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Arteterapia em Educação Cenas de uma sala de enfermagem Osvaldo Theodoro Arteterapia em Educação Cenas de uma sala de enfermagem SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 11 2 O ADOLESCENTE ................................................................................................................................. 17 2.1 Adolescência e tanatologia .......................................................................................................... 20 3 A ARTETERAPIA COMO POSSIBILIDADE DE SABER/FAZER UMA PEDAGOGIA DE RESSURREIÇÃO DO CORPO NUMA AULA DE ENFERMAGEM ................................................. 23 4 PERCORRENDO CAMINHOS DA PERCEPÇÃO DA MORTE .................................................... 33 a) morte, morrer e dor ................................................................................................................................ 34 b) A enfermagem e a tanatologia ................................................................................................................ 35 c) Cultura e tanatologia ............................................................................................................................... 38 CONCLUSÃO ............................................................................................................................................ 41 NOTAS ........................................................................................................................................................ 45 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................................... 49 Sobre o Autor .............................................................................................................................................. 52 Dedico este livro A DEUS, meu ajudador; A ADNELMA da Silva Theodoro, esposa amada; AOS FILHOS queridos: Patrícia do Nascimento Theodoro, Nilton José Theodoro Neto, André Felipe Veiga Theodoro, Pedro Thiago Veiga Theodoro e Amanda da Silva Theodoro; AOS AMIGOS enfermeiros; AOS COLEGAS de trabalho; À UNISULMA. Disse UTNAPISHTIM: Nada permanece. Será que construímos casa para ficar para sempre? Será que selamos um contrato que valha em todos os tempos? Dividem os irmãos uma herança para a guardarem para sempre? [...] desde os dias antigos que nada permanece. Que semelhantes são mortos os que dormem - são como uma morte pintada! Que há entre o senhor e o servo quando ambos chegarem o seu fim? 1 INTRODUÇÃO O presente livro foi adaptado da monografia apresentada à Universidade Cândido Mendes (RJ), à Pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento do Instituto de Pesquisas Sócio-pedagógicas, sob a orientação do professor MSc. Marcos Antonio Chaves, para obtenção do título de Especialista em Arteterapia em Educação e Saúde, apresentada no mês de agosto de 2000. Não se pretende aqui esgotar o assunto, mas discutiremos de forma simples e aguda as relações dos atores facilitadores e sujeitos da aprendizagem e com toda a nuança que o caso requer; entender cenas de uma aula de enfermagem em tanatologia utilizando o instrumento da arteterapia. Este trabalho não pretende se moldar nos rigores da metodologia da pesquisa, contudo, é uma adptação de um trabalho científico e tem o objetivo de trazer para o debate a arteterapia como possibilidade de um saber/fazer dentro da sala de aula, contribuindo assim para a construção de um profissional de enfermagem crítico e reflexivo. A arteterapia como saber/fazer ainda não está introduzida de maneira efetiva, salvo melhor juízo, nas instituições educacionais. O mundo está em constante transformação. A velocidade da informação é impressionante, e a globalização une o mundo. A produção do conhecimento é afetada por essas mudanças. Há um certo “louvor” à produção. É inexorável esta cooptação do incentivo à produção e demanda de (pg.11) mercado como fim último dessa política neoliberal. Por outro lado, o terceiro milênio aponta para questões voltadas à leitura de fenômenos simbólicos. A arteterapia possibilita a materialização do símbolo; possibilita usar o corpo e o material para harmonizar e humanizar. O símbolo é o que é, É o fenômeno. Não é verdade, nem mentira, simplesmente É. A abordagem simbólica aproxima-se da emoção. A expressão da imagem é o desvelar do conteúdo humano não racional. Não é o que está velado. A arteterapia pode materializar as imagens arquetípicas. Arquétipo é a mente humana pensando nela mesma, é disforme, é princípio, é a gênese dos motivos das coisas. O inconsciente coletivo é a sede dos arquétipos. A prática educacional, de igual modo, e por ser parte integrante do mundo, recebe influência dessa política globalizante neoliberal. Como produto dessa mudança, temos a nova LDB1 - Leis de Diretrizes e Bases nº 9394/96, que, gestada a partir dessas concepções, procura adequar a educação às mudanças provocadas por essa globalização e pela política neoliberal. Há mudanças em vários pontos do fazer/saber educacional na questão ensino/aprendizagem. Surge, então, a partir dessas concepções, questões inquietantes, indagações pertinentes na busca desse saber/fazer para a construção de uma cidadania plástica. Uma construção plástica no tecido social que requeira a plasticigenia do humano na ressurreição do corpo oprimido pelo conhecimento da coisa e de si mesmo. O que é educar para a vida? Que atitude tomar para ir além da educação bancária? A arte como processo terapêutico possibilita que o sujeito tenha relação com o próprio corpo? Ou seja, satisfaz o seu desejo? Possibilita uma (pg.12) aprendizagem que aflora os instintos? Esse educando tem consciência de si mesmo? É autêntico? Sente as próprias sensações? Apesar de anatomizado, anteriorizado, medianizado, distalizado... o sujeito da aprendizagem é uno é, hólos (totalidade). Fazer arteterapia não é estanque, e holismo, é integrar todos os lados. Em um curso técnico de enfermagem onde os alunos são iminentemente adolescentes, alguns aspectos merecem destaque e podem ser problematizados: a) Qual a percepção na prática educacional do aluno adolescente do curso técnico em enfermagem em sala de aula sobre a morte, morrer e a dor? b) Pode a arteterapia contribuir com esses alunos na relação de ajuda para minimizar a tensão de contato? Assim, pretende-se estudar a arteterapia na prática educacional. Construir fazeres/saberes/fazeres (a política neoliberal aponta para a satisfação do deus mercado; isso não é ruim, só que é imperativo o produzir para entender) na educação do curso técnico de enfermagem através da arteterapia, conhecendo as percepções (signos e significados) dos discentes quanto aos aspectos de suas vivências para elaboração de conteúdo disciplinar do Plano de Ação em Enfermagem (PAE) do Projeto Político-Pedagógico (PPP). Pretende-se contribuir com esses discentes adolescentes com novas práticas educacionais na relação de ajuda para minimizar a tensão docontato com a morte, o morrer e a dor, através da arte como processo terapêutico. Não se pretende ensinar padrão de excelência no contato com a coisa; apenas facilitar caminhos para que o sujeito desabroche sua hominidade arquetípica criadora, sua humanidade. (pg.13) A população estudada foram os alunos da disciplina Prevenção em Saúde I da Escola Técnica Estadual de Santa Cruz (RJ), disciplina esta da matriz curricular proposta pelas professoras enfermeiras Ângela Carlos do Amaral e Danielle de Souza Santos ao curso técnico de enfermagem das escolas técnicas estaduais do Estado do Rio de Janeiro (SECTEC/FAETEC), escolhidos aleatoriamente e identificados pelas iniciais de seus nomes. Tiveram participação voluntária. Utilizou-se o método fenomenológico na análise do conteúdo que, segundo Trivinõs2 (1987), num primeiro momento representa os processos e produtos elaborados pelo pesquisador. Foram analisadas as percepções dos sujeitos sobre a morte, o morrer e a dor. Primeiramente, os alunos foram provocados a verbalizar e escrever suas percepções e, num segundo momento, os elementos produzidos pelo meio, ou seja, a arteterapia e as oficinas usadas na sala de aula como dimensão plástica do sujeito, foi realizada a análise dos conteúdos. As oficinas foram marcadas pela técnica de relaxamento, pintura, colagem, trabalho com argila e possibilidades de escrever as percepções como perspectiva de análise do processo e produtos originados pela estrutura cultural e socioeconômica, que nesse caso serão representados pela percepção de morte numa cultura neoliberal capitalista. O método fenomenológico segundo Capalbo3 (1994), nasceu como reação e ruptura do idealismo e do empirismo positivista. Nascido da pena de Edmundo Husserl, tem o seguinte lema: “Volta às coisas nelas mesmas... livre de pressupostos interpretativos ... a experiência humana vivida é concreta”. (pg. 14) A experiência do profissional de saúde frente a morte não deve ser agradável. O que pode significar a morte para quem cuja função primordial é preservar a vida? D'Assumpção4 diz que todas as pessoas que trabalham com a saúde sabem da enorme resistência que os profissionais, especialmente os médicos, opõe a este tipo de trabalho. Capalbo5 (1994) diz que a enfermagem apresenta-se como um movimento de transcendência e de imanência. Transcendência, salvo melhor juízo está relacionada aos fatores de estruturação do Ser. Está relacionada aos arquétipos do inconsciente coletivo e individual. A imanência é a materialização da transcendência, portanto, pode ser o produto da arteterapia. A volta da coisa ao ponto de origem. O material toma a forma da vivência e da experiência vivida pelo ator. Lopes6 et all (1995) diz que as pesquisas de abordagem fenomenológica na enfermagem devem estar centradas em questões que têm sujeito como pessoa que vivencia o mundo de modo próprio. Portanto, serão provocadas a humanização e a hominização latente, no processo educacional através da arte como terapia aos alunos adolescentes enfrentando a morte, o morrer e a dor. Não importa quantas vezes isso acontece, porém, como isso acontece. Que impacto impõe aos discentes adolescentes? Um caso é absolutamente único. É uma experiência única. A ressurreição desses corpos oprimidos é ponto de destaque numa educação para a cidadania, e que olhe os sujeitos da aprendizagem holisticamente. A proposta não é ensinar técnica ou história da arte, mas proporcionar espaço terapêutico, comunicação rapport e “ressurreição” de corpos oprimidos. Vejamos a seguir quem são esses adolescentes em destaque. (pg. 15) 2 O ADOLESCENTE A percepção da infância como parte do segmento do desenvolvimento humano é recente. As crianças na Idade Média eram vistas como adultos em miniatura. Isto pode ser pela época onde as crianças são representadas como adultos minimizados (SIC)7. A especialização em adolescência, no entanto, é mais recente ainda. São poucas as instituições hospitalares que têm especialização para adolescentes. No Hospital Universitário Pedro Ernesto existe a antiga UCA (Unidade Clínica de Adolescente), hoje NESA (Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente). É possível que essa questão possa de maneira efetiva justificar a pouca literatura para essa fase da vida, fase destacada pela mudança do comportamento, pela instabilidade do humor e por conflitos. Não são adultos nem crianças. É como Talbott8 (1992) define: A adolescência destaca-se por causa da relatada mudança do comportamento, instabilidade do humor e dificuldades de viver, bem como pelos conflitos e discussões com as famílias... Estes não são nem crianças, nem adultos, e a definição de sua posição na sociedade é a de estarem parcialmente excluídos (grifo nosso) de qualquer daquelas comunidades mais dominantes. Um trabalho mais recente tenta definir a adolescência como uma subcultura distinta com suas regras. (pg.17) Talbott9 et all (1992), descrevendo a psicologia da adolescência, relata estudos normativos como o de Freud (1905) que descreveu em 1937 a oscilação entre excesso (grifo nosso) durante a adolescência. Bettelheim10 (1994) descreve períodos ativos e passivos no conto ''A Bela Adormecida”. Em grandes mudanças na vida, como a adolescência, para que as oportunidades de crescimento tenham êxito, são igualmente necessáríos períodos ativos e passivos (grifo nosso). Portanto, a adolescência, sendo marcada por períodos de tumulto e introspecção, que impacto poderia haver quando são confrontados com o paciente à morte? Seria pertinente em sala de aula trabalhar essas questões referentes a morte para amenizar o enfrentamento desses adolescentes na enfermaria? Ou, por outro lado, isso não é pertinente e representa o processo normal que não merece qualquer destaque? Talbott11 (1992) ainda cataloga oito temas no processo do desenvolvimento da adolescência: 1) Dependência - Independência; 2) Liceusiosidade - Controle Intelectualizado; 3) Família - Grupo de Camaradas; 4) Normalização - Privacidade; 5) Idealização - Desvalorização; 6) Identidade, papel e caráter; 7) Sexualidade e 8) Rearranjo das defesas e estilo. Destaco neste momento o conflito da dependência-independência como atitude sublime do crescimento porque pode relacionar-se a essas questões do arquétipo do herói onde o adolescente encontra-se no momento do ritual de passagem para a fase adulta; então, pode ter grande significação o contato do adolescente com a morte no campo de estágío. Kaplan12 et all (1997) dizem que “em muitas culturas, o início da adolescência é claramente assinalado por ritos de passagem que, em geral, envolvem testes de força e coragem”. Kaplan13 et all ainda (pg.18) relaciona a adolescência à independência financeira, à oportunidade para o casamento e à contribuição criativa para a sociedade - todas atitudes do papel de adulto. Com todas essas expectativas de vida, a morte para o adolescente, com todos os significados, pode ser ainda reforçada pelas representacões sociais que envolvem todo aquele que vive numa sociedade capitalista/consumista. Desejo e temor é o que Aberastury14 (1970) relaciona como a perda definitiva da condição de criança e a passagem para o mundo dos adultos (ritual de passagem): “É o momento crucial na vida do homem e constitui a etapa decisiva de um processo de desprendimento que começou com o nascimento”. É pertinente o fato em que concordam especialistas com a síndrome da adolescência como uma patologia normal. Aberastury15 fala da inevitabilidade desse momento de sofrimento, contradição, confusão e transtornos. Quando confrontados com essa questão do adolescente frente ao morrer e a morte em nossa cultura, perguntamos: “Qual deveser nossa atitude frente aos fatos? “Podemos ter uma atitude passiva contemplativa e pensar que é uma fase que logo passará e deixá-los à sorte da compreensão e concepção do fenômeno e que encontrará a ruptura para o enfrentamento e conseqüente equilíbrio. Ou aprofundar as questões e através de novos saberes/fazeres contribuir para enfeitiçar corpos oprimidos e através da arte como terapia (uma verdade) possibilitar que esses corpos renasçam, ressurjam. Vejamos a seguir que impacto a morte pode ter na adolescência. (pg.19) 2.1 Adolescência e tanatologia A morte é um profundo mistério. Porém, é a única coisa que o homem não pode evitar. Mesmo sabendo dessa inevitabilidade, não minimiza a interrogação do porquê da morte, segundo escreveu Vidal16 (1981). A preocupação neste momento não é descrever o ethos do homem diante da morte. Mas deseja-se destacar de maneira simples e tênue o valor que numa sociedade ocidentalista/capitalista/consumista esse impacto pode causar no adolescente, e o que o fazer educacional numa escola de enfermagem pode realizar. Etimologicamente, tanatologia significa (θάνατος = morte e λογια = estudo ou tratado de). O estudo não tem a simplicidade que parece, baseado somente na análise etimológica. Numa cultura baseada no sucesso, a morte configura-se como derrota, insucesso. Principalmente quando nos deparamos com este estado de globalização onde as mudanças são tão rápidas e há um apelo frenético ao consumismo. Quem morrer deixa de ser consumidor. Não estamos evidentemente descrevendo o que é, porém, estas percepções são originárias desse olhar cósmico sobre a morte. Só sabe o gosto da maçã quem a comer. Para o adolescente, essas ideias tornam-se contudo bastante significativas porque eles estão em pleno desenvolvimento das potencial idades e começando a participar dessa comunidade globalizada consumista-capitalista, uma sociedade voltada para juventude e o progresso, é '0 que diz D'Assumpção17: ...vivendo numa sociedade capitalista, consumista, tais problemas serão agravados e reforçados. Isto porque, (pg.20) para manter esta sociedade, necessita-se de homens consumidores... E a morte continuará sendo o tabu, o terror do homem ocidental- capitalista-consumista. Para isto contribui todo sistema educacional, todas programações ditas culturais; todo esquema social. Outro fato que reforça a idéia do louvor à juventude na sociedade capitalista/consumista e a morte como uma impossibilidade ao consumo. Na sociedade oriental, o idoso é reverenciado porque está mais próximo da ancestralidade. Por isso, o morrer é festa. D’ Assumpção18 mostra isso muito claro. Bem sabemos que existem civilizações onde a morte tem um significado bastante diferente do nosso. Ali, ela não é encarada como algo triste, mas aceita naturalmente e até mesmo com alegria. Essas concepções culturais de maneira efetiva poderão ter grande impacto nesses adolescentes. (pg.21) 3 A ARTETERAPIA COMO POSSIBILIDADE DE SABER/FAZER UMA PEDAGOGIA DE RESSURREIÇÃO DO CORPO NUMA AULA DE ENFERMAGEM Pensar o corpo nos faz ler vários corpos. Corpos oprimidos, fragilizados, vituperados, excluídos. Corpos não pensantes. Corpos anatomizados, cartesianados. O novo milênio aponta com percepções nobres a inaugurar novas relações na prática educacional? As mudanças preconizadas pela reforma educacional desejam que tipo de corpo? A arteterapia pode contribuir com uma nova prática de reconstrução de um novo homem? A estética e sensibilidade podem ser úteis na ressurreição dos corpos oprimidos? Pode existir uma política de igualdade dos corpos? Vejamos. Baseada na.Lei 9394/96 (Nova Lei de Diretrizes e Bases) em substituição à 5692/71, o Conselho Nacional de Educação19 desenvolveu as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional de Nível Técnico. Trata o documento em construir questionamentos e desenvolvimentos da educação, trabalho e tecnologia, educação profissional no Brasil e medidas que regulamentam a nova LDB. Destaco ainda no relatório os princípios gerais que tratam da sensibilidade e da estética, voltados para melhoria dos produtos que servem aos consumidores, que talvez possa referir-se em última instância utilitária, na busca desses consumidores e adequar-se à (pg.23) filosofia globalizacional. Será possível ver no texto que esta competência avança com passos largos para a construção da cidadania? É neste contexto que desejamos construir nosso fazer pedagógico da esperança (parafraseando Paulo Freire). Nossa viagem cosmo-náutica e cosmo-pedagógica passam pelo “planeta luz”, onde não há política da igualdade, onde não há lugar para excluídos concluídos, acabados, formados... Nossa utopia nos permite voar pelos campos onde contemplamos iguais entre iguais. Queremos uma pedagogia onde os diferentes sejam iguais sendo únicos. Onde São (de Ser, de Self). O homem só é autêntico quando É. Esta práxis: estética de sensibilidade das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional, busca qualificar o fazer humano20, como no texto abaixo: Antes de ter sentido tradicional de expressão ou produto da linguagem estética, a palavra arte diz respeito ao fazer humano, na prática social. A estética, sinônimo de sensibilidade, qualifica o fazer humano na medida em que afirma que a prática deve ser sensível a determinados valores... A educação profissional pertinente por excelência ao âmbito do fazer - seja ele a produção de um bem, de um serviço, um conhecimento, um sinal, uma comunicação (grifo nosso), um código... A incorporação desse princípio se insere em um contexto mais amplo que é o do respeito pelo outro (pg.24) (grifo nosso), e que contribui para expansão da sensibilidade, imprescindível ao desenvolvimento da cidadania. Educar com sensibilidade significa, portanto, possibilitar ao outro a capacidade de promoção do Ser (ολος - totalidade); do homem em toda sua plenitude; possibilita ainda inaugurar a cidadania e a integralidade. É uma possibilidade de olhar o discente de forma holística. Parece tarefa difícil, mas é possível conciliar a globalização da economia e das comunicações, que a priori prescreve uma uniformização com a educ ação, que mergulha na defesa contemplativa da diversidade, da multiversidade. É possível uma unidade na diversidade. É possível estar atento às questões nacionais e locais nessa universalidade. Gadotti21 diz que: Vivemos na era da globalização da economia e comunicações, mas também numa época de acirramento das contradições inter e intrapovos e nações. Época do ressurgimento do racismo e de certo triunfo do individualismo. É dentro desse cenário da pós-modernidade que a escola precisa atuar. Um cenário que coloca novos desafios para nós: Que tipo de educação necessitam homens e mulheres para viver nos próximos vinte anos num mundo tão diverso? Certamente necessitam (pg.25) de uma educação para a diversidade. Uma sociedade multicultural deve educar o ser humano multicultural, capaz de ouvir, de prestar atenção ao diferente, respeitá-lo. Nesse rito de passagem para construir a escola cidadã, é necessário que o professor desarme-se da arrogância de único detentor do saber e saber-se sujeito que aprende com o aluno e com o mundo. Deverá ser criativo e tolerante com o diferente. Continua Gadotti22: “Numa época de violência, de agressividade, o professor deverá promover o entendimento com os diferentes e a escola deverá ser um espaço de convivência, onde os conflitos são trabalhados, e não camuflados”. Como diz FRG: Aprendi a perceber mais as pessoas e me relacionar melhor. Essas aulas estão me ajudando muito a me expressarmelhor e a lidar melhor. (FRG) Essa nova consciência nos impulsiona para novos saberes e fazeres. Nos faz pensar e agir como seres transformadores de um mundo coisificado. Nos faz agir, interagir com um homem que é além do que é visível, quantificável, palpável. Um homem que É. Homem em toda sua plenitude é total, é um cidadão. Talvez o que se esteja falando seja apenas desejos internos; o objeto desejado é aquilo que se deseja, são sonhos. Sonhos estes que podem ser concretizados na medida em que a prática educacional não contemple a exclusão, a discriminação. Há uma manifestação de melhora do nível da (pg.26) auto-estima. O aluno é um agente, um cidadão. Participa efetivamente do processo de construção de si mesmo e da sociedade. Continua FRG: Aprendi também a impor os meus pensamentos, mesmo quando alguém acha que é errado, aprendi a ser mais humana e a expressar o que sinto; pois muitas vezes ficava reprimida por medo ou até mesmo por imaturidade. Pois somos adolescentes e nos deixamos influenciar pelo meio. (FRG) As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Nível Técnico23 destaca esse ambiente terapêutico que supera a discriminação e trabalha a diversidade numa política da igualdade. É necessário vencer o medo e discriminação. O ponto de partida para a busca de uma política de igualdade é a constatação de que todos os seres humanos têm deveres, enquanto cidadãos com direitos iguais à educação... ao meio ambiente saudável e a outros benefícios sociais, implicando na superação de todas as formas de discriminação. A política da igualdade na educação profissional deve inspirar práticas e ambientes de aprendizagem que trabalhem a diversidade entre os alunos, assegurando que, independentemente de sexo, raça, credo político ou religioso, todos tenham oportunidade de aprender. A arte como terapia pode ser ponto de sustentação da estética e sensibilidade e da política da igualdade. Philippinil24 (1995) diz que a arte como instrumento terapêutico ainda é vista por segmentos mais conservadores com reservas. Contudo, vale ressaltar que a arte pode tornar-se imanência (pg. 27) das questões simbólicas e arquetípicas. Ou seja, os símbolos materializados. Urrutigaray25 (s/d) diz que “a arte começa sua história juntamente com a do homem, quando aquele pela primeira vez imprimiu sua vontade frente a uma matéria e a transformou em artefato”. O homem pode materializar, artefatificar suas simbologias e suas heranças arquetípicas. A autora ainda faz uma citação de Bolton (1998) que, citando Nietzsche, escreve: “A arte transforma reflexões horríveis sobre a terra e o absurdo da existência em representações com as quais os homens podem viver”. Continua Urrutigaray26: A arte possibilita, enquanto fruto do imaginário, que o homem fique a meio caminho entre seu lado animal e seu lado divino, sem atrelar-se a nenhum dos dois unilateralmente e conseguindo conviver com os dois aspectos irredutíveis de sua contingência que é “Ser humano”. A arteterapia possibilitou estes alunos fundir seus lados divino e animal, possibilitou ainda viver a hominidade e humanidade. Perceberam que a morte deve ser tratada de modo significativo pelos profissionais de enfermagem. Veja o que RNCS diz abaixo: aprendemos a ouvir mais as pessoas respeitar sua opiniões, e que também no hospital a morte do paciente pode significar muito pr'a gente. (RNCS) (pg. 28) Eu aprendi bastante, bastante mesmo; amadureci, aprendi a respeitar as pessoas, ajudar principalmente na hora da sua morte. Devemos deixar o profissionalismo, e deixar o humanismo falar mais alto. E dar uma palavra de conforto. Eu aprendi mais sobre a morte. Eu tinha uma outra visão; isso me impressionou muito e eu só digo que aprendi muito. Foi muito bom. (VCR) A morte tem muitas significações e é preciso trabalhar essas questões em sala de aula. Na síntese entre o animal e o divino, como percebe Urrutigaray27 no trabalho descrito, a arte como terapia pode ser um instrumento pedagógico valioso de irredutibilidade do homem, construindo-se num rito de passagem imperioso da mediocridade para auto reconstrução, para plasticidade (resumo de uma das aulas de arteterapia do curso de Arteterapia em Educação e Saúde da Universidade Cândido Mendes). Fazer arteterapia não é estanque, é holismo, é integração de todos os lados. Aquilo que não é culturalmente aceito não é necessariamente ruim. Os diversos materiais das mais variadas formas de expressão artística podem construir plasticidade que além de reconstruir, retransformar, vincam a hominidade e a possibilidade de recomeço. O estado do material tem que estar vinculado ao estado Psicológico do cliente. Nesse caso, o material é o outro com quem o cliente pode relacionar-se. Arteterapia é abertura para o outro. Tem que ser realizada em série. Tem que ser anatomizada, sendo integral numa plasticigenia crescente. O neologismo plasticigenia evoca uma gênese na construção do conhecimento. É o barro que vai tomando forma, construindo (pg. 29) o sujeito. Ou seja, a arteterapia é a semente desse saber. É o que significa esta percepção de EML. Ter participado das aulas foi bastante interessante. [...] tive até coragem de fazer uma brincadeira em sala quando [...] o meu grupo improvisou uma peça para apresentar o tema do trabalho e debater. No meu estado normal não faria isso, pois me acho super vergonhosa e tímida para lidar com o público a me olhar fazendo algo. Me sentia tão descontraída e à vontade que nem sentia quando começava a falar e automaticamente a participar dos debates, e além disso não só eu, mas acho que a turma inteira [...] coisas que a gente não tem quando só é dada a matéria... (EML) O arteterapeuta não é o ator. Ator é o cliente (aluno). O arteterapeuta é apenas o contemplador, o facilitador. Não é o quem tem, mas o que faz nascer o conhecimento. O maior dos conhecimentos é o que aluno tem de si mesmo. E perceber que são possibilidades de contribuição efetiva para construção de uma sociedade mais justa e fraterna. Aprender ainda é o caminho mais seguro e certo para a felicidade. Talvez um dia eu entenda ainda mais coisas que hoje me confundem. Porém, jamais chegarei ao limite, já que minha sedede aprender é ilimitada. (EML) Gostei muito das aulas, pois [...] nos apresentou um jeito novo de ensino, fazendo com que cada um de nós se interessasse mais. (JRLR) (pg.30) Eu acho que aprendi muito com as aulas. Tive muito proveito porque é um novo estilo de aula, mais interessante e estimulante. (ACC) Gostei muito das aulas [...] pelo simples fato de ter aprendido muito; além de ser bastante dinâmica. (DAS) A arteterapia na sala de aula como terapia pela arte diminui distâncias, fraternaliza, hominiza, facilita o cuidar. Valho-me da expressão de Nise da Silveira, no caput do texto de Urrutigaray, para sintetizar o pensamento dessa práxis pedagógica. “emoção do lidar”. Emoção em ministrar uma aula plástica. Emoção de incluir! Emoção em construir! Construir um homem novo! Um novo Ser! Um corpo único! Um corpo ressurreto! Foi pela arteterapia que utilizou-se saberes/fazeres em sala de aula para construir uma plasticidade edificante e minimizar o impacto que o enfrentamento da morte, o morrer e a dor causam em adolescentes no curso técnico de enfermagem. Esta é uma possibilidade de ampliar os espaços terapêuticos dentro de uma sala de aula, onde o facilitador proporciona os sujeitos dos diversos matizes e matrizes a perceber-se construtores de suas próprias possibilidades e assumir definitivamente uma postura mais crítica, reflexiva e mais fraterna, resultando assim quealém de técnico, o cuidado seja realizado com emoção. (pg.31) 4 PERCORRENDO CAMINHOS DA PERCEPÇÃO DA MORTE Neste capítulo destacaremos as percepções sobre a morte nos alunos e o impacto que pode ocorrer na sua vida profissional e sua referência no meio cultural. No primeiro momento procurará descrever os fenômenos centrados no próprio sujeito. A seguir se debruçará nos aspectos relacionados ao saber/fazer na relação com o paciente terminal. E por último, as percepções que têm como gênese imagens arquetípicas produzidas na cultura. Seguindo assim uma metodologia proposta por Trivinos28. Neste momento possibilitou-se a expressão através da escrita, da fala, da expressão corporal e da pintura. No momento de introdução da dinâmica houve um relaxamento e reflexão sobre o significado da morte. Num primeiro momento, os participantes foram orientados a descrever no papel na forma de arte e a escrita. As falas do primeiro momento que estão em negrito no texto são suas percepções. Num segundo momento, foi lido um texto do livro da professora Araci Carmem Pereira, “O ethos da enfermagem”29 - aspectos fenomenológicos para uma fundamentação da deontologia da enfermagem (vide anexos). Esse texto é uma carta anônima publicada no The Americam Journal at Nursing Company, onde uma estudante de enfermagem, em estado terminal, escreve sobre sua angústia por estar morrendo numa instituição (pg.33) hospitalar sem a dignidade dos profissionais de saúde. Novamente foram orientados a descrever suas percepções na forma de arte e escrita. Esse momento foi considerado como ampliação tênue da percepção dos aspectos fenomenológicos relacionados com o tema em questão, na possibilidade de manifestação da arte e exteriorização das questões arquetípicas. a) Morte, morrer e dor A religião é apresentada como ponto de equilíbrio entre a vida e a morte. Talvez por descrever a existência da vida após a morte e a perpetuação num lugar especial onde todo aquele que crê tem merecimento. A religião minimiza a tensão. E a visão de Deus é importante para o conhecimento do fato. Acho que todos gostam de acreditar em alguma coisa quando o fim é tão eminente. Por isso a necessidade de uma religião, alguma coisa em que se agarrar. Eu acho que ninguém deve ser indiferente à morte. É impossível. (Sem identificação) [...] Morte é ter certeza da vida eterna em Jesus, pois Ele foi o único que a venceu. (Sem identificação) Me ajudou a compreender como é importante estar perto de alguém, e viver como se hoje, ou esse momento fosse o único. A visão da eternidade e da existência de que há vida após a morte pela visão do paraíso eterno ameniza o medo da morte. (pg.34) A morte nada mais é do que um momento de “êxtase”, ou seja, apesar de cada um ter o seu ponto de vista, na minha opinião é o maior prazer que o ser humano pode sentir. (DSA) A morte também tem seu lado negativo, porque a pessoa que morreu descansou do seu sofrimento, mas quem ficou sofre a dor da perda com muitas saudades e lembranças. (Sem identificação) A morte é uma perda dolorida, mas temos que alcançar forças e superar. (Sem identificação) o meu sentimento é o mesmo, porém nós os técnicos de enfermagem, enfermeiros, médicos e profissionais de saúde devemos ver o paciente como um ser humano e não como um objeto. (Sem identificação) b) A enfermagem e a tanatologia A enfermagem edificante busca incansavelmente saberes e fazeres para possibilitar desempenho eficaz na assistência de qualidade. O tema em questão é pertinente e merece ser discutido de maneira mais intrépida, pois sendo o profissional de enfermagem o que permanece nas vinte e quatro horas com o paciente, possibilita de maneira efetiva uma relação emocional contundente. Sendo assim, a finitude tem aspecto diferenciado para os enfermeiros mais do que para outros profissionais de saúde. Estes ainda são os que preparam o corpo após à morte. Isto merece destaque. Para Pereira30 (1981), o relacionamento enfermeiro/paciente deve ser (pg.35) um contato mais significativo para ambos, principalmente na situação original de proximidade com a finitude da existência biológica. Para Figueiredo31 et all (1998), o objeto que mais define a enfermagem é o cuidado: “Para nós, o cuidado é o objeto fundamental da prática de enfermagem e acreditamos que é ele que dá sustentação à profissão”. Pereira32 (1981) diz que os hospitais raramente atendem às carências do ser agonizante, porque são instituições comprometidas com o processo de cura. “Se o ambiente hospitalar não favorece o “viver com dignidade”, muito menos o “morrer com dignidade.” “O enfermeiro está diante da vida e da morte”. O meu desenho significa a libertação deste mundo para um mundo melhor [...] na minha opinião, morte é uma libertação. (LRO) [...] acho que os profissionais que lidam com essa experiência deveriam ser humanos, não esquecendo do profissionalismo. Na minha opinião, a morte não tem fim, pois para os cristãos nunca morremos, porém, dormimos. (VCR) Mudou no aspecto que nós profissionais devemos também chorar com o paciente. A morte significa tristeza [...] pela pessoa que morreu não estar mais comigo. (LLML) Porém com mais união e humanismo. Às vezes é preciso esquecer o profissionalismo. (pg.36) Cuidados é olhar cósmico. Olhar cósmico é cuidado que mostra plasticidade. Ser humano é marca primordial e é gênese da existência. Sou profissional porque sou humano. Lima33 (1998) escreve artigo onde apresenta sua experiência como docente. Experiência que transcende a imanente técnica do cuidar para um transcendente olhar cósmico. Chamo de imanente técnica aquele cuidado descompromissado com a plasticidade edificante, já que todo cuidado é plástico. O olhar cósmico seria Eu, Tu e as instituições harmoniosamente engendradas nesta plasticigenia. Deve haver harmonia tanto em quem é cuidado como em quem cuida. O profissional de enfermagem que cuida, se cuida. Continua Lima34 (1998): “[...] pois estou certa de que é impossível prestar cuidados a outras pessoas quando estamos desarmonizada/os com nosso próprio corpo. Vejam as ampliações das falas dos sujeitos após a sensibilização e dos envolvimentos com os materiais artísticos em sala de aula: [...] é horrível estar diante daquele corpo e fazer os procedimentos que nos compete e depois dar a notícia aos parentes e até confortá-los com palavras amigas. (RGB) Devemos ser profissionais excelentes e fazer de tudo pelo paciente que está precisando de nós, e antes dele morrer devemos tratá-lo com muito amor e carinho, segurar bem a mão para dar um pouco de segurança. (pg.37) [...] a morte é um descanso ... sofremos muito com doenças. (CSM) [...] a morte também tem um lado negro. Talvez não para quem vai, mas para quem fica. Quem fica sofre? Conforma-se? A enfermagem presta cuidados tanto aos clientes como aos familiares. O desenho (uma cruz com um lado escuro e o outro branco) significa a morte em dois sentidos, o mau e o bom. O mau, que é o final da vida, tristeza para todos, esse é o lado escuro da cruz. O bom é que pode ser fim de um sofrimento de uma pessoa que terá seu descanso merecido. (Sem identificação) Sentimento de morte deve ser uma coisa terrível, mas com a presença de um amigo deve amenizar um pouco. A enfermagem está compromissada com a vida, mesmo tendo que conviver constantemente com a morte. O morrer, no entender desses profissionais, não é motivo para ganhar o prêmio “ISO 2009”. Será que para os profissionais de enfermagem morte e incompetência se confundem?A arteterapia possibilitou a ampliação dos saberes e dos cuidados que devem ser prestados ao usuários e aos familiares. c) A cultura e a tanatologia. Adolescentes estão no momento de vida, na construção da sua autonomia. Não é possível descrever ponto de rupturas da a-nomia, hetero-nomia e da auto-nomia. Porém, o que (pg.38) há de concreto nessa discussão é que estão no processo de tornar-se indivíduo, si- mesmo, descartesianado, desanatomizados. Eu penso que quando morremos vamos para um lugar alegre colorido e cheio de paz e amor, diferente do que temos aqui enquanto estamos vivos, mas com tudo isso eu tenho medo de morrer agora. Espero que quando chegar minha vez já tenha realizado todos os meus sonhos e objetivos. (ACC) Os meus pensamentos não mudaram muito, mas acho que todos nós devemos ser mais humanos com as pessoas na hora da morte, porque todos somos iguais. (ACC) Estão no processo de individuação. O arquétipo do herói contrasta indelevelmente com a possibilidade de morte eminente. “[...] tenho medo de morrer agora”. O adolescente está no processo de individuação. De construção de si mesmo através da força arquetípica de superação dos opostos. Não importa o quão terrível é morte, porque no final “todos somos iguais''. Figueiredo35 (1998), citando Souzenelle, diz que a dualidade vida-morte, como dimensão que faz parte da prática da enfermagem, traz embutida o arquétipo como: “Toda vida é arquetípica, a começar pelo homem. Microcosmo, às vezes macrocosmo, unindo o Céu e a Terra”. O pensamento da morte causa desconforto tanto por expressar e se opor a inconsciente coletivo de preservação da espécie e de posicionamento frente ao processo de individualização. (pg.39) Todo labor no momento de elaborar uma cena de aula de enfermagem no processo de morte, morrer e dor, deve o facilitador levar em conta os aspectos arquetípicos. (pg. 40) 5 CONCLUSÃO Os professores precisam olhar seus alunos com olhar cósmico. Olhar de ver. Olhos padrão integrado. Para Alves36 (2000), os professores precisam se ver nos alunos: “A gente se vê no outro. Os espelhos são mágicos. A imagem do outro é a minha imagem. Somos aquilo que o outro quer que sejamos. Se nossa imagem for bonita, nossos alunos serão bonitos”. As questões abordadas não pretendem ser ruptura da problemática abordada, porém, as percepções dos alunos mostram que é possível construir potencialidades e possibilidades de superação de obstáculos vencendo “bruxas” e “monstros” através da arteterapia. O espaço aberto em sala de aula possibilitou ainda abrir laços fraternos da cooperação. Aquele espaço era mágico! Não era ruptura daquela educação bancária. Destarte, as aulas não eram aquela “verborréia” que sacaliza e sacraliza a exclusão e imanentiza a diferença do inconsciente transcendente, produzida no consciente político/público/privado/ neoliberal, que torna ricos em mais ricos e pobres em mais pobres. Não falo aqui da palavra conformadora. Alves37 fala da palavra que é falo, que engravida, que dá vida. Falo da palavra transformadora, reformadora. Repito, não é “verborréia”! Não é dislalia! Não é lalia! (lalia) Não é um palavrório! É o lagos (logoz). Palavra que é, e dá vida. (pg.41) É uma semente (semente). São Marcos38 diz que Jesus pregava a palavra às multidões. Na parábola, a semente que o semeador semeou foi a palavra. Alves39 ainda diz que a palavra pode “seduzir” ou “estuprar”. A língua é fálica. Com ela é possível construir uma pedagogia da vida e reconstrutora. O professor pode ser um semeador de vida, de cidadania. Em sala de aula foi possível construir uma pedagogia reconstrutora. Utilizou-se da arte para construir plasticidade. Arte aqui é uma expressão lata. Toda manifestação em sala de aula onde pode perceber objetivação de imagem simbólica, reorganização da ordem interna e reconstrução da realidade pode ser lida como arte. O momento da arte em sala de aula é único. É ímpar e nunca será o mesmo. Não merece intervenção, apenas observação. Terapia tradicionalmente é bruxaria. É possibilidade de cura. Cura seja pela “porção mágica” que o médico prescreve e o enfermeiro oferece. Não estamos falando de CURA, falamos de CARE, que é o cuidado, porém, não é um cuidado qualquer, é cuidar com emoção e humanização. É esplêndido pensar no conhecimento semiológico e nos métodos de tecnologia de ponta para propor um caminho terapêutico. À célula doente, como medida terapêutica, usa- se o saber da química, física ou cirurgia. Porém, é reduzida a ideia de que estas são as únicas possibilidades terapêuticas. Doença é ausência de saúde, mas saúde não é ausência de doença. Aquilo que chamamos plano de saúde deveria chamar-se de plano de doença. A doença é o referencial de utilização de relações entre interessados. Boltanski40 diz que no aspecto social o que interessa não é a doença, mas o doente. Aquilo que chamamos de doença (pg. 42) pode ser chamado de adoecimentos. O sujeito doente é o ator social que no processo saúde/doença pode saber-se doente e curar-se, ele é o objeto do cuidado. Arteterapia, portanto, aponta para possibilidades e ações variadas no processo de construção do sujeito. A arte é uma possibilidade terapêutica que faz desvelar as questões fenomenológicas centradas naquela matriz (arch) que é arquetípica. É a gênese, o início de tudo. Amancio41 diz que “a ciência de hoje é o lixo de amanhã”, Para Nogueira42, a epistemologia de Gaston Bachelard compõe de atitude e esforço para superar o erro. A arte como processo terapêutico ainda não é aceito como corpo de conhecimento efetivo na academia. A arteterapia possibilita vivenciar os materiais. É criando, descriando e recriando que ocorrerá a plasticidade do sujeito e será realidade a inclusão. A arteterapia possibilita materializar imagens arquetípicas, repito. O profissional de enfermagem, como os demais profissionais de saúde, estão a serviço do homem. Além de todas as prerrogativas inerentes aos cidadãos, ainda se ufana porque o objeto do trabalho é o homem-doente, aquele sofredor, o doente. Utilizar o conhecimento da arteterapia em sala de aula possibilitou perceber a manifestação de corpos em processo de construção no conhecimento de si mesmo. Muitos caminhos ainda há para percorrer na implantação efetiva da arteterapia nas instituições de ensino e de saúde. Contudo, existe “cheiro” de utopia no ar, Muitos óbices há que se enfrentar. A morte para estes adolescentes, partindo da matriz arquetípica (pg.43) do herói, é a condição da não realização da autonomia tão presente nesse período da vida. E ainda está em oposição à preservação da integralidade. Esses alunos percebem que como potenciais profissionais de enfermagem podem contribuir com o outro sofredor, doente, e para com os familiares, e trabalharem também a própria morte. A arteterapia provocou aqueles adolescentes a sentir o toque do outro, o calor do corpo, a energia da mão, a luz e a imanência do cosmos. Naquela sala de aula não mais prostrados ou sentados em fila, agora plastados pelo toque, pela música e pela arte, viram testemunhos de reconstrução. Relaxaram, choraram, sorriram, cuidaram e se auto-cuidaram, emocionaram-se. Naquele ambiente mágico, puderam trabalhar a sua morte e a morte do outro. A educação em arteterapia pôde contribuir para que os discentes cooptados pelo ambiente terapêutico desenvolvessem suas potencialidade no processo ensino/aprendizagem. O facilitador foi mero incentivador do saber/fazer. Em saúde, contribui para conhecimento de si mesmos e o desenvolvimento da auto-estima e dos sujeitos cuidados. Estas são cenas de uma aula de enfermagem reconstrutora!(pg.44) NOTAS 1 BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto - Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Para Educação de Nível Técnico. Estética da sensibilidade. p.28-29. 2 TRIVINÕS, A. N. S. Introdução à Pesquisa em Ciências Sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987. p. 138-140. 3 CAPALBO, Creuza. Considerações Sobre o Método Fenomenológico e a Enfermagem. Revista de Enfermagem da UERJ. Rio de Janeiro - RJ, v. 2, n.2, p. 192-197, out. 1994. 4 D'ASSUMPÇÃO. Evaldo. Tanatologia e o Doente Terminal. Revista Nacional, BH, p, 22. [Dr. Evaldo A. D'Assumpção é cirurgião plástico do Hospital Mater Dei - Belo Horizonte. Professor de Ética Profissional da PUC-MG e membro da Academia Mineira de Medicina] 5 CREUZA, Capalbo. Op cit. 6 LOPES, Regina Lúcia Mendonça; RODRIGUES, B. M. R. D. & DAMASCENO, M. M. C. Fenomenologia e a Pesquisa em Enfermagem. Revista de Enfermagem da UERJ, Rio de Janeiro - RJ, v.3, n.1, p.49-52, maio 1995. 7 SIC - Informações colhidas nas aulas de Pediatria do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 8 TALBOTT, John, HALES, R. E. & YUDOFSKY, S. C. et col. Tratado de Psiquiatria. [Tradução de Maria Cristina Monteiro Goulart& Dayse Batistab] Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. p. 85. 9 Idem. p. 87. 10 BETTELHEIM; Bruno. Na Terra das Fadas: análise dos personagens femininos [Extraído da obra "A psicanálise dos contos de fadas"] Tradução de Arlene Caetano. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. p. 76. 11 TALBOTT, John et all. Op.cit., p.88. 12 KAPLAN; HAROLD, I ;SADOCK; B.J. e GREBB; J. A. Compêndio de Psiquiatria. Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica. 7. Ed. Porto Alegre: Artes Médicas. 1997. p.61. 13 Idem, p. 69. 14 ABERASTURY; Arminda; KNOBEL, M. Adolescência Normal. Porto Alegre: Artes Médicas, 1970. p. 13.Idem, p. 13. 15 Idem, p. 13. 16 VIDAL, Marciano. Moral de atitudes: ética da pessoa. 4. ed. vol. 2. São Paulo: Santuário, 1981. p. 229. 17 D'ASSUNPÇÃO, Evaldo. op. cit. p. 22 18 Idem, p.22. 19 BRASIL Ministério da Educação e do Desporto - Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Para Educação de Nível Técnico. Política de Igualdade. p. 31-32. 20 Idem 21 GADOTII, Moacir. Escola Cidadã: Uma Escola, Muitas Culturas. In: Construindo a Escola Cidadã: Projeto Político-Pedagógico. Brasília: MEC - Secretaria de Educação à Distância. p. 79. 22 Idem, p.80. 23 BRASIL Ministério da Educação e do Desporto - Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Para Educação de Nível Técnico: Política da Igualdade. p. 31-32. 24 PHILIPPINI, Ângela. Universo Jungiano e Arteterapia: imagens e transformações. RJ: vol. II, n. 2, POMAR, agosto 1995. p. 4. 25 URRUTIGARAY, Maria Cristina. A Arte - A Terapia - A Emoção de Lidar [Apostila utilizada no Curso de Arteterapia em Educação em Saúde da Universidade Cândido Mendes], p. 1. 26 Idem, p. 2. 27 Ibidem. 28 TRIVIÑOS, A N. S. loc. cit. 29 PEREIRA, Araci Carmem. O "Ethos" da Enfermagem: Aspectos fenomenológicos para uma fundamentação da deontologia da enfermagem. Rio de Janeiro, 1981. p.86 [Dissertação de Mestrado em Filosofia - Universidade Gama Filho]. 30 Idem. 31 FIGUEIREDO, Nébia Maria A de; MACHADO, W. C. A; PORTO, I, S. & FERREIRA, M. de A. A Dama de Branco Transcendendo para a Vida/Morte Através do Toque. In: Marcas da Diversidade: saberes e fazeres da enfermagem contemporânea. Porto Alegre: Artmed, 1998. p. 137-169. 32 PEREIRA, Araci Carmem. Op.cit. 33 LIMA, Maria José. Desafio de Hoje: O Desenvolvimento de Profissionais de Enfermagem - Uma Década de Trabalho com Criatividade, Sensibilidade e Expressividade. In: Marcas da Diversidade: Saberes e Fazeres da Enfermagem Contemporânea. Porto Alegre: Artmed, 1998. p. 103-125. 34 Idem. p. 103. 35 FIGUEIREDO, Nébia Maria A. de. et all. p. 139. 36 ALVES, Rubens. Do Prazer de Ensinar ao Prazer de Aprender. SIC [Informações colhidas no filme de vídeo apresentado no curso de Arteterapia em Educação e Saúde da Universidade Cândido Mendes - RJ), na disciplina de Pedagogia. Este filme é uma palestra do professor Rubem Alves sobre o tema em questão na Faculdade Abeu – RJ] 37 Ibidem. 38 Gideões Internacionais no Brasil. Novo Testamento Salmos e Provérbios. São Paulo: s/ed, s/data. p.73-75. 39 ALVES, Rubens. Op. cit. 40 BOLTANSKI, Luc. As Classes Sociais e o Corpo. 3. ed. [Tradução de Regina Machado, organização de texto de Maria Andréa Loyola Leblond e Regina A. Machado] Rio de Janeiro: Graal, 1984. p. 13. 41 NOGUEIRA. Roberto Passos. Perspectivas da Qualidade em Saúde. Rio de Janeiro: Quality Mark, 1994. p. 141. 42 AMÂNCIO FILHO, Antenor. O Programa de Vocação Científica da Fundação Oswaldo Cruz (PROVOC) como estratégia educacional relevante. História, Ciência e Saúde. [S/loc.], v. VI. p. 181-193. mar/jun. 1999. REFERÊNCIAS ABERASTURY; Arminda, KNOBEL, M. Adolescência Normal. Porto Alegre: ArteS Médicas, 1970. ALVES, Rubens. Do Prazer de Ensinar ao Prazer de Aprender. SIC [Informações colhidas no filme de vídeo apresentado no curso de Arteterapia em Educação e Saúde da Universidade Cândido Mendes - RJ, na disciplina de Pedagogia. Esta filmagem é uma palestra do professor Rubem Alves] AMÂNCIO FILHO, Antenor. O Programa de Vocação Científica da Fundação Oswaldo Cruz (PROVOC) como estratégia educacional relevante. História, Ciência e Saúde. [S/loc.], v. VI. p. 181-193. mar/jun. 1999. BETTELHEIM; Bruno. Na Terra das Fadas: análise dos personagens femininos (Extraído da obra ''A psicanálise dos contos de fadas"), tradução de Arlene Caetano. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. BOLTANSKI, Luc. As Classes Sociais e o Corpo. 3. ed. (Tradução de Regina Machado, organização de texto de Maria Andréa Loyola Leblond e Regina A. Machado) Rio de Janeiro: Graal, 1984. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto - Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Para Educação de Nível Técnico: Estética da sensibilidade. BRASIL. 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Bacharel em Teologia pele Seminário Teológico do Sul do Brasil (STBSB) e Faculdade Teológica Seminário Unidos (FATESU) - RJ. Pós-Graduado em Arteterapia em Educação e Saúde pela Universidade Cândido Mendes (RJ); Saúde Pública - Saúde da Família pela UFMA; Saúde Mental (UFRJ); Ativação de Mudança do Ensino Superior dos Profissionais de Saúde (ENSP/FIOCRUZ) e mestrando em Educação pela Universidade Lusófona de Humanidades - Lisboa/Portugal. Atualmente atua como Diretor do NAISI - Núcleo de Atenção Integral à Saúde de Imperatriz (Secretaria Municipal de Saúde), professor de enfermagem da Unidade de Ensino Superior Sul do Maranhão - UNISULMA, e do Seminário Teológico Batista Sul Maranhense - Imperatriz. KatMartins - 2014
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