Prévia do material em texto
EFEITOS DE ENCADEAMENTO: A CONTRIBUIÇÃO DE ALBERT HIRSCHMAN Desenvolvimento Socioeconômico 2º quadrimestre de 2018 Profª Fernanda Cardoso Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 2 Hirschman • Albert Otto Hirschman (1915-2012), economista e cientista social alemão. • Passou por Paris (Escola de Altos Estudos Comerciais) e por Londres (London Schooll of Economics). • Militou contra governos autoritários europeus. • Fugiu para os EUA em 1941, onde se estabeleceu intelectualmente. • Na sua vasta produção bibliográfica, vale destacar: ✓ A Estratégia do Desenvolvimento Econômico, 1958. ✓ Viagens para o progresso: estudos de política econômica na América Latina, 1963. ✓ Projetos de desenvolvimento observados, 1967. Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 3 Hirschman e a América Latina “O nome de Hirschman é bastante significativo para nós, brasileiros, por ter sido um dos poucos teóricos do desenvolvimento estrangeiros que entrou em contato com correntes de pensamento tipicamente latino-americanas, como o Estruturalismo cepalino e a Teoria da Dependência. Ainda que divergindo de sua perspectiva teórica, Hirschman debateu com os adeptos dessas correntes, em suas próprias línguas nativas, as questões relativas à promoção do desenvolvimento e às políticas adequadas para atingir esse alvo” (Bianchi, 2013, p. 7). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 4 Um pioneiro dissidente “Quando eu recebi o convite para participar do simpósio como um dos “pioneiros” junto com Raúl Prebisch, Gunnar Myrdal, Arthur Lewis, e outros representantes da Economia do Desenvolvimento, minha primeira reação foi de surpresa. Não porque eu não me considerasse um representante; mas, sob minha perspectiva, eu ainda me via como um rebelde contra a tradição, como uma segunda geração dissidente formadora das proposições que, enquanto pareciam ser novas e heterodoxas, foram rapidamente se tornando, nos anos 1950, uma nova ortodoxia sobre os problemas do desenvolvimento. Minhas ideias ousadas e insurgentes tinham se tornado clássicas, respeitáveis...” (Hirschman, 1984, apud Cardoso, 2012a, p. 80). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 5 Para além da economia “Em sua economia do desenvolvimento mesclam-se com naturalidade noções de ciência econômica, ciência política, psicologia, filosofia, ética e até literatura, tendência que viria a acentuar-se ao longo do tempo. É verdade que os pioneiros do desenvolvimento nunca foram economicistas, no sentido estrito da expressão. Mas em Hirschman esse traço é mais acentuado, pois esteve sempre aberto para acolher contribuições de outras disciplinas” (Ana Maria Bianchi, “As muitas travessias de Albert Hirschman”, 2013, p. 9 – disponível em http://www.seer.ufu.br/index.php/revistaeconomiaensaios/article/vie w/26285/14345). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 6 Dois males a serem enfrentados 1. Hábito dos representantes (políticos ou acadêmicos) dos países desenvolvidos de emitir conselhos relativos a políticas econômicas, baseando-se em princípios econômicos de suposta validade universal [chute da escada?]. 2. Atitude passiva dos próprios países subdesenvolvidos frente à sugestão dessas políticas prejudiciais às suas próprias economias. Os latino-americanos teriam sido acostumados a apenas aceitar sugestões externas - “fracassomania” (failure complex). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 7 Fracassomania “Hirschman dá esse apelido a um estilo auto-depreciativo de fazer política observado entre as autoridades públicas da América Latina. Movidos pelo afã de resolver todos os problemas o mais rapidamente possível (…), os formuladores de política inclinavam- se a buscar uma solução “fundamental”, definitiva. O entusiasmo ansioso com o qual missões de especialistas estrangeiros eram saudadas em sua chegada à América Latina faria parte desse padrão ambivalente (....) Seus conselhos eram aparentemente aceitos, mas a presença da fracassomania gerava um clima de sabotagem inconsciente” (Bianchi, 2013, p. 11). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 8 Efeitos de encadeamento Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 9 Dificuldades e soluções • Para Hirschman, antes que se inicie o processo de desenvolvimento, é difícil visualizá-lo, por conta dos grandes obstáculos existentes. • Para o pioneiro, boa parte da solução desses problemas estaria no próprio processo de desenvolvimento. “o desenvolvimento depende menos de encontrar combinações ótimas para recursos e fatores de produção dados e mais em invocar e elencar recursos e habilidades que levem ao desenvolvimento, que estejam escondidos, dispersos ou mal utilizados” (Hirschman, 1958 apud Cardoso, 2012a, p. 81). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 10 Determinação e aprendizado • O desenvolvimento depende da habilidade e determinação de uma nação em se organizar para tal. • O foco na determinação considera o contexto específico de retardatários, em que o desenvolvimento é um “processo menos espontâneo e mais deliberado do que no caso dos países em que esse processo ocorreu primeiro”. • Entretanto, a determinação não seria condição suficiente: precisa combinar-se com a compreensão das necessidades a serem satisfeitas, o que envolve um processo de aprendizado. Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 11 A tomada de decisões • Para Hirschman, o atraso econômico se deve à quantidade e à velocidade insuficientes de decisões relativas ao desenvolvimento. • É a habilidade em tomar decisões o recurso escasso que condicionaria as outras dificuldades. • O processo decisório das autoridades políticas na América Latina teria sido, nesse sentido, falho. Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 12 Tensões e aprendizado • A habilidade em tomar decisões emerge do próprio processo; não pode ser tomada como pré-requisito. • Aprender a tomar decisões reflete o incremento da capacidade de compreensão dos próprios problemas. • Assim, as próprias tensões que surgem no processo de desenvolvimento podem adicionar força para que ele prossiga. “trata-se de lugar comum o fato de que o desenvolvimento carrega consigo muitas distorções e tensões. Mas o que é menos compreendido é o fato de que o desenvolvimento também extrai nova força das tensões que ele cria. Ao chocar-se com essas dificuldades, o desenvolvimento possibilita o enfrentamento delas” (Hirschman, 1958 apud Cardoso, 2012a, p. 87). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 13 Particularidades • No caso dos países subdesenvolvidos, as dificuldades se encontrariam em como conectar a poupança e o investimento. “o desenvolvimento é contido primeiramente pelas dificuldades de canalizar a poupança existente, ou potencialmente existente, para oportunidades de investimentos produtivos existentes, isto é, e pela escassez de habilidade em fazer e executar decisões de desenvolvimento” (Hirschman, 1958 apud Cardoso, 2012a, pp. 82-83). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 14 Efeito complementaridade do investimento • A habilidade para investir é adquirida e incrementada principalmente pela prática. • Seria o investimento o mecanismo capaz de superar as dificuldades enfrentadas pelas nações subdesenvolvidas. • A explicação para tal seria o efeito complementaridade do investimento. “o efeito complementaridade do investimento é (...) o mecanismo essencial pelo qual novas energias são canalizadas em direção ao processo de desenvolvimento e por meio do qual o círculo vicioso que parece confiná-lo possa ser quebrado” . Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 15 Processo desequilibrado • Hirschman defende que o processo de desenvolvimento só pode ser provocado pelos desequilíbrios. • Contrapõe-se à ideia de crescimento equilibrado: “se um país estivesse pronto para aplicar a doutrina do crescimento equilibrado,então, em primeiro lugar, ele não seria subdesenvolvido” (1958 apud Cardoso, 2012a, p. 84). • Seriam os mecanismos que levam ao afastamento do equilíbrio que desencadeiam as mudanças! • O desenvolvimento seria, então, uma cadeia de desequilíbrios. Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 16 Atalho errado “Seguindo Gerschenkron, eu via originalidade e criatividade em desviar da trajetória seguida pelos países industriais mais antigos, em pular estágios, e em inventar sequências que tivessem a aparência de um “atalho errado”. Eu tenho certeza que foi essa atitude que me permitiu trazer à tona a dinâmica dos encadeamentos para frente e para trás e aclamar como uma proeza dialético-paradoxal o que mais tarde foi chamada, com intenção depreciativa, de industrialização substitutiva de importações” (Hirschman, 1958 apud Cardoso, 2012a, p. 84). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 17 Efeitos de encadeamento • Encadeamento para frente: “qualquer atividade, que por sua natureza, não atenda exclusivamente a demandas finais, induzirá esforços para que se utilizem seus produtos como insumos em algumas outras atividades” (apud Cardoso 2012a, p. 84). • Encadeamento para trás: “qualquer atividade econômica não primária induzirá esforços para suprir, por meio da produção doméstica, os insumos necessários àquela atividade” (idem). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 18 [Observação: Atlas da complexidade - http://atlas.cid.harvard.edu/] Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 19 Subdesenvolvimento • A falta de interdependência e de encadeamentos entre os setores que compõem o sistema econômico nacional seria uma das características típicas das nações subdesenvolvidas ✓[por que e como isso ocorre?]. • As nações subdesenvolvidas permaneciam baseadas principalmente na agricultura, especialmente na agricultura de subsistência. • Portanto, o potencial inicial de encadeamentos seria, necessariamente, baixo. Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 20 Industrialização “a agricultura certamente está condenada ao resultado de sua falta de estímulo direto ao estabelecimento de novas atividades por meio de efeitos de encadeamento: a superioridade da manufatura a esse respeito é esmagadora. Essa pode ser ainda a mais importante razão militando contra qualquer completa especialização dos países subdesenvolvidos na produção de primários” (Hirschman, 1958 apud Cardoso, 2012a, pp. 86-87). Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 21 Necessidade de coordenação e planejamento • O processo de desenvolvimento necessariamente requer alguma forma de coordenação. • No entanto, “O desenvolvimento não deveria ser pensado como um processo equilibrado, nem como um processo totalmente planejado pela autoridade pública, sem tensões, sem brechas temporárias, sem pressões de qualquer espécie” (Bianchi, 2013, p. 10). • Hirschman ressalta que a resolução do problema do subdesenvolvimento encontra-se, primeiramente, no seu claro entendimento. • Caso contrário, o sonho do desenvolvimento pode se transformar em um pesadelo! Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 22 Reflexão final “a política econômica pode ser pior do que somente ineficaz: a inutilidade pode ser substituída abruptamente pela brutalidade, pelo desprezo ao sofrimento humano, aos direitos adquiridos, aos procedimentos legais (...) em suma, à “tênue e precária camada de civilização”” (Hirschman, 1958 apud Cardoso, 2012a, p. 88). ✓ Como tornar a política econômica eficaz para o desenvolvimento? ✓ Como evitar consequências socioeconômicas perniciosas? ✓ Qual a estratégia de desenvolvimento? Desenvolvimento Socioeconômico - UFABC 23