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DECIDIRDECIDIRDECIDIRDECIDIR OU NÃO OU NÃO OU NÃO OU NÃO DECIDIRDECIDIRDECIDIRDECIDIR O processo decisórioO processo decisórioO processo decisórioO processo decisório Se não correr o bicho pega, se ficar o bicho come... Jorge Alberto Zietlow Duro 2 1998 ao Prof. Paulo Cesar Motta , grande mestre; a Profa. Sylvia Vergara , pela iniciação; aos filhos Thiago e Victória para suas futuras decisões 3 PREFÁCIO O livro DECIDIR OU NÃO DECIDIR é um livro de leitura fácil e que contempla aspectos relevantes no processo decisório de indivíduos e organizações. O tema é muito atual face as mudanças que as empresas e a própria sociedade vêm se deparando em um ritmo cada vez mais assustador. As empresas estão sendo obrigadas a decidir cada vez mais rapida e acertadamente, e além disso, deverão estimular um permanente processo de aprendizagem entre seus colaboradores para prover a flexibilidade essencial nesse ambiente turbulento. O livro DECIDIR OU NÃO DECIDIR desenvolve numa abordagem instigante a quebra de alguns paradigmas importantes que revestem o tema. Olivier Mathieux C.E.O . Essilor Brasil ( VARILUX ) 4 INTRODUÇÃO O ATO DE DECIDIR “Viver é decidir...” Passamos toda nossa vida a tomar decisões, seja consciente ou inconscientemente. Este processo só tem fim quando, à noite, exaustos, vamos para a cama ou então ao darmos o último suspiro. Desde o momento em que despertamos, nosso primeiro pensamento já envolve algum tipo de decisão: sair ou não da cama, ficar ou não mais cinco minutos, tomar banho ou não, e assim por diante. Estamos o tempo todo a decidir. A grande dúvida é: vale ou não a pena decidir? Uma vez que vivemos assaltados por esses dilemas diários, por que não passarmos a tomar decisões de forma consciente? O objetivo deste livro é justamente tentar demonstrar até que ponto as decisões são válidas e como é importante nosso envolvimento consciente neste processo. É necessário, contudo, que não se pense que a simples leitura deste trabalho irá transformar você, leitor, em um brilhante decisor. A proposta aqui não é essa , mas mostrar os vários aspectos e mecanismos internos e externos - que interagem nesse processo, abordando o processo decisório tanto na ótica do indivíduo, ou seja, pela ótica individual no que tange às suas decisões pessoais, como pela ótica empresarial, com a 5 influência da cultura e da estrutura organizacional, quer estejamos tratando de organizações com ou sem fins lucrativos. O livro pretende questionar o foco adotado até então pelos estudos do Processo Decisório, concentrando-se na importância de quebra de paradigmas e como o sucesso interfere no processo decisório CAPÍTULO 1 6 O MITO DOS GRANDES DECISORES “O bom decisor nasce feito...” Existe um grande mito: o dos grandes decisores. Tudo nos leva a crer que tomar decisões é uma especialidade, que só aquelas pessoas detentoras de um dom divino teriam a capacidade de decidir acertadamente, motivo pelo qual se tornariam uma referência para o restante da sociedade. De acordo com essa ótica, existiria a crença de que o bom decisor estaria praticamente predestinado desde o nascimento a transformar-se em um Henry Ford, um Lee Iaccoca, um Akio Morita ou outros ícones bem conhecidos da arte decisória. O que a prática nos mostra é que eles foram, sem sombra de dúvida, bom decisores, que tomaram grandes decisões e obtiveram resultados extraordinários, mas, em termos genéricos, são pessoas que decidem normalmente como as demais. O mito de que o grande decisor já nasce feito cai, assim, por terra, quando continuamos analisando outras decisões destes mesmos personagens e que resultaram em retumbantes fracassos. Robert Helller, em seu livro Os Tomadores de Decisão aborda muito bem estes mitos: Vejamos o caso de Akio Morita, por exemplo. Tendo fabricado um hi-fi de bolso, decidiu lançá-lo imediatamente no mercado a preços baixos, mesmo 7 indo contra a opinião de todos na Sony. O resultado foi a transformação do walkman numa das mais populares e rendosas invenções deste século. Por outro lado, após desenvolver o primeiro gravador videocassete do mundo, com capacidade para gravar e reproduzir programas de televisão e filmes, Morita decidiu que a Sony deveria manter um controle sobre essa invenção. Enquanto isso, a JVC aperfeiçoava a tecnologia de um produto com tempo de execução mais longo e surpreendia o concorrente com o formato VHS, roubando o mercado que a Sony construíra a duras penas. Outro exemplo expressivo é o de John R. Opel, chefe-executivo da IBM, que partiu para a comercialização irrestrita do PC, tornando-o tão popular a ponto de colocar a IBM reinando absoluta no mercado. Ao liberar, contudo, a tecnologia, a fim de que qualquer fabricante de software preparasse programas destinados aos computadores pessoais, Opel abriu a porta para que nada menos de 300 concorrentes, que começaram imediatamente a produzir cópias, reduzindo os preços e abocanhando cerca de três quartos do mercado da IBM. Vejamos também o que aconteceu a Carlo de Benedetti que, em 1978, tomou a decisão de investir 17 milhões de dólares do próprio patrimônio para adquirir 20 por cento da Olivetti e dirigi-la. O resultado foi um aumento de 250% nas vendas em cinco anos e a eleição de Benedetti como Homem de Negócios 8 do Ano, na Europa. Dez anos depois, todavia, pisaria em falso na tentativa de criar um conglomerado financeiro transeuropeu, a partir da conquista da Societé Génerale belga. A transação revelou-se um desastre, justamente no momento em que a Olivetti pedia socorro após dois anos de queda nos lucros. Assim, como podemos observar, todos esses homens tomaram decisões brilhantes em suas empresas, mas cometeram, por sua vez, grandes asneiras. Isso nos leva a crer que o parâmetro para uma decisão é sempre uma outra decisão tomada no passado e que obteve êxito. Curiosamente, os acertos do passado acabam por se voltar contra o decisor, uma vez que este não leva em conta as mudanças conjunturais ocorridas no intervalo entre uma decisão e outra. Bill Gates disse que “o sucesso é um péssimo professor, ele ensina à gente brilhante que é impossível errar ”. Isto se aplica não somente no plano individual, mas também no que se refere às grandes organizações. Uma boa síntese desse tipo de pensamento é a velha teoria de que “em time que está ganhando não se mexe”. A própria vaidade do decisor de sucesso reduz sua percepção das mudanças conjunturais, o que acaba acarretando uma perda na eficiência do processo decisório, tanto em nível empresarial quanto pessoal. Cabe então aqui a pergunta: ser um bom decisor é não errar nunca, acertar mais de 50% da 9 vezes? O certo é que o parâmetro para a definição de um bom decisor está calcado na confiança daqueles que entregam a ele a responsabilidade da tomada de decisões. É uma percepção do grupo,e quando este confia na capacidade decisória de um dado elemento, isso é um sinal claro de que estamos, naturalmente, falando de um bom decisor. Mas o que significa essa confiança que o grupo nele deposita? O grupo sempre avalia com base em três grandes variáveis, a saber: a história pregressa, a competência, a consistência de imagem e os valores. ( Vide Diagrama 1) Competência Confiança História Pregressa Consistência Imagem Diagrama 1 - Confiança Por história pregressa entenda-se o passado de sucesso, isto é, o número de decisões acertadas tomadas por alguém, que acabam por gerar confiança, qualificando-o como um bom decisor. Para fins de ilustração, na área empresarial, podemos utilizar inúmeros exemplos de empreendedores ( Metal Leve, Cofap, Perdigão, Mesbla ), que tiveram 10 uma história de sucesso, em sua época, como decisores executivos. O padrão de decisão também está intimamente ligado à competência da pessoa. Vale aqui lembrar que competência é uma questão de área, isto é, ninguém é competente em todas as áreas. Podemos ser competentes no ramo empresarial e não o sermos no esportivo, termos sucesso na política e fracassarmos na área da psicologia, e assim por diante. Muitas vezes, entretanto, a própria sociedade acredita que uma pessoa que foi bem-sucedida em determinada área pode sê-lo em outra. Tomemos o caso de Pelé, por exemplo, uma pessoa altamente competente na área esportiva, mas nem tão feliz na política. Ou o de Emerson Fittipaldi, um grande piloto, de reconhecida competência na área automobilística e habilitado a orientar com sucesso uma escuderia. Qual seria a vantagem, entretanto, de pedir a ele conselhos políticos ou médicos? É praticamente impossível transferir sua competência de bom decisor na área automobilística para um campo muito mais complexo, como o político ou médico. Surge aí a questão: já que não existe, obrigatoriamente, relação entre competência e área, os grupos incorrem no erro de empregar pessoas de reconhecida competência num determinado campo, para tomarem decisões em áreas com as quais não estão muito bem familiarizadas. 11 Por que pedimos a um artista da Globo ou a um atleta de renome que opine sobre política, economia ou algo que o valha? É porque acreditamos que como eles tiveram sucesso como decisores em suas áreas específicas, teoricamente deveriam tê-lo também em outros campos de atividade, o que é uma falácia. O terceiro vértice do triângulo chama-se consistência de imagem , que envolve valores e padrões mentais, se referindo ao plano interior e à consistência desses padrões mentais e comportamentos em consonância com o plano exterior. Ou seja, como o grupo avalia as características do decisor: se ele é consistente ou não, se possui coerência em seus pensamentos, julgamentos e ações. Na prática, isso tudo pode ser resumido na palavra sinceridade, no que diz respeito à postura e ação. Fecha-se assim o triângulo. Valeria a pena ainda, na análise desse modelo, levantar a tão discutida questão da história pregressa. Peguemos como exemplo uma moeda que, ao ser jogada para o alto, a fim de decidir alguma questão, tenha apresentado cinco vezes seguidas o mesmo resultado: “cara”, vamos supor. A pergunta que nos fazemos é qual será o próximo resultado: “cara” ou “coroa”? A escolha vai depender muito dos padrões mentais de julgamento de cada pessoa. Matematicamente, a probabilidade de resultados “cara” e “coroa” é absolutamente idêntica, 50% para 12 cada. Uma pessoa observadora pode achar que a moeda está viciada e sugerir “cara”. Os mais analíticos arriscariam “coroa”, pelo fato deste resultado não ocorrer há algum tempo, e isto se opor à Lei dos Grandes Números. Esse tipo de decisão está intimamente ligado aos padrões mentais, à percepção e à consistência de valores de cada indivíduo ou decisor. Ou seja, mesmo com a mesma base de dados, dois decisores poderão decidir diferentemente em função de seus valores. 13 CAPÍTULO 2 SIGNIFICADO DA DECISÃO “Você é hoje o que decidiu no passado ... “ Normalmente, nas organizações, espera-se que o decisor seja uma pessoa rápida, precisa e eficiente em todas as suas decisões. Na prática, entretanto, o que se observa nas grandes empresas é que muitas pessoas que optaram por não decidir, seja por uma postura política ou por questões de segurança, acabam sendo premiadas. São elas que conseguem, dentro da estrutura da empresa, conquistar o menor número de inimigos e cometer menos erros. Devido ao modelo hierárquico, organizacional, que premia aqueles com menor número de erros, tudo indica que essas pessoas terão maiores chances de serem melhor avaliadas e portanto promovidas ( o que acaba normalmente ocorrendo). Boa parte delas, especialmente nos escalões superiores, são consideradas mais qualificadas e equilibradas, porque souberam “ponderar” e jogar para outros a responsabilidade das decisões. Vale a pena lembrar que, principalmente no topo das organizações, os modelos são diferentes daqueles preconizados para as bases. Mais adiante trataremos detalhadamente dessa questão no “modelo decisório organizacional”. É bom que se diga, contudo, que existem duas realidades: aquilo que é pregado como regra para o 14 corpo da organização e o que vale apenas para a direção. Vejamos agora o que é decidir. Apresentaremos para isso duas versões. Passemos agora à primeira versão, que chamaremos de soft. Nela, decidir significa optar. Nossa opção ocorre com base na relação custo x benefício (trade off). Lamentavelmente, não podemos obter uma coisa do nada; para conquistarmos algo, para angariarmos alguma vantagem, devemos obrigatoriamente arcar com algum tipo de custo. A verdade é que não existe amostra grátis, tudo que nos é dado tem um custo. No caso específico da amostra, ou alguém já pagou por ela ou vai pagar certamente. O que está em jogo é a relação custo x benefício, ou seja, aceitamos a idéia de que todo lucro tem um custo, mas imaginamos poder ignorá-la em determinadas circunstâncias. É gratificante imaginar que estamos obtendo alguma coisa do nada. Isso ocorre nas organizações também, quando os problemas são encarados de forma ingênua. Vamos supor que o Departamento de Produção tenha decidido usar uma matéria-prima mais barata na confecção de uma mercadoria específica , a fim de diminuir os custos. O resultado pode ser a qualidade inferior do produto e sua conseqüente desvalorização no mercado, além de reclamações por parte dos consumidores. Nesse caso, quem pagará a conta dentro da empresa será o Departamento de Marketing e Vendas. O que 15 significou uma economia para o Departamento de Produção tornou-se uma despesa a mais para o pessoal do marketing. Qualquer companhia tem a possibilidade de usar material de menor custo, mas ao fazê-lo, tem de considerar tanto o lucro quanto o custo dessa decisão, realizando um trade off dos ganhos contra os custos e decidindo se o lucro líquido lhe é favorável. Dentro da relação custo x benefício, especialmente nas decisões individuais, ambos os fatores podem não estar ligados a dinheiro propriamente dito. Essa relação de custo x benefício talvez ocorra em termos de sobrevivência (ou seja, dinheiro); mas também pode acontecer como segurança (no sentido de não perder), afeto (significando atenção), ego (simbolizandoreconhecimento) e auto-realização (como prazer e desafio). Todos esses cálculos podem estar contabilizados tanto na ótica do benefício quanto na de custo. ( Diagrama 2) Custo Benefício Sobrevivência Sobrevivência Segurança Segurança 16 Afeto Afeto Ego Ego Auto Realização Auto Realização Diagrama 2 Custo x Benefício Em última instância, passamos toda a nossa vida decidindo, com base nessa relação de custo x benefício. No momento da troca, da decisão, nós conscientemente ou não avaliamos se o benefício decorrente tem uma importância maior que o custo. Outro aspecto importante é que não faz sentido trocar coisas iguais (não trocamos dinheiro por dinheiro, nem segurança por segurança). Acabamos trocando “pacotes” de necessidades maiores por outras menores. O próprio afeto não é trocado, na verdade, puramente por afeto. O que acontece é que quando decidimos dar afeto, estamos buscando uma auto-realização, vendo o outro receber afeto, ou provocando um reply (dizemos “eu te amo” para ouvir a recíproca). A segunda versão chamaremos de “radical”, e ela é simbolizada pela frase “não fomos educados para decidir”. É curioso observar que a palavra decidir possui o mesmo radical de suicídio, homicídio, fraticídio e parricídio: esse radical tem o significado de matar. ( De significa parar de e caedere significa cortar. ) Ao decidirmos, a referência à morte e ao assassinato se faz com relação às demais opções, já que tomar uma decisão implica em escolher entre 17 duas ou mais alternativas, ou seja, em matá-las, até que reste apenas uma. Assim, dentro da ótica da versão radical, decidir significa matar. O problema é que não fomos, culturalmente, educados para matar e assassinar, atitudes que estão longe de ser consideradas politicamente corretas. Nossos instintos assassinos e animais foram contidos já há muito. Ensinaram-nos também que matar implica em sério risco, o que também se aplica às decisões: toda decisão está ligada a um grau de risco. Automaticamente, ainda de acordo com esse ponto de vista, avaliamos a situação da seguinte forma: as pessoas são propensas a decidir mais rápida ou lentamente, em função do grau de risco que avaliam ou do grau de segurança que possuem. Quanto ao tipo de análise, podemos classificar as decisões do tipo “ou” (n=2), isto é, aquelas que envolvem em escolher (ou matar) entre duas opções, e as decisões do tipo “seleção” (n>2), ou seja, aquelas onde mais do que duas opções são analisadas. Em resumo, teremos decisões do tipo ou, isto é, n=2, ou do tipo seleção, onde n>2. Matematicamente, restaria ainda a opção n=1, na qual teríamos apenas uma única alternativa. Ora, só existe uma situação em nossas vidas onde essa unanimidade é possível, trata-se da questão eu não querer morrer (fisicamente, pelo menos). O fator gerador de nosso nascimento já ocorreu e temos uma única opção futura, embora não queiramos. No 18 futuro, todos estaremos mortos. O peso dessa afirmativa é algo de tão profundo e sério que acaba por gerar uma série de outras conseqüências e decisões, que têm impacto sobre toda a humanidade, a partir de nós mesmos. É justamente essa decisão que nos leva a desejar ter filhos e a perpetuar a espécie, em última instância, o eu. No plano do grupo, isso gera a perpetuidade da espécie. Essa mesma incapacidade de tomar a decisão de não querer morrer é o que leva um artista a criar uma obra, uma escultura ou um quadro que o eternize para sempre. É isso que motiva também um político a realizar uma obra faraônica ostentando uma placa com seu nome; que leva um esportista a quebrar um recorde a fim de entrar para a posteridade. Se pararmos para pensar, tudo o que fazemos aqui, neste planeta, é protestar contra essa decisão fatal, a que todos nós estamos sujeitos: a morte. Como já dissemos anteriormente, este livro quer mostrar por que as pessoas decidem, tanto em termos individuais quanto grupais. No primeiro caso, o objetivo é a busca da felicidade, enquanto que no caso do grupo, ou das organizações, é a sobrevivência. Analisemos o caso das decisões individuais segundo Anna Campos, professora da FGV/RJ. 1. Basicamente a felicidade é o que todos nós visamos. 19 2. Essa meta ramifica-se, para cada pessoa, em uma série de outras, abrangendo diferentes áreas de seus interesses. 3. Várias metas podem, muitas vezes, chocarem-se umas com as outras. Assim, algumas delas ficam subotimizadas (trade off) . 4. O tempo exerce papel importante na questão das metas subotimizadas. Em geral, tendemos a otimizar apenas no instante em que tomamos as decisões. Mais tarde, a subotimização reaparece, ou porque as previsões sobre as quais se basearam as decisões modificaram-se, ou então por uma mudança nos próprios valores e interesses da pessoa. 5. Decidir é uma questão complexa, a ponto de se tornar impossível a descoberta do conjunto de ações ótimas. Os indivíduos, em geral, tratam suas metas em função dos bons resultados. 6. É muito difícil que uma pessoa tente, ou consiga, encontrar todas as informações disponíveis a fim de decidir, uma vez que não se pode ter acesso a todas as informações e que o fator tempo atua limitando- nos. Temos que lidar também com nosso próprio limite na “absorção” de informações. 7. A despeito de todos os embaraços, tentamos ser racionais ao resolvermos nossos problemas e selecionarmos as oportunidades. Para nos auxiliar, contamos com nossa experiência acumulada de princípios éticos, máximas e heurísticas. Agir de 20 acordo com os mesmos pode não garantir o sucesso, mas sempre é uma ajuda. Vejamos agora as questões relacionadas à tomada de decisões nas organizações: 1. O que as organizações visam primeiramente é continuar, isto é, sobreviver. 2. Essa meta ramifica-se em uma série de outras metas que dizem respeito ao relacionamento da organização com o mundo exterior. 3. As próprias metas da organização podem, muitas vezes, colidir entre si. Diante da impossibilidade de priorizar todas, algumas são subotimizadas (trade off ) . 4. Essa questão tem origem no fato de que as unidades da organização costumam ter metas funcionais que também se chocam entre si, ou até mesmo com outras metas da organização. 5. O fator tempo pode também afetar a otimização de metas, devido a mudanças de condições inesperadas. 6. Quem administra, geralmente, não busca a excelência em sua totalidade porque as decisões, nas organizações, costumam ser pautadas de acordo com o conceito de racionalidade limitada. Isso se dá pelos mesmos motivos que limitaram a racionalidade das decisões individuais. 7. Em uma organização, decidir muitas vezes significa utilizar uma base de exigências e conhecimentos acumulados, ou seja, técnicas e métodos de 21 diagnosticar, projetar e avaliar, somados a algumas teorias. A base social de conhecimentos auxilia os decisores, mas não é suficiente se não houver criatividade e intuição ao longo do processo de decidir. Falemos agora sobre a base das decisões. Individualmente, pelo menos, os indivíduos têm suas decisões pautadas por um sistema de crenças. Define-se crença como um conceito que carrega um valor agregado. CRENÇAS = CONCEITO + VALOR Os conceitos são geralmentede ordem intelectual ou racional, ao passo que os valores são de ordem emocional ou intuitiva. O grande desafio na formação de bons decisores é desenvolver essa escala de valores para que se possam romper os paradigmas e viver sob sua limitação. Dentro de uma análise temporal, somos hoje uma soma das decisões que tomamos no passado, às quais chegamos com base em crenças. Elas tiveram influência sobre decisões importantes como casamento, diploma e emprego, pelo fato de existir uma crença de que necessitamos dessas coisas para sermos mais felizes. A crença, portanto, é o fundamento da decisão e, em seu interior, existe uma variável de valor que é emocional e pessoal. Isso nos leva a concluir que 22 pessoas diferentes, com a mesma base de dados, analisarão diferentemente uma situação idêntica. Vejamos um exemplo: Você enviou dois analistas de produto para a África a fim de pesquisar o mercado de sapatos. Um deles voltou desanimado, com informações de que lá não há mercado, já que ninguém usa calçados. O outro retornou muito entusiasmado, dizendo que havia encontrado um extraordinário mercado em potencial, porque ninguém usava sapatos. Caso semelhante é o do “cara” ou “coroa”, mencionado anteriormente no Capítulo 1. Todos esses exemplos visam mostrar que duas pessoas, dispondo da mesma base de dados e informações, farão análises específicas e tomarão decisões bastante diferentes, em função de suas crenças e, particularmente, de seus valores. Cabe dizer aqui que os conceitos são cognitivos por natureza, ao passo que os valores são emocionais. Não basta, portanto, formar profissionais em cima de bases de dados, com sistemas fantásticos de informação, se eles sentirem medo pelo fato de não terem sido preparados para decidir, ou se basearem suas análises em valores preconceituosos. A imagem que melhor ilustra essa questão é aquela do soldado a quem foram fornecidos todos os equipamentos de combate possíveis que pudesse vir a solicitar, e que é derrotado por um pivete com um mísero canivete. Esse “Rambo” foi abatido porque alimentava a crença de 23 que não se poderia matar uma criança, mesmo estando armado até os dentes. Nessa hora, o pivete portando apenas com um canivete arremessa-o contra o “Rambo” e provavelmente mata-o. Passemos agora a um teste a fim de que o leitor descubra se seu problema, no que diz respeito a decisões, está localizado no campo dos valores ou dos conceitos. Pedimos ao leitor que selecione uma questão muito difícil, relacionada à sua vida, como mudança de emprego, de cônjuge ou de cidade. O diagrama 3 mostra o seguinte: 1) Reversivel ? S N 2) Assumir Responsabilidades? S N 3) Medo S N Diagrama 3 O grande entrave O Início refere-se a saber se a decisão a ser tomada é reversível em seus resultados, isto é, será que é possível tornar os resultados advindos dessa decisão retroativos? Se a resposta for sim, é sinal de que nada nos impede de seguir em frente para a próxima pergunta, relativa à responsabilidade, a qual diz respeito à possibilidade de se poder bancar ou não as conseqüências desse resultado. Contanto que não haja restrições a isso, é hora de encarar a próxima condição, que se refere à hipótese de estarmos com medo ou confusos. Se ela estiver descartada, meu caro leitor, execute, (nem decida), 24 simplesmente entre em ação. Caso contrário, se ao chegar neste ponto, perceber que está confuso, lamento informar que seu problema jaz na esfera dos padrões mentais e dos valores. Geralmente, é possível observar que a maior parte das pessoas empaca, tranca o processo decisório por conta desses medos e dessas confusões mentais. Isso reforça ainda mais a importância que é preciso dar à escala de valores dentro do processo decisório. É o que vai acelerar e gerar, de fato, uma melhoria significativa na evolução do processo decisório. Capítulo3 TEORIA DA DECISÃO “ Prática é quando tudo funciona e nada se sabe. Teoria é quando tudo se sabe e nada funciona...” 25 Embasando o lado conceitual do processo decisório, vamos lidar com tipos de pensamento, de decisão e de processo. O diagrama 4 , diz respeito ao Pensamento Linear: Uma Causa Um Problema Uma Solução Diagrama 4 - Pensamento Linear perante uma situação-problema, o decisor leva em conta apenas uma única causa como sendo responsável pela dificuldade e vai, naturalmente, buscar uma única solução. (Vejamos o caso da violência urbana, por exemplo. Podemos apontar como sua causa única a pobreza e acharmos que, ao erradicar esta última, estaríamos resolvendo o problema ) Complementarmente, temos o Pensamento Sistêmico. ( Diagrama 5). Várias Causas Um problema Várias Soluções 26 Diagrama 5 - Pensamento Sistêmico Diante de um problema, avaliamos as condições externas que o circundam e descobrimos sua causa, provavelmente mais de uma. Nossa ação, no sentido de buscar uma solução, necessitará de pelo menos uma ou mais opções, em que cada uma delas apresentará impactos diferentes, previsíveis ou não. Tratam-se de opções que, provavelmente, não serão estáveis, ou seja, uma vez que se decida por um tipo de caminho isso resultará em condições e problemas posteriores. A mudança de uma das partes sempre afeta a outra. Reaproveitando o exemplo anterior, partindo do fato de que a violência urbana não se deve exclusivamente à pobreza, pois nesse caso a Índia seria o país mais violento do mundo, podemos também levantar outras causas, como a formação familiar, o envolvimento com drogas, a competição e assim por diante. Quando se pensa em alguma solução para o problema da violência e se tenta erradicá-lo, isso implica mais custos para o orçamento governamental, mais educação e esbarrará em questões familiares. Ou seja, a solução de um problema acaba gerando novos problemas. Assim, a fim de analisar e solucionar dificuldades nas grandes organizações, é importante que o decisor não fique preso a uma linearidade extremamente rígida. De acordo com a visão linear, a seqüência de pressupostos tem a seguinte forma: 27 1. Existe uma dificuldade. 2. Ela tem uma causa. 3. Essa dificuldade pede uma solução que ponha fim a causa. 4. É absolutamente factível a avaliação de toda e qualquer alternativa em termos de conseqüências futuras. 5. Torna-se possível, portanto, selecionar uma solução apropriada para resolver a dificuldade. Uma vez que as organizações são muito complexas e o contexto decisório é bastante dinâmico, cria-se uma pressão que acaba por introduzir uma série de complicações na questão do pensamento linear e de seus pressupostos. Assim, somos forçados a admitir que há sempre mais de uma dificuldade, e que cada uma delas é fruto de várias circunstâncias. Além disso, a solução de cada dificuldade é acompanhada por efeitos que vão além da situação em jogo, e toda e qualquer alternativa tem que ser avaliada de acordo com resultados esperados e inesperados, ou seja, não programáveis. Portanto, a solução é muitas vezes temporária, já que as circunstâncias certamente se modificarão. Não podemos esquecer da ação protelatória, que tem lugar após uma tomada de decisão cuja causa sequer fora identificada. É uma maneira que o decisor encontrade ganhar tempo, a fim de poder fazer uma análise mais profunda da dificuldade. 28 Um outro aspecto não levado em conta pelo esquema de racionalidade são as pressões sobre quem decide. A decisão racional prevê uma sintonia de interesses que não encontra eco na realidade. As pressões são resultantes das demandas e expectativas de grupos e de particulares com interesses diversos. Toda vez que optamos, estamos satisfazendo e ao mesmo tempo indo contra interesses. Ao supormos que nossos interesses podem não ser atendidos, encontramo-nos já sob pressão por conta dessa expectativa. Os grupos e as pessoas que tiveram seus interesses contrariados ou beneficiados mobilizam-se para exercer pressão sobre os decisores, de forma que a escolha a ser feita propicie seus objetivos Quanto ao aspecto de programação do tempo, as decisões podem ser divididas entre as programáveis e as não programáveis. As primeiras estão geralmente ligadas à área operacional e à rotina das empresas. São coisas que sabemos irão se repetir muitas vezes. Contudo, à medida que subimos na escala hierárquica, passamos a nos confrontar com decisões cada vez mais não programáveis. São as decisões estratégicas, que pedem uma visão mais de longo prazo, num contexto decisório e mais aberto, no qual as situações não são obrigatoriamente repetitivas. Segundo Anna Campos no processo decisório, existem diferentes níveis mantendo relações de 29 condicionamento, tanto no sentido descendente (diretrizes) quanto ascendente (informações de acompanhamento). Dessa forma, decisões elaboradas em termos institucionais e fundadas na estratégia proporcionam as premissas e os condicionamentos para as decisões táticas. A tática norteia as decisões em termos de operação. Temos, portanto, um fluxo descendente, no qual as decisões de determinado nível influenciam aquelas do nível diretamente abaixo. Dentro da classificação das tipologias de decisores, podemos contemplar ainda dois tipos, no tocante ao número de pessoas que fazem opção pela decisão. Podemos ter decisões individuais, aquelas de foro íntimo, e as coletivas, envolvendo mais de um decisor, como acontece nas organizações, comitês, tribunais e partidos. Quanto à biotipologia, os processos decisórios podem ser classificados como racionais ou intuitivos. Vale a pena lembrar que o próprio corpo humano tem uma bilateralidade cerebral, onde existem funções distintas nos hemisférios direito e esquerdo. Este último é racional, analítico, abrigando em seu interior a noção de tempo. A esse hemisfério competem as decisões de cunho prático, repetitivo e programável. Já o hemisfério direito é sintético, criador, inexistindo a noção de tempo em seu interior. Conforme já foi dito, as decisões de rotina, ou programáveis, são mais facilmente resolvidas com 30 base nos processos racionais, ou seja, no hemisfério esquerdo. Por outro lado, quanto mais complexo, mais abrangente for o cenário, quanto mais a curto prazo for o tipo de decisão, os métodos racionais e analíticos tornar-se-ão provavelmente muito demorados e/ou custosos. Esse é o motivo de se adotar o método intuitivo como mais vantajoso nesses casos. Um bom exemplo disso é que por mais complexas que sejam as modelagens disponíveis, hoje, em termos de previsão de Bolsas, é praticamente impossível prever como uma operação de um banco mal sucedido em Singapura vai quebrar um banco de Londres, repercutindo na cotação das ações no Brasil. Mesmo que houvesse condições de se fazer essa modelagem, o tempo e o custo implicados neste sentido inviabilizariam praticamente o processo. A este nível, uma mãe-de- santo que diga “Meu filho, não invista na Bolsa hoje” torna-se quase tão eficiente quanto qualquer outra pretensão de modelo computadorizado. Um bom decisor deve tentar desenvolver os dois processos, o racional e o intuitivo. A vantagem do primeiro é a possibilidade de analisar a fundo, facilitando muito a implantação de decisões e, a partir disso, permitir também a democratização da informação. No processo intuitivo, as intuições são individuais, além de nem sempre serem repassáveis ou poderem ser repetidas. Além disso, para desespero dos tecnocratas da informação, a maior 31 parte das pessoas se vale muitas vezes apenas de opiniões baseadas em seus valores próprios ou de terceiros, fugindo da área totalmente racional. Não queremos negar os sistemas de informação e métodos racionais, mas num ambiente holístico, isso significa que não podemos negar Descartes nem fazer-lhe uma apologia exclusiva. Passemos novamente ao processo decisório. Antes de mais nada, vale a pena lembrar que a informação, dentro do método racional, é a base da decisão e o ingrediente fundamental do processo decisório. Não podemos, contudo, confundir informação com dados. Esses últimos são fundamentalmente insumos básicos, sem maior significado ou utilidade. Uma vez que se consiga compilar, cruzar e chegar a um grau qualquer de configuração desses dados, sob forma organizada, obtém-se o ponto de partida para a decisão: informação significa, portanto, dados devidamente trabalhados. A utilidade de uma informação está intimamente relacionada à contribuição que ela confere à qualidade das decisões. Segundo Anna Campos, a primeira característica de uma informação útil diz respeito à qualidade, ou seja, ela deve ter um mínimo de consistência e conteúdo para que possa permitir ao decisor tomar algum tipo de decisão. A segunda refere-se à adequação, isto é, ela deve estar voltada para a questão que vai ser 32 decidida. A terceira característica de uma informação útil é ser oportuna, existir no momento e no tempo certos, nem antes e nem depois. Se for muito antes, ela perde o valor e muito depois, não tem mais valia. Outros aspectos importantes relativos a informações úteis são a clareza, o que significa que elas devem ser inteligíveis para quem for utilizá-las, e a relatividade, isto é, um número absoluto sem qualquer padrão de referência não se presta como apoio para o decisor. Por exemplo, se você informa que dez pessoas foram contempladas hoje com bilhetes da loto, isso não faz muito sentido. Agora, saber que dez entre cem pessoas, ou dez entre um milhão foram premiadas, confere à informação um grau de relatividade que ajuda na tomada de decisão. Certamente, se tivermos a relação dez em cem, será muito mais interessante e provável que o decisor tome a iniciativa de apostar também. Por fim, vale a pena lembrar que toda informação tem um custo e, portanto, na hora em que se vai montar algum sistema de coleta de informações, é necessário que se contemple o custo dessa coleta em face do benefício na parte da decisão. QUALIDADE ADEQUAÇÃO OPORTUNIDADE INFORMAÇÃO CLAREZA 33 RELATIVIDADE CUSTO Diagrama 6 Quesitos de uma informação Dentro do objetivo do processo decisório, a função de planejamento é cada vez mais importante porque propõe uma diminuição da incerteza diante do futuro, já que todas as decisões estão ligadas ao fator tempo. Como seres vivos, boa parte de nossas decisões está atrelada à questão do futuro, isto é, de como moldá-lo. Isso implica em saber que a variável tempo pesa e acaba por ser determinante em boa parte das decisões. Passemos então aos métodos racionais de decisão: 1. Crença subjacente: a decisão ótima é possível, desde quese substitua a emoção pela razão, ou seja, desde que as escolhas se apoiem em métodos e técnicas científicas. 2. Podem ser mecanicistas (base matemática) ou determinísticos (base estatística). 3. Refletem um conceito de racionalidade desenvolvido pela economia clássica: melhor uso possível de recursos escassos com a máxima utilidade. 4. Máxima utilidade supõe um conjunto de decisões essenciais: 34 a) o decisor tem perfeito e completo conhecimento de todos os fatores relevantes para a situação de escolha; b) o decisor tem habilidade de construir uma escala de preferência de acordo com a utilidade esperada traduzida em termos monetários; c) o decisor tem condições de escolher a alternativa que maximize a utilidade. 5. As suposições da máxima utilidade são bastante difíceis de se confirmar no nosso cotidiano. O conceito passa a ser uma ficção teórica porque: - a maioria das decisões não é perfeitamente informada; - o ato da escolha afeta geralmente mais de um objetivo, não sendo a prioridade entre eles uma questão técnica nem uma solução definitiva; - nem todos os objetivos são traduzíveis em utilidade no sentido econômico; - nem todos os decisores maximizam sempre (racionalidade limitada - busca do satisfatório). O processo decisório advém da necessidade de se resolver algum tipo de problema. Ele parte da premissa de que teremos de definir o problema. O simples fato de se definir bem o problema já representa praticamente 50% de uma provável solução. A partir daí, obteremos dados e informações para podermos fazer uma análise. Com base nessa análise, dentro do possível, formular-se-á uma série de alternativas e, por fim, será escolhida uma para 35 determinar algum tipo de ação, visando uma solução. É importante notar que estamos vivendo em ritmo de final de século e de milênio, época na qual os decisores são muito incentivados a usar os métodos racionais. Vale a pena lembrar também que, em termos práticos, todo o aprendizado humano da civilização ocidental, nos últimos 500 anos, foi baseado em uma dicotomia, ou seja, aprendemos a distinguir o que é claro e escuro, calor e frio, bem e mal. Isso nos permitiu chegar à identificação de entidades opostas. Só que hoje em dia, cada vez mais, o que se observa é que não existe frio nem escuridão, e assim por diante. O frio, dentro do conceito físico, é a ausência de calor, assim como a escuridão é a ausência de luz, e o mal, a ausência do bem. Na realidade, estamos tratando de uma única coisa, uma única entidade. Assim, o momento pelo qual estamos passando é de integração e síntese. É aí que passa a valer a noção dos métodos não dicotômicos, mais intuitivos. Vivemos, portanto, o momento de questionar uma série de assuntos que eram tidos como verdadeiros paradigmas. Um bom exemplo para ilustração desse tópico é o do balde de tinta branca. Se pusermos nele uma gota de tinta preta e mexermos, para qualquer pessoa que o veja após misturado, ele continuará a ser um balde de tinta branca. Entretanto, já é uma tonalidade de cinza muito claro. Na medida em que se for 36 adicionando mais tinta preta, ele irá se tornando cada vez mais cinza, a ponto de isso se tornar visível e perceptível. Vai chegar um momento em que, com tanta tinta preta, a branca não será mais percebida. Naturalmente, teremos a idéia de que se trata de um balde de tinta preta quando, na verdade, é uma tonalidade de cinza extremamente escura. O momento atual demanda síntese e integração de partições realizadas nos últimos 500 anos. Aqueles que melhor realizarem essas etapas, disporão de uma base decisória muito mais ampla e completa, diante da adversidade com a qual nos defrontamos. 37 CAPÍTULO 4 O PROCESSO DECISÓRIO INDIVIDUAL “ Decidir ou não decidir , eis a questão...” O objetivo deste capítulo é analisar como o indivíduo, isoladamente, processa suas decisões. Existe uma premissa, base de todo este capítulo, que é a seguinte: só mudamos porque precisamos e não porque desejamos, ou seja, existe uma resistência natural dentro de nós à mudança. As transformações só se fazem com base na necessidade. Além disso, possuímos uma crença natural na segurança, isto é, idealizamos um emprego duradouro, um casamento para o resto da vida, felicidade e saúde enquanto vivermos, e assim por diante. A cultura dos dias de hoje, que tem um impacto no processo individual, valoriza extremamente a segurança. Temos muito medo de perdê-la. Mais adiante, veremos que todo o processo decisório parte, a princípio, de uma idéia de perda. 4.1 Ciclo da mudança Passemos agora às mudanças no plano individual. Para tal, utilizaremos uma questão do tipo sair ou não do emprego, terminar ou não o casamento, enfim, qualquer coisa. O processo 38 começa no primeiro quadrante do gráfico abaixo, ( Diagrama 7) Presente Futuro Não Mudar Mudar Benefício Racionalização Sonho Custo Sofrimento Medo Diagrama 7 Ciclo da mudança Neste primeiro quadrante avaliamos que existe um custo em não mudar, e portanto surge uma necessidade de mudança. Sendo assim, o estado presente gera um sofrimento; a pessoa está insatisfeita com o trabalho, o que a leva ao desejo de mudança. Logo a seguir, no segundo quadrante, ela racionaliza e avalia os benefícios de não mudar, vantagens do estado presente. Bem ou mal, aquele emprego ou casamento tem seus pontos positivos, levando naturalmente a uma acomodação que afasta a idéia de mudança. A esse quadrante, damos o nome de Fase da Racionalização. Mas tal estágio não é definitivo. Superada essa fase, a pessoa ingressa no terceiro quadrante, onde passa a vislumbrar e avaliar as vantagens de um momento futuro, vantagens da mudança. Provavelmente existirá a alternativa, ao trocar de emprego ou de casamento, de ser mais feliz, e esse é o objetivo básico do processo decisório 39 individual. Esse quadrante é chamado de Fase de Sonho ou Desejo, e ele marca o retorno da vontade de mudança. Após esse estágio, a pessoa ingressa finalmente no quarto quadrante, onde passa a avaliar o custo e riscos do estado futuro, ou seja, da mudança. Esse custo vem caracterizado pelo medo. Uma série de receios aparecem fazendo com que a pessoa evite a mudança. Assim, o quarto quadrante é denominado Medo. Mas o processo não acaba aí. A pessoa vai então fazer uma reavaliação do primeiro quadrante, uma vez que a necessidade de mudança foi refreada pelo quarto quadrante e pelo fato de ela não se sentir feliz. Assim, o estado de sofrimento retorna e tem lugar uma avaliação do custo de não mudar, isto é, do estado presente. O desejo de transformação voltará, fechando o ciclo no sentido horário, do primeiro para o quarto quadrante, até o momento de decisão em algum dos quadrantes. É bom que se observe, ao analisarmos detalhadamente esses quadrantes, que existem dois deles, o primeiro e o terceiro, que se referem à mudança. São aqueles ligados ao sofrimento e ao sonha, respectivamente. Por outro lado, o segundo e quarto quadrantes são marcados pela racionalidade e pelo medo, que evitam a mudança. Assim, podemos traçar dentro desse modelo um vetor relativo ao primeiro e terceiro quadrantes, ou seja, o Vetor da Mudança. No segundo e quarto quadrantes teremos outro vetor, o da não mudança, que 40 chamaremos de Vetor da Estabilidade.Analisando-se o processo em sentido horário, veremos que esses vetores são alternadamente colocados à disposição do decisor, isto é, ora queremos mudar, ora não o queremos mais. Essa dualidade provoca no decisor um estado de estresse e conflito, que será melhor analisado no diagrama 8. Capac. P.Decisão Conviver Stress Percepção Risco Tempo Diagrama 8 Decisão e Stress No diagrama anterior, pode-se avaliar em que momento o decisor tomará a decisão, face ao ciclo de mudança-não-mudança. É fácil observar em um dos lados, na abcissa, o fator tempo, e na ordenada, à esquerda, a capacidade de conviver com o conflito. À direita, temos a percepção do risco. Todo o processo é uma sucessão de picos, um sobe-e- desce, mas geralmente numa ascendente. Por exemplo, peguemos o processo de mudança de emprego. Há momentos em que existe o conflito, isto é, desejamos mudar, e outros quando 41 nos acomodamos à situação presente. Até chegar o momento em que não podemos mais tolerar e conflito e resolvemos assumir o risco da decisão. O ponto de decisão, portanto, está ligado a dois fatores, ou seja, à avaliação de risco e à capacidade de conviver com o conflito. A avaliação de risco é uma função interna, ligada basicamente à experiência e à própria maturidade. Quanto mais vivemos, mais nos tornamos experientes, avaliando melhor a complexidade da realidade que nos cerca e percebendo um grau maior de risco. Isso ajuda a explicar porque os jovens são mais impetuosos, decidindo mais rápido, enquanto os mais velhos e experientes mostram-se mais ponderados. Quanto à capacidade de conviver com o conflito, as pessoas menos estruturadas ou propensas a lidar com o estresse serão, certamente, as primeiras a tomar decisões. Em suma, quanto menos tolerarmos as situações de estresse, mais rápido será nosso ponto de decisão. De posse desse modelo, podemos afirmar que só mudaremos o padrão decisório de alguém, se conseguirmos envolvê-lo numa menor percepção de risco ou fazer com que conviva melhor com o estresse inerente à tomada de decisões. Isso implica mexer com valores, sejam eles mentais, morais ou espirituais, que terão grande influência sobre esse ciclo aqui apresentado. Um outro ponto importante é que o estresse vai 42 aumentando até se tornar insuportável. Nessa hora, o decisor resolve efetivamente assumir as rédeas juntamente com os riscos que acompanham a tomada de decisão. E no instante em que decide, mesmo que essa decisão se dê apenas no plano mental, sem nenhuma ação física, o estresse retorna ao ponto zero. A tensão que vinha sendo acumulada no processo decisório é eliminada. Podemos dizer, portanto, que o processo decisório é basicamente uma luta contra o estado de estresse e tensão x risco. Essa percepção de risco está intimamente ligada a um sistema de informação que obtemos do ambiente externo e que é confrontado com os valores internos. Quanto à questão de conviver com o estresse, ela está relacionada aos padrões físicos, éticos, espirituais, morais e mentais. Em um processo decisório difícil, quando uma pessoa toma uma decisão, chega a ser fisicamente visível que ela fica mais leve e aliviada, após ter feito uma opção, mesmo que esta não tenha ainda sido posta em prática. 4.2 Decisão, crenças e paradigmas Vamos falar agora da importância da mudança dos padrões mentais, tecendo algumas considerações sobre nosso processo cognitivo. Todo o conhecimento humano, ou o que chamamos de 43 realidade, foi baseado nos sentidos e na percepção que temos do ambiente que nos circunda. A própria ciência, dentro de seu princípio de negação, desenvolve-se à medida que fatos e fenômenos podem ser atestados, ou seja, até que se prove em contrário, eles simplesmente não existem. Outro aspecto interessante é que nossa educação foi fundamentada numa dicotomia, num processo cartesiano e analítico, com cerca de 500 anos, no qual aprendemos claramente as diferenças com base nos opostos. . Estas diferenças se tornam referências e que acabam por se transformar em conceitos. Durante a vida, somos obrigados a optar por um desses conceitos, abandonando outros, o que gera uma escala de valores: o correto é fazer o bem, devemos ser belos, inteligentes e assim por diante. À medida em que estudamos e aprofundamos essa dicotomia, ampliamos nosso processo cognitivo, até chegarmos à conclusão de que essas dualidades aparentes não existem na forma em que nos são apresentadas. Na realidade, o ambiente que nos cerca é uno. O que acontece é que analisamos um mesmo fenômenos sob óticas diferentes. Por exemplo, se analisarmos o quente e o frio de acordo com a física, observaremos que não existe o conceito de frio. Outro aspecto interessante dentro do processo de cognição é que temos uma noção de tempo linear. Reconhecemos o hoje, o amanhã, aquilo que 44 está à frente e com o qual sonhamos, e o ontem, marcado por lembranças, recordações e ligado ao passado. Em termos de processo decisório, só podemos executar a mudança num único estado, ou seja, o presente. Não podemos realizar mudanças no passado e muito menos no futuro. A ação de mudança só pode ser empreendida no presente. Cada vez mais, portanto, torna-se importante entender que tudo o que somos hoje é resultado de decisões e ações empreendidas no passado, e que nosso futuro depende de decisões e ações tomadas no presente. Compete apenas a nós mesmos o caminho pelo qual trilharemos em direção ao futuro, em nível decisório. Vejamos por exemplo alguém que esteja cursando uma faculdade. Enquanto um aluno está assistindo “àquelas aulas intermináveis” na sua cabeça, a conclusão do curso já é uma realidade enquanto objetivo. Sem esforço, atenção e disciplina dificilmente ocorrerá a concretização desta meta. Toda decisão surge primeiro no plano mental para depois ser executada no plano físico. O que chamamos de realidade é apenas uma percepção da realidade, e tudo o que existe no plano material, teve uma existência apenas mental num estágio anterior. Tomemos o exemplo de um prédio, que antes de ter sido colocado o primeiro tijolo para sua construção, ele já existia na mente do arquiteto. Ao transformar sua idéia em uma planta, ele apenas democratizou a comunicação com recursos visuais, 45 permitindo que alguém executasse seu plano mental para concretizá-lo em termos materiais. É importante, assim, que cada vez mais trabalhemos nossos planos mentais para melhorarmos os padrões decisórios. A decisão sempre antecede a ação. Somos exatamente o que decidimos, entrando em choque com nosso lado determinista, o qual nos torna uma vítima da fatalidade ou do destino. A diferença se dá a partir de decisões e posturas mentais, adotadas por decisores em momentos de crise e mudança. Voltando ao exemplo da faculdade; certamente no decorrer do seu curso, aquele aluno se defronta com provas, testes e cobrança de freqüência. Aqueles que acharem por demais difícil encarar tais situações diante das possíveis vantagens de uma graduação, provavelmente acabarão abandonando a faculdade. Aqueles que perseverarem e continuarem acreditando na importância do diploma e do conhecimento, estes serão capazes de sacrificar suas horas de lazer em nome daquele objetivo. Com isto, reforçamos o conceito da relação custo x benefício e ressaltamos aimportância da estrutura do decisor. É bom que se diga também que os padrões mentais atuam exatamente como uma liga. Assim como nos metais existe uma liga, dentro do indivíduo há uma estrutura. Conforme a natureza desta, teremos um comportamento e um tipo de padrão decisório. Na metalurgia existe um termo técnico 46 denominado “tenacidade” que qualifica o seguinte: uma mola helicoidal não é apenas um arame espiralado; se a comprimirmos, ela voltará a seu formato natural assim que a soltarmos, e mais, passará por um estado maior do que estava quando comprimida. Se pegarmos apenas um arame espiralado e o pressionarmos, teremos apenas um arame amassado. Tenacidade, enquanto característica de uma estrutura do decisor, refere-se à capacidade de QUERER, tirar forças num momento de crise para enfrentá-la. Essa propriedade de “tenacidade” deve ser cada vez mais desenvolvida na cabeça dos decisores, no sentido de tirarmos partido das crises e pressões para conquistarmos espaços e condições melhores do que tínhamos anteriormente. Quando falamos do processo decisório em termos de liga e tenacidade, é importante observarmos duas coisas. Primeiro, essa tenacidade psicológica ou flexibilidade será um resultado da estrutura do ego de cada um. Entendamos “ego” como o administrador de nossas percepções, o que nos mantém em contato com a realidade que nos cerca. Esse ego é permeado por duas variáveis. De um lado temos a vaidade e do outro o orgulho. Em função de como esses dois sentimentos manifestam- se e de como são administrados por nós, desenvolveremos a “liga” no sentido de que ou nos tornamos uma vítima do mundo, durante os 47 momentos de pressão, ou reagiremos alcançando um estado melhor que o anterior. Caso predomine o orgulho, é provável que no auge da crise a reação seja de afirmar o ego e gerar forças para superar a crise. Caso predomine a vaidade, o medo do erro e da aprovação dos outros, provavelmente levará a um enfraquecimento do ego e esvaziamento das forças de reação. Isso é algo assustador, uma vez que nos dá uma liberdade de ação extremamente ampla, para a qual a maioria não está preparada. É muito cômodo culparmos nossos pais, nosso chefe, nossos filhos e assim por diante por fracassos e insucessos, relacionados a decisões não tomadas ou mal tomadas. Mas quando passamos a entender que somos resultado de decisões passadas, e que precisamos aprimorar nossa “tenacidade” e capacidade de nos estruturamos melhor numa crise, tornamo-nos melhores decisores e assumimos as rédeas de nossos destinos. Antes de tratarmos da quebra dos paradigmas, vejamos uma pequena amostra de como decidimos baseados em percepções. ( Diagrama 8A) o 48 Diagrama 8A Decisão e Percepção Observe o triângulo do diagrama 8-A com um ponto central. Por incrível que pareça, esse ponto central encontra-se exatamente no meio da altura do triângulo. Isso pode parecer um absurdo, mas a verdade é que fomos levados a concluir em cima de uma ilusão ótica. Os dois lados inclinados do triângulo nos induzem a pensar que ele está mais ao alto. Em caso de dúvida, basta pegar uma régua e medir. A mesma coisa vale para as nossas pretensas verdades. Decidimos baseados em “verdades” que não refletem exatamente nossa realidade, o que é uma prova de que decidimos fundamentados em percepções. O que julgamos ser a realidade não passa da percepção que temos dela. Se achamos que não temos “sorte” com as mulheres, que não temos “jeito” para aquela profissão ou coisas do gênero, essas convicções se tornarão uma realidade e, muito provavelmente, prejudicarão nosso processo decisório. Vivemos cheios de paradigmas que em algum momento de crise foram úteis, mas continuamos a utilizar esses recursos sem perceber que o instante é outro e as variáveis outras. Ao 49 mudarmos essa percepção, mudamos também nosso processo decisório. Peguemos um exemplo para ilustrar a maneira pela qual podemos avaliar crenças e paradigmas que atrasam nosso processo decisório. Imaginemos uma criança com a qual tenhamos vínculos afetivos. Embora seja muito querida por nós, há momentos em que ela se torna um pouco insuportável. Agora responda o seguinte: como essa criança consegue nos tirar do sério? Fazendo o quê ou dizendo o quê, ela consegue nos irritar? Pense um pouco e escreva a resposta num papel. Terminou? Gostaria então de dizer-lhe que a característica ruim que tanto lhe desagrada nessa criança também existe em você, em grau menor ou igual, embora não a aceite. Esse processo de não aceitação é o que tira você do sério. A irritação advém do fato de que ao decidirmos, assumimos um papel previamente estruturados onde nós eliminamos posturas e imagens negativas, não aceitas socialmente, preferindo o reconhecimento dos arquétipos positivos. A criança se manifesta com posturas e atitudes quer positivas, quer negativas e que serão paulatinamente reforçadas ou eliminadas em função da educação daqueles que a cercam. Em função de como é eliminado mo lado feio, o errado, esta negação fica em estado latente apenas. Todos nós continuamos a possuir no fundo um lado mau, um lado negro, um lado feio. Quanto mais o negamos, mais ele se 50 revolta e se manifesta, quando encontra eco e reflexo. As pessoas que nos cercam funcionam como espelhos de nós mesmos. O que chamamos de amigos são pessoas que reforçam pontos positivos que já conhecemos, ao passo que nossos inimigos, aquelas pessoas que nos irritam e incomodam, conseguem expor facetas, comportamentos e atitudes que não admitimos possuir. Assim chegamos à triste conclusão de que temos muito mais a aprender com nossos inimigos do que com os amigos. Se mudarmos nosso padrão, nossa referência, quebrando esse paradigma, mudaremos de amigos e de inimigos também. Os inimigos são, portanto, nossos grandes mestres. Não fique esperando que eles mudem, é mais fácil você mudar para deixar de tê-los como inimigos, ou se afastar para não ter o custo desta mudança. Não se espera que adotemos esses comportamentos tidos como indesejáveis, mas o simples fato de entendermos que eles são parte de um todo e que não há motivo para se lutar contra os mesmos coloca-nos, quase que automaticamente, numa condição de força, acima deles. O fato é que estabelecemos relações a partir de espelhos de nós mesmos. Essa mesma situação também tem lugar dentro de uma empresa. Existe um modelo que reflete a relação que há entre um chefe e um subordinado. Em geral, podemos avaliar o primeiro pelo perfil do segundo. Duas pessoas 51 trabalham melhor juntas quando têm características afins. Da mesma forma, os chefes tendem a rejeitar aqueles subordinados que lhes parecem ser seus contrapontos. Avaliando o impacto deste princípio entendemos porque as decisões organizacionais tendem a assumir posturas convergentes e ortodoxas, dificultando a mudança do status quo . 52 CAPÍTULO 5 PADRÕES MENTAIS E O PROCESSO DECISÓRIO “A decisão antecede a ação...” Neste capítulo enfocaremos como a mudança dos padrões mentais é essencial para alterar o processo decisório individual. Segundo Bellieney, psicólogo comportamental, a conquista de um novo padrão mental normalmente advém de um perda , conforme modelo abaixo: Suicídio - Depressão ApatiaVingança Rancor Raiva Mágoa Tristeza Angústia Culpa Ansiedade Negação PERDAPERDAPERDAPERDA Aceitação Brandura Reflexão Caridade + Auto Perdão Libertação 53 Diagrama 9 - Estados Mentais e Perdas O primeiro impulso diante de uma perda é adotar uma das posturas , a de aceitação ou negação da perda; sendo que a escala superior ( da negação )do diagrama é a normalmente mais adotada. Neste segmento arranjamos culpados e bodes expiatórios para evitar o contato com a aceitação. Essa escala aumenta até o estado de vingança contra o culpado ou bode expiatório. A partir daí , na falta deste prossegue para a apatia, onde não tendo mais alvos expiatórios, voltamo-nos contra nós mesmos. Isso culmina com o estado de suicídio, agressão máxima ao ego. Somente quando ingressamos na escala da aceitação é que passamos a superar a perda e o estado de culpa , o que estabelece um padrão mental positivo. Perante o estado de culpa ingressamos normalmente em um ciclo vicioso onde necessitamos automaticamente de um perdão. Normalmente procuramos este perdão externamente, arranjando um bode expiatório ou alguém para se confessar. Acontece que o alívio da culpa dessa maneira permite que se incorra novamente no estado de culpa o que transforma o processo em um ciclo interminável. Somente quando nós nos perdoamos é que rompemos este ciclo. 54 Na escala da aceitação, adotamos um novo padrão mental que pode levar a reflexão e culminar com o estado final de auto perdão, quando nos liberamos definitivamente da culpa. Acontece que a nossa educação analítica e dicotômica como fomos criados, nos orientou para optar por apenas um dos lados, negando o outro. Essa unilateralidade opcional gera conflitos internos o que acarreta um estado de stress. Analisemos agora o que ocorre imediatamente após uma perda. Perante uma situação de perda o nosso caráter vai definir como reagiremos. Neste cenário temos de um lado a vaidade e do outro temos o orgulho. Ambos atuam na mesma direção embora os sentidos sejam diametralmente opostos. Se prevalecer o orgulho, este pode ser utilizado como alavanca propulsora no sentido de decidir a ação , acionando o vetor mudança . Se prevalecer a vaidade é provável que a não ação prevaleça, gerando um vetor de não mudança, conforme visto no capítulo 4. Outro aspecto controverso é o da inteligência e o processo decisório individual. Inteligência pode ser concebida como a capacidade de um organismo perceber diferenças e a velocidade com que as mudanças ocorrem . Isso ocorre variando de pessoa para pessoa e o fato de perceber essas mudanças em tempo não é garantia de ação, uma vez que o ciclo da mudança e de stress antecedem a essa . 55 Em um ambiente volátil e em constante mudança, como são os dias de hoje, esse tipo de inteligência será cada vez mais determinante na sobrevivência de indivíduos e organizações. CAPÍTULO 6 O PROCESSO DECISÓRIO ORGANIZACIONAL 56 “Este nem Deus afunda...” ( frase dita no batizado do Titanic) 6.1 Decisão e modelo organizacional O paradima Tamanho é Documento A princípio, o sonho de qualquer grande profissional é trabalhar, fazer carreira, se possível, se aposentar no auge desta como diretor de uma grande empresa. As estatísticas provam, entretanto, que esse sonho está cada vez mais difícil de acontecer ou de se concretizar. No Brasil existe um ranking feito pela revista Exame, onde são listadas anualmente as 500 maiores e melhores empresas do país. Em função de seu nome e poderio econômico, elas têm condições de contratar os melhores profissionais e, portanto, as melhores massas cinzentas; dispõem das melhores facilidades de crédito, uma vez que todos os bancos desejam lhes emprestar dinheiro, e têm acesso às tecnologias mais modernas. Teoricamente, essas organizações teriam tudo para prosperar durante um futuro bastante longo. O que se observa, contudo, é que a maior parte destas empresas lamentavelmente não conseguem nem mesmo sobreviver por muito tempo, mesmo com todas as vantagens que dispõem. Passemos à análise de algumas estatísticas assustadoras: o primeiro ranking da Exame, em 1974, relacionou as maiores e melhores empresas de então. 57 Em 1992, contabilizando-se quantas delas ainda faziam parte da lista original, chegou-se à triste estatística de que apenas 223 ainda estavam lá. E o que é pior, das 500 de 1974, apenas 91 haviam subido no ranking, ou seja, tinham galgado posições melhores nesses últimos dezoito anos. Isso é um paradoxo, uma vez que já foi dito que essas organizações dispunham de todas as facilidades de recursos humanos, financeiros e tecnológicos que fariam inveja a qualquer média ou pequena empresa. Examinando-se agora o ranking de 1994, dois anos após, essa estatística se agrava mais ainda. Das 223 empresas que faziam parte da lista em 1974, encontramos apenas 186, sendo que só 85 delas haviam conseguido subir de posição. A maioria absoluta simplesmente desapareceu do ranking e cada vez um número menor daquelas empresas continuava com “fôlego” para ainda subir no ranking. Muitos pensarão que esse fenômeno é fruto de um modelo econômico como o brasileiro, com inúmeros planos econômicos, aos quais as empresas não resistiram. Comparando-se com a lista de 500 empresas da Fortune americana, que inspirou a Exame, observa-se a mesma estatística e, mais ainda, esse vai-e-vem de colocações no ranking se dá numa velocidade muito superior à nossa. Em vez destas mudanças se darem a cada 18 anos, como é o caso da Exame, as transformações se dão a cada 12 ou 13 anos na Fortune. Fica então a seguinte dúvida: como 58 empresas bem sucedidas, com os melhores profissionais do mercado, com acesso às melhores tecnologias e linhas de crédito do mundo podem ter um desempenho tão medíocre. Afinal, o que há de comum entre essas bem sucedidas empresas para explicar a razão de sua efemeridade no ranking? Todas têm algo em comum: o mesmo modelo organizacional. A ciência da Administração surgiu no início deste século, junto com a Revolução Industrial e adotou modelos para estruturar organizações a partir da Igreja Católica e o Exército. Dessas instituições, se tiraram os conceitos de hierarquia, especialização, unicidade de comando e assim por diante. Assim, todas essas empresas têm o formato de uma grande pirâmide: no topo, um presidente; e na base, uma infinidade de subordinados. Quanto ao modelo de comando, há até bem pouco tempo ao menos, seguia-se aquele adotado pelo Exército ou pela Igreja. Como já foi dito, outra característica desses modelos era a clara separação da função da “cabeça” da empresa, como no Vaticano e no Estado Maior, do resto da organização. Os modelos, tanto do Exército quanto da Igreja, são de obediência e não de decisão. Não é à toa que seja comum na cultura dessas empresas - entendendo cultura como um somatório de crenças - a filosofia de que “ordem dá quem pode, obedece quem tem juízo”. Esse modelo que separa a cabeça do corpo, onde a primeira decide e o outro obedece, tem 59 levado a uma sucessãode fracassos dentro dos processos decisórios empresariais, ocasionando uma série de atrofias. Um aspecto importante é que para muita gente a “não decisão” é uma opção. Uma vez que somos avaliados, a princípio, mais pelos próprios erros do que pelos acertos, principalmente nas esferas superiores, a maneira mais fácil de não errar é não decidir. Quanto mais ascendemos dentro de nossa carreira numa organização, o plano político passa a ser mais relevante que o técnico. A questão do poder, dos relacionamentos e a administração de conflitos acabam promovendo e facilitando a vida e o crescimento dos não decisores. Paradoxalmente, a área administrativa torna-se um excelente refúgio para eles, que acabam prosperando, porque o resultado do trabalho realizado nesse campo é de difícil mensuração direta e objetiva. Outro aspecto importante é que nem sempre há convergência de interesses de decisões individuais e corporativa e na “cabeça”, na matriz das empresas, as regras não são as mesma comunicadas ao corpo da organização. Esses órgãos funcionam literalmente como grandes clubes, abrigando uma série de interesses particulares e pessoais, mesmo que em detrimento dos organizacionais. Um bom exemplo disso é a ditadura de Wall Street, onde cada vez mais a carreira e a remuneração dos principais gestores estão submetidas a um pagamento de dividendos aos acionistas, no sentido de retorno do capital 60 investido, facilitando uma visão de curto prazo com a dilapidação de patrimônios e o pouco arrojo nos investimentos. Por exemplo, em relação a um lucro do período, resta ao gestor distribuir o montante ou alocá-lo em reinvestimentos no negócio. Ora, se o prazo de maturação desses investimentos for longo, a pressão para o pagamento de dividendos acaba sendo, a curto prazo, um fator decisivo ; para a manutenção dos cargos e carreiras daqueles administradores decisores. A prorrogação ou redução daqueles investimentos em tempo hábil acaba tirando a competitividade da organização. Assim, essa conjuntura compromete o sucesso de médio e longo prazo das empresas, em troca da manutenção de cargos, que é política e de curto prazo. Já percebendo isso, as grandes organizações americanas de hoje estão partindo para a abertura de capital em favor dos próprios funcionários, uma vez que eles conseguem avaliar o sucesso da organização a médio e longo prazo. O investidor da área financeira normalmente não consegue ter essa mesma paciência e serenidade em termos de investimento. Esse modelo organizacional do qual estamos tratando, e que nós mesmos, professores de Administração perpetuamos em nossas aulas, está por incrível que pareça “falido”. Como já comentamos a modelagem organizacional através da ciência da 61 Administração, partiu da observação das instituições de sucesso, na época. A Igreja Católica, por exemplo, como organização, era todo-poderosa até por volta de 1960, exercendo um monopólio dentro do mundo ocidentalum exemplo disso ainda é o seu peso nas decisões econômicas, sociais, políticas e muitas vezes até científicas. Durante toda a Idade Média a “fogueira” ameaçava pensadores que contrariassem seus preceitos religiosos e podemos ainda sentir esta influência, só que em menor escala ainda nos dias de hoje. Vale lembrar que os feriados, dias tidos como não produtivos, estão ligados a maior parte à Igreja Católica. No caso do Exército, e entenda-se Forças Armadas, há o mesmo exemplo de monopólio citado acima, ou seja, o Estado tem apenas uma Força Armada, um exército. Vale ressaltar que essas observações se referem às organizações, e não aos produtos e valores por elas representados. O que há de comum nos modelos da Igreja e do Exército é que eles sempre operaram em ambientes de baixa turbulência, com pouca ou quase nenhuma ameaça, como monopolistas, e isso promoveu o princípio da obediência de um corpo a uma cabeça pensante. Ao copiarem esses modelos, as empresas prosperaram e se agigantaram sem maiores problemas até meados da década de 60. Nesse ambiente de baixa turbulência, todos aqueles preceitos advindos da Igreja e do Exército eram 62 louvados, e coitados daqueles funcionários e trabalhadores que ousassem desafiar suas chefias: ao invés da corte marcial, excomunhão, apenas a demissão sumária... O ingresso numa dessas organizações significava uma espécie de sacerdócio, e a promoção era apenas uma questão de paciência e servilismo. Mas dentro do modelo em pauta, há espaço para muita disfunção administrativa e para a prática da “não decisão”, que pode até ser bem sucedida, já que não induz ao risco de erro. Esse modelo organizacional passou a dar sinais de colapso quando, a exemplo da Igreja Católica, começou a perder fatias de mercado para os concorrentes. Desde 1960, a Igreja Católica já contabilizou perdas de mais de um terço de seu rebanho, cooptado e assistido pelos concorrentes diretos: as linhas kardecistas e espíritualistas, na classe média; a umbanda e os evangélicos nas classes menos favorecidas. Lembramos aqui que mesmo a Igreja Católica, enquanto instituição, precisa contar com recursos de seus clientesos fiéis. E aqui vale a pergunta, qual foi o pecado da Igreja como organização? Por volta de 1960, uma grande mudança tecnológica, a pílula anticoncepcional, e outra social, o divórcio, surgiram, e a postura da Igreja foi de negação e condenação de seus clientes. À medida que sua clientela ficava desassistida, a concorrência fazia a festa. A Igreja foi obrigada a 63 rever uma série de pontos, desde os cultos que eram, até 1968, ministrados em latim, até a própria dinâmica das missas. Quanto ao Exército, o erro de avaliação da modelagem se deveu ao estado default dessa organização. O normal de um exército é estar em paz e não em guerra. Lembre-se que há mais de meio século, o Brasil entrou em guerra. Nesse estado, fica relativamente fácil administrar, basta seguir o manual (“By the book management”). Enquanto que o normal de um exército é estar em paz, o que mais se observa na vida empresarial é o estado de guerra. Ora, analisando-se o modelo do exército em guerra, observamos que a estrutura organizacional perde a rigidez, e o poder decisório sai da cabeça do general, com os tenentes assumindo o comando. Comparando-se isso à vida empresarial, é como se os gerentes passassem a assumir as decisões de competição. O grande problema é que esses gerentes-tenentes foram educados para a paz e obediência, o que dificulta a quebra de valores e paradigmas. Nós, professores de Administração, insistimos em ensinar esses modelos, que praticamente só estimulam a obediência e não o raciocínio, formando bons empregados administradores em vez de empreendedores. É o caso de lembrar a frase que diz “quem sabe faz, quem não sabe ensina, chefia ou até escreve um livro”. 64 Capítulo 7 MUDANÇAS DE PARADIGMAS 7.1) Paradigma do Trabalho “ O homem nasceu para o trabalho ....” provavelmente algum patrão Retornando à questão da cultura das empresas, já salientamos que cada uma tem a sua. Vale ressaltar que há uma estreita ligação entre cultura e tecnologia. Esta última não tem o poder de mudar uma cultura se as premissas de crença e valor forem 65 afrontadas. Para uma tecnologia ser bem sucedida, é preciso que seja recebida
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