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Dialética de Um Detento - Uma Análise marxista da música "Diário de um Detento"

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UNIVESIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE 
FACULDADE DE DIREITO 
 
 
 
 
 
 
A DIALÉTICA DE UM DETENTO 
Uma análise marxista sobre a música “Diário de um Detento” 
 
 
 
 
 
Alef Granjero: 3141140-1 
Bruno Carenzi : 413586-3 
Pedro Henrique Varrichio da Silva:3147547-7 
Marcos Antônio LeForte: 3141078-2 
William Pimentel: 3144722-8 
 
 
 
 
SÃO PAULO – SP 
Novembro - 2014 
2 
 
1. INTRODUÇÃO: 
O escopo do presente trabalho é examinar os precedentes, 
consequências e razões que levaram o Governo do Estado de São Paulo em 1992, 
sob o comando do então governador em exercício Luís Antônio Fleury, a 
autorizar o Massacre da Casa de Detenção de São Paulo ou simplesmente O 
Massacre do Carandiru que ficou imortalizada na letra “Diário de um Detento” 
escrita pelo ex-presidiário Jocenir e cantada pelo grupo de rap “Racionais-Mc ” 
na voz de “Mano Brown”. 
Encaramos o desafio de apresentar essa pesquisa com muita 
responsabilidade e forte carga emocional, pois o ocorrido não teve seu desfecho 
no momento mais trevoso da história brasileira que foi claramente o regime 
militar com todo seu aparato repressivo, mas sim na roupagem democrática 
alguns anos após a fundação da Nova República sob a égide da “Constituição 
Cidadã” que inaugurava em seu bojo a noção dos Direito Fundamentais, bem 
como o principio maior da Dignidade Humana. 
A Casa de Detenção de São Paulo foi cenario da batalha mais cruel e 
visível de uma classe em ascensão que facilmente descartou os indesejáveis para 
a nova sociedade em construção que ora se assenhorava no horizonte. Alguns, 
apontavam para um sistema que possuía uma eficiência de concretização dos 
seus interesses, enquanto outros, marginalizados e tratados como animais, 
padeciam sob o julgo daqueles que em nome da “ordem, moral e bons costumes ” 
os satanizavam e reduziam sua história a um conglomerado de artigos penais sem 
ao menos lançar sobre estes uma luz de esperança e compartilhamento de uma 
sociedade mais fraterna depois que pagassem por suas faltas. 
Para a sociedade paulista da época, era um genocídio popular 
anunciado há muito tempo. A penitenciária que se localizava no bairro do 
Carandiru, engolia mais corpos e detentos do que sua própria capacidade física 
poderia suportar, amontoando homens de todas as idades e crimes variados em 
uma velocidade nunca antes vista na história recente do Brasil. Diga-se, que no 
dia do Massacre foram mortos, segundo dados oficiais, apenas 111 mortos, no 
3 
 
entanto, os sobreviventes afirmam que a violência policial estendida até os dias 
atuais foi capaz de fazer mais mortos do que o contabilizado. 
O Rap “Diário de um Detento” foi uma adaptação dos escritos do ex-
detento Jocenir que foi capturado pela polícia em 1994 e cumpriu pena no 
referido presidio após a ocorrência do massacre. Jocenir vinha de classe média, 
empregou seus conhecimentos e logo foi ganhando notabilidade entre os 
presidiários por não usar drogas e registrar em um livro de memórias tudo o que 
se passava dentro da cela e corredores da cadeia, conferindo a ele a alcunha de 
“Tiozinho da Caneta”. Jocenir conheceu o então “Mano Brown” que cumpria 
também reclusão, da qual surgiu uma parceria para compor a música em questão 
que logo atingiria a marca 52 º na Rolling Stones em 1998 e num só contra 
ponto, se tornaria o hino por excelência dos “manos da quebrada”. 
Visto o fato sob a perspectiva marxista, é possível deslindar fatores 
na própria letra cantada pelo grupo de como o Estado e a Sociedade Brasileira, 
ainda embebidos do autoritarismo herdado do regime militar, tratavam seus 
próprios delinquentes – observando atentamente as causas sociais que levavam 
muitos homens a cometer crimes , como se dirá, primários e receber penas tão 
insuportáveis. 
A presença do Estado que se fazia conhecido entre as periferias 
somente através do poder policial, relata uma sociedade que fecha seus olhos 
para um local que se apresentava propriamente como um bário de pólvora, e 
mesmo sabendo da gravidade de uma possível rebelião há poucos metros do 
centro, ignoravam – estavam mais preocupados com seus bens matérias – 
demonstrando um individualismo levado ao seu limite máximo. 
Se todo o réu é um oprimido pela conjunção processual na espera da 
justiça, o detento também o é – pois é visto como um pária e proscrito perante a 
família, amigos e tem delegado para si um futuro sem esperança e total 
abandono. 
4 
 
A prisão, que tem sua origem na própria pena canônica das 
masmorras da Idade Média, segundo seus fundadores, recebe a herança de fazer 
até a atualidade o preso refletir sobre sua falta social e procurar nunca mais 
comete-la – algo completamente impossível, pois a sociedade não aceita de bom 
grado um ex-presidiário mesmo depois de cumprir sua pena – condenando-o 
novamente a marginalização e exclusão do sistema. 
Para realizar esta pesquisa, nos utilizamos do conteúdo bibliográfico 
disponível, pesquisa sobre os antecedentes e relatos de quem vivenciou a 
realidade carcerária do Carandiru, bem como reprodução de imagens e análise 
sistêmica da canção “Diário de um Detento” sob a óptica marxista. 
Nosso trabalho não tem como meta apontar culpados, acusar 
qualquer instituição ou até mesmo satisfazer os espíritos mais emocionados com 
um juízo de valor, pelo contrário, pretendemos lançar luzes sobre este episódio 
que marcou a história recente da sociedade paulista e brasileira, não permitindo 
seu esquecimento e indagando, mais uma vez, sobre a própria lógica do sistema 
carcerário e a possibilidade de outras chacinas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
2. HISTÓRICO DO INFERNO: O CARANDIRU 
 
A Casa de Detenção de São Paulo foi inaugurada no ano de 
1920 com o projeto do arquiteto Samuel da Neves. A penitenciaria já 
chegou a abrigar mais de 8 mil homens, se configurando como a maior da 
América Latina em números reais. É valido ressaltar que o presidio foi 
planejado para atender aos desígnios do Código Penal chancelado em 
1890, traduzindo sua referência arquitetônica por atender aos pressupostos 
pelo direito positivado na época. 
Vale lembrar a curiosidade de que o próprio Stefan Zweig - 
amigo pessoal de Sigmund Freud – teceu elogios ao sistema do presidio, 
apontando novamente como modelo, pois desde a limpeza do presidio até 
a própria comida, eram atribuídas como trabalho para os reclusos – 
configurando o presídio como uma grande fábrica de trabalho. O próprio 
presidio, na época, se tornou até mesmo cartão postal da cidade. 
A partir do governo Vargas, em 1940, o presidio passa a 
padecer com a super lotação e a má administração – começando a existir 
entre os presos maiores tentativas de brigas, rebeliões e fugas. Várias 
tentativas foram planejadas a fim de conter os problemas que se 
assomavam no complexo penitenciário, sendo a última, capitaneada por 
Jânio Quadros em 1956, de construir um complexo adjacente aos 
pavilhões existentes elevando sua capacidade para pouco mais de 3.560. 
O problema começa a se agravar com o deferimento do golpe 
político em 1964 que culminou com a ascensão dos militares ao poder, 
reprimindo manifestações populares e prendendo em mesma cela 
homicidas, estelionatários, estuprados e professores universitários contra o 
sistema. 
Muitos dos presos, só tiveram contato com educação ou 
literatura após conviverem mais pessoalmente com estes presos políticos 
de clara orientação progressista. 
Com o fim do regime militar e a inauguração da então “Nova 
República” em 1985, o presídio já havia chego à muito em seu limite 
6 
 
máximo e mesmo assim recebia cada vez mais marginais das várias 
regiões da Grande São Paulo. 
No entanto, somente em 02 de outubro de 1992, após uma 
briga que teve sua origem emum desentendimento entre dois reclusos por 
causa de um pacote de cocaína, foi acionada a política militar do Estado 
de São Paulo para conter – em uma operação mal planejada e 
despreparada – a rebelião iniciada no Pavilhão 09 que logo se alastrou por 
todo o complexo, culminando com o maior massacre de presidiários já 
presenciado na América Latina, ganhando, na época projeção 
internacional. 
A polícia militar de São Paulo, tal como o Governador em 
exercício, afirmaram que só foi “executado” quem investiu contra os 
policiais e portavam armas ilícitas, porém, o laudo pericial alega que em 
todas as celas, as trajetórias dos disparos indicavam atirador posicionado 
na soleira da porta apontando sua arma para os fundos ou laterais da 
cela;Não se observou quaisquer vestígios que denotassem reação dos 
presos, tais como vestígios de disparo na direção oposta aos descritos; 
Dadas as condições observadas pela perícia, pôde-se inferir 
que o objetivo principal da operação foi conduzir parte dos detentos à 
incapacitação imediata (ou seja, morte); O local foi violado antes da 
chegada da perícia, com a remoção dos cadáveres do local em que foram 
mortos e com a retirada de inúmeros estojos (cápsulas, no linguajar 
popular) vazios, notadamente de metralhadora (nenhuma foi encontrado 
pela perícia). 
Mesmo após o genocídio do cárcere, a penitenciária continuou 
funcionando até ser desativada no ano 2000, tendo seus presos 
transferidos para outros presídios no interior de São Paulo. 
 
 
 
 
7 
 
3. RACIONALIZANDO A PERIFERIA: RACIONAIS MC’S 
 
O grupo de Rap, Racionais Mc’s, nasceu em 1988 na periferia 
de São Paulo, retratando em suas letras a truculência policial, crime 
organizado, a repressão estatal, discriminação social e a latente exclusão 
dos jovens negros. O Grupo ganhou grande notabilidade em 1991 quando 
abriu no parque Ibirapuera o show do grupo norte-americano “Public 
Enemy”. 
Com a crescente fama, Racionais Mc’s retratavam em suas 
letras ritmadas a dificuldade enfrentada pelos moradores da periferia que 
tinham como saída para sobreviver vender sua força de trabalho para os 
mais abastados ou encontrar uma solução na vida criminosa. 
Em 1994, em um show realizado no Vale do Anhangabaú, o 
líder do grupo conhecido como “Mano Brown”, foi detido pela polícia 
paulista acusado de incitar a violência entre os jovens. Neste fato, foi 
sentenciado a cumprir pena na Casa de Detenção de São Paulo – 
Carandiru. 
Mano Brown que já gozava de grande popularidade na 
periferia foi logo recebido com respeito dentre os reclusos, onde conheceu 
o presidiário Jocenir. Desta parceria, unindo a revolta em comum e a vida 
tormentosa na cela, nasceu a obra-prima do grupo: “Diário de um 
Detento”. 
Retratando o dia-a-dia no presídio, a música atinge seu clímax 
ao descrever o que foi o “Massacre do Carandiru” no imaginário do 
presidiário, fornecendo grande carga crítica do modo como os presidiários 
são tratados tanto pelos internos quanto pela sociedade em si, agravando 
os traços discriminatórios e reconduzindo, para sua própria necessidade, a 
volta no crime. 
“Diário de um Detento” analisa as características do preso em 
si, acentuando a diferença social e econômica persistente, a discriminação 
da sociedade em relação o preso e a busca alternativa de se livrar dos 
párias que incomodam os homens e mulheres de bens. O outro, infrator, é 
8 
 
retratado como o ápice da degradação – sendo comparado com o mal 
moral Católico – Lúcifer. Dividindo outra vez a sociedade entre: Eles e 
Nós. 
A música rendeu ao grupo a respeitável classificação no 
ranking da Rolling Stones de 1998 na posição 52º de 100. Exportando o 
Rap para fora da periferia e retratando em letras duras a vida ignorada de 
quem mora em regiões marginais ao Centro. 
O Grupo não lança há 12 anos nenhum disco, mas já anunciou 
a volta aos palcos com data marcada para o dia 20 de dezembro de 2014. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
3.1. LETRA DA MÚSICA: DIÁRIO DE UM DETENTO 
 
São Paulo, dia 1º de outubro de 
1992, 8h da manhã. 
 
Aqui estou, mais um dia. 
Sob o olhar sanguinário do 
vigia. 
Você não sabe como é 
caminhar com a cabeça na mira 
de uma HK. 
Metralhadora alemã ou de 
Israel. 
Estraçalha ladrão que nem 
papel. 
Na muralha, em pé, mais um 
cidadão José. 
Servindo o Estado, um PM 
bom. 
Passa fome, metido a Charles 
Bronson. 
Ele sabe o que eu desejo. 
Sabe o que eu penso. 
O dia tá chuvoso. O clima tá 
tenso. 
Vários tentaram fugir, eu 
também quero. 
Mas de um a cem, a minha 
chance é zero. 
Será que Deus ouviu minha 
oração? 
Será que o juiz aceitou 
apelação? 
Mando um recado lá pro meu 
irmão: 
Se tiver usando droga, tá ruim 
na minha mão. 
Ele ainda tá com aquela mina. 
Pode crer, moleque é gente 
fina. 
Tirei um dia a menos ou um dia 
a mais, sei lá... 
Tanto faz, os dias são iguais. 
Acendo um cigarro, vejo o dia 
passar. 
Mato o tempo pra ele não me 
matar. 
Homem é homem, mulher é 
mulher. 
Estuprador é diferente, né? 
Toma soco toda hora, ajoelha e 
beija os pés, 
e sangra até morrer na rua 10. 
Cada detento uma mãe, uma 
crença. 
Cada crime uma sentença. 
Cada sentença um motivo, uma 
história de lágrima, 
sangue, vidas e glórias, 
abandono, miséria, ódio, 
sofrimento, desprezo, 
desilusão, ação do tempo. 
Misture bem essa química. 
Pronto: eis um novo detento 
Lamentos no corredor, na cela, 
no pátio. 
Ao redor do campo, em todos 
os cantos. 
Mas eu conheço o sistema, meu 
irmão, hã... 
Aqui não tem santo. 
10 
 
Rátátátá... preciso evitar 
que um safado faça minha mãe 
chorar. 
Minha palavra de honra me 
protege 
pra viver no país das calças 
bege. 
Tic, tac, ainda é 9h40. 
O relógio da cadeia anda em 
câmera lenta. 
Ratatatá, mais um metrô vai 
passar. 
Com gente de bem, apressada, 
católica. 
Lendo jornal, satisfeita, 
hipócrita. 
Com raiva por dentro, a 
caminho do Centro. 
Olhando pra cá, curiosos, é 
lógico. 
Não, não é não, não é o 
zoológico 
Minha vida não tem tanto valor 
quanto seu celular, seu 
computador. 
Hoje, tá difícil, não saiu o sol. 
Hoje não tem visita, não tem 
futebol. 
Alguns companheiros têm a 
mente mais fraca. 
Não suportam o tédio, arruma 
quiaca. 
Graças a Deus e à Virgem 
Maria. 
Faltam só um ano, três meses e 
uns dias. 
Tem uma cela lá em cima 
fechada. 
Desde terça-feira ninguém abre 
pra nada. 
Só o cheiro de morte e Pinho 
Sol. 
Um preso se enforcou com o 
lençol. 
Qual que foi? Quem sabe? Não 
conta. 
Ia tirar mais uns seis de ponta a 
ponta (...) 
Nada deixa um homem mais 
doente 
que o abandono dos parentes. 
Aí moleque, me diz: então, cê 
qué o quê? 
A vaga tá lá esperando você. 
Pega todos seus artigos 
importados. 
Seu currículo no crime e limpa 
o rabo. 
A vida bandida é sem futuro. 
Sua cara fica branca desse lado 
do muro. 
Já ouviu falar de Lucífer? 
Que veio do Inferno com 
moral. 
Um dia... no Carandiru, não... 
ele é só mais um. 
Comendo rango azedo com 
pneumonia... 
Aqui tem mano de Osasco, do 
Jardim D'Abril, Parelheiros, 
Mogi, Jardim Brasil, Bela 
Vista, Jardim Angela, 
11 
 
Heliópolis, Itapevi, 
Paraisópolis. 
Ladrão sangue bom tem moral 
na quebrada. 
Mas pro Estado é só um 
número, mais nada. 
Nove pavilhões, sete mil 
homens. 
Que custam trezentos reais por 
mês, cada. 
Na última visita, o neguinho 
veio aí. 
Trouxe umas frutas, Marlboro, 
Free... 
Ligou que um pilantra lá da 
área voltou. 
Com Kadett vermelho, placa de 
Salvador. 
Pagando de gatão, ele xinga, 
ele abusa 
com uma nove milímetros 
embaixo da blusa. 
Brown: "Aí neguinho,vem cá, 
e os manos onde é que tá? 
Lembra desse cururu que 
tentou me matar?" 
Blue: "Aquele puta ganso, 
pilantra corno manso. 
Ficava muito doido e deixava a 
mina só. 
A mina era virgem e ainda era 
menor. 
Agora faz chupeta em troca de 
pó!" 
Brown: "Esses papos me 
incomoda. 
Se eu tô na rua é foda..." 
Blue: "É, o mundo roda, ele 
pode vir pra cá." 
Brown: "Não, já, já, meu 
processo tá aí. 
Eu quero mudar, eu quero sair. 
Se eu trombo esse fulano, não 
tem pá, não tem pum. 
E eu vou ter que assinar um 
cento e vinte e um." 
Amanheceu com sol, dois de 
outubro. 
Tudo funcionando, limpeza, 
jumbo. 
De madrugada eu senti um 
calafrio. 
Não era do vento, não era do 
frio. 
Acertos de conta tem quase 
todo dia. 
Ia ter outra logo mais, eu sabia. 
Lealdade é o que todo preso 
tenta. 
Conseguir a paz, de forma 
violenta. 
Se um salafrário sacanear 
alguém, leva ponto na cara 
igual Frankestein. 
Fumaça na janela, tem fogo na 
cela. Fudeu, foi a, se pã!, tem 
refém. 
Na maioria, se deixou envolver 
por uns cinco ou seis que não 
têm nada a perder. 
Dois ladrões considerados 
passaram a discutir. 
12 
 
Mas não imaginavam o que 
estaria por vir. 
Traficantes, homicidas, 
estelionatários e uma maioria 
de moleque primário. 
Era a brecha que o sistema 
queria. Avise o IML, chegou o 
grande dia. 
Depende do sim ou não de um 
só homem. 
Que prefere ser neutro pelo 
telefone. 
Ratatatá, caviar e champanhe. 
Fleury foi almoçar, que se foda 
a minha mãe! 
Cachorros assassinos, gás 
lacrimogêneo... 
quem mata mais ladrão ganha 
medalha de prêmio! 
O ser humano é descartável no 
Brasil. 
Como modess usado ou 
bombril. 
Cadeia? Claro que o sistema 
não quis. 
Esconde o que a novela não 
diz. 
Ratatatá! sangue jorra como 
água. 
Do ouvido, da boca e nariz. 
O Senhor é meu pastor... 
perdoe o que seu filho fez. 
Morreu de bruços no salmo 23, 
sem padre, sem repórter. 
sem arma, sem socorro. 
Vai pegar HIV na boca do 
cachorro. 
Cadáveres no poço, no pátio 
interno. 
Adolf Hitler sorri no inferno! 
O Robocop do governo é frio, 
não sente pena, Só ódio e ri 
como a hiena. 
Rátátátá, Fleury e sua gangue 
vão nadar numa piscina de 
sangue. Mas quem vai acreditar 
no meu depoimento? 
Dia 3 de outubro, diário de um 
detento." 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13 
 
4. A INFRAESTRUTURA DA EXPLORAÇÃO: A VISÃO 
SOCIAL EM KARL MARX 
 
A nossa análise terá como base os ideais marxistas, os quais 
foram desenvolvidos, durante o século XIX, através da crítica ao 
pensamento moderno e de seus contemporâneos tais como Hegel e 
Feuerbach. Marx sai do idealismo alemão como foi próprio de Kant e de 
toda filosofia alemã, até mesmo de Hegel, e dirige-se à uma instância 
totalmente diferente, a humana, com uma filosofia concreta, da práxis. 
Não obstante, ele rompe, também, com o materialismo contemplativo de 
Feuerbach, elevando seu pensamento a transformação da sociedade. 
Assim, Alysson Leandro Mascaro exprime no livro "Filosofia 
do Direito": 
 
"Marx atrela a filosofia, necessariamente, a uma 
postura revolucionária. Essa proposta se choca 
frontalmente com a tradição filosófica de seu tempo, 
em especial a alemã [...]. Na verdade, o homem 
somente o é enquanto se perfaz nas próprias 
relações sociais, de trabalho." 
 
Marx desenvolve uma ferramenta grandiosa: o materialismo 
histórico, partindo das relações sociais históricas concretas, superando 
tanto o idealismo e o empirismo, respectivamente, invertendo a filosofia 
de modo a colocá-la de pés no chão e não esgotando a verdade na matéria 
no seu sentido físico. Inverte também a dialética de Hegel (negação da 
negação), pois se seguisse essa lógica, todo novo teria algo do velho, a 
proposta marxista nessa questão traz o comunismo como algo totalmente 
distinto do capitalismo. 
 
 
14 
 
Em seu estudo Marx também desenvolve a ideia da alienação, 
no sistema capitalista, como um afastamento do homem de si mesmo, 
sendo propiciada pela condição de trabalhador no processo produtivo. 
Para Marx a alienação também se apresenta no campo dos valores, dos 
modos de reflexão do pensamento, da cultura e das ideias, ou seja, a 
questão da ideologia. Uma infraestrutura (base material concreta) levanta 
uma superestrutura ideológica, porém essa ideologia não mostra sua real 
face, a qual protege os interesses de uma minoria exploradora, na verdade, 
se apresenta como valores universais, tidos como bons e eternos. 
 
Sobre a lógica do capital Marx chega a conclusão de que são 
as específicas relações de produção entre capitalistas e trabalhadores 
assalariados que determina essa lógica e através da mais-valia o capitalista 
distancia-se do trabalhador em meios e possibilidades. O acúmulo 
desenfreado do capital deixa clara as diferentes posições sociais de cada 
uma das classes e portanto, a lógica do capital descrita por Marx é a lógica 
da exploração do trabalho assalariado e a lógica da circulação universal de 
todos as pessoas e coisas como mercadorias. 
 
Para Marx o Estado se presta apenas para garantir que os 
interesses capitalistas sejam atendidos e não para manter uma igualdade 
real, ou para o bem comum. Marx coloca o Estado atual como algo a ser 
superado (A forma política estatal corresponde à exploração capitalista), já 
que ele serve apenas para garantir a posição de sujeito de direito 
(isonomia) e a reprodução e manutenção do sistema capitalista, de modo 
que todos possam se vender para o capitalista detentor dos meios de 
produção. 
Para Marx há de ser feita uma revolução nos meios de 
produção, numa transição para o socialismo, de tal sorte que se transforme 
o próprio modo como os trabalhadores se organizam, controlando 
totalmente a produção de sua vida material. 
15 
 
5. DIÁRIO DE UM DETENTO: ANÁLISE CRÍTICA DO 
MASSACRE DO CARANDIRU 
 
Em consonância com o já explicitado, fornecendo os fatos e 
sobre qual perspectiva iremos comentar a música em questão, podemos 
com propriedade avançar mais um passo e chegar no ponto fundamental 
de nosso trabalho que é analisar o “Diário de um Detento” munido do 
conhecimento até aqui exposto. Frisamos que seguiremos a cronologia da 
letra em si, buscando sempre apontar uma explicação plausível para 
materializar a narrativa. Seguimos: 
 
• Aqui estou, mais um dia. Sob o olhar sanguinário do vigia. Você não 
sabe como é caminhar com a cabeça na mira de uma HK - 
Metralhadora alemã ou de Israel - Estraçalha ladrão que nem papel: O 
preso conta com a reprovação moral que a sociedade lhe incumbe ao 
cumprir pena em regime fechado, pois é considerado perigoso no meio das 
relações sociais devendo, portanto, pagar com a própria liberdade a lesão 
que empregou ao bem jurídico de outrem – desta maneira, vive sob um 
regime carcerário que o reprime submetendo seu psicológico a um 
constante estado de nervosismo, pois sabe que no menor alarde, o “vigia” 
não irá pestanejar em descarregar o cartucho da metralhadora em seu 
corpo, pouco se importando com o processo judicial que corre ou a dor 
dos parentes, corroborando de que, ali, poderia ser um pai de família preso 
injustamente. 
 
• Será que Deus ouviu minha oração?Será que o juiz aceitou a 
apelação?: Marx muito bem pontua de que a religião é o ópio que o povo 
utiliza para aliviar seu sofrimento diário em face da exploração imposta 
pelo capital, na lógica carcerária, a religião – como também se verá a 
frente – se assoma como a única companhia do preso e roga-se a uma 
entidade superior que possa fazer em um “passo de mágica” o juiz reverter 
toda a situação – a Apelação, refere-se ao recurso processual onde o 
16 
 
patrono entra com uma ação de revisão do prolatado em juízo, só quepara 
uma turma de juízes (desembargadores). O preso espera que sua pena, tal 
como seu sofrimento, sejam amenizados como resultados das súplicas 
dirigidas a “Deus”. A incerteza do processo judicial e do futuro depois de 
cumprida a pena é marcante. 
 
• Cada detento uma mãe, uma crença. Cada crime uma sentença: O preso 
ainda confronta-se com o juízo moral que sua família, desta vez na 
imagem materna, faz de sua atitude e pensa no sofrimento que impôs aos 
familiares. Retomando o trecho anterior, não é difícil observar a 
diversidade religiosa dentro do presídio – tendo a convivência pacifica de 
católicos, espiritas e até mesmo praticantes de religiões afro descentes – 
tudo, não passa de uma tentativa de recorrer a uma instância superior, na 
intenção de que sua pena seja atenuada – No Carandiru, bem como em 
outras penitenciarias, cada preso gira em torno dos dias contabilizados em 
sua sentença proporcionalmente ao delito praticado, em uma mesma cela 
era possível observar alguém que deveria cumprir de 01 ano até outros de 
20 anos. As histórias se confundem e todos sabem que estão ali “pagando 
o que devem para a sociedade” ou como dirá os mais conservadores 
“paga-se pelo pecado”. 
 
• Uma história de lágrima, sangue, vidas e glórias, abandono, miséria, 
ódio, sofrimento, desprezo, desilusão, ação do tempo Misture bem essa 
química - Pronto: eis um novo detento: O homem não procura o crime 
por livre e espontânea vontade. É possível apontar que causas sociais o 
conduzem para cometer algum ato delituoso que muitas vezes tem sua 
origem direta na desigualdade social em que está inserido – muitos com 
nada, e poucos com tudo. A centralização do capital e oportunidades para 
um grupo seleto reflete diametralmente em uma grande margem de 
excluídos que para sobreviver, só tem como alternativa a prática criminosa 
– não se dirá, portanto, que este deveria, sob a óptica liberal, trabalhar e se 
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“constituir um homem de bem”; não se lança em defesa do preso, mas 
acredita-se que esta mesma sociedade que lhe cobra uma postura, é a 
mesma que não lhe dá condições necessárias para seu próprio 
desenvolvimento como trabalhador; o exclui, o marginaliza e lhe delega 
que viva a própria sorte – O presídio, esta estrutura chancelada pelo 
sistema como método de correção, o preso só tem a si mesmo e convive 
com os olhares inquisitivos dos outros presos, o abandono da família, a 
falta de perspectiva, com o tempo deteriorando sua sensibilidade e moral.. 
 
• Mas eu conheço o sistema, meu irmão, hã! Aqui não tem santo. 
Rátátátá: preciso evitar que um safado faça minha mãe chorar: 
Recorremos novamente aos ensinos de Marx do qual diz que o homem faz 
a sua própria história, no entanto, não como quer – o preso, na tentativa 
de buscar, mesmo de forma ilícita uma melhoria momentânea de vida, 
abraça o crime e tem a consciência de que se torna um perigo em potencial 
para a sociedade – não se deve esperar que alguém que estruturalmente 
conviveu com toda a sorte de privações, depois de uma temporada na 
cadeia com outros malfeitores, vá melhorar necessariamente seu caráter – 
o autor reconhece que lá, a cadeia, não é lugar de gente boa. A música é 
rica em onomatopeia “ratata” que reproduz o som da metralhadora e 
acompanhada da frase seguinte revela o modo como a repressão policial 
responde as delinquências dos homens na periferia: com a morte. 
 
• Ratatatá! Mais um metrô vai passar com gente de bem, apressada, 
católica, lendo jornal, satisfeita, hipócrita com raiva por dentro, a 
caminho do Centro. Olhando pra cá, curiosos, é lógico! Não, não é não, 
não é o zoológico. Minha vida não tem tanto valor - quanto seu celular, 
seu computador: O som da metralhadora se faz presente mais uma vez, 
mostrando o olhar externo da sociedade sobre os reclusos do Carandiru. 
Ao observar as toalhas na janela, lamentos, murmúrios e palavras de 
revolta que saiam do complexo, é estimulada a curiosidade daqueles que 
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os condenaram a esta condição – o modo como vivem, como comem, 
como dormem, suas relações sexuais – é a observação externa de outro 
mundo, que é o presídio com sua população – são outras pessoas. Chega-
se a um ponto determinante na teoria marxista, pois diz o filosofo alemão 
de que não é a consciência do homem quem o termina socialmente, pelo 
contrário, é seu ser social quem termina sua consciência – considerando de 
que os presos recebem o olhar incriminador da sociedade, o desprezo dos 
familiares e a opressão constante dentro da cela, é evidente que sua 
consciência muda; este agora ocupa outra posição na cena social: a do 
vilão. Mesmo que venha cumprir pena, “pagar o que se deve”, já há uma 
construção narrativa e social sobre a figura do presidiário, embutida com 
grande carga moral negativa da qual será seu estigma. A vida do preso não 
é importante, sob este mesmo raciocínio, ele é descartável, não é humano 
e não possui valor no sentido moral do termo – em uma sociedade na qual 
o materialismo individualista é levado ao seu ponto mais alto, quem não 
tem capital, bens materiais e chega ao cúmulo de subtrair essas premissas 
de quem possui, é visto como um inimigo público e não como mais uma 
vitima da sociedade. 
 
• Alguns companheiros têm a mente mais fraca: Não suportam o tédio, 
arruma quiaca (...) Tem uma cela lá em cima fechada desde terça-feira 
ninguém abre pra nada. Só o cheiro de morte e Pinho Sol - Um preso se 
enforcou com o lençol: Há aqui um ponto verdadeiro e cruel na narrativa 
burguesa – Não há mais espaço para o presidiário na sociedade. Quando o 
autor retrata sobre “tédio” neste ponto, remete a uma triste realidade de 
que a prisão não cumpre, por desinteresse dos detentores do capital e 
Estado, a função de resocializar o infrator dando a este condição 
necessária para sobreviver ao mercado de trabalho – a deterioração moral 
e física é latente. Homens amontoados e sem ocupação, no antigo adágio 
“mente vazia é oficina do diabo”, acabam por se aniquilarem e cumprir 
uma função que está já prevista – sua própria eliminação social. Não raro, 
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muitos presos morriam na própria cela pelos próprios companheiros. 
Aqueles que são julgados mais violentos e perigosos para os demais, 
possuem uma “prisão” dentro da “prisão” denominada: solitária. No caso 
em tela, o preso se enforcou com o lençol – algo constante, pois o ócio 
munido ao desespero de viver em condições sub-humanas resultam em 
atitudes como o suicídio. 
 
• A vida bandida é sem futuro. Sua cara fica branca desse lado do muro. 
Já ouviu falar de Lúcifer? Que veio do Inferno com moral, 
Um dia no Carandiru, não ele é só mais um comendo rango azedo com 
pneumonia: Há uma clara confissão de desesperança e descredito no 
futuro. A própria consciência já alterada pela nova realidade, deixa o 
preso refletindo sobre sua própria existência e condenação – Mesmo 
aquele que nas ruas era considerado como invencível e grandioso por suas 
façanhas criminosas, é imortalizado na imagem do diabo moral, que por 
mais considerado que fosse no meio, para o Estado não passa de mais um 
pária e tem o mesmo tratamento inflexível que os demais. Na doutrina 
Marxista, o Estado tal como se apresenta, não passa de um grande comitê 
chefiado pelos burgueses que se utilizam do aparado policial por meio da 
violência para empregar métodos corretivos àqueles que são subjugados e 
marginalizados: Quem está subvertendo a ordem presente, deve ser tratado 
como um inimigo. Há um claro desrespeito ao principio da dignidade 
humana, os presos, além de conviver com um ambiente lúgubre em si, 
padecem com moléstias derivadas das condições precárias que vivem. 
 
• Lealdade é o que todo preso tenta - Conseguir a paz, de forma violenta: 
O nome do criminoso era sua garantia nas ruas e continua sendo dentro 
das celas, é uma sentença de morte não se associarcom outros que 
possuam “moral” neste próprio meio, pois para garantir a sua vida, a única 
lei que impera no presidio é a do mais forte. A violência se faz necessária 
para manter uma ordem dentro da ordem. 
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• Fumaça na janela tem fogo na cela. Fudeu, foi além, se pã! Tem refém. 
Na maioria, se deixou envolver por uns cinco ou seis que não têm nada 
a perder. Dois ladrões considerados passaram a discutir, mas não 
imaginavam o que estaria por vir: Através da briga de dois criminosos 
influentes no complexo, foi deflagrada a rebelião que culminaria no maior 
massacre da América Latina. Mais uma vez, os presos não tinham opção 
de reeducação e inserção ao trabalho como em outros tempos: apenas 
banho de sol, musculação e competições internas de futebol. É claro que 
as características criminosas nesse ambiente inóspito eram acentuadas 
através da violência e imposição de força para a sobrevivência.. 
 
• Traficantes, homicidas, estelionatários e uma maioria de moleque 
primário. Era a brecha que o sistema queria avise o IML, chegou o 
grande dia! : A descrição dos tipos criminosos revela o perfil 
característico dos reclusos no presidio. Chamando atenção especial para os 
ditos “calouros” que haviam cometido crimes considerados “leves” em 
consideração dos homicidas – eram em sua maioria, jovens iniciantes que 
deveriam ter cometido em sua maioria furto. O desinteresse do Estado em 
diminuir a pena dos reclusos e inseri-los de volta na sociedade é 
respondido em rajadas de metralhadora, dizimando homens que poderiam 
vir a se tornar produtivos para o capital, mas foram descartados. A “brecha 
que o sistema queria” faz alusão de que a ação policial não foi arquitetada, 
planejada e executada, pelo contrário, se tratava da oportunidade dourada 
que o Estado tinha de se livrar em um único ato os homens indesejáveis 
pela sociedade. “Avisa o IML! Chegou o grande dia” a frase é atribuída ao 
Coronel Ubiratan que capitaneou a ação policial no Carandiru , com clara 
alusão de que a polícia não entraria para negociar com os presos e conter a 
rebelião, mas iria cometer arbitrariamente uma chacina nunca vista se quer 
no regime militar. 
 
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• Cachorros assassinos, gás lacrimogêneo. Quem mata mais ladrão ganha 
medalha de prêmio! O ser humano é descartável no Brasil 
Como modess usado ou Bombril: O Policial , nos dizeres do cantor, é 
visto como um cachorro assassino pois não fez juízo correto de valor e 
agiu instintivamente ao disparar tiros, como já comprovado, em todas as 
celas. Algo muito chamativo é o prêmio que existia (não oficial) dentro da 
própria policia militar para o soldado que matasse ladrões: O Estado não 
quer corrigir, mas se livrar dos elementos indesejados pelo corpo 
conservador e social. É uma clara herança da truculência observada pelo 
Estado opressor no regime militar. 
 
• Cadeia? Claro que o sistema não quis. Esconde o que a novela não diz 
Ratatatá! Sangue jorra como água, do ouvido, da boca e nariz: Mais 
uma vez, a cadeia é o amontoado de homens que não entram na lógica 
burguesa e são reprimidos pela violência policial – para estes, sob a 
narrativa do dominador, não tem mais chances. Longe de ser uma 
corporação organizada, a policia militar agiu como uma grande massa 
enfurecida, como um corpo uníssono, armado e violento destinado a 
descarregar todo o ódio que a sociedade tinha sobre os moradores da Casa 
de Detenção de São Paulo. 
 
• Cadáveres no poço, no pátio interno. Adolf Hitler sorri no inferno! 
O Robocop do governo é frio, não sente pena. Só ódio e ri como a hiena. 
Ratatatá, Fleury e sua gangue vão nadar numa piscina de sangue: A 
chacina estava feita. Milhares de corpos estavam expostos nos corredores, 
nas celas e nos pátios com claros tiros de metralhadora – não foi preciso 
ordens, a polícia militar agiu instintivamente. A sociedade, em um 
primeiro momento, aplaudiu a atitude do Governador Fleury para conter 
um problema crescente que era o aumento da população carcerária e 
reprimir os marginais. Este foi o momento perfeito para reduzir este 
problema que já se somava anos a fio – O Carandiru ganhava vida própria, 
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uma autofuncionamento, uma grande maquina devoradora de homens e 
sonhos, que ao invés de ser repensada, pelo contrário, serviu para eliminar 
o excesso de marginais existentes em São Paulo. Foi sem dúvidas, um 
genocídio e um ataque frontal tanto aos direitos humanos quanto ao recém 
Estado Democrático de Direito. 
 
• Mas quem vai acreditar no meu depoimento? Dia 3 de outubro, diário 
de um detento : O relato se encerra. A indagação ainda perdura: Quem 
acreditaria na palavra de um criminoso? A sociedade capitalista que o 
condenou a dura realidade? A verdade é que até hoje não há condenações 
para todos os agentes diretos do massacre. Pois este não terminou no dia 
03 de outubro de 1992, mas continua até hoje nas periferias, não só de São 
Paulo, mas das grandes capitais, com o genocídio de jovens negros que 
são marginalizados pelas condições impróprias que lhe são impostas. Há 
uma diferença crucial de como o Governador Fleury agiu na época e como 
o atual Governador, Geraldo Alckmin, encara este episódio: O primeiro, 
procurou desfazer do excedente carcerário impiedosamente enquanto o 
segundo conferiu força simbólica ao fato quando ordenou sua demolição. 
A queda do Carandiru diluiu a micro realidade do cárcere para outros 
cantos do país, chamando para si o fato de que outros massacres, se 
depender do aparato burguês, poderão se repetir para garantir a ordem 
vigente. Não há limite para a repressão Estatal. Para aqueles que 
sobreviveram, uma vida marcada pela lembrança do vale de sombras, 
continuando na periferia, vão se regendo pela lei da vida, procurando 
encarar de algum modo aos caprichos do Capital e dos detentores do 
poder. 
 
 
 
 
 
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6. GALERIA DE FOTOS: 
 
 Pilha de corpos 
Noticia de jornal 
 Diário de um Detento
Piscina de Sangue 
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7. CONCLUSÃO: 
É impossível deixar que uma história como esta passe 
despercebida pelo tempo e caia no abismo do esquecimento. O Massacre do 
Carandiru tem como principal objetivo alertar a população que caso não haja 
uma mudança de consciência em face a população marginalizada e uma 
alteração nos modos de produção – cenas como esta poderão se repetir 
continuamente nos anos a fio. 
A letra perdura após 22 anos como um gemido de dor nas noites 
paulistanas e um eco na busca de respostas para o injustificável. A reflexão 
que o grupo Racionais Mc’s leva para fora da periferia sobre a situação, 
principalmente, da população mais carente devido a constante truculência 
policial é algo marcante em sua letra. 
Mesmo tento o complexo do Carandiru dinamitado, a sua 
essência esvaiu-se de um espaço físico e concentrado e passou a ser diluído 
nas ruas, cidades e grande metrópoles com a observância ainda presente da 
exploração e discriminação de um grupo social determinado. 
É preciso pontuar que a letra, ritmada em passos fortes, traz a 
baila um problema constante no sistema carcerário: A má administração, 
super lotação e o problema que o Estado encontra em reincluir os seus 
infratores, optando pela ultima ratio que culmina com o extermínio de um 
determinado tipo social indesejável. 
Faz-se necessário, portanto, uma mudança de consciência social e 
encarar o presidiário como uma vítima das mazelas impostas pelo capital e 
alguém que também goza dos mesmos direitos do que qualquer outro cidadão 
– precisando ser reincluso no mercado de trabalho para evitar sua reincidência 
no crime. 
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As classes dominantes não veem com interesse a reformulação do 
preso e sempre irá responder em maior tom quanto sentir a sua ordem 
ameaçada pela subversão de elementos indesejáveis socialmente.Para ser verdadeiramente justa e genuína, a sociedade e o Estado 
devem por obrigação, tratar todos com o mesmo peso e medida para que 
massacres como este não voltem a se repetir. É uma mácula que não deve ser 
esquecida, mas que sirva de exemplo para que as gerações futuras rompam 
com o ciclo de genocídio que vitimiza a periferia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
26 
 
 
 
 
6. BIBLIOGRAFIA: 
 
AZEVEDO, José Eduardo Azevedo;A Penitenciária do Estado: a 
preservação da ordem pública paulista in Revista do Conselho 
Nacional de Política Criminal e Penitenciária; Vol. 1, nº 9; Brasília: 
jan/jun.1997, p. 91-102. 
 
CARNEIRO, Silvio. Diário de Um Detento – 20 Anos depois. 
http://zagaiaemrevista.com.br/diario-de-um-detento-20-anos-depois/ 
Visitado em 08 de Novembro de 2014 
 
História do Carandiru , http://acessajuventude.webnode.com.br/historia-
do-carandiru/ , Visitado em 08 de Novembro de 2014 
 
MASCARO, Alysson Leandro. Estado e forma política. São Paulo: 
Boitempo, 2013. 
 
MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. 2. ed. São Paulo: 
Atlas, 2012. x, 594 p. 
 
N°52 - Diário de um Detento - Edição 37 - (Outubro/2009) - Rolling 
Stone Brasil Rolling Stone. Visitado em 08 de Novembro de 2014 
 
NIGRINI NETO, Osvaldo. O MASSACRE DO CARANDIRU: A 
HISTÓRIA ESTAVA ESCRITA NAS PAREDES, disponível em: 
https://flitparalisante.wordpress.com/2013/04/22/o-massacre-do-
carandiru-a-historia-estava-escrita-nas-paredes/, acesso em 09/11/2014. 
 
VARELLA, Drauzio. . Estação carandiru. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2003. 
 
ZWEIG, Stefan; Encontros com homens livros e países; Editora 
Guanabara; 1942

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