas e distante de Bolsonaro, o tucano Geraldo Alckmin volta a ser
pressionado no PSDB e se depara com velhos fantasmas
diminuto número de intenções de voto fragiliza Meirelles, que passou a ser
contestado dentro de seu próprio partido. Um grupo de parlamentares
descontentes, puxado por Fabio Ramalho e por Osmar Terra, quer largar o ex-
ministro da Fazenda na estrada e substituí-lo por Nelson Jobim. “Ele é a melhor
alternativa para o momento. Tem conhecimento, tem boa relação com a esquerda e
a direita, foi ministro do Supremo, ministro da Defesa”, afirmou Ramalho ao Estado
de S. Paulo. Somente depois, verificou-se um impeditivo. Jobim não está filiado ao
partido e perdeu o prazo para o registro, até 2 de abril. Ademais, que diferença faria
trocar de candidato com Temer de âncora?
Diante do banho de água fria, líderes de partidos governistas trataram de minimizar
as revelações do Datafolha. “Não tem surpresa nenhuma, são números que já
vinham sendo desenhados. O quadro continua muito aberto”, disse ACM Neto,
presidente do DEM e prefeito de Salvador. “Desses nomes, exceto Lula, não vejo
nenhum candidato que possa empolgar. A única coisa que permanece é a
polarização entre direita e esquerda”, emendou José Rocha, líder do PR na
Câmara. Segundo o deputado Marcus Pestana, secretário-geral do PSDB, a eleição
“não está no cardápio de 90% dos brasileiros”. Como previsto, nenhuma admissão
de culpa pelo fracasso do projeto golpista.
Se não apresentar um substituto até 17 de setembro, o PT pode
ficar sem cabeça de chapa, alerta especialista
É por essa razão que Guilherme Boulos, pré-candidato à Presidência pelo PSOL,
confia na presença de ao menos um candidato de esquerda no segundo turno.
“Todos os demais postulantes defendem o projeto neoliberal de Temer, alguns
assumidamente, outros de forma envergonhada, mas a essência é a mesma. Trata-
se de um projeto rejeitado pela ampla maioria da população, derrotado nas urnas
por quatro eleições”, resume.A opinião está, porém, longe de ser consensual entre
as lideranças do campo progressista. Algumas delas advogam por uma aliança
ainda no primeiro turno, a exemplo dos governadores Flávio Dino (PCdoB) e Camilo
Santana (PT), embora este seja historicamente ligado ao grupo político de Ciro
Gomes.
O principal obstáculo é a estratégia petista de levar a candidatura de Lula até as
últimas consequências, forçando o Judiciário a assumir o ônus político de retirá-lo
da disputa. Não serão poucos os aspectos que o PT terá de analisar com cuidado.
De acordo com o advogado Fernando Neisser, da Academia Brasileira de Direito
Eleitoral e Político, tem até 17 de setembro para solicitar a mudança do cabeça de
chapa. Depois disso, não haveria tempo hábil para a Justiça Eleitoral carregar a foto
do novo candidato nas urnas eletrônicas. Até alguns anos, isso não era um
problema, tanto que a mulher de Joaquim Roriz chegou a disputar o governo do
Distrito Federal, em 2010, com a imagem do marido, barrado pela Lei da Ficha
Limpa. A partir de 2012, a prática foi considerada fraude, e estabeleceu-se o prazo.
O PT também terá de calcular outro risco. Caso o Tribunal Superior Eleitoral negue
a candidatura de Lula, o ex-presidente poderá recorrer ao Supremo Tribunal
Federal e continuar na disputa até que a condenação criminal do ex-presidente seja
julgada em todas as instâncias. Na hipótese de vencer as eleições, mas não
conseguir reverter a condenação posteriormente, novas eleições serão convocadas.
“Até 2015, o segundo colocado levava a disputa nesses casos, mas a legislação
mudou”, explica Neisser. De acordo com relatos na mídia, ministros do TSE
articulam-se para impedir a candidatura de Lula por ofício no ato do registro de
candidatura. Tal decisão não encontra respaldo na lei, tampouco na jurisprudência,
emenda o especialista.
A
medida de exceção não causaria surpresa, a julgar pelo longo histórico de
“excepcionalidades” no processo contra Lula, condenado sem provas por
representantes do Santo Ofício curitibano. E as viradas de mesa no Judiciário só
aumentam o caráter imprevisível da disputa deste ano, a mais pulverizada desde
1989, quando o outsider Fernando Collor roubou a cena, com o inestimável apoio
da mídia e sua máquina de propaganda. •
ÍNDICE
 CRÉDITOS DA PÁGINA: Douglas Magno/AFP, Paulo Pinto,Antonio Cruz/ABR, Aloisio Mauricio/Fotoarena,
Heuler Andrey/AFP, Paulo Whitaker/Reuters, Mauro Pimentel/AFP e Elza Fiúza/ABR
Apostas. Se demorar demais para lançar um “plano B”, o apoio de Lula pode cair no colo de
Ciro. Boa de largada, Marina não costuma manter o desempenho até o fim
Antipetistas de velas na
mão
Lula segue fortíssimo nas pesquisas e a eleição caminha para um
desfecho indesejado para a coalizão que derrubou Dilma
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A semana começou mal para os adversários de Lula e do PT. Foram dormir
esperançosos no sábado, como as crianças que acham que vão ganhar presentes
de Papai Noel na manhã do Natal. Que decepção! Receberam péssimas notícias no
dia seguinte, com os números do último Datafolha. 
Os antipetistas relacionam-se de maneira curiosa com o Datafolha, a empresa de
pesquisas da Folha de S.Paulo. Talvez por saber que o jornal compartilha as suas
preferências, sempre imaginam que os resultados de novos levantamentos do
instituto serão “bons”, isto é, iguais ao que pensam. Às vezes, no entanto, se
desapontam. 
A nova pesquisa tem um só resultado relevante, que foi, no entanto, tão diluído pelo
tratamento editorial a que foi submetido que quase passou despercebido. Tirando
obviedades e insignificâncias, ela mostrou que Lula continua fortíssimo e que a
eleição caminha para o desfecho indesejado pela coalização política, empresarial,
judicial e midiática que derrubou Dilma Rousseff, perseguiu o ex-presidente e o
levou para a cadeia. 
Não foi a primeira pesquisa que os frustrou. A rigor, desde outubro de 2016, não
houve uma única com resultados que pudessem festejar. Todas foram unânimes ao
apontar a liderança do PT e de Lula, preservada mesmo com a caçada e a prisão.
Todas a mostrar que os que mais sofreram foram os que quiseram destruí-los, no
Judiciário, na imprensa e no empresariado, sem falar nos partidos e lideranças
políticas que se apoderaram do governo. Enquanto a imagem de Lula e do PT se
recuperou e cresceu, a confiança e a avaliação dessas instituições nunca esteve
em nível tão baixo. Quase mais ninguém acredita nelas. 
Assim como na divulgação de pesquisas anteriores, também agora a Folhafez o
possível para não chamar atenção para o dado relevante. A manchete do domingo
foi típica, destacando que a rejeição a Michel Temer “(...) salta para 82%”. Como se
houvesse novidade ou interesse na (im)popularidade do personagem. 
Tampouco foram surpreendentes os resultados relativos às chances de Lula na
eleição. A pesquisa confirmou a larga vantagem que o ex-presidente tem diante de
quaisquer candidatos, em primeiro e segundo turnos. Lula permanece como favorito
a vencer a eleição, apesar de tudo o que contra ele é dito e feito. Para quem, como
o jornal, raciocina com a hipótese de Lula não poder ser candidato, as respostas à
pergunta que interessa só foram mostradas nas páginas internas, em texto tortuoso:
“Apoio de Lula pode aumentar chances de candidato, segundo Datafolha”. 
Por que um título com tanta condicionalidade e cautela? O próprio contratante e
dono do instituto estaria colocando em dúvida a pesquisa? Em português claro e
respeitando os números do levantamento, o que a pesquisa mostrou foi que 30%
dos entrevistados “votariam com certeza” e 17% “poderiam votar” no candidato a
presidente indicado por Lula, um total de 47% do eleitorado. Ou seja, que o apoio
do ex-presidente quase certamente colocaria um nome no segundo turno da eleição
(ou, quem sabe, a depender da performance na campanha, em condições de até
vencer em um turno). 
Igualmente importante é ver que essa proporção se mantém estável nos últimos
meses, apesar da condenação por aqueles juízes de Porto Alegre e da prisão.
Segundo o Datafolha, no fim de janeiro, a soma desses contingentes alcançava
44% do eleitorado, com 27% afirmando que “votaria com certeza” no candidato
apontado por Lula. Em abril, o total foi a 46%, dos quais 30% dizendo “com
certeza”. Agora em junho, chegamos aos 47% que levaram o articulista a dizer que
o apoio de Lula “pode aumentar (as) chances...” Difícil falar de um número tão claro
de modo tão dissimulado. 
Qualquer especulação a respeito de como se sairiam nomes que Lula poderia
apoiar é hoje impossível. Seus eleitores querem mesmo é votar nele e só não o
farão se forem proibidos. Por enquanto, a única coisa que sabemos é que seu
potencial de transferência é muito grande. 
O PT, por tudo que se vê e de acordo com a pesquisa, deverá estar no segundo
turno da eleição e seu adversário mais provável, como era previsível desde o ano
passado, é Jair Bolsonaro. Quem não gostar desse cenário que vá se
acostumando. Enquanto isso, pode continuar acendendo velas para que um futuro
Os frutos da reforma
agrária
SAÚDE Responsáveis pela maior parte da produção de alimentos orgânicos do País,
agricultores familiares e assentados resistem à falta de incentivo estatal
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O gaúcho Cleomar José Pietroski, de 36 anos, engrossava o público de 10 mil
participantes da 17ª Jornada da Agroecologia, realizada em Curitiba de 6 a 9 de
junho. Além da exposição de produtos da agricultura familiar, o evento promovido
pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra serviu como palco de debates e
palestras. Morador de um assentamento em Nova Santa Rita, na Região
Metropolitana de Porto Alegre, Pietroski é produtor de arroz orgânico em uma área
de apenas 12 hectares. 
Por René Ruschel, de Curitiba
O agricultor é um daqueles que acreditam na força da união. Somado a outras 546
famílias distribuídas em 16 assentamentos do MST no estado, ajudou a transformaro Rio Grande do Sul no maior produtor de arroz orgânico da América Latina. Na
safra 2016-2017, foram cultivados 4.886 hectares e colhidas 464.409 sacas. Um
dos desafios do movimento, além de superar os obstáculos pela falta de políticas
públicas do governo Temer, é justamente apresentar esses resultados à sociedade,
para provar que a reforma agrária no Brasil é muito mais do que apenas assentar
pessoas. 
“No início, a meta principal do movimento era garantir terra para trabalhar e criar as
famílias. A visão era até um pouco ingênua: terra para quem nela trabalha. É um
princípio justo, porém insuficiente para resolver os problemas da produção de
alimentos. Na medida em que evoluímos, fomos adequando o nosso programa e
incorporando a agroecologia”, explica João Pedro Stedile, coordenador nacional do
MST. O modelo agroecológico, segundo o dirigente, é antagônico ao do
agronegócio, porque este último “visa o lucro a qualquer custo, usando agrotóxicos,
transgênicos e maquinário, o que afasta os trabalhadores rurais do campo”. O
projeto do MST é exatamente o oposto. Produzir alimento de qualidade, saudável,
destinado, prioritariamente, às famílias de baixa renda. 
Para ele, é preciso ir sempre além. Cita o modelo de países europeus onde a
produção de orgânicos segue em ritmo acelerado. A Dinamarca pretende
transformar 100% de sua agricultura em orgânica, eliminando de vez o uso de
agrotóxicos. A primeira fase acontece até 2020, quando o volume de terras com
plantações orgânicas deve ser o dobro da área atual. Em terras verde-amarelas,
nossas lavouras consomem cerca de 1 milhão de toneladas de agrotóxico por ano,
uma média de 5,2 quilos por habitante, segundo um estudo do Instituto Nacional do
Câncer. 
Na contramão das nações europeias, o Brasil é recordista em uso
de agrotóxicos
No Brasil, de acordo com os dados do Centro de Inteligência em Orgânicos,
da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), a área plantada com orgânicos chega
a 750 mil hectares. O País ocupa a 12ª posição entre os principais produtores e o
quinto lugar entre os países emergentes, atrás de Uruguai e Argentina. Estima-se
que o mercado brasileiro apresenta um crescimento de 20% ao ano. Dos atuais 15
mil produtores certificados ou em processo de transição, 75% estão na agricultura
familiar. 
Por aqui, os incentivos fiscais só chegam aos produtores do agronegócio. A isenção
de IPI e redução de 60% do ICMS são dois exemplos clássicos. Os produtores de
orgânicos não têm nenhum desses benefícios. Daí um dos motivos de os produtos
dessa linha serem mais caros para o consumidor. Outra questão é o desmonte dos
programas e projetos de políticas públicas promovido, a partir de 2016, pelo atual
governo. 
Criado em 2003, no início do primeiro governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, o Programa de Aquisição de Alimentos era o principal incentivo para o
aumento da produção de orgânicos. Tinha dois objetivos básicos: possibilitar às
famílias de baixa renda o acesso à alimentação e incentivar a agricultura familiar. O
mecanismo era simples: o governo financiava e depois comprava a produção para
ser distribuída às entidades carentes. Desde 2016, todo esse esforço veio por água
abaixo. 
Para se ter uma ideia das dificuldades vividas pelos pequenos produtores, a
dotação orçamentária desse programa, em 2015, na segunda gestão de Dilma
Rousseff, era de 32,8 milhões de reais. Em 2018, o valor despencou para 3,2
milhões, um décimo de três anos atrás. Os recursos federais são repassados à
Companhia Nacional de Abastecimento. Por meio das cooperativas de produtores,
a empresa pública repassa os valores ao produtor no campo. “Nossa cooperativa
recebia, em média, de 6 a 7 milhões de reais por safra para financiar todo o
processo produtivo de nosso assentamento. Hoje, recebemos cerca de 300 mil”,
relata Pietroski. 
O
drama vivido pelo gaúcho é o mesmo de milhares de outros assentados. Com isso,
Ceres alerta para os malefícios dos pesticidas. Pietroski queixa-se da redução brutal de
financiamento para os pequenos produtores
as famílias de baixa renda deixam de receber os produtos e os cooperados não
conseguem vender o que produzem. Ainda segundo Pietroski, quase a metade da
produção de arroz da safra passada permanece depositada nos armazéns à espera
de compradores. 
O caminho tem sido a busca do mercado formal. Uma das contradições é de que as
grandes redes de abastecimento, quando se propõem a comprar, exigem que a
marca do produto estampada nas embalagens seja a bandeira do supermercado.
Essa prática mostra o preconceito em relação à reforma agrária e aos movimentos
de luta pela terra. 
Ceres Hadich, engenheira agrônoma, mestre em agroecologia e agricultura
sustentável, além de integrante da direção nacional do MST, explica que um dos
objetivos da jornada agroecológica é justamente conscientizar os agricultores e a
sociedade dos malefícios e danos causados à saúde pelo uso excessivo de
agrotóxicos. “Nos últimos anos, a feira tomou outra dimensão, ao ampliar seu
enfoque até então voltado para as questões de produção e conscientização interna
do Movimento. Era preciso atingir a sociedade como um todo. Transformamos a
feira em uma grande vitrine”, comenta. 
No documento final, os organizadores do encontro questionam: por que o
agronegócio no Brasil insiste em liberar agrotóxicos nos alimentos em uma
quantidade 400 vezes superior à média europeia? A quem interessa a redução das
políticas públicas que apoiam a produção de alimentos de qualidade para o povo
brasileiro? Como enfrentar a indústria cultural que reforça preconceitos e promove
um modo de vida que nos adoece? 
Algumas pistas estão no Projeto de Lei nº 6.299, de 2002, o chamado “Pacote do
Veneno”, em discussão na comissão especial da Câmara dos Deputados. A
proposta é de autoria do então senador Blairo Maggi, hoje ministro da Agricultura. O
colegiado que vai decidir se o texto segue para votação em plenário é composto de
26 deputados, dos quais 20 fazem parte da bancada ruralista, ligados ao lobby da
indústria de agrotóxicos. Além de pequenas firulas, como mudar a expressão
“agrotóxico” por “defensivos fitossanitários”, o projeto regulamenta o uso de novos
venenos nocivos à saúde humana e ao meio ambiente. Uma verdadeira luta de Davi
contra Golias. Alguém se arrisca a prever o resultado da votação? • 
ÍNDICE
 CRÉDITOS DA PÁGINA: René Ruschel e Gibran Mendes
O horizonte das cidades
DIÁLOGOS CAPITAIS O novo ciclo de investimentos nas metrópoles não pode
repetir os erros do século XX
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Um novo ciclo de investimentos públicos nas metrópoles não pode repetir os erros
da expansão urbana do século XX, avalia Marco Aurélio Crocco, diretor-presidente
do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais. “Pensar a sustentabilidade não é
só plantar árvores. O desafio é promover uma nova revolução, ampla e inclusiva,
que some o estímulo ao mercado de capitais e a atuação das instituições
financeiras estatais.” 
Crocco foi um dos debatedores da segunda etapa do ciclo de seminários “Bancos
Públicos e o Desenvolvimento Econômico e Social”. Realizado em Belo Horizonte
Por Karla Monteiro
1. Jair Ferreira, presidente da Fenae
2. Maria Fernanda Coelho, ex-presidente da Caixa
3. Marco Aurélio Crocco, presidente do BDMG
4. Luiz Gonzaga Belluzzo, economista
na quarta-feira 13, o debate teve como tema central o financiamento da
infraestrutura nas cidades. 
Segundo o executivo, repensar a atuação dos bancos públicos é o ponto de partida
para enfrentar o que chamou de desafios contemporâneos. “Com a crise do
pensamento keynesiano nos anos 1980, a meta passou a ser a estabilidade
monetária. Os bancos públicos e de investimento deixaram de ter papel. Aí começa
o processo de privatização. A Associação Latino-Americana de Desenvolvimento
tinha 173 instituições filiadas em 1980. Hoje tem 75”. Crocco acrescenta: “Não é só

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