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Testamento Genético: Possibilidade e consequências da sua adoção no direito brasileiro

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POSSIBILIDADE DE ADOÇÃO DO TESTAMENTO BIOLÓGICO/GENÉTICO NO 
BRASIL E AS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS QUE TAL INSTITUTO TRARIA 
PARA O DIREITO DE FILIAÇÃO 
 
André França 
 
Sumário: 1 Introdução; 2 O Testamento no sistema jurídico brasileiro: 
Dos primórdios a atualidade; 2.1 Autonomia da vontade privada e o 
testamento: Da capacidade pra testar; 3 Breves colocações acerca do 
biodireito e da bioética a luz do sistema constitucional brasileiro; 4 
Da possibilidade da adoção do testamento genético no Brasil: As 
consequências jurídicas para o direito de filiação; Considerações 
finais; Referências 
 
RESUMO 
 
O presente trabalho de pesquisa tem por objetivo estudar o instituto do testamento no direito 
brasileiro compreendendo os requisitos necessários para sua validade. A partir disso, será 
pensada a possibilidade de adoção do testamento biológico para utilização de óvulos e sêmen 
post mortem, possibilidade esta que ainda não encontra disposição legal no Brasil. Desse 
modo, se propõe apresentar as possibilidades e desafios de promover o testamento biológico, 
levantando discussão no que se refere ao direito de filiação que poderia advir à criança fruto 
dessa suposta relação jurídica, no âmbito do direito das famílias, levando em consideração o 
princípio da não diferenciação dos filhos. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Direito das Famílias. Testamento Genético. Sucessão testamentaria 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
Uma época se revela pelos seus costumes, regimentos, entretenimento, mas, 
sobretudo, pelas instituições, bem como pelos comandos destas. Ocorre que em virtude de um 
contexto contemporâneo de globalização, o Direito ocupa um importante lugar de destaque 
passando a ser protagonista nas relações sociais, o que tem de certo modo expandido o seu 
âmbito de atuação englobando a tutela de novos valores e interesses jurídicos a exemplo do 
campo do Direito das Famílias. 
Diante disso, sabendo que com a adoção dos ideais do Estado Democrático de 
Direito que representam em si a melhor forma de consagrar e efetivar direitos fundamentais, 
houve uma clara e significativa aproximação entre a Constituição e o Direito Civil. Nesses 
termos, coadunando com tais ideais, o Direito Civil deve estar de acordo com os anseios da 
nova estrutura constitucional. Foi por essa razão que a Constituição ampliou a visão do que é 
 
 
família, passando o direito de família a ser um direito privado constitucionalizado. No 
entanto, a sociedade continua evoluindo, novas relações (familiares) vão surgindo e tal 
matéria encontra-se defasada em muitos dispositivos, pois mesmo o sendo o Código Civil 
relativamente novo, a elaboração do seu projeto remonta a década de 70. 
Diante de tais colocações e sabendo que o Código é silente em diversas matérias 
referentes à composição familiar brasileira hodierna, se faz imprescindível desmitificar a 
visão reducionista das entidades familiares e ir além, é necessário enfrentar diversos 
paradigmas, para se romper o silêncio do legislador que muitas vezes se abstém de 
manifestar-se em questões polêmicas que envolvem principalmente discussões de âmbito 
moral e religioso. Sabendo ainda que não é o fato de não estar previsto em lei que tira do 
cidadão, ou da família, o direito de vê seu pleito apreciado, ou ter seu direito garantido é que 
este trabalho se põe, pois ao trabalhar a possibilidade de adoção do testamento genético no 
Brasil, em especial no referente aos efeitos sobre o direito de filiação estar-se, em verdade, 
questionando-se sobre a possibilidade de se criar medidas além daquelas estipuladas pelo 
Código Civil sendo que a partir dela a verdadeira composição familiar poderia ser melhor 
atendida que a composição atual. 
 
2 O TESTAMENTO NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO: DOS PRIMÓRDIOS A 
ATUALIDADE 
 
É bem verdade que praticamente todos os ramos do Direito podem ser esmiuçados 
de forma mais elucidativa utilizando-se de um levantamento histórico. Pois bem, com o 
Direito de Família e das Sucessões não é diferente. Através desse capítulo, entenderemos um 
pouco da pré-história do testamento que serviu como base para as demais fases distribuídas de 
acordo com o tempo até que cheguem as manifestações hodiernas desta prática. 
No tocante a esse aparato histórico de desenvolvimento e evolução do testamento, 
começando pela antiguidade, pode-se utilizar das palavras de Carlos Roberto Gonçalves: 
 
O testamento, ao menos como ato de última vontade como compreendiam os 
romanos, no período clássico de seu direito, era desconhecido no direito primitivo. 
Nem sempre a lei e os costumes o admitiam, havendo legislações pelas quais eram 
punidos aqueles que pretendiam instituir herdeiros ao arrepio da lei (2014, p. [?]). 
 
Baseando-se, mais a frente, no período pré-clássico como uma vicissitude de 
melhor assimilação e de acordo com as colocações de Silvio Salvo Venosa (2006), sabe-se 
que na Lei das XII Tábuas e mesmo antes dela, o testamento não ocupava grande espaço entre 
 
 
as compilações, no entanto foram constituídas as primeiras noções acerca desse instituto, 
existindo duas formas normais de testamento, quais seja o testamentum colatis comittiis 
realizado duas vezes por ano durante comícios, onde cada pai de família tinha a oportunidade 
de manifestar sua última declaração de vontade perante o povo reunido que servia como 
testemunha. Por sua vez, existia também o testamento in procintum, realizado em tempos de 
guerra e perante o exército. 
Em um segundo momento, ainda a época pré-clássica, surgiu o testamento per aes 
et libram realizado mediante o cobre e a balança, vindo a por em desuso os dois instrumentos 
anteriores. Diante disso são esclarecedoras as seguintes colocações: 
 
A permissão para que qualquer pessoa pudesse dispor, por morte, de seus bens, sem 
a intervenção do povo, foi dada pela referida Lei das XII Tábuas, relegando ao 
desuso as primitivas formas de testamento. O modelo então criado era fundado na 
mancipação, denominava-se per aes librum (por dinheiro e peso) e era uma venda 
fictícia da sucessão feita pelo testador ao futuro herdeiro, perante o oficial público e 
com a participação de cinco testemunhas (GONÇALVES, 2014, p.[?]). 
 
Levando em consideração que o testamento possui relação direta com as relações 
familiares e com direito de propriedade e mantem ainda intrínseca relação com a autonomia 
da vontade, é possível perceber que a tendência desse instituto ao longo dos anos foi se 
solidificar no campo das sucessões e de reduzir as formalidades existentes acerca do mesmo, 
para permitir assim que qualquer indivíduo pudesse expressar sua última vontade. Nesse 
contexto, surgiu a figura dos pretores que passaram a aceitar a validade do testamento escrito 
mediante a apresentação de sete testemunhas, no intuito de tornar o testamento um negócio 
jurídico eminentemente simples. (Idem) (grifado). 
Como decorrência disso, percebe-se que os moldes concretizados no período 
clássico foram importantes para o desenvolvimento das demais formas testamentárias, 
observando a utilização da escrita na concretização do ato para manter a ordem dos negócios. 
Posteriormente, passado esse momento, agora já no período pós-clássico surgiram 
formas de testamentos mais semelhantes às manifestações hodiernas, foi nessa época que 
surgiram os testamentos particulares (nuncupativo, hológrafo), testamento militar, testamento 
rurícola, testamento em tempo de peste e os testamentos públicos. Acrescente ainda 
 
Entre os testamentos públicos, temos então o principi oblatum, pelo qual o testador 
apresentava ao príncipe seu ato de última vontade, que era confiado ao poder 
público para arquivá-lo, e o apud acta conditum, que nada mais erado que a 
declaração de última vontade do testador ao juiz ou autoridade municipal, que a 
reduzia a termo. Delineiam-se, pois, nessa fase, as formas de testamento utilizadas 
até hoje (VENOSA, 2006, p. 173). 
 
 
 
No tocante ao período extenso da Idade Média, onde a Igreja se encontrava em um 
dos seus auges históricos, o testamento não tinha grande importância e sua existência se 
resumia tão somente ao fato de deixar algo para a Igreja, mediante a presença de um clérigo e 
algumas testemunhas. 
Visto isso, no que se refere ao direito brasileiro, conforme assevera Carlos 
Roberto Gonçalves (2014), antes do Código Civil de 1916, foram dispostos os testamentos 
aberto ou público, cerrado ou místico, particular ou ológrafo, nuncupativo ou por palavras. Já 
com a efetiva disposição do Código, foram instituídos os testamentos público, cerrado, 
particular, marítimo, militar e nucunpativo quando se tratar de testamento militar. Analisando 
o referido diploma legal é possível perceber que fora permitida a coexistência das sucessões 
legítima e sucessão testamentária. O Código Civil de 2002, por sua vez, acrescentou a 
modalidade de testamento especial e incluiu o testamento aeronáutico, exigindo também um 
mínimo de formalidade para a elaboração do testamento em qualquer de suas formas. 
Entende-se, dessa maneira, que relatos históricos são de suma importância para o 
entendimento das situações ocorridas no direito civil. Importante ressaltar que a cultura 
constitui um importante aspecto no surgimento do testamento, haja vista, que as evoluções 
das organizações sociais propiciaram diversas mudanças em todos os segmentos do direito 
que se apresenta como um reflexo da própria sociedade sendo decorrência lógica da sociedade 
em que está inserido. 
 
2.1 Autonomia da vontade privada e o testamento: Da capacidade para testar 
 
É sabido que o objetivo do testamento é assegurar a declaração de vontade de 
quem testou, nesse sentido é evidente que o testamento está intrinsicamente ligado a 
autonomia da vontade privada. Por essa razão é um dos instrumentos mais importantes do 
direito privado. 
O testamento, utilizando-se das palavras de Maria Helena Diniz Daniel (2013, 
p.11) “é ato personalíssimo, unilateral, gratuito, solene e revogável, pelo qual alguém, 
segundo norma de direito, dispõe, no todo ou em parte, de seu patrimônio para depois de sua 
morte, ou determina providências de caráter pessoal ou familiar”. 
Em síntese, pode se concluir que o testamento se trata de um negócio jurídico 
(que requer necessariamente agente capaz, objeto lícito e forma) unilateral, causa mortis, pois 
o seu efeito está condicionado a um evento que é a morte do declarante, para assim fazer valer 
 
 
a sua manifestação de vontade. 
Sabendo dessas informações introdutórias de acerca do testamento, é importante 
que se tenha em mente que esse instituto possui algumas características decorrentes da 
legislação e da doutrina que remontam aos princípios legais. Desse modo, é interessante que, 
desde logo, sejam apresentadas algumas das principais características do testamento no âmago 
da sociedade brasileira. Para isso, utilizar-se-á das colocações de Caio Mário da Silva Pereira: 
 
Segundo os elementos definidores, e na conformidade dos princípios legais e 
doutrinários, fixamos os seguintes caracteres: 
1.Negócio jurídico. Tendo em vista que o testamento se constitui de uma declaração 
de vontade, destinada a produção dos efeitos jurídicos, queridos pelo disponente, 
inscreve-se como negócio jurídico; 
2.Unilateral. O testamento perfaz-se com uma emissão de vontade. Trata-se de 
declaração não receptícia de vontade, uma vez que se não dirige a alguém, ainda 
quando seja nomeado testamenteiro; 
3.Personalíssimo. No sentido de que há de ser feito pelo próprio testador, sem a 
interferência de quem quer que seja. Não permite a participação de outro agente, a 
qualquer título que seja; 
4. Gratuito. Não comporta correspectivo. A disposição que o contenha é inválida. A 
gratuidade é da essência do ato; 
5.Solene. Em todo o tempo, o testamento é ato formal. A manifestação de vontade 
do testador há de revestir a forma prescrita em lei; 
6.Revogável. Para caracterizá-lo diz-se que a vontade testamentária é essencialmente 
revogável [...] conservando, pois, a ideia de sua plena revogabilidade, até a morte 
do testador (2013, p.177). 
 
Depois de observados esses pontos, é importante tecer informações acerca da 
capacidade para testar. A capacidade ativa diz respeito à legitimidade de quem pode testar 
que não compreende a mesma capacidade para os atos da vida civil. Nesta senda, de acordo 
com o Código Civil, em regra qualquer pessoa física pode testar. A exceção prevista a regra 
fica por conta dos incapazes (abarcando os menores de 16 anos, os mentalmente enfermos, 
surdos-mudos sem condições de manifestar sua vontade) e de pessoa que no ato de elaboração 
não tiver pleno discernimento conforme preceitua o artigo 1.860, CC. O que deve ser levado 
em consideração é o momento de elaboração do testamento, devem ser observadas as 
condições de quem vai testar. Nesses termos, é que um menor de 16 anos é totalmente 
excluído da capacidade ativa, já relativamente capaz maior de 16 anos pode perfeitamente 
elaborar um testamento, haja vista que o legislador quis levar em consideração a capacidade 
de discernimento do indivíduo. Assim, o relativamente capaz tem plena capacidade de testar. 
Trata-se, pois, de uma capacidade mais ampla do que a capacidade geral. Importa pensar que, 
para fazer testamento, a lei procura reconhecer do sujeito um certo grau de discernimento. 
Acertadamente, a lei entende que o maior de 16 anos tem esse discernimento (VENOSA, 
2006, p. 184). 
 
 
No que diz respeito à capacidade passiva, é sabido que esta se refere à 
legitimidade de alguém para ser herdeiro (ou legatário se tratar de bens individualizados) e 
requer a existência do indivíduo levando em consideração o momento da sucessão. Aqui estão 
incluídas as pessoas jurídicas, mas assim como o fez na capacidade ativa o Código Civil no 
seu artigo 1.801 prevê um rol de exclusão e dispõe que “Não podem ser nomeados herdeiros 
nem legatários: I- a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou 
companheiro, ou seus ascendentes e irmãos; II- as testemunhas do testamento; III- o 
concubino do testador casado, salvo se este, sem culpa sua estiver separado de fato do cônjuge 
há mais de cinco anos; IV- o tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou escrivão, perante 
quem se fizer, assim como o que fizer ou aprovar o testamento”. Percebe-se, dessa maneira, 
que são não possuem capacidade passiva a pessoa que escreveu no lugar do testador (a rogo), 
as testemunhas constantes no testamento, o concubino impuro e as autoridades que vão 
receber ou arquivar meu testamento não podem ser beneficiadas. Cabe lembrar que só pessoas 
podem receber herança, animais não podem ser herdeiros nem legatários na sucessão 
testamentária, no entanto o declarante na hora de elaborar o ato pode estabelecer algum 
encargo ou condição no que se referir a estes. 
O testamento, portanto, apesar de não muito utilizado na prática, compõe e torna-
se algo indispensável no que se refere a disposição do patrimônio do testador, sendo 
inteligente a sua disposição na legislação brasileira, haja vista que necessita de regularização, 
organização e legitimidade, para assim estabelecer parâmetros importantes para fazer valer a 
última vontade daquele que testa. 
 
3 BREVES COLOCAÇÕES ACERCA DO BIODIREITO E DA BIOÉTICA A LUZ DO 
SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO 
 
Tendo em vista que o ponto central desse estudo, qual seja a possibilidadeda 
adoção do testamento genético no direito brasileiro, está ligado, em uma espécie de relação 
simbiótica, com a concepção de biodireito é que este capítulo se debruça em uma análise do 
tema. Sabendo que, em uma aplicação do biodireito há que se estudar conjuntamente outro 
ramo social responsável por balizar as questões por ele geridas. É que se fará um estudo 
relacionado entre biodireito e aquilo que o legitima, ou o mitiga, qual seja, a bioética. 
 
3.1 Conceitos de Biodireito e Bioética 
 
 
 
Não tão difundido quanto o conceito de ética, que possui algumas definições 
inclusive pode ter diversos viés a depender do filosofo que a defina. O conceito de bioética 
remonta a década de 1971, tendo sido empregado a primeira vez por Van Rensselaer Petter, 
biólogo estadunidense. Ele empregou tal neologismo “para destacar a importância das 
ciências biológicas como garantidoras da qualidade de vida e sobrevivência do planeta.”. 
(FERREIRA, 2009). 
Maria Helena Diniz (2002) ao destrinchar o pontuado por Petter explícita que “a 
bioética seria então uma nova disciplina que recorreria às ciências biológicas para melhorar a 
qualidade de vida do ser humana, permitindo a participação do homem na evolução 
biológica”. Porém, essa participação do homem não poderia se dá de maneira a degradar, ou 
romper com a harmonia do universo. 
Em uma compreensão mais contemporânea poder-se-ia definir a bioética como a 
configuração de um paradigma. Tal paradigma teria como escopo a possibilidade ou o 
objetivo de fazer surgir um novo discurso sobre a vida, discurso esse que estabeleceria uma 
nova ética que viria como resposta ao anseio de um discurso da dogmática cientifica moderna 
e em decorrência lógica das mudanças de paradigmas ocorridas ao longo das últimas décadas 
e, em grande parte, resultado das inovações na área cientifica, o papel do homem, até então 
encarado como sujeito manipulador – em sentido amplo – de objetos, se tornou o próprio 
objeto de manipulação. Assim sendo, todas essas “questões relativas à Bioética vêm eivadas 
de complexidade, haja vista tratarem-se de questões científicas, filosóficas, econômicas e 
jurídicas, da qual a interdisciplinaridade é notória.”. (FERREIRA, 2009). 
Ora, ante essas questões, e principalmente, ante a necessidade de se tutelar 
relações de extrema importância pra sociedade – como a tecnologia atrelada ao melhoramento 
ou mitigação do direito a vida - e que, apesar de carecerem de proteção e de se entender que o 
Direito é decorrência lógica da sociedade em que está inserido. Essa transformação não estava 
e ainda, em grande medida, não esta, acompanhando as transformações sociais pelas quais a 
sociedade brasileira tem passado. Ora, tem-se que “em decorrência desse desenvolvimento 
biotecnológico [e da necessidade de se proteger esse ramo da ciência que interferia de forma 
direta nas relações humanas é que] nasceu o Biodireito como o ramo do Direito que estuda, 
analisa e cria parâmetros legais, acerca dos assuntos relacionados à Bioética, caracterizando-
se como sendo o elo entre esta e o Direito.”. (FERREIRA, 2009). (Grifado). 
 O biodireito pode ser conceituado, de forma bastante simples como “a produção 
 
 
doutrinária, legislativa e judicial acerca das questões que envolvem a bioética. Vai desde o 
direito a um meio-ambiente sadio, passando pelas tecnologias reprodutivas, envolvendo a 
autorização ou negação de clonagens e transplantes [...]”. (Idem). 
Ainda segundo Santos (2006) “Chega-se ao conceito de ‘Biodireito’, como sendo 
a positivação das normas bioéticas”. Em outras palavras, “biodireito é a positivação jurídica 
de permissões de comportamentos médicos-científicos e de sanções pelo descumprimento 
destas normas.”. Portanto, uma vez que se estar a tratar da possibilidade de adoção do 
testamento genético no Brasil, testamento esse que qualifica o gene humano como objeto, e 
como tal passível de doação, e ciente de que qualquer regulamentação, ou qualquer pretensão 
de se adotar o mesmo, deverá antes de tudo passar pelo crivo do Biodireito e da Bioética é que 
se passará a análise de alguns princípios que regem tal ramo jurídico. 
 
3.1.1 Princípios constitucionais aplicáveis a Bioética a ao Biodireito 
 
A dignidade da pessoa humana, elencada a qualidade de fundamento da República 
Federativa do Brasil, fato que pode ser observado segundo a disposição do art. 1º, inciso III da 
Carta Magna de 1988 pode ser definida, segundo as lições de Alexandre de Morais como: 
 
Um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na 
autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a 
pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo 
invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar. (MORAIS, apud, 
FERREIRA, 2009). 
 
Logo, qualquer medida que mitigue ou esvazie o princípio da dignidade da pessoa 
humana será passível de ter a sua inconstitucionalidade decretada. Tal princípio possui força 
irradiante e por esse motivo a dignidade da pessoa humana é aplicável ao campo do Biodireito 
e da Bioética, porque, pelas razões acima expostas, não se pode conceber a aplicação de um 
método genético sem que o mesmo esteja de acordo com tal princípio. (FERREIRA, 2009). 
O Princípio da Igualdade, tal princípio é encarado hodiernamente, muito mais em 
viés isonômico que objetivo, ou seja, o mesmo só estaria satisfeito quando se se “mitigasse” a 
falácia de que todos são iguais perante a lei. Logo, sua satisfação viria pela diferenciação, em 
outros termos, tal igualdade só seria estaria satisfeita se se tratasse os diferentes na medida das 
suas diferenças. (FERNANDES, p. 155, 2013). 
Inviolabilidade da vida. Ora sabe-se que “a vida representa para o indivíduo, bem 
vital, de valor inestimável, deve guardar a mais absoluta proteção à integridade física ou 
 
 
moral do indivíduo, devendo o biodireito resguarda-la, ao máximo, referentemente, aos 
experimentos científicos que envolvam seres humanos.” Portanto, diante do até aqui 
explicitado, para que haja a aplicação do testamento genético no ordenamento brasileiro, só 
seria possível com a observação, dentre outras coisas, de um dialogo sócio-constitucional e do 
repeito pelos princípios fundantes do Estado Democrático de Direito. (Idem). 
 
DA POSSIBILIDADE DA ADOÇÃO DO TESTAMENTO GENÉTICO NO BRASIL: 
AS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS PARA O DIREITO DE FILIAÇÃO 
 
Antes de se adentrar diretamente ao cerne da questão que aqui se pretende 
desenvolver e, tendo ciência da novidade do assunto que está sendo trabalhado. Na verdade, 
pode-se falar, em termos doutrinários, de ineditismo, haja vista que nenhum trabalho, com 
semelhante teor, foi encontrado. Logo, diante dessa carência de referencias e, visando o 
desenvolvimento desse estudo da forma mais didática possível é que se estabelecerão alguns 
pontos. 
O primeiro deles é que apesar de se usar aqui, em determinados momentos, 
inclusive no tema do trabalho a palavra testamento biológico, esse termo também é utilizado 
para se designar a feitura do testamento vital, o qual não é o objeto desse estudo. Só a titulo de 
esclarecimento o testamento objeto desse trabalho é o testamento no qual o testador dispõe de 
seu material genético, por isso também chamado de testamento genético. Já o testamento 
vital, que também pode ser chamado de instrumento de "diretivas antecipadas de vontade". 
Ou seja, no testamento vital se institui diretivas de “vontade e instruções [que] devem ser 
aplicadas sobre uma condição terminal do testador ou em casos de impossibilidade dele dispor 
sobre sua vontade, no que diz respeito à dignificação do seu estado de paciente e/ou de sua 
morte,à recusa ou suspensão de tratamentos paliativos, (ortotanásia), etc.” (ALVES, 2014). 
O segundo é a de que, embora a legislação nada preveja, ou a jurisprudência ainda 
não tenha tido a possibilidade de se debruçar sobre um caso com tais peculiaridades, se ainda 
assim, seria possível a adoção, ou a feitura de um testamento que tivesse como objeto a 
disposição do material genético do(a) doador(a). Sabe-se, pela leitura do art. 1.857 § 2º, do 
Código Civil (2002) com a seguinte redação “São válidas as disposições testamentárias de 
caráter não patrimonial, ainda que o testador somente a elas se tenha limitado.”. Nem só, 
disposições patrimoniais pode ser objeto de testamento, além disso, não parece haver qualquer 
obstrução a disposição de material genético por meio do testamento. Claro que observando os 
 
 
requisitos já trabalhados nesse estudo, como capacidade para testar, dentre outros. 
Logo, no referente ao tema, a questão estará muito mais voltada para um viés 
ético, e qualquer pretensão de adoção teria que superar debates abarcados pelo estudo da 
bioética e do biodireito, talvez até dos setores mais conservadores da sociedade que sempre 
estão a postos para levantar o dedo e dizer que não concordam, quando na verdade as questões 
estão muito além da sua concordância ou não. Direitos e liberdades não podem ser discutidos 
em virtude de “achismos”, as liberdades de uma coletividade devem estar além do 
pensamento individual. 
Enfim, como não há vedação no Código Civil ou em qualquer outro dispositivo 
legal e sabendo que no direito privado vige a lógica, devido ao princípio da legalidade, de o 
que não é proibido é que: 
 
No atinente aos "testamentos genéticos", inexiste previsão na legislação brasileira, 
dispondo, entretanto, a resolução 1.957/11, do Conselho Federal de Medicina, [diz] 
que "não constitui ilícito ético a reprodução assistida 'post mortem', desde que haja 
autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológico 
criopreservado, de acordo com a legislação vigente". Este normativo ético é 
premissa de base suficiente a sugerir a prática mais elaborada de testamentos da 
espécie. (ALVES, 2014). 
 
Portanto, estabelecida à premissa de que, rigor, não há qualquer óbice legal para a 
feitura de um testamento genético se passa agora a analise de algumas questões de ordem 
prática que poderiam advir caso o mesmo fosse adotado. 
A primeira delas é sobre quem poderia ser legatário desse testamento. Nesse caso 
vale consignar que aqui não se estar a tratar de pessoas que formam uma entidade familiar, 
porque nesse caso, ou seja, no caso de inseminação heteróloga o ordenamento não só permite 
como regula a questão – vide art. 1.597, inc. V, CC/02 –. Portanto, aqui se estar a falar de 
pessoas fora dessas relações. Em suma, pontua-se que qualquer pessoa que pode ser legatária 
de um testamento comum, a rigor, poderia ser legatária de um testamento genético, haja vista 
que o mesmo é ato unilateral e não receptício, logo, o legatário do mesmo poderia abrir mão 
do legado, haja vista ser bem individualizado, quando da abertura do testamento. 
Vale pontuar ainda, que o testamento genético como afirma a advogada israelense 
Irit Rosenblum, diretora da ONG Nova Família, e autora da ideia, representa "o desejo de dar 
continuidade à nossa vida [o que] é um desejo natural e essa vontade da pessoa deve ser 
respeitada mesmo após sua morte". Logo, quando alguém deixa o seu material genético para 
outra pessoa (sêmen ou óvulo) o intuito desse alguém é de que haja uma fertilização e 
consequentemente a prolongação da vida. Ainda a título de curiosidade, vale destacar que essa 
 
 
ideia foi primeiramente adotada em Israel onde filhos deixaram para os pais o material para 
que os mesmos, caso queiram, possam ter um neto. Isso de certa forma é justificável pelo 
contexto sócio-histórico daquele país, onde situações de guerra e ataques terroristas podem 
ceifar, a qualquer momento, a vida de uma pessoa. 
Pontuado que se poderia testar e que o material genético testado teria fins de 
inseminação. Surge a seguinte indagação, como se daria o reconhecimento da paternidade? 
Como aqui não se trata de uma doação anônima, nessas, a rigor, prevalece o anonimato do 
doador e sabendo que o material é de pessoa determinada, autora do testamento, não se pode 
chegar à outra conclusão a não ser a de que caberá sim a presunção de paternidade – inclusive 
como uma decorrência do direito a identidade genética da criança - e como a intenção da 
pessoa que doa o material, - ao menos nos casos narrados na reportagem da BBC – é a de que 
haja um prolongamento da sua relação parental, o natural é se concluir que o nome do doador 
poderá sim constar no registro da criança se essa for a sua vontade e se o legatário concordar, 
quando da aceitação do legado. 
Outra questão de ordem prática que poderia surgir é relacionada à possibilidade de 
se pedir alimentos gravídicos, em interpretação conforme as disposições da Lei 11.804/08 que 
regulamenta a possibilidade de se “obter” alimentos gravídicos, acredita-se, ser possível, até 
porque poderia ser um caso em que o testador deixou o legado para os pais e que seus pais 
escolheram a mãe do seu neto. Portanto, desde que necessário, a priori não haveria qualquer 
óbice. 
E se a criança – fruto do legado – tiver irmãos. Poderia haver pedido de alimentos 
para os mesmo? Em uma primeira análise – e, fazendo uma interpretação conforme o art. 
1.697 do CC/02 – não parece haver óbice para isso sendo que poderia haver inclusive o 
inverso, o da pessoa fruto da inseminação desse material dado em testamento ter que pagar 
alimentos para os seus irmãos. 
Para finalizar, no que concerne ao direito de herança, com relação aos bens do/da 
pai/mãe doador do material genético, essa criança, não pode será herdeira na sucessão 
legitima, pois se o herdeiro ainda não existe há época da abertura da sucessão ele não poderá 
suceder, conforme dispõe o art. 1.798, CC/02. Porém, na sucessão testamentaria, o autor do 
testamento biológico poderia deixar algum legado para essa criança, ou crianças a depender 
da quantidade de filhos que seu material genético possa gerar. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
 
 
Embora, dentre os institutos responsáveis por reger a vida em sociedade o Direito 
de Família seja um dos que mais sofre pressão de grupos conservadores ansiosos pela 
manutenção do status quo justificado como uma proteção da “família tradicional” e dos seus 
valores, o mesmo não pode ficar estagnado. Em razão disso, as maiores inovações 
concernentes ao instituto tem ocorrido à margem do legislativo, tomadas por magistrados que 
ousaram ir além das disposições estritas da lei e a reconhecer direitos individuais que não 
podem ser mitigados por contas de pensamentos retrógrados. 
Certo que o testamento genético ainda é apenas uma possibilidade inovadora e 
como tal, com certeza, polarizador de ideias contrárias. Porém, há uma possibilidade, até 
porque o princípio da inafastabilidade jurisdicional é a regra em nosso ordenamento. É certo 
que ainda há muito que se construir a respeito do tema, mas tal construção só será possível 
quando houver pessoas dispostas a ultrapassar as barreiras do obvio e a lutar pela efetivação 
dos seus direitos, talvez esteja na hora de uma verdadeira autonomia da vontade privada se 
efetivar e de o Estado e “alguns cidadãos de bem”, deixarem de interferir quando o que está 
em jogo é algo que se refere tão somente às liberdades individuais e que não afetem 
sobremaneira direitos de terceiros. 
 
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