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Henrique-Simonsen-Brasil-2001

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MARIO HENRIQUE SI-
MONSEN 
BRASIL 2001 
 
Digitalização: Argo 
www.portaldocriador.org 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
O objetivo do presente livro é o de examinar as condições para 
que o Brasil escape às previsões do Hudson Institute, as quais nos 
vaticinam crescente atraso em relação à renda per capita dos paí-
ses mais prósperos. A conclusão básica da análise é a de que pode-
mos nutrir a esperança de que os fatos desmintam essas projeções. 
Mas que isso depende da nossa racionalidade e do nosso esforço, e 
não da simples e inerte extrapolação das tendências. 
O título do livro deveria ser BRASIL ANO 2000, com base nas 
projeções do Capítulo I. Mas como recentemente foi publicado outro 
livro com esse título, apelou-se para o devido substituto cine-
matográfico. Parte do material contido no texto já havia sido di-
vulgada em várias publicações como APEC, Indústria e Produtivida-
de, Boletim Cambial etc. Todavia, os dados foram atualizados e vá-
rias partes intermediárias revistas, de modo a dar ao texto certa 
continuidade e alguma seqüência lógica. 
Enquanto o livro estava sendo escrito, a Fundação Getúlio Var-
gas revia as suas Contas Nacionais. Os resultados dessa revisão 
ainda não foram publicados e, por isso, não foram incorporados aos 
quadros constantes do presente texto. Ao que parece, a principal 
conclusão é a de que o desenvolvimento do setor terciário no decê-
nio de 1950 foi mais brilhante do que se supunha pelo julgamento 
das antigas estatísticas. Em essência, isso não altera nenhuma das 
principais conclusões do presente texto. 
Devo agradecer aos professores Octávio Gouvêa de Bulhões, Au-
gusto Jefferson de Oliveira Lemos e João Paulo dos Reis Velloso 
pela paciência com que leram alguns capítulos do texto original, 
contribuindo com valiosas críticas e sugestões. Obviamente essa 
colaboração não os torna solidários com os erros do livro, que 
correm pela exclusiva responsabilidade do autor. 
 
Rio de Janeiro, março de 1969 
 
Mário Henrique Simonsen 
ÍNDICE 
 
 
 
 
 
CAP. I — AS PREVISÕES DO HUDSON INSTITUTE 
 
1.1 A Defasagem Crescente 
1.2 O Cenário Quantitativo — O Mundo Dicotômico 
1.3 O Cenário Quantitativo — As Projeções por Países 
1.4 Variações Brasileiras em torno das Projeções de Kahn e Wiener 
 
CAP. II — A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO: 1920/1967 
 
2.1 O Crescimento do Produto Real 
2.2 Composição da Despesa Nacional Bruta 
2.3 Industrialização e Estrutura Ocupacional 
2.4 O Modelo Brasileiro de Desenvolvimento — Avaliação e Crítica 
 
CAP. III — O PENSAMENTO ESTRUTURALISTA 
 
3.1 A Comunicação Mística 
3.2 Problemas de Crescimento no Brasil — A Visão Estruturalista 
3.3 O Diagnóstico Estruturalista — Exame Crítico 
3.4 A Terapêutica Estruturalista e o Keynesianismo Prematuro 
3.5 Uma Variante Estrutralista 
3.6 A Mensagem Estruturalista 
 
CAP. IV — A ARITMÉTICA DOS COELHOS 
 
4.1 A Progressão Explosiva 
4.2 O Ufanismo Demográfico 
4.3 Do Malthusianismo Clássico ao Bom-Senso Aritmético 
4.4 Política Populacional e o Fatalismo Demográfico 
 
CAP. V — A TOLERÂNCIA INFLACIONÁRIA 
 
5.1 A Evolução da Taxa Inflacionária no Brasil 
5.2 Raízes Sócio-Políticas dos Processos Inflacionários Crônicos 
5.3 As Distorções Inflacionárias 
5.4 O Inflacionismo e a Estreiteza dos Horizontes de Programação 
5.5 Inflação e Desenvolvimento — O Caso Brasileiro 
 
CAP. VI — O GARGALO EXTERNO 
 
6.1 O Desenvolvimento Introvertido 
6.2 O Modelo dos Três Limites 
6.3 Dívida Externa e Balanço de Pagamentos 
6.4 Exportar ou Estagnar 
 
CAP. VII — PLANEJAMENTO, MERCADO, INTERVENÇÃO ESTATAL 
7.1 Os Erros do Mercado e os Erros do Planejador 
7.2 Planejamento, a Técnica Neutra 
7.3 Planejamento e Realismo Orçamentário 
7.4 O Crescimento do Setor Público na Economia Brasileira 
 
CAP. VIII — O PROBLEMA EDUCACIONAL 
 
8.1 Educação e Desenvolvimento 
8.2 O Esforço Quantitativo 
8.3 Deformação Cultural e Estrutura do Ensino 
8.4 A Pirâmide do Desperdício 
8.5 O Desperdício nas Universidades 
8.6 A Mensagem de Esperança 
 
CAP. IX — ANALISE ANTIECONÔMICA 
 
9.1 Racionalidade e Política Econômica 
9.2 O Nacionalismo Obscurantista 
9.3 O Mito do Subsídio 
9.4 A Cibernética de São Tome 
9.5 As Fórmulas da Cadeia da Felicidade 
9.6 O Antitecnicismo 
9.7 O Capitalismo Tomista 
 
CAP. X — O DESAFIO DO DESENVOLVIMENTO 
 
10.1 A Corrida da Renda Per Capita 
10.2 A Semelhança dos Modelos 
10.3 Cinco Grandes Problemas 
 
APÊNDICES 
 
I — ÍNDICE DO PRODUTO REAL — RESULTADOS E DISTORÇÕES 
II — O ÍNDICE DE CONCENTRAÇÃO DE LORENZ 
III — MODELOS DO CIRCULO VICIOSO DA POBREZA 
IV — EFEITO DO CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO NUMA FUNÇÃO COBB-DOUGLAS 
V — INFLAÇÃO E CRESCIMENTOECONÔMICO — VERIFICAÇÃO EMPÍRICA 
VI — DIVIDA EXTERNA E BALANÇO DE PAGAMENTOS 
VII — DESENVOLVIMENTO E PROGRESSO TECNOLÓGICO 
 
CAPÍTULO I 
 
AS PREVISÕES DO HUDSON INSTITUTE 
 
1.1 — A Defasagem Crescente 
 
Todo brasileiro, ao tomar conhecimento das projeções do Hudson 
Institute, contidas no livro "The Year 2000" de Herman Kahn e An-
thony Wiener, sente-se decepcionado com o baixo nível de renda per 
capita que nos é previsto para o fim do século. A valerem tais ex-
trapolações, no ano 2000 estaremos com apenas 506 dólares anuais 
de renda per capita, enquanto os Estados Unidos terão ultrapassado 
a casa dos 10.000 dólares, e o Japão, o Canadá e vários países da 
Europa Ocidental a ordem dos 6.000 dólares. Em termos absolutos 
teremos conseguido algum progresso: os 506 dólares no fim do sécu-
lo representam 81% a mais do que os 280 dólares per capita estima-
dos para 1965 — o que, em progressão geométrica, equivale a uma 
taxa anual de crescimento de 1,7%. Em termos relativos, porém, es-
taremos ainda mais distanciados do que hoje das nações desenvolvi-
das. Hoje a relação entre a nossa renda per capita e a dos Estados 
Unidos é da ordem de 1:12,7. Pelas projeções do Hudson Institute, 
no ano 2000 ela será de 1:20,1. O Quadro 1 a seguir ilustra esse 
problema da crescente defasagem relativa. Até em comparação com o 
nosso vizinho, a Argentina, estaremos cada vez mais atrasados. 
 
QUADRO 1 
 
RENDA PER CAPITA DE ALGUNS PAÍSES 
EM RELAÇÃO AO BRASIL 
 
PAÍS Renda per ca-pita em dóla-
res de 1965 
Número de vezes a 
renda per capita do 
Brasil 
 1966 2000 1965 2000 
Estados Unidos 3.557 10.160 12,70 20,08 
Canadá 2.464 7.070 8,80 13,97 
França 1.924 6.830 6,87 13,50 
Alemanha Ocidental 1.905 7.790 6,80 15,40 
Japão 857 8.590 3,06 16,98 
U.R.S.S. 1.288 4.650 4,60 9,19 
Itália 1.101 4.450 3,93 8,79 
Argentina 492 1.300 1,76 2,57 
Brasil 280 506 1 1 
Fonte: Kahn e Wiener — The Year 2000. 
 
Entre nós, as reações quanto a essas previsões se têm dividido 
bastante. Uma corrente pessimista as toma como um vaticínio fatí-
dico de que o Brasil será o eterno país de um futuro cada vez mais 
distante. Outra, mais moderada, as encara apenas como uma séria 
advertência quanto ao que nos poderá ocorrer se não soubermos 
construir um processo sólido de desenvolvimento. Mais numerosos, 
talvez, sejam os otimistas, que confiam que mais uma vez fique 
provado que a economia é a ciência que justifica no presente por-
que as suas previsões para o futuro fracassaram no passado. Na boa 
filosofia do avestruz, vários argumentos são utilizados por essa 
corrente: o que nega a validade das comparações internacionais de 
renda per capita, o que nega a representatividade da renda per ca-
pita como indicador da importância e do bem-estar de um povo, e o 
que nega a viabilidade de qualquer previsão econômica a longo pra-
zo na linha do Hudson Institute. Como esses argumentos desfrutam 
de certa popularidade valem alguns comentários. 
A principal crítica usualmente oposta às comparações interna-
cionais de renda per capita é a da dificuldade de escolha de uma 
taxa adequada de conversão cambial.O método mais simples de con-
versão seria dividir a renda per capita de cada país, na sua moe-
da, pelo preço do dólar no mercado de câmbio. Os resultados, no 
entanto, poderiam ser bastante distorcidos, pois a taxa cambial 
corrente não necessariamente reflete a paridade dos preços inter-
nos nos diversos países. O fato de existirem países onde a vida se 
considera mais cara ou mais barata é a conseqüência óbvia desse 
fato. Admitindo que nos Estados Unidos a vida seja mais cara do 
que no Brasil esse sistema de conversão subestimaria o nosso pa-
drão de vida, colocando-nos numa escala indevida de subdesenvolvi-
mento. 
Acontece que esse não é o critério de que se utilizam os eco-
nomistas nas comparações internacionais de renda per capita. Tais 
dados são obtidos pela aplicação de determinados coeficientes de 
ponderação aos índices de produção física por habitante, e não pe-
la simples conversão por taxas cambiais. É claro que existem difi-
culdades na escolha de um sistema de pesos adequado para diferen-
tes países, e por isso as estimativas internacionais de renda per 
capita não se podem considerar suficientemente precisas. Em todo o 
caso o método contorna o problema das divergências entre as taxas 
cambiais de mercado e de paridade de poder aquisitivo. Para nos 
certificarmos desse fato, lembremos que em 1965 o produto interno 
bruto per capita no Brasil era de NCr$ 374,60. Convertido à taxa 
cambial média do ano (NCr$ 1,92 por dólar) esse valor corres-
ponderia a 195 dólares per capita. Na realidade Kahn e Wiener par-
tem de 280 dólares — cifra que já leva em conta a correção de pa-
ridade de poder de compra. É possível que, alterando os coeficien-
tes de ponderação internacional a nosso favor, conseguíssemos es-
ticar essa estimativa até 320 dólares. Em todo o caso, o ponto de 
partida do Hudson Institute parece situar-se dentro da faixa ad-
missível de ordens de grandeza. 
Quanto à representatividade da renda per capita para a avalia-
ção do desempenho de um país, cumpre não incorrer em exageros num 
sentido ou noutro. É claro que ela está longe de ser um indicador 
inequívoco da hierarquia das nações — se tentássemos comparar os 
países apenas por essas tabelas chegaríamos a resultados absurdos, 
como o de que o Kuwait é mais importante que os Estados Unidos, ou 
o de que a Venezuela é o principal país da América Latina. De fato 
uma nação pode ser importante por outros fatores: pela extensão 
territorial, pela população, pelas tradições culturais, etc. Tam-
bém é óbvio que a renda per capita é um valor médio, por trás do 
qual se pode ocultar uma distribuição injustamente desigual — lem-
brando aquela definição de que estatístico é o sujeito com a cabe-
ça num forno, os pés na geladeira, e que na média se sente muito 
bem. Essas ressalvas, todavia, não diminuem a importância econômi-
ca das estimativas de renda per capita. Afinal a fonte de recursos 
para o consumo e para a poupança de um país é a sua produção, cujo 
valor médio por habitante equivale à renda per capita. Na realida-
de, seria próprio olharmos as estatísticas com um unilateralismo 
eliminatório: uma renda per capita alta talvez superestime o de-
senvolvimento de um país, se existirem excessivas desigualdades 
distributivas; mas uma renda per capita baixa é sempre um indício 
definitivo de subdesenvolvimento. Mais uma vez poderíamos voltar à 
filosofia do avestruz e repetir aquela frase com que os ricos ten-
tam consolar os pobres — a de que dinheiro não dá felicidade. O 
problema é que a sociedade moderna, cujos desejos aumentam cada 
vez mais pelo efeito da propaganda e dos meios de comunicação, não 
parece inclinada a esse espírito de renúncia material. Diante da 
revolução das aspirações crescentes deve considerar-se alarmante a 
hipótese de ficarmos cada vez mais atrasados em relação aos povos 
desenvolvidos. 
Quanto à viabilidade de projeções econômicas a prazo longo, 
como as do Hudson Institute, cumpre mais uma vez evitar os extre-
mismos. É óbvio que os cientistas sociais estão muito longe dos 
físicos e dos astrônomos na precisão da sua futurologia, e que a 
evolução dos fenômenos econômicos é continuamente perturbada por 
fatores imponderáveis. Aliás os autores do livro "The Year 2000" 
são bastante cautelosos nesse ponto, apresentando suas estimativas 
num capítulo intitulado "Some Surprise Free Economic Projections". 
Daí é sensato concluir que qualquer previsão econômica a longo 
prazo está sujeita a considerável margem de erro, mas não que os 
exercícios desse tipo sejam inúteis. Metodologicamente as proje-
ções do Hudson Institute se resumem em simples manipulações de 
progressões geométricas. Essas manipulações, no entanto, são bas-
tante proveitosas pois nos mostram para onde caminhamos se não 
conseguirmos inverter determinadas tendências. Apenas para anteci-
par um exemplo, uma das conclusões mais importantes que se podem 
extrair da análise é que dificilmente o Brasil recuperará seu a-
traso em relação aos países mais prósperos se a sua taxa de cres-
cimento demográfico não se reduzir substancialmente nos próximos 
trinta anos. 
Essas observações servem para aliviar a interpretação pessi-
mista, segundo a qual as previsões do Hudson Institute mostram que 
fatalmente nos atrasaremos cada vez mais em relação aos países de-
senvolvidos. Na realidade é possível compor diversas variações so-
bre o tema de Kahn e Wiener e chegar a perspectivas mais risonhas 
para o nosso fim de século. As cifras apresentadas no "The Year 
2000" valem-nos, porém, como advertência, mostrando-nos o que nos 
poderá acontecer se continuarmos a encarar certos problemas de de-
senvolvimento com o otimismo do avestruz. 
 
1.2 — O Cenário Quantitativo. O Mundo Dicotômico 
A metodologia adotada por Kahn e Wiener nas suas projeções e-
conômicas para o ano 2000 é a mais simples possível: os autores 
projetam independentemente o produto nacional bruto (por países e 
por continentes) e a população, obtendo por divisão as previsões 
de renda per capita. Em pormenores, as etapas de cálculo são as 
seguintes: a) compilação das estimativas de população e de renda 
per capita em dólares para o ano de 1965; b) cálculo do produto 
nacional bruto em dólares, multiplicando-se as estimativas acima; 
c) projeção das taxas de crescimento demográfico até o ano 2000; 
d) estimativa da população no fim do século com base nessas taxas; 
e) projeção da taxa de crescimento do produto real até o ano 2000; 
f) projeção do produto nacional bruto no ano 2000 (em dólares de 
1965) com base nessa taxa; g) estimativa da renda per capita no 
ano 2000 dividindo-se as projeções do produto total pelas da popu-
lação. 
Do ponto de vista técnico essa metodologia pode considerar-se 
bastante rudimentar, praticamente se resumindo numa série de exer-
cícios sobre progressões geométricas. Os fatores de crescimento 
que usualmente integram os modelos econométricos — a taxa de for-
mação de capital, o progresso tecnológico, os limites do comércio 
exterior etc. — não são destacados na análise, ficando implicita-
mente englobados nas taxas de crescimento postuladas para o produ-
to real. Kahn e Wiener talvez tenham razão em evitar qualquer me-
todologia mais sofisticada, pela imprevisibilidade dos seus parâ-
metros no prazo de um terço de século. Em todo o caso isso nos o-
briga a admitir em torno das projeções médias do Hudson Institute, 
uma considerável margem de dispersão pela acumulação da diferença 
de juros compostos. 
Também, como reconhecem os autores, a projeção da população e 
do produto total como variáveis independentes é uma escapatória 
simples para um problema difícil. Teoricamente, desde que a produ-
tividade marginal da mão-de-obra seja positiva, o crescimento da 
força de trabalho contribui positivamente para o aumento do produ-
to real. Sabe-se, porém, que uma explosão demográfica pode exercer 
certosefeitos que freiam a expansão do produto nacional, como a 
absorção de vultosas poupanças em obras de infra-estrutura social, 
e a freqüente necessidade de sacrificar o objetivo de crescimento 
do produto pelo da expansão do emprego. Diante disso talvez o mais 
prudente seja admitir, como os autores do "The Year 2000" que a 
relação a longo prazo entre crescimento da população e do produto 
real ainda é desconhecida. 
As taxas medianas de crescimento do produto real projetadas 
para o último terço de século compõem aquilo que Kahn e Wiener de-
nominam "cenário otimista". Com ligeiros corretivos, elas se apro-
ximam bastante das taxas médias de crescimento registradas nos úl-
timos quinze anos — uma espécie de Belle Époque do crescimento e-
conômico mundial — excedendo consideravelmente as tendências das 
séries seculares do produto real. Várias razões justificam essa 
perspectiva otimista. Primeiro, o próprio "culto do crescimento" 
que se espalhou entre as nações nos últimos anos ensinando-as a 
formular uma política econômica mais adequada aos objetivos de de-
senvolvimento. Segundo, a improbabilidade de que o crescimento ve-
nha a ser interrompido por depressões profundas (como a do decênio 
de 1930) devido ao domínio das técnicas anti-recessivas. Terceiro, 
o crescimento exponencial da tecnologia exportável. Quarto, a me-
lhoria nos arranjos institucionais do mundo — uniões aduaneiras, 
entidades de assistência técnica etc. 
Dentro dessa linha, o primeiro exercício apresentado por Kahn 
e Wiener é o das projeções medianas da população, do produto real 
e do produto real per capita por continentes. Os dados, resumidos 
no Quadro 2, subdividem o mundo em dois grandes grupos — o dos pa-
íses subdesenvolvidos, compreendendo a África, Ásia (exceto Japão) 
e América do Sul (inclusive Central) e o das nações desenvolvidas, 
contendo o Japão, a América do Norte e a Europa. Os principais re-
sultados dessas projeções são os seguintes: 
a) Entre 1965 e o final do século a população do mundo deverá 
expandir-se de aproximadamente 3,3 para 6,4 bilhões de habitantes 
— o que equivale a uma taxa média anual de 1,86%; a renda per ca-
pita, de cerca de 630 para 1.700 dólares (de poder aquisitivo de 
1965). 
b) O crescimento do produto real total nos dois mundos se pro-
cessará a taxas muito próximas, em torno de 4,8% ao ano; assim, a 
relação entre o produto real total nos dois blocos deverá permane-
cer praticamente inalterada (1:5,8 no ano 2000 contra 1:5,9 em 
1965). 
c) A população do mundo subdesenvolvido deverá crescer a uma 
taxa bem mais rápida (2,15% ao ano) do que a dos países desenvol-
vidos (1,15% ao ano). Como corolário, a percentagem da população 
subdesenvolvida no total mundial crescerá de 67,7% ano 1965 para 
74,8% no ano 2000. 
d) Como conseqüência do hiato demográfico, o atraso relativo 
dos países subdesenvolvidos se acentuará daqui até o fim do sécu-
lo; a sua renda média per capita crescerá de 135 para 332 dólares 
anuais (2,6% ao ano); a do grupo desenvolvido, no entanto, se ex-
pandirá a taxas sensivelmente superiores — passando de 1.675 para 
5.744 dólares per capita (3,6% ao ano). Assim, a distância média 
relativa entre os dois grupos se afastará da escala de 1:12,4 para 
a de 1:17,3. 
É interessante comentar o aspecto mais chocante dessas previ-
sões — o do distanciamento crescente entre a renda per capita dos 
mundos subdesenvolvido e desenvolvido. Não se trata propriamente 
de uma conclusão, mas de um simples corolário aritmético das duas 
principais hipóteses de trabalho de Kahn e Wiener — a de que o 
produto real dos dois mundos cresça aproximadamente à mesma taxa, 
e a de que a população se expanda bem mais rapidamente nos países 
subdesenvolvidos. Contudo essas hipóteses de trabalho (e, natural-
mente, o seu corolário aritmético) parecem plausíveis, a menos que 
se invertam certas tendências atuais. 
Em matéria de crescimento do produto real, os países subdesen-
volvidos levam algumas vantagens e outras tantas desvantagens em 
relação às nações mais avançadas. As vantagens residem na possibi-
lidade de absorver um longo percurso tecnológico já trilhado pelas 
nações mais prósperas (os países subdesenvolvidos não esbarram nu-
ma fronteira tecnológica cuja expansão sempre depende de novas in-
venções); na escassez do capital que, em tese, permite extrair dos 
investimentos maior produtividade marginal; e na própria consciên-
cia, nacional e internacional, de que é preciso abrandar o hiato 
entre as nações mais e menos prósperas. Como contrapeso, no entan-
to, podem citar-se outras tantas desvantagens: a dificuldade natu-
ral de sustentação de uma taxa de poupança semelhante à dos países 
desenvolvidos; o agravamento dessa dificuldade pelo impacto dos 
meios modernos de comunicação que despertam nos povos subdesenvol-
vidos o desejo de imitar os padrões de consumo das nações mais a-
vançadas (efeito-demonstração); a freqüência dos erros de política 
econômica, que parece correlacionar-se fortemente com o inverso da 
renda per capita; e a tendência a reproduzir prematuramente certas 
conquistas sociais que só se justificam pelo desenvolvimento eco-
nômico (o Brasil, na faixa dos 300 dólares anuais de renda per ca-
pita, se orgulha de possuir a legislação trabalhista mais adianta-
da do mundo). Além disso, cumpre observar que os países desenvol-
vidos têm conseguido desvendar novas fronteiras tecnológicas com 
tal velocidade que se fica em dúvida se é realmente vantagem eco-
nômica estar na retaguarda para dispor de um horizonte mais amplo 
de percurso. (Lembre-se, nesse particular, o algo superenfático, 
mas sugestivo "Desafio Americano" de Jean Jacques Schreiber). É 
obviamente impossível dar um balanço quantitativo satisfatório 
nessas vantagens e desvantagens. Em todo o caso, o seu simples e-
nunciado confere certos ares de plausibilidade à hipótese de Kahn 
e Wiener de que ambos os mundos cresçam à mesma taxa. 
Quanto à expansão demográfica, é fora de dúvida de que ela ho-
je se processa a taxas muito mais aceleradas no mundo subdesenvol-
vido de que no desenvolvido. Os progressos da higiene e da medici-
na moderna ensinaram como reduzir drasticamente as taxas de morta-
lidade. Mas só os países de alta renda per capita parecem ter a-
preendido a reduzir concomitantemente as taxas de natalidade. É 
possível que o avanço e a simplificação dos anticoncepcionais re-
duzam essa assimetria. Mas, sem essa inversão de tendências, jus-
tificam-se as projeções de Kahn e Wiener. 
Com o numerador proporcional e o denominador explosivo, é ób-
vio que a distância relativa entre o mundo desenvolvido e o subde-
senvolvido aumentará cada vez mais. Trata-se, talvez, de uma con-
clusão simples demais para que se possa tomar como previsão abso-
luta. De qualquer forma, o exercício sobre taxas geométricas vale 
pelas duas advertências que encerra: a de que os países subdesen-
volvidos precisam esforçar-se heroicamente para aumentar o seu 
produto total; e a de que esses mesmos países devem encarar com 
mais racionalidade os efeitos negativos de sua explosão demográfi-
ca. 
QUADRO 2 
 
PROJEÇÕES DO MUNDO DICOTÔMICO 
 
 População (milhões) 
Produto Nacional 
Bruto (bilhões de 
dólares de 1965) 
Produto per 
capita (dóla-
res de 1965) 
 1965 2000 1965 2000 1965 2000 
 
1) Mundo subdesenvolvido 
 
África 
Ásia (exceto Japão) 
América do Sul 
 
SUBTOTAL 
 
2) Mundo desenvolvido 
 
Japão 
América do Norte 
Oceania 
Europa 
 
SUBTOTAL 
 
TOTAL MUNDIAL 
 
310,7
1.791,0
116,2
2.267,9
98,0
294,2
14,0
674,7
1.080,9
3.348,8
 
 
 
779,0
3.578,0
420,0
4.777,0
123,0
578,0
25,0
886,0
1.612,0
6.389,0
 
 
 
43,9
203,4
59,4
306,7
84,0
774,2
28,0
923,9
1.810,1
2.116,8
 
 
 
 
216,0 
1.081,0 
292,0 
 
1.589,0 
 
 
 
1056,0 
3.620,0107,0 
4.476,0 
 
9.259,0 
 
10.848,0 
141
114
357
135
857
2.631
2.000
1.369
1.675
632
277
302
695
332
8.585
6.263
4.280
5.052
5.744
1.698
Fonte: Kahn e Wiener — The Year 2000. 
 
 
 
1.3 — O Cenário Quantitativo — As Projeções por Países 
 
 
A segunda tarefa desenvolvida por Kahn e Wiener nas suas ex-
trapolações econômicas para o ano 2000 é a de projetar a popula-
ção, o produto nacional e, por quociente, a renda per capita de 
vinte e nove países — dez nações principais e dezenove outras (en-
tre as quais o Brasil). A metodologia de cálculo é a mesma descri-
ta na seção anterior, mas os autores têm o cuidado de a desenvol-
ver sob várias hipóteses diferentes. Para o crescimento do produto 
real de cada país os autores admitem três taxas possíveis: uma al-
ta, uma mediana e uma baixa. Com ligeiros corretivos, a taxa alta 
correspondente geralmente à do subperíodo de crescimento mais rá-
pido registrado nos anos mais recentes; a taxa mediana, à tendên-
cia de médio prazo observada desde o término da Segunda Guerra 
Mundial; e a taxa baixa ao crescimento secular do produto real, ou 
à sua expansão em períodos relativamente desfavoráveis. O cresci-
mento demográfico é projetado em três hipóteses diferentes para as 
dez nações principais, e em uma única hipótese para as dezenove 
outras. De um modo geral as taxas utilizadas extrapolam as obser-
vações dos últimos censos, supondo-se certo declínio dos índices 
de natalidade nos países (como o Brasil) sujeitos a excessiva ex-
plosão demográfica, e certa recuperação noutros (como o Japão) on-
de o crescimento populacional se vem revelando muito lento. 
As tabelas seguintes resumem os principais resultados dessas 
projeções. Os Quadros 3 e 4 apresentam as estimativas de população 
e de produto nacional para os dez países principais, nas três hi-
póteses citadas. O Quadro 5 estabelece, como corolário, as proje-
ções de renda per capita para o ano 2000; para quase todos os paí-
ses a estimativa alta do produto total foi conjugada com a proje-
ção baixa da população, e vice-versa. Apenas para a Índia e para a 
China se associaram as estimativas na mesma direção, admitindo-se 
implicitamente que um maior esforço de crescimento estivesse asso-
ciado à maior expansão demográfica. Os Quadros 6 e 7 apresentam as 
projeções da população e do produto nacional bruto para os dezeno-
ve outros países. Finalmente o Quadro 8 indica as estimativas me-
dianas de renda per capita para esses dezenove países obtidas das 
projeções dos dois quadros precedentes. 
Fora a observação geral já registrada a propósito do mundo di-
cotomizado — a do crescente distanciamento econômico entre países 
subdesenvolvidos e desenvolvidos pelo efeito da explosão demográ-
fica nos primeiros — valem alguns comentários sobre as previsões 
para o Brasil. A vigorarem essas projeções, no fim do século esta-
remos muito bem servidos em matéria de população: 212,1 milhões de 
habitantes. Em matéria de produto nacional bruto as projeções do 
Hudson Institute nos deixam grande margem de indeterminação, entre 
65 (baixa), 107 (mediana) e 246 bilhões de dólares (alta) — cifras 
que corresponderiam a 306, 506 ou 1.160 dólares de renda per capi-
ta. O que se pode assegurar é que, dentro dessa faixa, a projeção 
mediana nos é muito pouco animadora. Se nos considerássemos isola-
dos do mundo, talvez nos pudéssemos satisfazer com a lenta taxa de 
crescimento pacientemente composta nas progressões geométricas, 
pois os 506 dólares projetados para o ano 2000 excedem em 81% os 
280 dólares de 1965. Mas, no confronto com o resto do mundo, a 
nossa posição decairia cada vez mais. O Quadro 1 já mostrou o 
crescente distanciamento que Kahn e Wiener nos prevêem em relação 
a alguns países mais avançados. De fato, em relação à média dos 
países desenvolvidos, a nossa renda per capita se afastaria da es-
cala de 1:6,0 para a de 1:11,4. E até no bloco subdesenvolvido 
perderíamos a posição de relativa prosperidade, a relação entre a 
nossa renda per capita e a dos países menos avançados caindo de 
2,1:1 para 1,5:1. Esse seria o resultado de sermos os líderes in-
ternacionais da explosão demográfica, sendo apenas capazes de sus-
tentar uma taxa normal de crescimento da produção física. 
 
 
QUADRO 3 
 
PROJEÇÕES DA POPULAÇÃO – DEZ PAÍSES PRINCIPAIS 
 
Taxa de crescimento demográfico(% a.a) 
P A Í S População em 1965 
(milhões) 1965/1975 1975/1985 1985/2000 
População 
em 2000 
(milhões) 
 
China 
 
 
Índia 
 
 
U.R.S.S 
 
 
Estados Unidos 
 
 
Japão 
 
 
Alemanha Ocidental 
 
 
Grã-Bretanha 
 
 
Itália 
 
 
França 
 
 
Canadá 
 
700 
755 
800 
487 
 
 
231 
 
 
195 
 
 
98 
 
 
59 
 
 
55 
 
 
52 
 
 
49 
 
 
20 
 
1,3 
1,8 
2,3 
2,2 
2,4 
2,5 
1,0 
1,3 
1,6 
1,2 
1,3 
1,7 
0,6 
0,8 
1,1 
0,2 
0,4 
0,5 
0,1 
0,3 
0,5 
0,3 
0,5 
0,6 
0,8 
1,0 
1,1 
1,7 
1,8 
2,2 
 
1,0 
1,5 
2,1 
1,9 
2,1 
2,5 
1,0 
1,3 
1,6 
1,2 
1,5 
1,7 
0,6 
0,8 
1,1 
0,2 
0,4 
0,5 
0,0 
0,2 
0,4 
0,1 
0,3 
0,4 
0,5 
0,7 
0,8 
1,6 
1,9 
2,1 
 
0,9 
1,3 
1,7 
1,5 
1,8 
2,4 
0,9 
1,2 
1,5 
1,1 
1,5 
1,9 
0,3 
0,4 
0,8 
0,0 
0,3 
0,5 
0,0 
0,2 
0,5 
0,1 
0,4 
0,6 
0,4 
0,7 
0,9 
1,6 
2,0 
2,4 
 
992 
1.271 
1.600 
914 
988 
1.128 
316 
352 
402 
290 
318 
362 
116 
123 
139 
61 
67 
70 
55 
60 
64 
55 
60 
62 
59 
64 
68 
34 
38 
43 
Fonte: Kahn e Wiener – The Year 2000 
 
 
 
QUADRO 4 
 
PRODUTO NACIONAL BRUTO — DEZ PAÍSES PRINCIPAIS 
 
Produto Nacional Bruto 
(bilhões de dólares de 1965) Taxas de crescimento do produto real (% ao ano) 2000 
 
Baixa Mediana Alta 1965 Baixa Mediana Alta 
 
Estados Unidos 
U.R.S.S........... 
Alemanha Ocidental 
Grã-Bretanha...... 
França............ 
Japão............. 
China............. 
Itália............ 
Canadá............ 
Índia............. 
2,0 
2,0 
3,0 
2,0 
3,0 
5,0 
3,0 
3,0 
3,0 
2,0 
4,5 
5,0 
4,5 
4,0 
4,5 
7,5 
5,0 
4,5 
5,0 
5,0 
5,5 
7,0 
5,5 
5,0 
5,5 
9,0 e 7,5* 
7,0 
5,5 
6,0 
6,0 
 
692,3 
297,0 
112,4 
98,5 
94,1 
84,0 
74,0** 
56,8 
48,3 
48,3 
 
 
1.384 
594 
316 
197 
265 
463 
169 
160 
136 
97 
 
3.231 
1.640 
525 
389 
439 
1.056 
408 
265 
266 
266 
 
4.510 
3.170 
732 
543 
613 
1.393 
961 
370 
371 
371 
 
* 9,0% até 1985; 7,5% daí por diante. 
** Adotaram-se ainda, para 1965, as estimativas de 60,0 e 90,0 bilhões de dólares para 
efeitos das projeções baixa e alta, respectivamente. 
Fonte:Kahn e Wiener —> The Year 2000. 
 
 
QUADRO 5 
 
RENDA PER CAPITA – DEZ PAÍSES PRINCIPAIS 
 
Renda per capita em dólares de 1965 
2000 PAÍS 1965 Baixa Mediana Alta 
Estados Unidos 
Canadá 
França 
Alemanha Ocidental 
Grã-Bretanha 
U.R.S.S 
Itália 
Japão 
Índia 
China 
3.557 
2.464 
1.924 
1.905 
1.804 
1.288 
1.101 
857 
99 
75/98/129 
4.760 
4.040 
4.480 
5.150 
3.570 
1.880 
2.940 
3.990 
86 
106 
10.160 
7.070 
6.830 
7.790 
6.530 
4.650 
4.450 
8.590 
270 
321 
12.480 
8.670 
9.070 
10.410 
8.440 
7.890 
5.930 
10.000 
406 
969 
Fonte: Kahn e Wiener – The Year 2000 
 
 
QUADRO 6 
 
POPULAÇÃO — DEZENOVE OUTROS PAÍSES 
 
Taxas de crescimento (% a.a.) PAÍS População em 1965 
(milhões) 1965/1975 1975/1985 1985/2000 
 
 
Paquistão 
Indonésia 
Brasil 
Nigéria 
México 
Polônia 
Tailândia 
R.A.U 
Argentina 
Romênia 
África do Sul e S.O. 
Colômbia 
Alemanha Oriental 
Tchecoslováquia 
Taiwan 
Austrália 
Suécia 
Nova Zelândia 
Israel 
 
 
115,0 
105,0 
82,2 
57,5 
42,7 
31,5 
30,6 
29,6 
22,4 
19,0 
18,4 
18,1 
17,0 
14,2 
12,411,4 
7,7 
2,6 
2,6 
 
3,2 
2,6 
3,1 
3,1 
3,4 
1,1 
2,9 
3,0 
1,4 
0,8 
2,7 
3,2 
0,3 
0,8 
2,3 
1,5 
0,5 
1,9 
2,0 
 
2,9 
2,4 
2,4 
3,2 
3,4 
1,1 
2,6 
2,9 
1,2 
0,8 
2,8 
3,3 
0,3 
0,6 
2,2 
1,6 
0,4 
2,2 
1,6 
 
2,2 
2,4 
2,4 
3,3 
3,1 
1,0 
2,4 
2,6 
1,0 
0,8 
2,7 
3,2 
0,2 
0,5 
1,9 
1,5 
0,4 
2,0 
1,3 
 
287,7 
239,0 
212,1 
176,4 
133,2 
45,4 
73,5 
78,5 
33,4 
24,6 
47,7 
54,9 
17,7 
17,2 
25,2 
19,6 
8,8 
5,3 
4,5 
Fonte: Kahn e Wiener — The Year 2000. 
 
QUADRO 7 
 
PRODUTO NACIONAL BRUTO — DEZENOVE OUTROS PAÍSES 
 
Produto Nacional Bruto(bilhões de 
dólares de 1965) Taxas de crescimento do produto real(% ao ano) 2000 PAÍS 
Baixa Mediana Alta 1965 Baixa Mediana Alta 
 
Polônia 
Alemanha Oriental 
Brasil 
Austrália 
Tchecoslováquia 
México 
Suécia 
Romênia 
Argentina 
Paquistão 
Indonésia 
África do Sul e S.O. 
Nova Zelândia 
Colômbia 
R. A. U 
Nigéria 
Tailândia 
Israel 
Taiwan 
 
 
3 
3 
3 
3 
3 
3 
3 
3 
2 
2 
2 
3 
3 
3 
3 
3 
3 
4 
4 
 
5 
5 
4,5 
4 
5 
4,5 
4 
5 
4 
5 
3 
4,5 
3,5 
4 
6 
4,5 
6 
6 
6 
 
6 
6 
7 
5 
6 
6 
5 
6 
5 
6 
6 
5 
4 
5 
7 
5 
7 
7 
8 
 
30,3 
26,8 
23,0 
22,9 
22,0 
19,4 
19,3 
14,4 
11,0 
10,5 
10,4 
9,26 
5,10 
5,0 
4,9 
4,75 
3,85 
3,40 
2,74 
 
85 
75 
65 
64 
62 
55 
54 
40 
22 
21 
21 
26 
14 
14 
14 
13 
11 
13 
11 
 
167 
148 
107 
90 
121 
91 
76 
79 
43 
57 
29 
43 
17 
20 
38 
22 
30 
26 
21 
 
233 
206 
246 
126 
169 
149 
106 
111 
61 
80 
80 
51 
20 
28 
52 
26 
41 
36 
40 
Fonte:Kahn e Wiener — The Year 2000. 
 
QUADRO 8 
 
RENDA PER CAPITA — DEZENOVE OUTROS PAÍSES 
 
Renda per capita 
(dólares de 1965) PAÍS 
 
1965 2000 
Suécia 2497 8679 
Austrália 2009 4612 
Nova Zelândia 1932 3195 
Alemanha Oriental 1574 8355 
Tchecoslováquia 1554 7046 
Israel 1334 5839 
Polônia 962 3680 
Romênia 757 3224 
África do Sul e Sudoeste 503 906 
Argentina 492 1300 
México 455 680 
Brasil 280 506 
Colômbia 277 359 
Taiwan 221 837 
R.A.U 166 480 
Tailândia 126 402 
Indonésia 99 123 
Paquistão 91 200 
Nigéria 83 125 
Fonte:Kahn e Wiener — The Year 20C0. 
1.4 — Variações Brasileiras em torno das Projeções de Kahn e Wiener 
 
 
Pelo que vimos na secção anterior, as projeções de renda per 
capita contidas no livro "The Year 2000" são muito pouco alentado-
ras para o Brasil. A esperança que podemos nutrir é a de que Kahn 
e Wiener tenham construído as projeções medianas para o nosso fu-
turo com base em hipóteses excessivamente pessimistas. Os 506 dó-
lares per capita previstos para o ano 2000 resultam da suposição 
de que a nossa população cresça de 3,1% ao ano até 1975, de 2,9% 
ao ano daí até 1985, e de 2,4% anuais nos últimos quinze anos do 
século, e de que o produto real cresça de 4,5% ao ano. As proje-
ções demográficas extrapolam plausivelmente os resultados dos úl-
timos censos, com a hipótese complementar de que o desenvolvimento 
contenha levemente as taxas de natalidade. A taxa de crescimento 
prevista para o produto real, no entanto, é inferior à média re-
gistrada nos últimos cinqüenta anos e, sobretudo, aos índices al-
cançados no período de após-guerra, como atestam os dados do Qua-
dro 9. 
 
QUADRO 9 
 
TAXAS DE CRESCIMENTO DO PRODUTO REAL BRASILEIRO* 
 
 
Período 
 
 
(% ao ano) 
1920/1967 
1946/1967 
1950/1961 
1950/1967 
1956/1961 
4,8 
5,2 
5,9 
5,1 
7,0 
 
* Taxas médias geométricas interpoladas entre extremos. 
 Fonte:Fundação Getúlio Vargas. 
 
 
Dentro da idéia de Kahn e Wiener, segundo a qual o culto do 
crescimento tenderá a reproduzir, no último terço do século, os 
bons índices de crescimento do período de após-guerra, sentimo-nos 
incentivados a desenvolver algumas variações em torno das proje-
ções do Hudson Institute. É verdade que, nos quinze anos que se 
seguiram à Segunda Guerra Mundial, o Brasil dispôs de condições 
excepcionais para se desenvolver a taxas aceleradas sem grandes 
sacrifícios, como veremos no próximo capítulo. Em todo o caso, po-
demos aceitar, com certo otimismo, que os caminhos menos óbvios 
possam ser trilhados com igual sucesso, mediante um pouco mais de 
racionalidade e esforço de desenvolvimento. Nesse sentido, o pri-
meiro exercício a que nos podemos dedicar é o de considerar razoá-
veis as projeções demográficas de Kahn e Wiener, mas alterar as 
taxas de crescimento do produto real. O Quadro 10 a seguir mostra 
os resultados desses cálculos. 
 
 
QUADRO 10 
 
Projeções para o ano 2000 Taxa de cresci-
mento do produto 
real (% ao ano) 
Produto total 
(bilhões de dó-
lares de 1965) 
População 
(milhões de 
habitantes) 
Renda per 
capita (dólares 
de 1965) 
4,5 
5,0 
5,5 
6,0 
6,5 
7,0 
107,4 
126,9 
149,8 
176,8 
208,4 
245,6 
212,1 
212,1 
212,1 
212,1 
212,1 
212,1 
506 
598 
706 
834 
983 
1.158 
 
 
O segundo exercício que podemos desenvolver é o de construir 
novas projeções sob a hipótese de que a taxa de crescimento demo-
gráfico se reduza substancialmente. Admitamos, a título de exemplo 
que, pela aplicação dos métodos de controle da natalidade, essa 
taxa caia de 3,1% a.a. entre 1965 e 1970, para 2,0% a.a. entre 
1970 e 1980, e para 1,0% a.a. nos últimos vinte anos do século. 
Com esse declínio se inverteria a tendência explosiva das taxas de 
aumento demográfico que se vêm registrando há quase um século, em-
bora ainda assim a nossa população continuasse crescendo mais ra-
pidamente do que a das nações desenvolvidas. Dentro dessa nova hi-
pótese, as projeções para o ano 2000 seriam as constantes do Qua-
dro 11. 
 
QUADRO 11 
Projeções para o ano 2000 Taxa de cresci-
mento do produto 
real (% ao ano) 
Produto total 
(bilhões de dó-
lares de 1965) 
População (mi-
lhões de habi-
tantes) 
Renda per capi-
ta (dólares de 
1965) 
 
4,5 
5,0 
5,5 
6,0 
6,5 
7,0 
 
 
107,4 
126,9 
149,8 
176,8 
208,4 
245,6 
 
142,4 
142,4 
142,4 
142,4 
142,4 
142,4 
 
754 
891 
1.052 
1.242 
1.463 
1.725 
 
 
Esses exercícios, embora não passem de simples manipulações de 
progressões geométricas, nos levam a algumas conclusões interes-
santes. A primeira é a de que a mecânica dos juros compostos deixa 
grande latitude de indeterminação na futurologia econômica — não 
se pode ter a pretensão de prever as rendas per capita para o ano 
2000 com a mesma precisão e com a mesma tranqüilidade com que os 
astrônomos prevêem a ocorrência de eclipses. Os nossos exercícios, 
que não chegam a esgotar toda a gama de hipóteses, plausíveis, a-
pontam para o fim do século uma renda per capita brasileira de 506 
a 1.725 dólares anuais, o que corresponde a uma indeterminação em 
escala superior a um para três. 
A segunda conclusão é a de que, pelo menos dentro do atual ho-
rizonte tecnológico, não há milagre econômico que permita que se 
recupere em um terço de século, o tempo perdido das gerações pas-
sadas. Ainda que o crescimento brasileiro se processe em condições 
extremamente favoráveis, tanto no que tange ao aumento do produto 
real quanto no que diz respeito ao controle da explosão demográfi-
ca, dificilmente chegaremos no ano 2000 à atual renda per capita 
da Inglaterra, da França ou da Alemanha. Essa observação não nos 
deve desanimar quanto aos esforços de crescimento, pois é sempre 
preferível o desenvolvimento mediano ao subdesenvolvimento fla-
grante. Mas serve para nos convencer de que desenvolvimento é pro-
cesso de longo prazo, que exige sacrifício e paciência, insuscep-
tível de ser alcançado por súbitos passes de mágica como alguns 
desejam. 
A terceiraconclusão a se extrair é a de que o nosso atraso em 
relação aos países desenvolvidos dificilmente se atenuará, a menos 
que estes últimos sofram algum processo imprevisto de estagnação, 
ou que consigamos conter a nossa explosão demográfica. A previsão 
de Kahn e Wiener segundo a qual a relação renda per capita dos Es-
tados Unidos e a do Brasil passará de 12,7 vezes em 1965 para 20,1 
vezes no ano 2000, talvez se possa considerar pessimista, por par-
tir da hipótese de que o nosso produto real só crescerá de 4,5% ao 
ano no próximo terço de século. Mas, se substituirmos essa taxa 
pelos 6% ao ano habituais nos planos do governo, e se conservarmos 
as previsões demográficas do Hudson Institute, concluiremos que no 
ano 2000 o padrão médio de vida americano ainda será 12,2 vezes 
superior ao nosso — o que praticamente corresponde à mesma dis-
tância relativa atual. Em suma, a vantagem que um esforço especi-
almente intenso de desenvolvimento nos possa conferir, dificilmen-
te anulará a resistência passiva da explosão demográfica. 
São essas as principais considerações que nos são sugeridas 
pelas projeções do livro "The Year 2000", no que diz respeito ao 
Brasil. Não as devemos encarar como um vaticínio fatídico do futu-
ro do país, pois, em períodos longos, os fatos freqüentemente de-
safiam a imaginação dos economistas. Mas elas nos valem como ad-
vertência, apontando os fatores sobre os quais devemos agir se não 
nos quisermos perpetuar na condição de país do futuro. 
Capítulo II 
 
A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO: 1920/1967 
 
2.1 — O Crescimento do Produto Real 
 
Seria ocioso lembrar que o principal obstáculo ao estudo da 
experiência brasileira de desenvolvimento reside na insuficiência 
de séries estatísticas dignas de confiança. Os historiadores de 
nossa economia têm feito o possível para reunir informações quan-
titativas sobre o nosso passado, às vezes até ligando os elementos 
com boa dose de imaginação. Em geral, porém, os resultados são pu-
ramente impressionistas. Para citar um exemplo, há fundadas razões 
para se suspeitar de que o nosso Império, tão decantado nos livros 
para a infância, foi um período de relativa estagnação, talvez pe-
lo domínio da tradição bacharelesca sobre o espírito empresarial. 
Contudo, é difícil documentar numericamente essa conjectura. Fe-
lizmente, para os últimos cinqüenta anos, dispomos de um pouco 
mais de informações objetivas. Recentemente a Fundação Getúlio 
Vargas conseguiu construir uma série de índices do produto real, 
remontando a 1920, a qual, por maiores imprecisões que contenha, 
melhora a objetividade da análise da experiência brasileira de de-
senvolvimento. 
Comecemos pois em 1920. Nesse ano a população brasileira era 
pouco superior a 27 milhões de habitantes. Em moeda de poder aqui-
sitivo de 1965, a renda per capita devia ser da ordem dos 100 dó-
lares anuais, talvez com menores desigualdades regionais do que 
hoje, mas certamente com acentuadas diferenças pessoais. Cerca de 
70% da população ativa vivia na agricultura. A indústria ainda en-
gatinhava, limitando-se à produção de bens de consumo corrente, 
principalmente no setor têxtil e no de produtos alimentares. O 
consumo de cimento se limitava a 173 mil toneladas anuais, o de 
ferro-gusa a 85 mil toneladas, ambos inteiramente supridos por im-
portações. A potência elétrica instalada não ia além de 367 mil 
kW. E o país era fortemente dependente do comércio com o exterior, 
as exportações representando 17% e as importações 20% do produto 
interno bruto. 
Entre 1920 e 1967 o produto real cresceu, em média de 4,8% ao 
ano, a agricultura se expandindo de 4,1% anuais, a indústria de 
6,1%, o comércio de 5,0%, os transportes e comunicações de 7,2% ao 
ano. Tendo em vista que em boa parte desse período ainda não se 
praticava o culto do desenvolvimento, e que no decênio de 1930 o 
mundo esteve mergulhado na Grande Depressão, esse foi um resultado 
bastante satisfatório. Em matéria de crescimento da renda real per 
capita a taxa foi menos brilhante — 2,3% ao ano, em média — devido 
à nossa tradicional explosão demográfica. Contudo, no confronto 
com a maioria dos países, essa taxa representou uma média razoável 
para os últimos cinqüenta anos. Isso mostra que o nosso atraso em 
relação às nações desenvolvidas não se acumulou no presente sécu-
lo, mas foi herança dos séculos anteriores. 
Mas passemos à análise por períodos. No decênio de 1920, o 
produto real cresceu, em média, de 3,7% ao ano. A agricultura, a 
indústria e o comércio se expandiram praticamente à mesma taxa mé-
dia (3,3% e 3,4% ao ano), os maiores índices de crescimento se 
tendo registrado nos transportes (8,1% anuais). Embora entre 1920 
e 1930 a potência elétrica instalada quase tenha duplicado, e as 
primeiras iniciativas tenham surgido na siderurgia e na produção 
do cimento, não houve mudança substancial na estrutura econômica 
do país. De fato, entre 1923 e 1927 o índice de produção industri-
al praticamente não aumentou (tendo caído nos anos intermediá-
rios), em boa parte devido ao liberalismo da política de importa-
ções. E nos últimos anos do período começou a surgir o problema da 
crescente superprodução de café, estimulada pela sustentação de 
preços introduzida pelo Governo. 
Bem mais satisfatório parece ter sido o desempenho da economia 
brasileira no decênio de 1930, particularmente quando se têm em 
conta as condições mundiais de crise. O impacto imediato da Grande 
Depressão foi a queda substantiva da nossa receita cambial, de 
445,9 milhões de dólares em 1929 para 180,6 milhões em 1932. Numa 
economia reflexa, liderada pela exportação de produtos primários, 
essa poderia ter sido a origem de um severo colapso do produto re-
al, do emprego e do balanço de pagamentos. Contudo, as medidas to-
madas pelo Governo conseguiram neutralizar os efeitos da crise 
mundial, abrindo inclusive o caminho para um processo de rápida 
recuperação a partir de 1932. No campo do comércio exterior, gra-
ças a uma combinação de controles quantitativos e de desvaloriza-
ções cambiais, as importações foram reduzidas de 416,6 milhões de 
dólares em 1929 para 108,1 milhões em 1932. A renda interna dos 
exportadores foi bastante protegida pela sustentação governamental 
dos preços do café (que, em 1929, era responsável por 71% da re-
ceita cambial) e pela famosa queima dos excedentes — política que 
impediu a retração abrupta da demanda global. Assim, entre 1929 e 
1931 (o ano mais fundo da crise no Brasil, a julgar pelos índices 
da Fundação Getúlio Vargas) a queda do produto real foi de 9,7%, 
percentagem relativamente suave no quadro internacional da época; 
e, em 1934, todos os principais índices de atividade econômica já 
superavam os de 1929. Por outro lado, as dificuldades de suprimen-
to externo, resultantes da queda da capacidade para importar, es-
timularam o desenvolvimento da indústria nacional em ritmo sem 
precedentes — numa primeira fase pelo aproveitamento das instala-
ções ociosas existentes, numa segunda etapa pela efetiva ampliação 
do parque manufatureiro. Não só se expandiram as indústrias tradi-
cionais (têxtil e produtos alimentares), como ganharam novas di-
mensões certos setores que pouca expressão possuíam no decênio de 
1920 — a metalurgia, a fabricação de produtos químicos e a de ci-
mento1. Em conjunto, o Brasil não só parece ter contornado satisfa-
toriamente a Grande Depressão, como nela ter encontrado motivação 
para a mudança de sua estrutura econômica no sentido da industria-
lização. Em média, entre 1930 e 1940 o produto real cresceu de 
4,6% ao ano, o produto industrial se expandindo de 5,2% anuais, 
taxas extremamente favoráveis para um período de recessão mundial. 
Um novo impulso de industrialização iria ser provocado pela 
Segunda Guerra Mundial. Com a escassez internacional de vários 
produtos e com as dificuldades de transportemarítimo, o volume 
 
1 Entre 1930 e 1940 a produção de cimento Portland aumentou de 87 mil para 745 mil toneladas anuais. 
físico de importações caiu de 41% entre 1939 e 1942. As exporta-
ções, embora sofrendo alguma redução em quantidade, ganharam em 
diversificação e foram beneficiadas pela melhoria das relações de 
trocas. Essas condições do comércio com o exterior geraram fortes 
tensões inflacionárias internas e forçaram o racionamento de vá-
rios produtos. Em compensação o país pôde acumular um bom volume 
de reservas em divisas e a indústria nacional, afastada a concor-
rência externa, expandiu-se em ritmo bastante rápido. Assim, se-
gundo os índices da Fundação Getúlio Vargas, entre 1940 e 1947 o 
produto real pôde crescer de 5,1% ao ano, a componente industrial 
aumentando, em média, de 6,5% anuais. 
Terminada a Segunda Guerra Mundial, a primeira preocupação do 
Governo parece ter sido de desafogar a demanda de importações. Com 
a intensidade da procura reprimida, com a alta internacional dos 
preços e com o bloqueio de alguns de nossos saldos externos, as 
reservas cambiais se esgotaram rapidamente. Em 1248, restabelece-
ram-se os controles quantitativos de importações por intermédio da 
CEXIM. Em face da incessante escassez de dólares, firmou-se desde 
então a política de incentivo à industrialização, baseada na forte 
proteção contra a concorrência externa, primeiro pelo regime das 
licenças de importação (que eram negadas para os produtos com si-
milar nacional), depois pelo sistema de taxas múltiplas de câmbio, 
e mais tarde pela introdução de pesadas tarifas aduaneiras. 
Entre 1947 e 1956, dentro dessa política de desenvolvimento 
liderada pela industrialização substitutiva de importações, o pro-
duto real cresceu de 5,6% ao ano em média. A taxa de expansão da 
agricultura não foi particularmente brilhante — 3,9% ao ano — mas 
a do setor secundário atingiu a média anual de 8,8%. Dessa feita a 
industrialização não mais se limitou à ampliação das atividades 
tradicionais, mas se aprofundou na produção de matérias-primas e 
bens de capital que até então eram exclusivamente supridos por im-
portações. 
Entre 1956 e 1961 o Brasil alcançou as taxas de crescimento 
mais espetaculares dos últimos cinqüenta anos. O produto real ex-
pandiu-se, em média, de 7% ao ano, a componente agrícola aumen-
tando de 5,8% a. a industrial de 11,1% anuais. A fórmula de desen-
volvimento então adotada foi a de industrialização a qualquer cus-
to, escudada em fortíssima proteção aduaneira e apoiada por gran-
des incentivos cambiais, e a proliferação das grandes obras públi-
cas federais, de acordo com o Programa de Metas do Governo Kubits-
chek. É verdade que esse crescimento eufórico se baseava numa po-
lítica fácil de substituição de importações e numa exploração de 
vantagens a curto prazo que iria transferir sérios problemas para 
o decênio de 1960. É verdade também que os índices do produto real 
amplificam o êxito da política de desenvolvimento no período em 
questão pela presença de três distorções estatísticas. Primeiro, 
por levarem em conta a superprodução de café, estimulada pelos ex-
cepcionais preços externos alcançados entre 1953 e 1955; dentro 
dos "cobwebs" longos das culturas perenes, a partir de 1957 come-
çaram a se acumular os estoques invendáveis da rubiácea, em boa 
parte responsáveis pelo crescimento de 5,8% da produção agrícola 
(o que, normalmente seria uma taxa quase excepcional, dada a baixa 
elasticidade-renda da procura de produtos alimentares). Segundo, 
porque os índices de produto real superestimam a melhoria do bem-
estar material quando o desenvolvimento é liderado por uma substi-
tuição de importações fortemente apoiada na proteção aduaneira: as 
indústrias novas, exatamente as que mais crescem, entram nos índi-
ces com um peso inflado pela ineficiência de seus custos. Tercei-
ro, porque os índices de produto real também superestimam os re-
sultados do desenvolvimento quando a oferta de determinados bens e 
serviços passa a ser racionada; e, entre 1956 e 1961, agravou-se o 
racionamento de diversos serviços — habitação, abastecimento de 
água, telefones, para citar três exemplos1. Em todo o caso é fora 
de dúvida que o período em questão não se destacou apenas pelo ê-
xito estatístico: foi uma fase em que se modificou profundamente a 
estrutura econômica do país e em que se implantou uma fórmula de 
desenvolvimento, a qual, se não é profícua a longo prazo, pelo me-
nos se deve considerar digna de análise. 
Desde 1962 as taxas de crescimento do produto real têm sido 
bem menos brilhantes (sobretudo quando expostas à subtração demo-
gráfica), em virtude de uma série de anomalias que levaram alguns 
pessimistas a encampar a tese algo estranha da estagnação estrutu-
ral da economia brasileira. Em 1962 e 1963 as taxas de aumento do 
produto real se limitaram respectivamente a 5,4% e a 1,6% em parte 
pelas distorções herdadas do período anterior, em parte pela agi-
tação política e pela instabilidade institucional promovidas no 
Governo João Goulart, em parte pelas condições climáticas adversas 
que prejudicaram a produção agrícola. Após a Revolução de 31 de 
março de 1964 o Governo procurou implantar uma política que visava 
simultaneamente à contenção da taxa inflacionária e à retomada do 
desenvolvimento. Como os dois objetivos facilmente entram em con-
flito a curto prazo (embora não num horizonte mais amplo), e como 
era indispensável situar o combate à inflação como prioridade cro-
nológica, não é surpreendente que as taxas de aumento do produto 
real tenham sido provisoriamente insatisfatórias nos últimos anos: 
3,1% em 1964, 3,9% em 1965, 3,4% em 1966 e 4,9% em 1967. Há indí-
cios de que o crescimento em 1968 foi bem mais convincente, mas, 
até o momento em que se escrevia este livro, não se dispunha de 
suficiente informação estatística a esse respeito. 
 
 
2.2 — Composição da Despesa Nacional Bruta 
 
 
As estimativas das Contas Nacionais da Fundação Getúlio Vargas 
fornecem, para o período 1947/1966 a decomposição da renda nacio-
nal bruta a preços de mercado por classes de despesas: consumo 
pessoal, consumo do governo, formação bruta de capital fixo, vari-
ação de estoques, capacidade de importar menos importações. As es-
timativas em questão são apresentadas em valores nominais, e em 
preços constantes de 1953. Como nosso interesse é o de analisar 
uma experiência de desenvolvimento, afastando as variações de pre-
ços relativos, concentraremos a maior parte de nosso estudo nas 
 
1 É possível, não obstante, que o crescimento do setor terciário tenha sido subestimado. O Apêndice I explica alguns 
pormenores técnicos dessas distorções dos índices do produto real. 
séries a preços constantes de 1953. Transformadas em percentagens 
do produto nacional bruto, essas estimativas se acham transcritas 
no Quadro 13. Antes de tirar qualquer conclusão vale notar que, 
como muitas outras estatísticas brasileiras, essas estimativas fo-
ram construídas com base em certas hipóteses algo ousadas, em face 
da insuficiência de informações diretas. Assim, a formação bruta 
de capital fixo só pôde ser calculada pelos critérios ortodoxos 
(compras de novos equipamentos mais valor de novas construções) 
para os anos de 1949 e 1958, e ainda aí foi necessário incluir no 
valor dos equipamentos uma percentagem mais ou menos arbitrária a 
título de margem de comercialização. Para os demais anos, a forma-
ção bruta de capital fixo foi obtida extrapolando ou interpolando 
esses dados básicos por um índice que combina o consumo aparente 
de matérias-primas e as importações de bens de capital. Assim, a 
fidedignidade da série está condicionada à hipótese de que esse 
índice realmente reflita com precisão as flutuações nos investi-
mentos fixos.Também, por falta de informações, o consumo pessoal 
teve que ser calculado como resíduo, a partir das estimativas do 
produto e das demais componentes da despesa. Nessas condições, um 
erro na cifra de investimento dá lugar a um erro de sinal contrá-
rio na estimativa do consumo pessoal. 
 
QUADRO 12 
TAXAS ANUAIS DE CRESCIMENTO DO 
PRODUTO REAL POR SETORES 
(% a.a) 
 
 
SETOR 
 
1920/1930 1930/1940 1940/1947 1947/1956 1956/1961 1961/1967 1947/1967 1920/1967 
 
Agricultura 
Indústria 
Comércio 
Transportes e 
Comunicações 
Governo 
Serviços 
Aluguéis 
 
PRODUTO REAL 
 
 
3,4 
3,3 
3,4 
 
8,1 
– 
– 
– 
 
3,7 
 
4,3 
5,2 
4,6 
 
5,1 
- 
- 
- 
 
4,6 
 
3,9 
6,5 
4,7 
 
8,5 
- 
- 
- 
 
5,1 
 
3,9 
8,8 
6,4 
 
7,9 
2,4 
3,0 
3,6 
 
7,0 
 
5,8 
11,1 
8,0 
 
8,8 
2,4 
3,0 
3,6 
 
7,0 
 
3,7 
3,8 
4,3 
 
5,1 
2,4 
3,0 
3,6 
 
3,7 
 
4,3 
7,8 
6,2 
 
7,3 
2,4 
3,0 
3,6 
 
5,4 
 
4,1 
6,1 
5,0 
 
7,2 
- 
- 
- 
 
4,8 
Fonte: Dados da Fundação Getúlio Vargas 
 
Feitas essas ressalvas passemos à análise da composição da 
despesa. 
Em percentagem do produto nacional bruto, o consumo pessoal 
caiu da média de 77,4% no quadriênio 1947/1950 para 70,8% no perí-
odo 1951/1964. Pelo menos dois fatores explicam essa queda da pro-
pensão média a consumir: a melhoria da renda per capita (que nor-
malmente libera maior disponibilidade de poupanças) e o aumento 
líquido da carga tributária (o qual alargou a cunha entre o produ-
to nacional bruto e a renda disponível do setor privado). Alguns 
economistas admitem ainda que a inflação tenha reprimido o consumo 
pelo discutido mecanismo da "poupança forçada". Essa, porém, é uma 
hipótese sem suficiente apoio empírico, como veremos no Apêndice 
V. 
 
 
QUADRO 13 
COMPOSIÇÃO PERCENTUAL DA DESPESA NACIONAL BRUTA 
A PREÇOS DE 1953 
1947/1966 
ANO Consumo Pessoal* 
Consumo do 
governo 
Formação 
bruta de 
capital fi-
xo 
Variação de 
Estoques 
Capacidade 
p/importar 
Importação 
de bens e 
serviços ** 
TOTAL 
 
1947 
1948 
1949 
1950 
1951 
1952 
1953 
1954 
1955 
1956 
1957 
1958 
1959 
1960 
1961 
1962 
1963 
1964 
1965 
1966 
 
 
79,4 
77,1 
77,3 
75,6 
70,2 
70,0 
71,0 
69,8 
73,0 
70,5 
70,9 
73,7 
72,4 
71,4 
68,8 
69,9 
69,1 
70,0 
77,1 
77,2 
 
11,6 
12,7 
13,5 
12,8 
12,6 
13,0 
15,2 
13,3 
13,5 
14,7 
14,3 
13,7 
13,8 
15,4 
15,6 
15,8 
16,5 
15,6 
12,9 
11,5 
 
12,1 
11,0 
11,8 
12,8 
16,3 
16,5 
13,1 
14,7 
12,4 
13,2 
13,8 
13,8 
14,2 
14,5 
14,8 
13,8 
13,8 
11,9 
9,2 
11,0 
 
-2,0 
-0,4 
-2,1 
-1,9 
2,8 
3,3 
0,6 
3,1 
1,2 
1,5 
2,1 
-0,2 
0,9 
0,7 
1,2 
1,7 
0,9 
1,9 
.. 
.. 
 
6,5 
6,0 
6,0 
8,1 
8,4 
6,3 
7,7 
8,1 
7,9 
8,2 
7,6 
6,9 
7,2 
6,4 
6,0 
4,6 
5,4 
5,2 
5,3 
5,3 
 
 
-7,6 
-6,4 
-6,5 
-7,4 
-10,3 
-9,1 
-7,6 
-9,0 
-8,0 
-8,1 
-8,7 
-7,9 
-8,5 
-8,4 
-6,4 
-5,8 
-5,7 
-4,6 
-4,5 
-5,0 
 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
100,0 
 
* Inclui em 1965 e 1966 a variação do estoque 
** Inclusive renda líquida remetida para o exterior 
Fonte: Fundação Getúlio Vargas 
 
A julgar pelos dados do Quadro 13, a percentagem do consumo 
pessoal no produto nacional bruto teria subido para mais de 77% em 
1965 e 1966. Pelo menos aí as estatísticas parecem muito duvido-
sas. Primeiro porque nesses dois anos as estimativas do consumo 
pessoal agregam as das variações de estoques. Segundo porque, ain-
da que se admita um substancial aumento de estoques em 1965, che-
ga-se a um incremento exagerado para o consumo pessoal nesse ano. 
Entre 1964 e 1965 o produto real cresceu de 3,9%. Supondo que, em 
1965, o aumento de estoques tenha sido de 2% do produto nacional 
bruto e conservando os dados do Quadro 13, conclui-se que, de 1964 
para 1965, o consumo pessoal teria aumentado de 11,5% em termos 
reais. Essa é uma conclusão muito estranha, pois nesse ano ocorreu 
visível recesso no consumo de bens industriais. 
Em percentagem do produto nacional bruto o consumo do Governo 
cresceu de 11,6% em 1947 até 15,6% em 1963, daí voltando a decli-
nar até 11,5% em 1966. O crescimento até 1963 explica-se pela no-
tória liberalidade do setor público com as suas despesas corren-
tes, nas quais estava embutida uma considerável propensão ao em-
preguismo. Os esforços de contenção dos gastos públicos postos em 
prática pelo Governo desde 1964, teriam sido a causa da queda da 
participação do consumo público nos últimos anos da série. 
A preços constantes de 1953, a taxa de formação bruta de capi-
tal fixo teria oscilado entre os seguintes valores médios: 
 
Período Taxa média de investimentos fixos (%) 
1947/1950 11,9 
1951/1954 15,2 
1955/1963 13,8 
1964/1966 10.7 
O substancial aumento da taxa média de investimentos fixos de 
1947/1950 para 1951/1954 teria sido provocado pelo relaxamento dos 
controles de importações (muito apertados pela CEXIM entre 1948 e 
1950 e grandemente liberados em 1951 e 1952, quando se temia que a 
guerra da Coréia degenerasse num conflito mundial). As menores fa-
cilidades de importação e a alta relativa dos preços dos bens de 
capital (que não puderam contar com subsídios cambiais tão genero-
sos) teria sido a causa do declínio da taxa de investimentos fixos 
no período 1955/1963. Um declínio ainda mais acentuado iria veri-
ficar-se no triênio 1964/1966, em virtude dos esforços de conten-
ção inflacionária aplicados pelo Governo. É muito possível, toda-
via, que esta última queda tenha sido exagerada pelas imprecisões 
das estatísticas — como contrapartida da superestimativa (como re-
síduo) do consumo pessoal em 1965 e 1966. 
É interessante salientar que as oscilações da taxa bruta de 
investimentos no período em análise não se deveram apenas às flu-
tuações do esforço de poupança, mas muito particularmente às mu-
danças nos preços relativos dos bens de capital. O Quadro 14 des-
taca esses dois efeitos, confrontando a taxa bruta de formação de 
capital (investimentos fixos mais variação de estoques) a preços 
correntes e a preços de 1953. Como se pode observar, as oscilações 
da taxa a preços correntes (a qual se associa ao esforço de pou-
pança) foram relativamente bem menos intensas do que as da taxa a 
preços constantes. Os anos de maior taxa real de investimentos fo-
ram aqueles em que as importações de bens de capital eram benefi-
ciadas por subsídios cambiais especialmente intensos. Nos últimos 
anos da série os preços relativos dos bens de capital teriam que 
subir — em parte porque não seria possível sustentar esses subsí-
dios cambiais sem chegar à virtual insolvência externa, em parte 
porque grande parcela dos equipamentos antes importados passou a 
ser produzida no país. Essa é uma observação importante para a a-
valiação da política de desenvolvimento do decênio passado e para 
o seu confronto com os métodos a serem recomendados daqui para o 
futuro. 
Quanto aos estoques, o seu nível absoluto caiu entre 1947 e 
1950, em parte pela rápida absorção dos novos excedentes de café, 
em parte pelos rígidos controles de importações aplicados na épo-
ca. Com a liberação desses controles, os estoques aumentaram subs-
tancialmente em 1951 e 1952. Entre 1953 e 1964 o crescimento anual 
dos estoques oscilou em torno da média de 1,3% do produto nacional 
bruto, nessa percentagem incluída a acumulação dos excedentes de 
café (particularmente entre 1957 e 1961). 
Examinemos agora as componentes externas da despesa nacional. 
A preços constantes, a capacidade para importar cresceu entre 1947 
e 1956 de 6,5% para 8,2% da renda nacional bruta, caindo nos anos 
subseqüentes até5,3% em 1965 e 1966. A expansão na primeira fase 
deveu-se à considerável melhoria das relações de troca com o exte-
rior, em boa parte decorrente da alta internacional dos preços de 
café. Na segunda fase o movimento das relações de trocas se inver-
teu, mas o país pôde contar com substancial ingresso de recursos 
externos, sob a forma de investimentos diretos, financiamentos e, 
em certos anos, pelo endividamento internacional desordenado. De 
fato, até 1963, o Governo pouco cuidou de incentivar as exporta-
ções. O crescimento econômico só não chegou a ser obstado pelo 
gargalo da capacidade para importar devido à melhoria das relações 
de troca numa primeira fase, ao ingresso de capitais estrangeiros 
numa segunda e, nos últimos anos, aos efeitos da política de subs-
tituição de importações. 
 
QUADRO 14 
TAXA BRUTA DE INVESTIMENTOS (%) 
 
ANO A preços Correntes A preços de 1953 
Índice dos preços 
relativos dos bens 
de capital 
 
1947 
1948 
1949 
1950 
1951 
1952 
1953 
1954 
1955 
1956 
1957 
1958 
1959 
1960 
1961 
1962 
1963 
1964 
1965 
1966 
 
 
15,9 
15,8 
13,2 
11,5 
19,0 
19,8 
13,7 
19,9 
15,7 
14,8 
15,2 
13,9 
17,0 
17,5 
18,7 
18,4 
17,6 
16,6 
10,9 
12,9 
 
10,1 
10,6 
9,7 
10,9 
19,1 
19,8 
13,7 
17,8 
13,6 
14,7 
15,9 
13,6 
15,1 
15,2 
16,0 
15,6 
14,7 
13,8 
9,2 
11,0 
 
155,4 
149,1 
136,1 
105,5 
99,5 
94,9 
100,0 
111,8 
115,4 
100,7 
96,6 
102,2 
112,6 
115,1 
116,9 
117,9 
119,7 
120,3 
118,5 
117,3 
Fonte: Dados da Fundação Getúlio Vargas 
 
No que diz respeito à relação entre importações e produto na-
cional bruto, a preços de 1953, foi a seguinte a sua evolução: 
 
Período Coeficiente de importações (%) 
1947/1950 7,0 
1951/1954 9,0 
1955/1960 8,3 
1961/1963 6,0 
1964/1966 4,7 
 
No quadriênio 1947/1950 o coeficiente de importações se mante-
ve reprimido em torno de 7,0%, em virtude dos controles quantita-
tivos postos em prática pela CEXIM. Entre 1951 e 1954, o relaxa-
mento desses controles elevou o coeficiente em questão para a mé-
dia de 9,0%. Nos períodos subseqüentes a relação importa-
ções/produto baixou gradativamente até a média de 4,7% entre 1964 
e 1966. Em parte esse era o resultado natural do amadurecimento da 
política de substituição de importações (com certa defasagem pois, 
numa primeira etapa, para substituir importações é necessário im-
portar equipamentos). Em parte, porém, os baixos coeficientes re-
gistrados a partir de 1962 parecem ter-se associado às taxas insa-
tisfatórias de crescimento do produto real. Há indícios de sensí-
vel aumento dos coeficientes de importação em 1967 e 1968, como 
resultado da melhoria do ritmo de expansão da atividade econômica. 
 
2.3 — Industrialização e Estrutura Ocupacional 
 
Um dos problemas que mais vêm preocupando os analistas da eco-
nomia brasileira é o de como absorver os vastos contingentes adi-
cionais de mão-de-obra que anualmente afluem ao mercado de tra-
balho. Duas razões especiais fundamentam essa preocupação: primei-
ro, o crescimento explosivo da população brasileira; segundo, a 
baixa taxa de criação de empregos na indústria, precisamente no 
seu período áureo de expansão — o decênio de 1950. 
Infelizmente são muito poucas as estatísticas sobre a distri-
buição de emprego no Brasil, as mais completas não fornecendo in-
formações posteriores a 1960. A partir dos Censos de 1940, 1950 e 
1960 é fácil calcular as suas taxas anuais de crescimento nos 
grandes setores da economia. Os resultados a que se chega são os 
do Quadro 15 a seguir. 
 
QUADRO 15 
POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA TOTAL E SETORIAL 
TAXAS GEOMÉTRICAS DE CRESCIMENTO ANUAL (% ao ano) 
SETOR 1940/1950 1950/1960 1940/1960 
Primário 
 
Secundário 
 
Terciário 
1,4 
 
5,2 
 
2,2 
1,7 
 
2,3 
 
5,2 
1,5 
 
3,8 
 
3,7 
 
TOTAL 
 
2,1 
 
2,8 
 
2,4 
 
É interessante combinar essas taxas com as do crescimento do 
produto real por setores estimadas pela Fundação Getúlio Vargas. 
Como resultado obtêm-se as taxas de incremento setorial da produ-
tividade apresentadas no Quadro 16. 
 
QUADRO 16 
TAXAS MÉDIAS DE CRESCIMENTO GEOMÉTRICO 
DO PRODUTO POR PESSOA ATIVA 
(% ao ano) 
SETOR 1940/1950 1950/1960 1940/1960 
Primário 
 
Secundário 
 
Terciário 
2,5 
 
2,6 
 
3,6 
2,7 
 
6,6 
 
— 0,6 
2,7 
 
4,5 
 
1,4 
TOTAL 3,4 3,0 3,3 
Para o decênio de 1940 os resultados parecem bastante equili-
brados. A população ativa expandiu-se com especial intensidade no 
setor secundário, precisamente o que mais rapidamente se desenvol-
veu. A taxa de crescimento da população empregada na agricultura 
(1,4% ao ano) ficou razoavelmente abaixo da taxa de aumento do to-
tal da população ativa (2,1% ao ano) dentro do tradicional princí-
pio da transferência de mão-de-obra do setor rural para o urbano 
com o aumento da renda per capita. E as taxas de incremento da 
produtividade, embora pouco maiores no setor terciário do que nos 
dois outros, não chegaram a apresentar divergências exageradas. 
Para o decênio de 1950 as conclusões são muito mais surpreen-
dentes. No setor primário, a evolução do emprego e da produtivida-
de parece ter sido perfeitamente normal. Todavia, no setor líder 
do desenvolvimento, a indústria, a absorção de mão-de-obra foi de-
cepcionantemente reduzida, limitando-se a 2,3% ao ano, taxa infe-
rior à do crescimento da população ativa. Naturalmente a pro-
dutividade média aumentou consideravelmente nesse setor (6,6% ao 
ano). O excedente não absorvido de mão-de-obra foi alojar-se no 
setor terciário, onde aumentou substancialmente o volume de empre-
go (5,2% ao ano), mas à custa do declínio da produtividade média. 
Para muitos economistas esse é um sintoma de acumulação de desem-
prego estrutural. Discutiremos essa conjectura mais adiante. 
A lenta absorção de mão-de-obra pelo setor secundário no decê-
nio de 1950 deveu-se, em primeiro lugar, à estrutura "capital-
intensive" das novas indústrias instaladas no país. Como se veri-
fica no Quadro 18, entre 1949 e 1966 a participação da indústria 
na geração do Produto Interno Bruto aumentou de 19,1% para 29,2%. 
Contudo, a produção tradicional de bens não duráveis de consumo 
praticamente não se alterou em percentagem do Produto Interno Bru-
to. As grandes taxas de crescimento se verificaram nas indústrias 
produtoras de bens duráveis de consumo, de bens intermediários e 
bens de capital — exatamente as que operam com maior relação capi-
tal/mão-de-obra. Por outro lado, o sistema de preços incentivava o 
uso intensivo do capital, pelos subsídios cambiais à importação de 
equipamentos e pelas taxas reais de juros negativas criadas pela 
inflação, e desestimulava a absorção de mão-de-obra pelo contínuo 
aumento das pressões salariais e dos encargos trabalhistas. Não 
surpreende assim, que o Brasil tenha chegado à estranha des-
proporção entre a participação da indústria no produto e no empre-
go indicada no Quadro 19. Embora os critérios estatísticos tendam 
a superestimar a participação da indústria no produto e a subesti-
mar a sua contribuição para o emprego, a conclusão parece qualita-
tivamente indiscutível. 
Para os adeptos da chamada escola estruturalista, essa despro-
porção foi a origem de um aumento da desigualdade de rendas indi-
viduais, responsável por um perfil inadequado da demanda e que a-
cabaria dificultando o crescimento econômico no decênio de 1960. 
Como veremos no próximo capítulo, a hipótese em questão, apesar de 
muito rica em termos de comunicação mística, parece bastante frá-
gil em matéria de conteúdo empírico e de lógica econômica. Talvez 
nos devamos limitar a uma conclusão mais modesta: a de que o hiato 
entre as participações da nossa indústria no produto e no emprego 
resultou simplesmentede uma política de desenvolvimento inteira-
mente alheia ao princípio das vantagens comparativas. 
Também a dramaticidade do desemprego estrutural no setor ter-
ciário parece ser exagerada pelas distorções das estatísticas. A 
conjectura em questão fundamenta-se na observação de que a produ-
tividade média do trabalho nesse setor caiu de 0,6% ao ano entre 
1950 e 1960. Ocorre que os índices do produto real para o setor 
terciário apurados pela Fundação Getúlio Vargas foram construídos 
sob hipóteses excessivamente precárias. Para duas componentes im-
portantes desse setor — os Serviços e o Governo — os índices em 
questão são meras progressões geométricas que extrapolam o número 
de pessoas ocupadas entre 1940 e 1950. Como entre 1950 e 1960 a 
população empregada nesses setores cresceu bem mais rapidamente do 
que no decênio anterior, a queda de produtividade apontada no Qua-
dro 16 é mais uma tautologia aritmética do que uma evidência eco-
nômica. Outros critérios de apuração do índice do setor terciário, 
em grau equivalente de arbitrariedade, poderiam ter levado a con-
clusões inteiramente diversas. De fato, do ponto de vista estatís-
tico, o nosso setor terciário ainda é um grande desconhecido. É 
possível que as indústrias "capital-intensive" implantadas no de-
cênio de 1950 tenham gerado um multiplicador de serviços bem supe-
rior ao das indústrias tradicionais. Se tal conjectura for válida, 
o problema da absorção da mão-de-obra pelo setor terciário talvez 
tenha sido bem menos grave do que se poderia imaginar pela análise 
das estatísticas disponíveis sobre crescimento do emprego e da 
produtividade média. 
Essas observações mostram que a evidência empírica usualmente 
apresentada nos relatórios oficiais sobre o problema do emprego no 
setor terciário é extremamente frágil. Mas não conduzem à con-
clusão de que o problema se possa considerar irrelevante. Sobretu-
do daqui para o futuro há motivos para nos sentirmos bastante a-
preensivos. Entre 1950 e 1960 a nossa população cresceu explosiva-
mente. E o impacto da explosão demográfica sobre a oferta de mão-
de-obra não se manifesta instantaneamente, mas com cerca de quinze 
anos de atraso. E a criação de empregos se torna problemàticamente 
lenta quando declinam as taxas de crescimento do produto real, co-
mo ocorreu nos primeiros anos do decênio de 1960. 
 
QUADRO 17 
ESTRUTURA DO PRODUTO INDUSTRIAL POR USOS (%) 
(em Cr$ de 1955) 
 
Categorias de Indústria 1949 1955 1969 1966 
Bens de Consumo 
Duráveis 
Não duráveis 
 
Bens Intermediários 
 
Bens de Capital 
62,8 
7,2 
55,6 
 
32,0 
 
6,2 
60,1 
9,5 
50,6 
 
34,2 
 
6,7 
63,3 
9,4 
43,9 
 
34,7 
 
12,0 
48,2 
13,3 
34,9 
 
40,1 
 
11,7 
TOTAL............ 100,0 100,0 100,0 100,0 
Fonte:Censos e Registros Industriais — IBGE. 
QUADRO 18 
PARTICIPAÇÃO DAS CATEGORIAS DE USO NO PIB (%) 
(em Cr$ de 1955) 
 
Categorias de Indústria 1949 1955 1959 1966
Bens de Consumo 
Duráveis 
Não Duráveis 
 
Bens Intermediários 
 
Bens de Capital 
12,0
1,4
10,6
6,1
1,0
13.8
2,2
11,6
7,8
1,3
14,5
2,6
11,9
9,4
3,3
14,1 
3,9 
10,2 
 
11,7 
 
3,4 
TOTAL............. 19,1 22,9 27,2 29,2 
Fonte:Censos e Registros Industriais — IBGE. 
 
 
2.4 — O Modelo Brasileiro de Desenvolvimento — Avaliação e Crítica 
 
Pelo que se viu nas seções precedentes, desde 1930 o Brasil 
vem adotando a política de desenvolvimento baseada na industriali-
zação substitutiva de importações. Por muito tempo, essa orienta-
ção não resultou de uma filosofia de crescimento a longo prazo, 
mas simplesmente de uma série de reações mais ou menos tópicas di-
ante das dificuldades do balanço de pagamentos. Só após a Segunda 
Guerra Mundial é que se firmou a idéia de que a industrialização 
deveria constituir o fulcro do desenvolvimento econômico do país. 
 
QUADRO 19 
PARTICIPAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DE TRANSFORMAÇÃO 
NO EMPREGO E NO PIB 
 
PAÍSES 
% do produto 
industrial 
no PIB 
% do emprego 
industrial 
na população 
empregada 
 
Brasil (1964) 
Argentina(1964) 
México (1964) 
Japão (1960) 
Itália (média 1949/59) 
Holanda (média 1949/59) 
Canadá (média 1949/59) 
Estados Unidos (média 1949/59) 
Dinamarca (média 1949/59) 
Noruega (média 1949/59) 
Grécia (média 1949/59) 
Espanha (média 1949/59) 
Irlanda (média 1949/59) 
Portugal (média 1949/59) 
 
29,9 
34,0 
25,2 
30,0 
30,5 
30,3 
28,2 
30,3 
27,1 
28,4 
17,7 
23,2 
19,3 
34,7 (1) 
 
 
8,26 (2) 
25 (2) 
16 (2) 
--- 
24,5 
29,5 
25,3 
25,6 
29,6 
23,4 
15,9 
18,2 (2) 
15,5 
19,7 (2) 
Fonte: "Some Factors in Economic Growth in Europe during the 1950' s" 
— ONU. 
Contas Nacionais do Brasil. 
(1) Inclui Construção Civil. 
(2) Emprego referido à População Economicamente Ativa. 
Qualitativamente não há que discutir a propriedade dessa ori-
entação. A nossa pauta tradicional de exportações era composta de 
produtos de demanda internacional pouco elástica. Se o país não 
modificasse a sua estrutura econômica no sentido da substituição 
de importações, as oportunidades de crescimento sustentáveis pela 
poupança interna seriam facilmente estranguladas pelo descompasso 
entre as compras ao exterior e a capacidade para importar. Descen-
do aos pormenores, no entanto, várias distorções parecem ter pon-
tilhado o crescimento da economia brasileira, particularmente de-
pois de 1950. Em primeiro lugar a erosão inflacionária, que nos 
acabou levando à beira da hiperinflação no Governo Goulart. Em se-
gundo lugar, a sustentação do desenvolvimento não por um alto es-
forço de poupança, mas por uma exploração artificial da relação 
capital/produto. Terceiro, o excessivo protecionismo a certos se-
tores industriais. Por último, o negligenciamento às exportações, 
que se expandiram a taxas ínfimas na maior parte do período em, 
análise. 
Como veremos no capítulo V é muito provável que a inflação 
pouca relação tenha mantido com a industrialização substitutiva de 
importações. A alta geral de preços parece ter resultado simples-
mente das reiteradas tentativas de implantação de uma política de 
incompatibilidade distributiva — uma política que se esforçava por 
dividir o bolo em fatias de soma superior ao todo. É provável, a-
inda, que à custa do abafamento de certos períodos de euforia 
transitória, o Brasil pudesse ter implantado o mesmo processo de 
industrialização com muito poucas tensões inflacionárias, se os 
Governos tivessem prestado maior atenção às limitações de ordem 
financeira. Na realidade a inflação não parece ter-se correla-
cionado positivamente com o desenvolvimento, mas apenas o acompa-
nhado numa espécie de paralelismo espúrio. E é certo que a explo-
são inflacionária entre 1961 e 1964, pelos seus impactos imediatos 
e pela posterior necessidade de sua correção, acabou criando sé-
rios prejuízos às taxas de crescimento do produto real no presente 
decênio. 
A exploração artificial da relação capital/produto talvez te-
nha sido estruturalmente mais importante, pois foi parte essencial 
da política de desenvolvimento do decênio de 1950. Pelo que suge-
rem as Contas Nacionais, o Brasil não tem sido um país excepcio-
nalmente esforçado em matéria de taxa de poupança. O desenvolvi-
mento rápido do período 1947/1961 foi em grande parte conseguido 
graças a uma relação incremental capital/produto extremamente fa-
vorável, a julgar pelos padrões internacionais: 2,2 em termos bru-
tos anuais, e em moeda de 1953. Esse excelente nível de produtivi-
dade monetária dos investimentos pôde ser sustentado graças a três 
fatores: ao estilo extensivo do aumento da produção agrícola, ba-
seado não na melhoria dos rendimentos por hectare, mas na amplia-
ção da área cultivada, o que permitia que se produzisse mais com 
muito

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