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Miryan Buzetti Educação Especial Sumário 03 CAPÍTULO 1 – O que é educação especial e inclusiva?.....................................................05 Introdução ....................................................................................................................05 1.1 A história da Educação Especial ................................................................................05 1.1.1 A Idade Contemporânea ..................................................................................07 1.2 A Educação Especial no Brasil ...................................................................................09 1.2.1 Da negação e descaso aos primeiros passos da Educação Especial e Inclusão .......09 1.2.2 As conquistas dos alunos com deficiências intelectual, auditiva e visual .................10 1.3 Educação Inclusiva ...................................................................................................12 1.3.1 A complexidade da Educação Especial e Inclusiva ...............................................13 1.3.2 Foco nas habilidades, não nas dificuldades ........................................................14 1.4 Políticas públicas nacionais .......................................................................................16 1.4.1 A legislação nos anos 2000 .............................................................................17 Síntese ..........................................................................................................................20 Referências Bibliográficas ................................................................................................21 Capítulo 1 05 Introdução Você já se perguntou o significado de Educação Especial? Qual será a diferença entre Educação Especial e Educação Inclusiva? Será que essas expressões sempre tiveram o mesmo significado ou ao longo do tempo seus conceitos foram se modificando? Vivemos em uma sociedade democrática, na qual, de acordo com a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 205, todos temos direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa humana. No artigo 208 está previsto, ainda, que o Estado deverá garantir o Atendimen- to Educacional Especializado às pessoas com deficiência preferencialmente na rede regular de ensino. Seguindo, portanto, o que determina a Constituição, vamos refletir: quem atenderá esse aluno na rede regular de Ensino? Como deve ser realizado esse atendimento? Levando em conta tais questionamentos, o presente capítulo irá apresentar os significados de Educação Especial e de Educação Inclusiva; trará um breve histórico sobre a Educação Especial em nosso país e também revelará o que nos diz a legislação sobre o assunto. Falar sobre a Educação Inclusiva nos leva a pensar sobre a concepção de educação e o papel da escola em nossa sociedade. A educação escolar deve oferecer aos alunos os desenvolvimen- tos cognitivo, social, psicológico, afetivo, enfim, deve prepará-los para atuar na sociedade. A maneira como o professor trabalha irá não apenas influenciar, mas determinar o sucesso ou não dos objetivos de ensino e dos ideais de inclusão da educação. 1.1 A história da Educação Especial A proposta de atendimento aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento (TGD) e altas habilidades/superdotação, denominada de inclusão escolar, vem se estabelecendo no Brasil, nas últimas décadas, e uma de suas consequências, evidenciada pelos censos escola- res, é a ampliação de matrículas em classes comuns, predominantemente em escolas municipais brasileiras. Até a década de 1950, não se falava em Educação Especial. Foi a partir de 1970 que ela passou a ser alvo de discussão, tornando-se uma preocupação dos governos com a criação de instituições públicas e órgãos especializados. Diante da análise do processo histórico, podemos verificar que a maneira como a sociedade se relaciona com as pessoas com deficiência está interligada às conquistas dessa mesma sociedade. Diferentes con- cepções de deficiência permearam esse debate, principalmente em se tratando de acesso à educação. Até o século XVIII, a exclusão das pessoas com deficiência era prática regular. Elas eram alijadas da sociedade em todos os tipos de atividades. Eram consideradas inválidas, sem utilidade, um peso social, não sendo merecedoras, portanto, de nenhuma atenção. Faremos agora uma breve viagem no tempo para entender essa história. O que é educação especial e inclusiva? 06 Laureate- International Universities Educação Especial • Pré-história: os povos eram nômades (não tinham um lugar fixo para morar; viviam em busca de lugar mais seguro e de alimentação), o que dificultava a vida das pessoas que tinham deficiência. Dependentes da tribo, eram abandonadas, sendo vítimas de outros animais selvagens ou da própria natureza (JANUZZI, 2004). • Antiguidade: em Esparta e em Atenas, as pessoas que apresentavam alguma deficiência (física, sensorial e intelectual) eram consideradas subumanas, sendo eliminadas da sociedade e abandonadas à “própria sorte”, já que havia o culto à beleza e ao corpo atlético. No Egito, nesta época, os surdos eram considerados indivíduos não educáveis, sendo unicamente tratados com preparados e soluções para dores de ouvido (JANNUZZI, 2004). VOCÊ QUER VER? O filme “300”, dirigido por Zazk Snyder (2007), é centrado no Rei Leônidas, que lidera 300 espartanos na guerra contra o “deus-rei” Xerxes da Pérsia e o seu exército com mais de 300.000 soldados. Enquanto a batalha ocorre, a Rainha Gorgo procura ajuda para o seu marido em Esparta. No filme, podemos ver o ideal de beleza da época e o abandono ou o homicídio (eram jogadas de um penhasco) de pessoas com deficiência, consideradas inadequadas para a guerra. Ilustra a visão dos deficientes como subuma- nos, comum na Antiguidade. Neste trecho do filme, podemos conferir um pouco sobre a educação espartana: <https://www.youtube.com/watch?v=H95HI-QGsKs>. • Idade Média: até a difusão do Cristianismo (principalmente da Igreja Católica Apostólica Romana), as pessoas com deficiência continuavam sendo “eliminadas” da sociedade. Com o Cristianismo, os deficientes “ganharam alma” e, portanto, passaram a ser considerados filhos de Deus. As pessoas com deficiência intelectual, por exemplo, obtiveram o direito de ser acolhidas em conventos, mas ainda assim não havia uma igualdade civil e de direito. No final do século XV, os deficientes eram marginalizados. Apesar de existirem exemplos de caridade e de solidariedade, em sua grande maioria, portadores de deformidades físicas, sensoriais ou mentais eram excluídos e pobres. No século XIV, surge a primeira legislação sobre pessoas com deficiência mental, cria- da por Eduardo II, na Inglaterra. Nela, o rei era responsável pelos cuidados com o deficiente e recebia a herança como forma de pagamento. A lei trouxe à tona a dife- renciação entre deficiente mental (loucura/idiotia) e doença mental (alterações psiqui- átricas transitórias). Na época, o doente mental tinha direito aos cuidados sem perder a herança (MAZZOTTA, 1996). VOCÊ SABIA? • Idade Moderna: No século XVI, destacamos os trabalhos de Paracelso (1493 – 1541), médico que escreveu, em 1526, um livro chamado “Sobre as doenças que privam o homem da razão”. Na obra, a deficiência mental era apresentada como um problema de Medicina, que deveria ser estudado e pesquisado pelos médicos. Em seu discurso, o médico e filósofo Jerônimo Cardano (1501 - 1576), além de concordar com o colega, se preocupava com a educação das pessoas que apresentavam a deficiência. Em Londres, outro médico, Thomas Willis (1621-1675) realiza um discurso com uma postura organicista da deficiência mental, demonstrando cientificamente que a deficiência tem origem de estruturas e eventos neurais, caminhando para umaexplicação das causas da deficiência e de um possível tratamento dessas pessoas. Apesar disso, ainda prevalecem na sociedade as atitudes religiosas e a postura de desigualdade entre as pessoas. 07 John Locke (1632 – 1704) foi um filósodo e idealista do liberalismo, sendo considera- da uma grande influência para o empirismo britânico e um dos principais teóricos do contrato social. No século XVII, questionou as doutrinas da mente humana e as suas funções. Seu principal conceito é o da “tábula rasa”, utilizado para se referir a pessoas tidas como idiotas e também para os recém- nascidos. Locke considerava a mente uma hu- mana uma folha em branco, que necessita de experiências para ser preenchida. Para ele, o melhor método para isso são programas sistemáticos de educação. VOCÊ O CONHECE? Na Idade Moderna, começaram a ser divulgadas experiências educacionais com surdos. Foi quando Cardano contradisse Aristóteles ao afirmar que a audição e a fala não eram essenciais à compreensão das ideias. Sua teoria era de que a audição não era uma condição para a aprendizagem e sim apenas uma barreira, em vez de um caráter essencial. Até então, pessoas com cegueira ou surdez eram consideradas também deficientes mentais, pois não aprendiam igualmente aos demais. 1.1.1 A Idade Contemporânea No final do século XIX e início do século XX, foram surgindo algumas escolas especiais e centros de reabilitação. É que, diante dos estudos que abordaremos a seguir e do sucesso dessas expe- riências, a sociedade começava a aceitar que pessoas com deficiência poderiam ser educadas e produtivas para a sociedade (BUENO, 1993). Vejamos como se deram esses passos. No século XVIII, Fodéré escreveu “Tratado do bócio e do cretinismo”, no qual defendeu que a deficiência era algo hereditário, sendo uma consequência genética do cretinismo, principalmente em relação à deficiência intelectual. No século XIX, quem se destacou foi Jean-Marc-Gaspard Itard. Mais conhecido como Itard, ele apresentou o primeiro programa sistematizado de Educa- ção Especial. Criou uma metodologia que utilizou com Vitor, um menino de aproximadamente 12 anos encontrado sozinho na floresta de Aveyron, no sul da França. O menino estava nu, não falava e andava de quatro. VOCÊ QUER VER? O filme do cineasta François Truffaut, L’enfant sauvage, de 1970, batizado no Bra- sil como O Garoto Selvagem, conta a história de Vitor e demonstra com riqueza de detalhes o trabalho desenvolvido por Itard. Recomendo para quem quer saber mais sobre um dos trabalhos mais importantes na área da Educação Especial. É uma obra clássica, que teve várias versões ao longo do tempo, demonstrando a influência do meio no comportamento do menino Vitor. A versão mais antiga demonstra com maior detalhamento o trabalho de Itard. Confira em: <https://www.youtube.com/ watch?v=K6GZPuxuBTU>. Ainda sobre o experimento de Itard que resultou em filme, cabe ressaltar que ele obteve autori- zação judicial para começar a cuidar e educar o menino, tornando-o foco de pesquisa e estudos por aproximadamente três anos. Na observação, ele fez descobertas fundamentais que deram origem à otorrinolaringologia (JANNUZZI, 2004; MAZZOTTA, 1996). 08 Laureate- International Universities Educação Especial Influenciado pelos estudos de Fodéré, o médico francês Phillippe Pinel (1745 – 1826) entendia que a idiotia era considerada uma deficiência biológica (contrariando assim os estudos de Itard). Considerado o pai da psiquiatria, foi o primeiro a tentar descrever algumas perturbações men- tais, buscando assim tratá-las. Dessa maneira, gerou uma discordância que encontramos até os dias de hoje e que dificulta o diagnóstico e a avaliação: a deficiência pode ser causada por diferentes fatores ambientais e biológicos. Tendo sofrido influência das ideias de Pinel, Jean-Étienne Esquirol (1772- 1840) propôs a dife- renciação entre cretinismo e idiotia. Para Esquirol, a idiotia era consequência de situações pré e perinatais. Diferentemente do termo cretinismo, que envolvia casos mais graves, ele não con- siderava a idiotia como uma doença. Acreditava que era apenas um estado da pessoa e que a educação poderia contribuir para a superação. Ao contrário dede Esquirol, Edouard Séguin criticava a teoria médica, pois enfatizava a edu- cação. Considerado o responsável pela sistematização da metodologia da Educação Especial, Séguin não se preocupou apenas com os estudos teóricos sobre idiotia, mas também se dedicou à criação de serviços, fundando, em 1837, uma escola para idiotas. Foi ainda o primeiro pre- sidente de uma organização de profissionais da área, atualmente conhecida como Associação Americana de Deficiências Intelectual e de Desenvolvimento (AADID). Figura 1 – O olhar educacional para o deficiente. Fonte: Eleonora_os, Shutterstock, 2016. De acordo com Stainback e Stainback (1997), nos Estados Unidos, entre os anos de 1842 e 1918, todos os estados legislaram em favor do ensino obrigatório e as escolas públicas recebe- ram recursos para desenvolver um trabalho pedagógico inclusivo. Maria Montessori nasceu em 1870, na Itália. Ela utilizou pequenos textos, sentenças, cartões de palavras no ensino da leitura e da escrita para pessoas com deficiência inte- lectual (DI). Na alfabetização, usou o método sensorial, tanto para portadores ou não de deficiência. O conceito fundamental que sustenta a obra pedagógica de Montessori é que as crianças necessitam de um ambiente apropriado onde possam viver e apren- der. Seu sistema foi influenciado pelas ideias de Froebel e Pestalozzi e sua metodologia buscava os princípios da Escola Nova, que pretendia educar para a liberdade. Saiba mais na página da Organização Montessori no Brasil: < http://omb.org.br/>. VOCÊ O CONHECE? 09 A ideia de integração surgiu então para acabar com a ideia de exclusão, que existiu por vários séculos. As instituições foram se especializando para atender as pessoas com deficiência, mas, infelizmente a segregação continuou sendo praticada: ao criar as instituições especiais, essas pessoas permaneciam excluídas dos serviços existentes na comunidade. Na década de 1960, nos Estados Unidos, houve um aumento significativo de instituições especializadas, reforçando essa postura de segregação (BUENO, 1993). Podemos concluir então que, na Antiguidade as pessoas com deficiência eram eliminadas, abando- nadas ou confinadas em asilos ou manicômios. Na Idade Média, com o poder da igreja, os defi- cientes passam a ser considerados filhos de Deus, anjos na Terra, então eles não eram mais elimina- dos, mas encaminhados para conventos, igrejas e asilos. Na Idade Moderna, surgem as primeiras observações e estudos sobre as patologias, numa tentativa de identificar as causas das deficiências. Em relação ao atendimento educacional, revela Bueno (1993), houve o período da negligência (nenhuma atividade era realizada), da institucionalização (o deficiente é retirado da sociedade e encaminhado para um abrigo, instituições especializadas, classes especiais em escolas regulares) e, hoje, podemos observar uma busca pelo reconhecimento do valor humano e pela garantia de seus direitos, numa luta efetiva por uma inclusão além de educacional, também social: o acesso a ambientes comuns para todos, como as salas de aula regulares. 1.2 A Educação Especial no Brasil Em um levantamento sobre a história da Educação Especial no Brasil, Jannuzzi (1992) concluiu que sua origem se deu em instituições localizadas em São Paulo, desde 1600, ainda no Brasil Colônia, e foi se expandindo com o decorrer do tempo. De acordo com Mazzotta (1996), a evolução da Educação Especial no Brasil pode ser dividida em duas fases. Na primeira, de 1854 a 1956, se observam iniciativas oficiais e particulares iso- ladas, sendo criados o Imperial Instituto para Meninos Cegos (atual Instituto Benjamin Constant) eo Imperial Instituto dos Surdos Mudos (atual Instituto Nacional de Educação de Surdos). Na se- gunda fase, que datamos de 1957 a 1993, ocorreram as iniciativas oficiais de âmbito nacional. A fundação desses dois institutos foi um grande passo para o atendimento das pessoas com defi- ciência em nosso país, já que sensibilizou a sociedade para o tema, incentivando discussões em todas as esferas, além de profissionais e pesquisadores. Apesar da sensibilização, o atendimento era insuficiente: em 1872, o Brasil tinha 15.848 cegos registrados e apenas 15 eram atendidos, enquanto a população de surdos chegava a 11.595, da qual somente 17 recebiam assistência (MAZZOTTA, 1999). O certo é que o atendimento manteve-se, por longo tempo, em escolas e instituições paralelas, em sua maioria privadas, não favorecendo a maioria da população. 1.2.1 Da negação e descaso aos primeiros passos da Educação Especial e Inclusão Diversos pesquisadores nacionais da área (JANNUZZI, 1992; BUENO, 1993; MAZZOTTA, 1999; MENDES, 2006) afirmam que, no período colonial, houve um descaso da educação voltada para a população em geral, reforçando a exclusão das pessoas com deficiência. Os autores pontuam que as poucas instituições que foram criadas realizavam um atendimento médico-pedagógico, com foco em uma visão médica, não priorizando os aspectos educacionais. Esse tipo de atendimento estendeu-se até 1920, centrando-se em instituições particulares, como já citado anteriormente. Nas décadas de 1920 e 1930, foram criadas as primeiras classes de Educação Especial. Em 1945, nasceu no Brasil a Pestalozzi e, em 1954, foi fundada a APAE (Associação de Pais e Ami- gos dos Excepcionais) - que em oito anos de existência já contava com 16 unidades de ensino. 10 Laureate- International Universities Educação Especial Podemos dizer que, neste período, houve uma expansão de instituições privadas na modalidade filantrópica (sem fins lucrativos), isentando assim o governo da obrigatoriedade de oferecer aten- dimento aos deficientes na rede pública de ensino. Jannuzzi (1992) aponta que, ao longo de 1960, ocorreu a criação de um grande número de escolas especiais. Em 1969, havia mais de 800 instituições de ensino especializado para pessoas com deficiência mental. Através de ONGs (Organizações Não Governamentais) como a Socie- dade Pestalozzi, a AACD (Associação de Assistência à Criança Defeituosa) e a APAE, a questão da deficiência foi ganhando espaço na área educacional e perdendo o peso da visão médica. O cenário do atendimento particular foi se alterando aos poucos com a organização da sociedade, dos grupos de pais e especialistas. Ressalte-se, portanto, que esse aumento no número das insti- tuições não se deve ao envolvimento do governo, mas da organização da sociedade. A Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) é um movimento que se desta- ca por ser pioneiro no Brasil. Foi fundada no Rio de Janeiro, no dia 11 de dezembro de 1954, por Beatrice Bemis, mãe de uma filha com Síndrome de Down, que participou de uma associação nesses moldes, no período em que viveu nos Estados Unidos. VOCÊ SABIA? 1.2.2 As conquistas dos alunos com deficiências intelectual, auditiva e visual Ao revisitarmos a história da Educação Especial até a década de 1990, notamos várias conquis- tas em relação à educação dos indivíduos que apresentam deficiência mental. Foi um grande avanço sair de uma quase completa inexistência de atendimento à efetivação de políticas de integração social. Notamos vitórias e retrocessos, tentativas bem-sucedidas e fracassadas, con- quistas questionáveis e de preconceitos cientificamente legitimados. Os princípios da integração e da normalização foram base para as propostas de definição das políticas públicas da Educação Especial, em torno dos anos de 1980 (MAZZOTTA, 1996). Em relação à educação de pessoas com deficiência visual/cegas, desde a fundação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos houve uma baixa oferta de serviços e recursos financeiros, impedin- do o atendimento a toda a demanda existente. Sobre a educação do aluno com deficiência auditiva/ surdo, a discussão principal gira em torno da linguagem e comunicação e a consequente adaptação dessa comunicação. O Brasil reconhe- ceu a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) por meio da Lei nº 10.436/2002, descrevendo-a como a língua das comunidades surdas brasileiras. Em seu artigo 4º, garante o ensino de LIBRAS como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais. A realidade hoje dos alunos com necessidades educacionais especiais no país se caracteriza pela dualidade: de um lado, existe um forte assistencialismo filantrópico e do outro, um sistema educacional fragilizado e limitado que vem sendo “obrigado” a abrir espaço para a educação escolar desta parcela da população. De acordo com Silva (2002), cabe lembrar que a Educação Especial no Brasil está enquadrada no contexto do pensamento neoliberal, que discorda da cor- rente da inclusão social e escolar, incentivando o terceiro setor e as parcerias com a sociedade civil, numa tentativa de minimizar o papel do Estado e a sua responsabilidade. O termo Educação Especial muitas vezes é compreendido como antônimo de Educação Inclusiva, mas temos que entender que se trata de uma área de conhecimento que busca desenvolver políticas, teorias e práticas com o objetivo de atender as necessidades educacionais das pessoas com deficiência. Pen- sando na inclusão, o desafio é não excluir o aluno da comunidade escolar, incorporando novas culturas e práticas para permitir que ele atinja a qualidade acadêmica e sócio-cultural sem discriminação. 11 Figura 2 - Avanços graças à organização da sociedade. Fonte: Olesia Bilkei, Shutterstock, 2016. O Atendimento Educacional Especializado (AEE) é um serviço da Educação Especial responsável por identificar, elaborar, e organizar recursos pedagógicos que eliminem os impedimentos para a participação plena dos alunos, considerando suas necessidades específicas. O ensino oferecido no AEE é diferente do ensino regular, utilizando outras metodologias e planos de ensino. Tam- bém não é caracterizado como um reforço escolar ou de complementação, pois se concentra em alunos com diagnóstico. É uma modalidade de ensino que deve estar presente em todos os níveis de ensino - desde a Educação Infantil até o Ensino Superior. O profissional que trabalha no AEE também deve elaborar o plano de atuação visando serviços e recursos de acessibilidade ao conhecimento e ambiente escolar. O atendimento deve ser ofe- recido preferencialmente no período inverso ao que o aluno estuda (contraturno), podendo ser realizado dentro da própria escola ou em outra instituição especializada que ofereça o serviço. A LDB 9394/06, em seu artigo 59, no parágrafo 2º, diz que: O atendimento educacional especializado será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas escolas comuns do ensino regular. É inquestionável o avanço de a Educação Especial ter sido concebida pela Lei de Diretrizes e Bases, que prevê a oferta da Educação Especial aos alunos de zero a seis anos de idade e a formação do professor para que atenda a diversidade dos alunos. A lei diz que o atendimento deve ser realizado preferencialmente na rede regular de ensino assegurando ao aluno currículo, método, técnica, recursos educacionais e organização específica para atender as necessidades desses alunos (JANNUZZI, 2004). Agora, cabe à sociedade, em parceria com o poder público, fazer com que a inclusão desses alunos seja assegurada de maneira satisfatória e respeitosa a todos que dela necessitam. 12 Laureate- International Universities Educação Especial 1.3 Educação Inclusiva Os processos de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais requeremum grande ajuste de ordem político-educacional em todos os segmentos da sociedade atual. O movimento mundial pela Educação Inclusiva é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os estudantes de estarem juntos, aprendendo e par- ticipando – leia-se “estar junto” não somente no sentido de conviver no mesmo ambiente, mas de ter o mesmo direito de aprendizagem, de estudar o mesmo conteúdo, respeitados seus limites e habilidades. A Educação Inclusiva é um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola. Dois eventos foram mundialmente importantes para a inclusão: a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em Jomtien, na Tailândia, em 1990, e a Conferência Mundial sobre Educação Especial, em Salamanca, na Espanha, em 1994 (JANNUZZI, 2004). O assunto Educação Inclusiva, a partir da chamada Declaração de Salamanca, tem sido tema de pesquisas e de eventos científicos. O Brasil adotou como política de Educação Especial a Educação Inclusiva, mas tem um grande desafio que é a implantação da inclusão, já que o nosso sistema público de ensino apresenta muitas dificuldades e problemas - estruturais, metodológicos e de formação docente, por exemplo. Como poderemos pensar, então, em escolas inclusivas, se não conseguimos oferecer nem mesmo os recursos básicos aos nossos alunos? Figura 3 - Como incluir na rede pública? Fonte: Brian A Jackson, Shutterstock, 2016. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva representa um novo marco teórico e político da educação brasileira, caracterizando a Educação Especial como uma modalidade não substitutiva à escolarização; o conceito de atendimento educacional espe- cializado complementar ou suplementar à educação dos estudantes; e o público-alvo da educa- ção especial constituído pelos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimen- to e altas habilidades/superdotação (BALL e MAINARDES, 2011, p 13). 13 1.3.1 A complexidade da Educação Especial e Inclusiva Diante do que estudamos até aqui, vamos pensar um pouco: • quem são as pessoas com necessidades educacionais especiais? • o que significa inclusão de pessoas com necessidades educativas especiais na rede regular de ensino? • qual é o papel do professor e o da sociedade no processo de escolarização de pessoas com necessidades educacionais especiais? • as pessoas com necessidades educacionais especiais podem ter desenvolvimento escolar? Percebemos que a Educação Especial na perspectiva inclusiva é algo complexo, exibindo níveis de exigência bastante altos diante da nossa estrutura social e da dinâmica escolar. Para um processo de inclusão dos excluídos, além de se fazer necessária uma mudança na postura dos professores em relação ao aluno com deficiência, é fundamental o envolvimento e o compro- metimento ético e moral. A ideia da inclusão vai além de somente garantir o acesso à entrada de alunos nas instituições de ensino. O objetivo é eliminar obstáculos que limitem ou dificultem a aprendizagem e a participação desses alunos no processo educativo. Precisamos pensar em adequações nos âmbitos políticos, econômico, social e cultural, para que a educação inclusiva seja de fato eficiente e os alunos não se sintam ainda mais excluídos durante o processo. Um dos problemas do sistema de ensino, ao se pensar em inclusão dos alunos com deficiência, é o que se chama de currículo terapêutico ou habilitativo, que foca apenas nas dificuldades e limita- ções dos alunos, privando-os muitas vezes de oportunidades de aprendizagem. Quando se pensa em educação inclusiva, temos que levar em conta que os alunos aprendem de diferentes maneiras, sendo necessário que se trabalhe baseado nas potencialidades. Daí, a importância de uma edu- cação de qualidade para todos, que ofereça novas dimensões de escola, que não somente aceite, mas que valorize as diferenças, conforme exposto na Declaração de Salamanca (1994, p. 8-9): As crianças e jovens com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas regulares, que a elas devem se adequar [...] elas constituem os meios mais capazes para combater as atitudes discriminatórias, construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos. CASO Lucas tem paralisia cerebral e, desde os três anos de idade, frequenta uma instituição especia- lizada. Hoje aos 10, vai estrear na rede regular de ensino. Lucas e sua família estão ansiosos, pois não sabem como serão recebidos. Ao chegarem à escola, são recepcionados pela direção, que apresenta a eles todo o prédio que, nos últimos anos, passou por várias reformas para que pudesse se tornar acessível a todos os alunos. Lucas fica feliz em saber que a estrutura possui rampas, elevador, portas amplas e que ele consegue se movimentar por toda a escola. A direção também explica que a escola tem recursos para que a professora da sala regular possa adaptar o currículo para que Lucas acompanhe as aulas. Ela explica ainda a oferta do atendimento educa- cional especializado, realizado por um professor capacitado, que irá atender o aluno de acordo com sua necessidade - seja em colaboração com a professora da sala regular ou no contraturno, para um trabalho dirigido com o aluno. Lucas se sente acolhido e feliz por ter seus direitos ga- rantidos e por saber que a inclusão plena está ocorrendo naquela escola. Podemos dizer, então, que são os princípios democráticos que fundamentam os sistemas educa- cionais inclusivos. Sistemas educacionais inclusivos estabelecem programas, projetos e atitudes que permitem o desenvolvimento pleno dos alunos. Igualdade de oportunidades, respeito às ne- cessidades individuais, melhoria da qualidade do processo ensino-aprendizagem e na condição 14 Laureate- International Universities Educação Especial de trabalho dos professores, além da participação ativa da família, são alguns dos princípios que devem ser seguidos e colocados em prática pelo sistema educacional inclusivo. Lembremo-nos das seguintes palavras: Direito à educação Direito à igualdade de oportunidade Direito de acesso a escolas de qualidade Direito à aprendizagem Figura 4 - Princípios de um sistema educacional inclusivo. Fonte: Elaborada pelo autor, 2016. Os direitos à educação e à aprendizagem envolvem uma discussão sobre o processo de apren- dizagem e de aquisição do conhecimento, que está diretamente relacionado às experiências e vivências desse alunado. Para que se possa ter um melhor resultado, é necessária a elaboração de planos pedagógicos individualizados que desenvolvam as potencialidades e atendam as di- ficuldades de cada um. Para isso, o professor deve exercitar toda a sua capacidade de obser- vação, percebendo e entendendo o seu aluno, para estabelecer metas e objetivos individuais. E mais: comparar o progresso do aluno com ele mesmo. 1.3.2 Foco nas habilidades, não nas dificuldades Os alunos necessitam de um olhar integral e de um professor que não perceba somente as dificuldades, mas que valorize as potencialidades. Em suma, precisam ser vistos de acordo com as suas possibilidades, e não somente pelas impossibilidades. É necessário também que a escola tenha uma estrutura para receber esse aluno, com as adaptações necessárias e que a equipe escolar (desde porteiro, merendeiras, agentes educacionais, direção, coordenação e professores) esteja preparada para acolher e ajudar os alunos, de forma que estes se sintam seguros no ambiente escolar. Stainback e Stainback (1999) afirmam que a educação é uma questão de direitos humanos e os indivíduos com deficiência devem por direito fazer parte do cenário escolar. Este, por sua vez, precisa se preparar para acolheresse aluno com suas características. Os Parâmetros Curricu- lares Nacionais (1998) apontam a necessidade implícita de mudança interna de cada educador para que se possam levar a efeito as orientações advindas desse documento. Os Parâmetros compreendem a cidadania como participação social e política: é necessário utilizar diferentes linguagens (verbal, musical, corporal, gráfica, plástica) para produzir, expressar e comunicar uma ideia e, assim, conseguir ter uma ação efetiva na sociedade. As adaptações curriculares implicam nas planificações pedagógicas e ações dos professores que favoreçam a aprendizagem e a expressão do aluno. 15 Figura 5 - Adaptação escolar para promoção do desenvolvimento pleno. Fonte: Jaren Jai Wicklund, Shutterstock, 2016. Diante da pluralidade do contexto escolar, o paradigma de inclusão escolar é um desafio, mas também uma necessidade cada vez maior. Acolher os alunos com condições físicas, intelectuais, sociais e sensoriais diferentes exige métodos, técnicas e planejamentos diferenciados, sendo ne- cessário, então, reformular as práticas pedagógicas e refletir sobre as necessidades atuais. Muitas escolas precisam passar por mudanças de paradigmas; precisam ter um olhar mais inclusivo para com seus alunos. Sassaki (1997) destaca as principais características de uma escola inclusiva: • ter a visão de que todo o aluno pertence à escola e que todos são responsáveis por acolher os alunos no ambiente escolar; • uma postura inclusiva por parte da diretoria, buscando participar de maneira ativa do dia a dia escolar; • atenção às necessidades educacionais dos alunos; • o envolvimento dos alunos no planejamento, realizando um trabalho de parceria, colaborativo, entre todos os membros da escola; • uma conduta mais mediadora por parte do professor, não sendo o único responsável pelas tomadas de decisão no processo de aprendizagem; • o estabelecimento de parcerias com as famílias dos alunos; • a garantia de acessibilidade em todos os ambientes físicos da escola; • o respeito ao ritmo e ao estilo de aprendizagem de cada aluno; • o incentivo à pesquisa e à formação continuada de todos na escola; • a reformulação das avaliações, respeitando o processo. Outro ponto que precisamos destacar é o Projeto Político-pedagógico (PPP), documento que define as características da escola, seus problemas, suas potencialidades e as responsabilidades de cada um. O PPP deve estar em sintonia com a Lei de Diretrizes e Bases, levando em conta 16 Laureate- International Universities Educação Especial quatro características fundamentais: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver. Os educadores precisam olhar para a sua prática de maneira mais crítica, avaliando se realmente estão ensinando e se a aprendizagem está contextualizada e adequada às possibilidades dos alunos. Contextualizar o ensino significa vincular os conhecimentos ao cotidiano do aluno, criando condições para aplicar esse conhecimento em sua vida real, ressignificando os conhecimentos prévios dos alu- nos. Diante disso, os professores precisam adotar situações de ensino- aprendizagem diversificadas. As adaptações realizadas pelos professores podem ser classificadas de duas maneiras: as adap- tações de acesso ao currículo e as adaptações de elementos curriculares. As adaptações de acesso ao currículo se referem às formas de agrupar os alunos; à adaptação de materiais que poderão ser utilizados por todos os alunos para facilitar a aprendizagem; ao favorecimento de várias maneiras de comunicação e à eliminação de barreiras que priorizem somente a dificuldade dos alunos. As adaptações de elementos curriculares são caracterizadas pela adoção de métodos ou técnicas diversificadas; por uma sequência de trabalho segmentada no sentido de dividir em pequenos passos (metas) o objetivo do ensino; pela retomada de alguns conteúdos, se necessário utilizando estratégias de ensino diferenciadas e pela avaliação flexível, que possibilite de fato aferir o desempenho do aluno. Os professores sabem que há um longo caminho a ser percorrido para que a inclusão total acon- teça. É essencial abandonar velhos hábitos, adotar novos conceitos e ter a consciência de que, entre a teoria da legislação e a prática no cotidiano escolar, ainda existe uma longa distância. O saber é diferente do fazer. A lei garante direitos, mas muitas vezes a realidade não oferece condições necessárias para se colocar os direitos em prática. A inclusão é um desafio para todos, portanto, o educador deve constantemente refletir sobre a sua função, o seu trabalho; se questio- nar sobre as suas maneiras de ensinar e o papel que está desempenhando nessa escola inclusiva. 1.4 Políticas públicas nacionais As diferentes abordagens que envolvem as políticas públicas se inserem em um contexto amplo e complexo. Juntamente a essas abordagens estão presentes as políticas educacionais de Educa- ção Especial na Perspectiva Inclusiva. Sabemos que educação implica diretamente na ação de cada pessoa como cidadão envolvido na sociedade. No entanto, o paradigma educacional atual requer políticas educacionais que atendam aos anseios exigidos nas diversas áreas da educação. Nesse contexto, a implementação das políticas públicas de educação inclusiva no âmbito educacional é relevante, pois contribui efetivamente para uma educação que fará a diferença. A maioria da legislação nacional referente à Educação Especial na Perspectiva Inclusiva apresenta como base e meta o direito do aluno à educação e ao acesso à escola, além de se referir à formação do pro- fessor especialista, ao currículo e aos métodos adequados para colocar em prática a inclusão escolar. Para reproduzir a parte da trajetória das políticas públicas de educação especial inclusiva, vamos apre- sentar os objetivos e aspectos marcantes das legislações brasileiras. Começamos com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que registra como um dos seus objetivos fundamentais o compromisso político brasileiro com a educação, de forma a estabelecer a igualdade no acesso à escola, sendo dever do Estado proporcionar atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente, na rede regular de ensino. Portanto, desde a Constituição de 1988 é dever do governo garantir uma escola democrática e acessível a todos (MAZZOTTA, 1996). 17 Após a Constituição da República, foi implementada a Lei 7.853, de 24 de outubro de 1989, que estabelece, em seu art. 1º, as normas gerais que asseguram o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiências, e sua efetiva integração social, nos termos desta Lei. Ensinar, na perspectiva inclusiva, significa ressignificar o papel do professor, da escola, da educação e de práticas pedagógicas que são comuns no contexto excludente do nosso ensino, em todos os seus níveis. A inclusão escolar não está de acordo com o paradigma tradicional de educação e, sendo assim, uma preparação do professor nessa direção requer mudanças profundas na formação do professor (MANTOAN, 2006, p. 54- 55). Na década de 1990, perpetuaram-se tendências por uma educação pública em bases realmente democráticas. Destaque para a Declaração Mundial de Educação para Todos (Tailândia, 1990) e a Declaração de Salamanca (Espanha, 1994), documentos que passaram a influenciar a for- mulação das políticas públicas de educação inclusiva (MANTOAN, 2006). A Declaração de Salamanca é uma resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) e foi organizada na Conferência Mundial de Educação Especial, realizada en- tre 7 e 10 de junho de 1994, na cidade espanhola que lhe deu nome, Salamanca. O documento ampliou o conceito de necessidades educacionais especiais e buscou garantir que a educação de pessoas com deficiência fosse parte integrantedo sistema educacional O texto trata de princípios, políticas e apontamentos práticos das necessidades educa- tivas especiais, e oferece orientações sobre a estrutura de ação em Educação Especial. Em relação à prática da escola, aborda a administração, a capacitação de educadores e o envolvimento comunitário. A declaração busca garantir o direito fundamental à educação, o ensino pautado nas necessidades individuais, levando em conta a diver- sidade dos alunos, adotando a educação inclusiva em caráter de lei, sendo obrigação do Estado oferecer o Atendimento Especializado. Notadamente, é um documento ino- vador, que ampliou o conceito de educação favorecendo a democratização de ensino. Recomendamos a sua leitura porque, além do conteúdo relevante e dos apontamentos práticos, é muito utilizado em concursos públicos da área. Confira em: <http://portal. mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf> VOCÊ QUER LER? Da Constituição da República até a LDB, de 1996, leis e pareceres apresentam direcionamentos sobre o atendimento dos alunos com deficiência. Será que algo aconteceu nas décadas de 1980 e 1990 para a inclusão desses alunos no ensino regular? Quais as principais mudanças entre as leis? Vários conceitos mudaram de nome e definição (como exemplo, deficiência mental, porta- dores de deficiência, pessoas com necessidades especiais). Será que essas mudanças foram um avanço na prática ou só uma evolução teórica? 1.4.1 A legislação nos anos 2000 Vamos agora estudar o que ocorreu com a legislação a partir da década de 2000. Em 2003, foi implementado o Programa Educação Inclusiva do MEC, que teve como objetivo apoiar a transformação dos sistemas de ensino em sistemas educacionais inclusivos, promovendo um amplo processo de formação de gestores e educadores nos municípios brasileiros. A intenção era a garantia do direito de acesso de todos à escolarização, a oferta do atendimento educacional especializado e a garantia da acessibilidade. (MEC/SEESP, 2003, p. 4) Percebe-se que para que haja de fato uma transformação no sistema é necessário rever e investir na formação do professor. 18 Laureate- International Universities Educação Especial Além desse programa, muitos pareceres e portarias foram publicados na tentativa de normalizar e favorecer a inclusão de todos. • Portaria nº 2678/02 – normas para a difusão e produção do sistema Braille em todas as modalidades de ensino. • Decreto nº 5296/04 – normas para promover a acessibilidade às pessoas com mobilidade reduzida ou deficiência, implementando assim o programa Brasil Acessível. • Decreto nº 5626/05 – estabelece o ensino de LIBRAS como disciplina curricular, formando professores e tradutor/interpretes de LIBRAS, considerando a Língua Portuguesa como segunda língua dos alunos surdos. • Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos – publicado em 2006, teve como objetivo principal implementar no currículo os temas voltados às pessoas com deficiência, buscando desenvolver ações afirmativas que favoreçam a inclusão e a permanência das pessoas com deficiência no Ensino Superior. Em 2007, foi instituído o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) pelo Decreto n° 6.094/2007 e ratificado no âmbito da Agenda Social da Presidência da República. Esse de- creto fortaleceu e ampliou a formação de professores para a Educação Especial na perspectiva inclusiva, a implantação de salas de recursos multifuncionais, a acessibilidade arquitetônica dos prédios escolares, acesso e a permanência das pessoas com deficiência na educação básica e superior (MEC/SEESP, 2007, p. 5). Para orientar a implementação da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, são instituídas as Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, por meio da Resolução CNE/CEB, n° 4/2009. De acordo com essas Diretrizes, o Atendimento Educacional Especializado (AEE) deve integrar o Projeto Político-pedagógico (PPP) da escola, envolver a participação da família e ser realizado em arti- culação com as demais políticas públicas. Assim, o documento regulariza a atualização do Plano Político-pedagógico, buscando assegurar a educação inclusiva. Percebemos, até aqui, apontamentos para orientar a ação docente, a caracterização da escola e do atendimento, além da formação do professor, mas quem pode ter esse atendimento assegu- rado de acordo com a legislação? Sobre os alunos que poderão se beneficiar desse atendimento, foram publicadas as diretrizes na- cionais para a Educação Especial, Resolução CNE/CEB nº 4/2009 em seu art. 1º, para a imple- mentação do Decreto nº 6.571/2008: “Os sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional Especializado (AEE), ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos”. O artigo 41 da Resolução CNE/CEB nº 7/2010, que fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de nove anos, reforça que “o projeto político-pedagógico da escola e o regimento escolar, amparados na legislação vigente, precisam contemplar a melhoria das condi- ções de acesso e de permanência dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desen- volvimento e altas habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regular, reforçando a inclusão escolar nas redes públicas e privadas, e buscando a universalização do atendimento”. Pelo Decreto n° 7611/2012, foi instituído o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiên- cia – Plano Viver sem Limite. Prevê a integração do eixo “Acesso à Educação”, ações destinadas à formação de professores bilíngues para os anos iniciais; ensino, tradução e interpretação da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS; oferta de recursos de tecnologia assistiva e a adequação 19 arquitetônica dos prédios escolares para promover a acessibilidade, entre outros Ainda em 2012, foi publicada a lei nº 12.764 que institui a política nacional de proteção dos direitos da pessoa com transtorno do espectro autista, assegurando a responsabilidade do poder público quanto ao atendimento e acompanhamento das pessoas com transtornos do espectro autista. A Lei nº 13 146, de 6 de julho de 2015, destina-se, segundo o art. 1º, a assegurar e promover em condições de igualdade os direitos das pessoas com deficiência vi- sando à inclusão social e de cidadania. A lei explica conceitos como acessibilidade, desenho universal, tecnologia assistiva e ajuda técnica e traz a atualização de alguns conceitos que foram surgindo com o tempo, (produtos e equipamentos acessíveis a todos). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/ Lei/L13146.htm>. VOCÊ QUER LER? Podemos perceber que muita coisa mudou ao longo dos tempos nas leis e pareceres, com con- ceitos surgindo e outros sendo excluídos. A busca da garantia do direito à educação para todos é constante. Mesmo que, na prática, as mudanças aconteçam lentamente, temos que ter ciência de que todos têm esse direito e que precisamos oferecer um ensino efetivo, de qualidade. Mas quais são os próximos objetivos? Visando dar continuidade às ações estratégicas de apoio à inclusão escolar das pessoas com de- ficiência, o Plano Plurianual - PPA 2016 /2019 prevê no programa 2080, “ampliar o atendimento escolar, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa na perspectiva da educação ao longo da vida e à formação cidadã”. Para atingir este objetivo, foi estabelecida a Meta 04KI, de forma a “promover ações para a universalização do atendimento escolar para toda população de 4 a 17 anos com deficiência,transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação em classes comuns da rede regular de ensino”. A portaria do MEC, n° 243/2016, tem a finalidade de parametrizar a atuação de instituições pú- blicas e privadas comunitárias, ou filantrópicas sem fins lucrativos especializadas em Educação, com vistas à meta de inclusão plena. Essa portaria buscou resolver a discussão sobre a finalidade de instituições como APAE e PESTALOZZI, entre outras, a partir da inclusão escolar. Discute-se a necessidade de mudança no escopo do atendimento realizado por elas, que devem incluir as crianças em idade escolar no ensino regular e oferecer apenas o atendimento educacional es- pecializado. Em paralelo, poderão oferecer atendimento multiprofissional para adultos e idosos, além de trabalhos terapêuticos e profissionais. Para concluir, percebemos que, sob o impacto da legislação nacional, um discurso de educação inclusiva ganha força no país. Dessa maneira, com o tempo é substituída a ideia de integração pela ideia de participação efetiva da pessoa com deficiência. No decorrer dos anos 2000, houve um esforço do governo brasileiro para que esses alunos fossem matriculados em salas comuns de escolas públicas, acompanhados ou não de um atendi- mento educacional especializado em salas de recursos multifuncionais. O intuito era garantir um atendimento mais personalizado, que respeitasse os limites e as potencialidades de cada defici- ência ou transtorno, oferecendo ao profissional que trabalhasse com o deficiente uma formação mais adequada para exercitar diferentes linguagens e estratégias de ensino. Hoje, percebemos que a tentativa do governo é oferecer um suporte ao ensino regular e aos pro- fessores, sendo o professor especializado e o professor do ensino regular parceiros no processo de ensino, buscando um ensino colaborativo. SínteseSíntese • Até a década de 1950, não se falava em Educação Especial. Foi a partir de 1970 que a Educação Especial passou a ser alvo de discussão, tornando-se preocupação dos governos com a criação de instituições públicas e órgãos especializados. • No século XIV, nasce a primeira legislação sobre pessoas com deficiência mental, criada por Eduardo II, na Inglaterra. • A ideia de integração surgiu então para acabar com a ideia de exclusão que existiu por vários séculos. As instituições foram se especializando para atender as pessoas com deficiência, mas, infelizmente, a segregação continuou sendo praticada, pois ao criar as instituições especiais, essas pessoas continuavam sendo excluídas dos serviços existentes na comunidade. • O Atendimento Educacional Especializado (AEE) é um serviço da Educação Especial responsável por identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos que eliminem os impedimentos para a participação plena dos alunos, considerando suas necessidades específicas. • A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva representa um novo marco teórico e político da educação brasileira, caracterizando a Educação Especial como uma modalidade não substitutiva à escolarização. • As adaptações realizadas pelos professores podem ser classificadas de duas maneiras: as adaptações de acesso ao currículo e as adaptações de elementos curriculares. 21 Referências ARANHA, M. Inclusão Social e Municipalização. In: Eduardo José Manzini (Org.). Educação Especial: temas atuais. 1ª Edição. Marília: Unesp Marília Publicações, p. 110, 2000. BALL, E. MAINARDES, J. (ORG.) Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011 BATISTA, Cristina A. Mota. Educação inclusiva: atendimento educacional especializado para a deficiência mental. Brasília: MEC, SEESP, 2006. BRASIL. Congresso Nacional. Lei 7.853 de 24 de outubro de 1989. Diário Oficial da União, Brasília, 25 out. 1989. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7853. htm>. Acesso em: 30/11/2016. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado. htm>. Acesso em: 30 nov. 2016. _______. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas especiais. Brasília: UNESCO, 1994. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/ pdf/salamanca.pdf>. 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