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A estrutura da maldade

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Prévia do material em texto

A ESTRUTURA DA MALDADE
 Christopher Bollas
 1992
 Índice
A estrutura da maldade................................................................................................pg.3
O assassino em série......................................................................................................pg.6
O morto vivo..................................................................................................................pg.7 
A morte do self...............................................................................................................pg.8
Espaço potencial maligno..............................................................................................pg.9
O sacrifício.....................................................................................................................pg.10
O receptáculo que guarda um conteúdo em putrefação............................................pg.11
Cenas primárias do morto............................................................................................pg.12
A cabeça oca...................................................................................................................pg.14
 infantilização catastrófica............................................................................................pg.14
A criança que sofre abusos............................................................................................pg.15
Ser violado mentalmente..............................................................................................pg.17
A mulher agredida.........................................................................................................pg.20
A aliança sadomasoquista.............................................................................................pg.22
Perversões da transferência e sensações de maldade na contratransnsferência.....pg.25
A maldade comum.........................................................................................................pg.30
(“Dois breve comentários sobre o texto”, J. Outeiral)...............................................pg.35
( material, não revisado; mantida -sem correções- a escrita original, exceto quando 
alguma retificação se tornava necessária para a compreensão do texto. O autor tem uma 
estrutura literária de texto, como é natural dada sua formação original, a literatura, de 
tradução “delicada”; material não publicado; exclusivamente para circulação interna 
nos Seminários Winnicott; tradução, a partir de um texto distribuído durante seminário 
com o autor na Associacion Psicoanalitica del Uruguay, Montevidéo ,1992 )
1
Fui procurado para consulta por uma jovem de vinte e seis anos. Ela chegara da 
Austrália e foi encaminhada por seu terapeuta,com quem havia estado em 
psicoterapia por vários anos.Não tenho hora e ela sabe; quando me conta coisas de sua 
vida, já sabe que vou enviá-la para outra pessoa. Não tinha sido possível encontrar o 
tipo de “felicidade” que esperava encontrar após graduar-se em Administração de 
Empresas e depois de haver começado a trabalhar em uma pujante empresa 
australiana. Foi por este motivo que abandonou tudo para vir para a Inglaterra. Seu 
relato desta brusca partida se projeta na sessão, porém é silenciado por uma espécie 
de “conversalhada”; suas razões, quaisquer que tenham sido, ficam nebulosas, dentro 
de uma atitude típica de uma menininha.
Estava na Inglaterra porque sua mãe era inglesa e esta nunca havia se entusiasmado 
com a Austrália. Enquanto me falava sua boca se torcia, de forma quase 
imperceptível, para baixo, quando se referia à mãe. As pessoas na Austrália eram 
muito rudes. A cultura inglesa era mais refinada, e sua mãe estava segura de que a 
Inglaterra era o lugar adequado para ela. De fato, a paciente havia estado aqui cinco 
anos antes, logo depois de sua graduação, e havia considerado a idéia de ficar. Um 
inglês, de pouco mais de trinta anos, havia visitado sua família e lhe havia proposto 
um trabalho em um “pub”, na zona rural. Durante este verão viveu em um pequeno 
povoado inglês e manteve um forte romance com o homem. Sentiu-se, porém, muito 
deprimida quando, ao chegar a primavera do ano seguinte, ele a deixou, e ela foi, 
novamente, para a Austrália.
Preocupei-me, neste momento, uma estranha mescla de atitudes puramente infantis, 
uma forte ambição, uma marcada tendência à depressão e um “oco” em sua mente. 
Terminada a hora a encaminhei a um colega; porém, um mês depois, meu colega me 
comentou que a paciente não havia procurado. Decidi chamá-la; disse-me que estava 
planejando uma viagem de vários meses pela Europa continental e que faria contato 
comigo quando voltasse.Cerca de seis meses depois tornei a vê-la em meu consultório. 
Sorrindo e rindo, em alguns momentos a ponto de chorar, conta-me que agora estava 
fortemente envolvida em uma relação. Havia tido um acidente de carro, havia sofrido 
ferimentos, e, enquanto estava internada, conhecera um enfermeiro de um país do 
Oriente Próximo ,de quem havia se enamorado de imediato. Ele era muito amável e 
atento, e quando a convidava a sair, em seus primeiros encontros, era o protótipo da 
boa educação e dos bons modos. O teatro, a Ópera, os cinemas, a Tate, Victoria and 
Albert Hall , eram seus diferentes “lares” na cidade, e a levava nestes locais com uma 
sensação de familiaridade e cotidianidade, que a fazia sentir-se “nas nuvens”.Ao fazer 
amor era incomparável; acariciava seu corpo com uma delicadeza cuidadosa e 
deliberada, o que nunca havia experimentado antes, e seu orgasmo era como estar 
no paraíso. .
O resultado era que se tornava difícil seu trabalho no escritório, ainda que fosse um 
trabalho novo que lhe era particularmente interessante. Todo o tempo pensava nele. 
O sentia a seu lado, o via, sentia seu sabor, se sentia transportada por ele, ainda que 
não estivesse a seu lado. Voltava a seu apartamento, onde ele havia se instalado, 
desesperada por vê-lo. Enquanto me contava esta história percebi que me sentia 
2
bastante inquieto. A paciente disse-me, então, que as “coisas” com o amante haviam 
mudado. Estava convencida de que este homem era uma pessoa estupenda, porém 
agora já não podia passar muito tempo junto á ela, se bem que pretendia que ela 
estivesse no apartamento o esperando, caso ele pudesse ir vê-la. Ainda que não mais 
houvesse Ópera em sua vida, escutavam música juntos, discos que o homem colocava 
na pick-up da paciente; e ela, então, se sentia transportada a outro mundo. Já não era 
tão sensível no plano sexual; a paciente me disse, não sem certa vergonha, que tinha 
atitudes cruéis, que eram muito estranhas: a atava e, às vezes, a agredia, porém, 
enquanto o fazia, a olhava com uma ternura que derretia nela qualquer resistência. O 
resto da sessão ficou marcado com uma imagem cada vez mais perturbadora da 
forma em que esta mulher estava cativa deste homem.
Pouco foi o que eu lhe disse. Porém o pouco que disse me tomou totalmente de 
surpresa, já que nunca o havia dito antes. Ao final da sessão disse-lhe – “Creio que 
este homem é um malvado” – com o que ela imediatamente manifestou seu acordou. A 
encaminhei, outra vez, a outro terapeuta, insisti para que telefonasse a ele e começasse 
uma terapia, porém creio que eu mesmo já sabia que ela não iria fazer isto. A paciente 
não se comunicou com o terapeuta e eu não voltei a ter notícias dela; a experiência 
submergiu em meu inconsciente, embora, de quando em vez, pensava na paciente e 
perguntava-me o que haveria sido dela. Também perguntei-me , muitas vezes, por quê 
havia lhe dito que seu amante era um “malvado”e refleti sobre a idéia que tive acerca 
da jovem. Fiquei irritado com sua aceitação passiva da crueldade e me perguntava se 
a paciente era uma “cabeça oca”, termo que me desagrada profundamente, porém 
que, estranhamente, considerei muito oportuno. Por quê eu havia pensado, neste 
encontro, entre o malvado e a “cabeça oca”?
A estrutura da maldade
É importante, em primeira instância, estabelecer uma diferença entre os processos 
malvados, com uma clara estrutura própria, e as ações infames ou as pessoas 
maliciosas. A história da cultura ocidental mostra um esforço claro e permanente por 
refletir sobre os processos que se qualificam como malvados, porem este esforço de 
pensamento se vê continuamente obscurecido por uma utilização mais ampla do 
significante, empregado para designar qualquer acontecimento horrível ou qualquer 
pessoa maliciosa. A maldade como processo é, também, um impulso incontrolável e 
parte de uma psicologia interna que se evade essencialmente do reconhecimento 
consciente. Assim, cada uma das milhares de representações da maldade que se 
encontram na literatura do mundo ocidental, somente expressa uma parte do 
processo, deixando-nos, em qualquer momento, somente parcialmente conscientes do 
que tentamos pensar.
O Gênesis nos oferece uma das experiências mais claras da estrutura da maldade; 
todos conhecemos a história da sedução de Eva pela serpente, que resulta na queda do 
homem e uma maldição para a humanidade. Certamente, se a serpente foi a primeira 
presença malvada, então Eva deve ter sido a primeira “cabeça oca”: uma cabeça vazia 
que não retém os conteúdos mentais que afiançariam sua segurança e sua 
sobrevivência. Sua ambição, de fato, nos diz algo acerca do porque a maldade faz dela 
3
uma presa fácil; Eva é guiada por seus próprios desejos de comer da única árvore que 
lhe havia sido proibida, e o poder de suas ânsias elimina o poder das outras partes de 
sua mente que poderiam havê-la mantido a salvo.
O êxito de Iago ao seduzir Otelo, ilustra de que forma outra poderosa emoção, neste 
caso o ciúmes, pode destruir a mente, criar uma “cabeça oca” assassina que asfixia o 
objeto de seu amor. A obra de Shakespeare, porém, examinava a estrutura da 
maldade com uma maior profundidade que no passado. Iago ganha a confiança de 
Otelo semeando no Mouro dúvidas sobre sua esposa, criando uma nova espécie de 
dependência. Cativo na estrutura de um destino psíquico que se desenvolve em 
espiral, Otelo fica preso no misterioso desaparecimento que Iago faz do lenço, 
presente de sua mãe antes de sua morte e objeto que ele havia dado a Desdêmona. Ele 
tem uma pequena fruta bordada em um canto, sinal de alimento. O ataque de Iago a 
função e ao lugar deste objeto, leva o Mouro a uma loucura assassina. Iago mata seu 
amor e ele sofre uma espécie de morte psíquica antes de assassinar a pobre 
Desdêmona.
O heróico príncipe das trevas de Milton é outra tentativa de refletir sobre a estrutura 
da maldade, pondo ênfase sobre a dor inconsciente que satura o satanás, que não 
somente sofreu a perda de seu lugar no paraíso, senão que também um catastrófico 
aniquilamento de sua posição. O Fausto de Marlowe, como Eva, parece sofrer por 
causa de sua própria ambição, porém como no caso do Fausto de Goethe, seu egoísmo 
e sua necessidade infantil, levam consigo um sinal maligno, dado que o self está dentro 
de uma estrutura que explora a vulnerabilidade da criança.
Somente vou referir-me aos esforços parciais da cultura ocidental por pensar a 
estrutura da maldade, pois não é minha intenção fazer um bosquejo acadêmico da 
história, desejando, apenas, indicar de que forma uma civilização como a nossa pode 
tentar pensar sobre algo durante muito tempo. Em minha opinião, a psicanálise pode 
nos permitir dar um passo adiante neste caminho, e com tal fato na mente, me 
dedicarei agora a criar o primeiro esqueleto deste processo, para, após, agregar-lhe, 
no papel, os ossos e a carne. Tratarei de indicar o alcance total da estrutura, ainda que 
ela não tenha sido totalmente representada na literatura ocidental. Minha ênfase se 
centrará na maldade como processo que implica a duas pessoas na atuação 
intersubjetiva de uma ontologia maligna.
O processo da maldade implica, por parte do sedutor, cativar a vítima, cuja 
vulnerabilidade é explorada de forma tal que (sob a modalidade de uma simples 
necessidade ou ambição) se converte em sua própria perdição. Há, ao menos, oito 
passos no desdobramento da estrutura da maldade:
1. A bondade como sedução . O processo começa a partir do que chamaremos 
malvado e que busca uma vítima.para capturar sua vítima deve aparentar ser 
bom, e, por certo, esta aparência de bom é o traço mais atrativo. Quaisquer 
que sejam os elementos pré-determinantes do inconsciente do outro, a bondade 
do sedutor é atrativa.
4
2. Criação de um espaço potencial falso . A chegada de quem aparenta ser bom 
cria um espaço potencial para o receptor de sua bondade. Seja pela sugestão de 
que o outro pode possuir realmente algo que sempre pensaram que lhes estava 
proibido, seja devido ao estado de verdadeira carência da vítima, carência que 
agora parece estar a ponto de resolver-se, o sedutor, através da representação 
da bondade, evoca a esperança (ou a ambição ou o poder) na vítima, que agora 
o considera como uma possível solução de sua situação.
3. O oferecimento . Muitas vezes considerado como uma tentação, o oferecimento 
sugere ao outro que o espaço potencial pode chegar a ser, infinitamente ou ao 
menos poderosamente, eficaz.
4. Dependência maligna . A vítima que aceita o oferecimento é agora, sem dúvida, 
totalmente dependente do sedutor para chegar com êxito em seu destino. 
Poderíamos dizer que a vítima fica totalmente dependente da bondade em que 
acreditou, porém dependente com base em uma cegueira criada pela 
intensidade de sua própria necessidade.
5. Escandalosa traição . O sedutor faz algo com o que indica que não é como o 
que parecia ser. Existe ali uma expectativa, quanto ao seu efeito, porém para a 
futura vítima é um profundo shock. Em termos lacanianos, é como se o 
imaginário fosse invadido pelo real, como se o real tivesse uma 
intencionalidade organizada própria que obtura os espaços onipotentes 
construídos pelo imaginário. A vítima, como Desdêmona, não pode crer no que 
está ocorrendo com ela, não simplesmente na realidade senão que através da 
realidade. 
6. Desilusão catastrófica e infantilização radical . O sedutor submete a vítima a 
uma desilusão catastrófica, a um colapso totalmente de suas crenças anteriores, 
que resultam na destruição das estruturas da personalidade adulta a medida 
que a vítima é praticamente desvirtuada pelo tempo e levada a uma posição 
infantil que, em alguns casos, deixa sua própria vida em mãos dos caprichos 
onipotentes de quem instituiu a estrutura da maldade.
7. Morte psíquica . A vítimas tem a vivência de um assassinato de seu próprio ser. 
O self que tinha necessidades, que sentia a chegada de um espaço potencial, o 
self que se havia tornado dependente e que acreditava em um destino bom é 
subitamente assassinado.
8. Uma dor interminável . A vítima nunca se recuperará do desenlace psíquico 
deste processo, na medida em que os atos do sedutor destruíram as estruturas 
geradoras de representação e o receptor sempre terá a lembrança deste 
aniquilamento.Se a vítima é assassinada, os membros de sua família levarão 
dentro de si uma dor interminável que não poderá ser resolvida. É 
insuportável saber que um ser amado, que vivenciou o outro como bom, que 
esta mesma bondade humana se converteu em causa de sua morte.Sugiro que os oito passos que acabo de bosquejar constituem a estrutura da maldade. 
Certamente que existem variações, porém esta é sua arquitetura. Para compreender o 
aspecto habitual da maldade, creio que deveremos analisar a patologia e, como fez 
Freud no final do século XIX, isto significa observar os transtornos extremos para 
compreender os aspectos mais comuns da mente humana. É possível que a observação 
5
do evidente colapso da histérica como um ícone do final do século XIX, corresponde a 
imagem da estrutura violenta do assassino em série como o fantasma das mentes no 
final do século XX. Nos cem anos decorridos neste tempo, o mundo sofreu duas 
guerras que anularam as presunções que se tinha sobre a humanidade, deixando ao 
homem do final do século uma espécie de self seriado que anda à deriva em uma vida 
que se torna cada vez mais anônima e que é, portanto, inevitavelmente um”branco” 
de seus pensamentos, seu desespero ou, em caso extremo, seus assassinatos.
O assassino em série
Albert De Salvo ( o estrangulador de Boston,1964 ). Herber Mullin, Edmund Kemper, 
Dean Corll e Elmer Wayne Henly, o assassino do Zodíaco, Kennet Bianchi ( O 
estrangulador da Colina ), John Gracy, Ted Bundy, Gerald Stano, Carlton gary, 
Wayne William, Henry Lee Lucas, Denis Nilson, Dahmer, e os nomes de muitos mais 
virão, que viverão em nossos aparelhos de televisão, encherão as páginas de nossos 
jornais e nos horrorizarão.Porém não desaparecerão.
Quem são? Não sei. Pelo que sei, a psicanálise teve alguns deles em seus divãs. Porem 
creio que temos pacientes que com um potencial para este ato e contamos como ocaso 
de Dennis Nilson ( e outros ), com discussões notavelmente francas, acerca de suas 
motivações, que podem nos permitir começar a pensar sobre os atos inconscientes 
destas pessoas.
Quero dizer, realmente, “estas pessoas”? A investigação da bibliografia a respeito 
revela uma ampla variedade de histórias pessoais, selves infantis, representações 
adolescentes, etc. Considero, entretanto, que a história do assassino em série é 
ilustrativa do ponto de vista da maldade. O genocídio se converteu na quinta essência 
do crime no século XX. O assassino em série é um ser genocida ( ver “Dois breves 
comentários”, pg. 35 ) que captura sua vítima com o objetivo de converter o humano 
em não humano, e logo desfazer-se do que, para o assassino, é um ser que não tem 
entidade desde o anonimato em que começou a relação até o esquecimento que 
marcará o seu fim. Muito pode se aprender sobre a especial relação de objeto 
inconsciente que atua este ser genocida, e, ainda que a psicanálise não tenha 
experiência clínica com o assassino em série, utilizarei suas ações e suas relações de 
objeto como matriz para estudar a estrutura da maldade, pois em minha opinião, o 
assassino em série atua, de forma total, um processo que tem tido um interesse 
permanente na cultura ocidental. Pode ser ele, então, a primeira manifestação 
completa da maldade, e através do estudo do que ele faz poderemos chegar a 
compreender algo que, sem dúvida, tem sido sempre parte de nossa cultura, de nossa 
sociedade e dos diversos destinos de alguns de nossos selves.
Confio que fica claro que meu ensaio sobre o assassino em série não surge de um 
estudo científico destas pessoas em particular; construo uma figura mítica com traços 
identificáveis que nos permitirá pensar não simplesmente sobre ela, como, de forma 
mais pertinente, sobre o que esta pessoa que deixa, à vista, uma estrutura lógica que 
tem absorvido nosso interesse durante milhares de anos, porém que recém agora está 
6
emergindo à superfície. O assassino em serie a que me refiro neste ensaio inclui, pois, 
os perfis de muitas destas pessoas.
Bundy engessava o braço, de quando em vez, apresentando-se como se fora uma 
pessoa com carências, revertendo-se, assim, o processo habitual de sedução, em que se 
oferece algum tipo de ajuda à vítima. Lucas parava seu carro para levar os jovens que 
pediam carona nas estradas. Nilsen ofereceu um lugar para um jovem passar a noite. 
O objeto da sedução é, porém, matar: “ É honroso matar o inimigo”/ É glorioso lutar 
até o sangrento final/ Mas a extirpação violenta/ Com base na confiança sagrada/ De 
tirar a vida de um amigo? ”
O que é a “confiança sagrada” que escreve Nielsen? Nos vem a mente a confiança com 
que se investe a quem oferece refúgio, assistência ou alimento, uma confiança que 
sabemos existir na base do ser humano.Qual é a origem da “confiança básica”, como 
chamou Erik Erikson ? Não sabemos, por acaso, que é a confiança que o infante e a 
criança tem em sua mãe e seu pai, que o cuidarão, que certamente reprimirão toda 
resposta violenta ou assassina, e que suportarão a ambição, a onipotência, a “cabeça 
oca” e os ciúmes da criança?
O assassino em série desdobra, então, sua relação objetal oferecendo-se a si mesmo 
como uma espécie de criança com carências ou, com maior freqüência, como um pai 
atento que oferece a mão da amizade. Este ato corresponde a estrutura inconsciente 
de todos os conatos entre pais e filhos, e, como veremos, é parte da intenção do 
assassino de matar os pais diante da vítima; eliminar a pretensão da criatividade 
paterna desmascarando este pai para revelar seu outro self abominável.
O morto vivo
Antes de começar a matar, Nilsen costumava deitar-se nu frente a um espelho e olhar 
seu corpo durante horas,de forma interminável, “A medida que se desenvolvia minha 
fantasia no espelho, meu rosto se punha branco, meus lábios azuis e meus olhos 
miravam fixamente o espelho. Atuava estas coisas sozinho, utilizando meu próprio 
cadáver ( eu ) como objeto de minha atenção”.Depois que matava suas vítimas, Nilsen 
as banhava, as punha na cama, falava com elas, as vestia, as enterrava sob as taboas 
do piso, as ressuscitava, as banhava novamente, após as esquartejava, as fervia, as 
enterrava e, assim, sucessivamente. Ocasionalmente sodomizava o cadáver, fascinado 
por suas características físicas, porém também, “fascinado pelo mistério da morte... eu 
lhe sussurrava porque acreditava que realmente estava ali”, escreveu sobre uma de 
suas vítimas.
Em sua excelente biografia de Dennis Nilsen, Brian Masters associou a horripilante 
fascinação de Nilsen para com os cadáveres com a morte de seu avô, Andrew Whyte. 
Segundo suas lembranças, uma manhã a mãe lhe perguntou se desejava ver o avô e o 
levou a um quarto onde seu amado avô jazia em um ataúde. Disseram-lhe que o avô 
estava simplesmente dormindo. Foi somente depois de muito tempo que se deu conta 
que não voltaria a ver seu avô com vida.
7
Nilsen escreveu:”... foi para baixo da terra meu verdadeiro eu, e, agora, estou lá com 
ele, jazendo sob o sal e o vento do Cemitério de Inverallochy. A natureza não prevê a 
morte emocional .” Desde este dia Nielsen se considerou um morto, opinião que, de 
acordo com seus diários, ele podia trazer à consciência, ainda que, a partir deste 
momento, obviamente, viveu grande parte de sua vida como se não fosse assim.
Os leitores de biografias sobre assassinos em série observarão que muito dos homens 
que se converteram em assassinos de pessoas anônimas sofreram a morte emocional 
que Nielsen havia descrito. O que acontece quando uma criança sofre a morte de seu 
self? Qual o tipo de morte de que se trata?
A morte do self
Sabemos, obviamente, que é o resultado de algum tipo de trauma. Um dos meus 
pacientes, aparentemente maníaco-depressivo, havia sentido, no início de sua análise 
que a morte de sua mãe,quando ele tinha 9 meses de vida, não havia tido significação 
para ele. Entretanto, sua sensação de desproteção, sua falta de fé na vida, seus 
incessantes e ineficazesimperativos, assinalavam uma devastação em sua infância 
inicial. Não possuía a relação de objeto interna e geradora que permite ao indivíduo 
acalmar seu self, e, ao contrário, manejava sua dor inconscientemente utilizando sua 
mente como objeto que o impelia a realizar atividades através de uma interminável 
provisão de duros imperativos e comandos (“Vamos, deixa de sentir pena de ti mesmo 
e te põe a trabalhar”). Embora seu pai nunca tenha discutido este acontecimento e 
ainda quando o acusava por diversas falhas em sua vida, seu pai o amava, o cuidava, e 
ele pode continuar, ainda que a duras penas. Não há dúvida de que com a morte da 
mãe, algo morreu dentro dele, ainda que parcialmente ressuscitado pelo amor e 
cuidado de seu pai.
Henry Lee Lucas, entretanto, foi brutalmente agredido por sua mãe, de forma 
repetida, durante sua infância. Seu pai havia sofrido uma dupla amputação e vivia – 
se este é um termo adequado – sobre uma madeira com rodas, na qual se movia pelo 
povoado. A mãe era uma prostituta que mantinha relações com muitos homens diante 
de seus filhos. Quando criança Henry matava animais, esquartejava seus corpos e 
brincava com o sangue. Antes de começar sua orgia de assassinatos em todos os 
estados, matou sua mãe. Ainda que eu não tenha conhecido este homem, creio que é 
certo pensar que vivenciou a morte – ou talvez, mais exatamente, a morte de seu self 
em inúmeras ocasiões durante sua infância.
O assassino em série pode, então, identificar-se com a morte, porém com uma morte 
que é o assassinato do self. Este self está agora morto e somente pode seguir “vivendo” 
se mata a outros selves que inda não se converteram em cadáveres. Os cadáveres se 
convertem em um a espécie de companhia, como conclui Masters em sua biografia de 
Nilsen.Converter um ser em cadáver é como criar uma espécie de família.
No lugar que alguma vez ocupou o self vivo emerge um novo self, que se identifica 
com o assassinato do bom, onde o “bom” significa, simplesmente, um self que acredita 
8
na confiança, no amor e na reparação. Eigen, Grotstein, Goldman e outros 
escreveram importantes trabalhos sobre a forma em que a maldade surge em um 
indivíduo. Eigen sugere que uma desorganização precoce do ego perturba o sentido de 
self e resulta em uma “corrupção” que encaminha a direção do self para atos 
malvados. É essencial lembrar que as mais horríveis crueldades dos pais para um 
filho não implicam que se gere uma mente assassina, quando o filho atinge a idade 
adulta. É importante ressaltar a resposta psíquica da criança, que toma partido pelo 
ato contra o self, matando as partes amáveis do self e deixando com vida o poder 
organizador das partes que odeiam e do ódio.
Pode ser inútil diferenciar entre os diferentes tipos de ódio, porém a bibliografia sobre 
os assassinos em série e o fenômeno clínico que identificarei como estrutura da 
maldade marcam a falta de paixão do ato do assassinato, mais que o ato apaixonado 
de assassinato ou agressão guiado pelo ódio. Creio que a pessoa malvada horroriza 
sua vítima e aqueles que estudam estas situações, precisamente devido a falta de afeto
que demonstra o assassino, a este terrível ato que é profundamente frio. Tais pessoas 
parecem ter-se identificado com o que Stuart Hampshire chama o “vazio moral”, que 
ele considera que existia nos assassinos nazistas. A pessoa genocida, então, não se 
identifica com o ato passional de um assassinato, senão com o vazio moral; para ele o 
assassinato não tem significado, salvo como ato sem significação e, por certo, como um 
horrível desperdício. É esta sensação de um horrível desperdício o que estes 
indivíduos levam consigo. Achar uma vítima que experimentará uma morte 
totalmente carente de sentido é, então, uma forma de converter psiquicamente o vazio 
moral em um ato ou, talvez possamos dizer, no ato.
Espaço potencial maligno
Creio que o assassino em série, inconscientemente, reconstrói o espaço potencial 
oferecido ao self no começo de sua vida. Este oferecimento evoca dependência, 
esperança e confiança. Quando o receptor desta sedução morde o anzol, o assassino e 
série, subitamente, “cria” uma desilusão catastrófica. Isto, de fato, precede a morte, 
tanto psíquica como física. É um momento em que há falta total e absoluta de crença. 
Charlene Gallago recorda o estado de total falta de fé de uma de suas vítimas:
“Gerald tinha um rolo de fita isolante cinza em sua mão esquerda, que passou a 
Charlene, com uma ordem curta: “Primeiro põe a fita para fechar suas bocas. Depois, 
ata os punhos e os tornozelos. E faz bem, compreendes?”. Quando Charlene estava 
por colocar a fita sobre a boca de uma de suas vítimas, a moça a olhou fixamente nos 
olhos por um momento e lhe disse:“Isto é realmente verdade, não é?”.
Ainda que os assassinos em série possam torturar suas vítimas, pouco se escreveu 
sobre sua relação com as permanentes mostras de que a vítima se encontra em um 
estado de shock ou de impossibilidade de crer que a loucura agora ocupa o real. Creio 
que a análise desta dimensão do ato de assassinato revelaria a identificação do 
assassino com o trauma acumulativo da vítima, no qual o “mundo parental”, 
repetidamente, viola a confiança sagrada.
9
É importante assinalar, uma vez mais, que o trauma do assassino não tem porque 
haver sido causado por uma mãe ou um pai patológicos. O trauma pode “matar” uma 
criança, seja através dos efeitos perturbadores de atos repetidos, pela morte de um ser 
mamado ou pelo divórcio de seus pais. Neste caso somente me refiro ao processo no 
qual a criança sente que seu mundo, que lhe gerava confiança, o traiu e causou a 
morte de seu self, deixando um vazio moral que é o espaço interno a partir do qual 
emerge um novo self, identificado com o assassinato e com a maldade.
Cada assassino pode transportar sua vítima através de condições da própria infância 
do assassino, porém agora existe, obviamente, uma diferença. O assassino sobrevive 
ao assassinato; segue vivendo. A repetição deste ato, a sobrevivência do assassino, 
pode dizer-nos algo sobre o que busca o assassino. Trata-se de uma espécie de 
transcendência maligna”? É a vítima um objeto de sacrifício posta no lugar do 
assassino?
O sacrifício
Georges Bataille argumenta que o sacrifício de um animal ou um ser humano dá 
àqueles que presenciam o ato uma sensação de transcendência sobre a morte. As 
testemunhas observam enquanto um ser vivo, de corpo inteiro, é assassinado. A vítima 
cai sem vida, porem as testemunhas seguem vivendo. Dado que todos os seres 
humanos são, de fato, “seres descontínuos”, o sacrifício parcialmente fica a serviço da 
necessidade inconsciente de sobreviver à própria morte.
O sujeito que “morreu” em sua infância não está disposto a identificar-se com sua 
própria descontinuidade; isto é, com sua própria morte prematura. Porém, ao achar 
uma vítima, que haverá de passar pela estrutura da maldade, se converte em um 
“transcendente maligno”, que mata com o objetivo de superar sua própria 
descontinuidade, suas próprias mortes. Em tal sentido, podemos imaginar que a 
vítima do sacrifício é uma oferenda aos deuses malignos que separaram o self do 
assassino dentro de seu próprio corpo quando era criança.
Entretanto, há, simultaneamente, uma estranha irmandade entre o verdugo e a vítima 
do sacrifício.Em algumas culturas as testemunhas bebem o sangue das vítimas ou 
banham seus corpos no sangue dos cadáveres. O que tão somente uns momentos antes 
estava vivo, está, entretanto, tíbio ( morno ), como se as testemunhas pudessem ser 
protagonistas deste momento de transição vital entre a vida e a morte, na qual uma, a 
vida, nãoestá totalmente separada da outra, a morte. O outro que antes estava vivo 
parece, de certa forma, continuar vivo; seu sangue cobre o corpo do assassino com sua 
presença tíbia e substancial.
O assassino em série que desfruta do sangue e do corpo de sua vítima, estará 
buscando uma afinidade com um espaço inconsciente intermediário, entre a vida e a 
morte, como um espaço vital, como um lugar onde antes viveu e que, entretanto, se 
converteu em um fantasma de seus selves anteriores? Muitos assassinos em série 
parecem mostrar-se confundidos pelo fácil que é matar; em um momento o outro está 
vivo e a seguir está morto. Qual foi o ultimo momento da vida? Quando veio a morte? 
10
Nilsen disse: “Ficava fascinado com o mistério da morte. Eu sussurava porque 
acreditava que ele realmente estava ali”. A vítima estava ali, como ele também estava 
depois de sua própria morte psíquica, não é verdade?
O assassino em série tem uma fascinação com a morte que merece mais estudo do que 
poderemos obter neste trabalho, porém é pertinente agregar que muitos deles 
parecem identificar-se com o real em sua destruição do imaginário; aqui o real é 
alguma força malévola externa al alcance imaginário da percepção do outro, tal como 
aquele que os matou, quando crianças, estava fora de sua percepção, mas era algo 
organizado. Matar o outro é identificar-se com uma força que está mais além da 
percepção, mas que – por certo – está ali, tal como a morte é algo que vai mais além 
de nosso conhecimento, porém que chegará algum dia. Estes assassinos vão mais além 
da imaginação. Este é o ponto, O assassino vem do mundo que está mais além da 
imaginação, do espaço que está mais além da percepção e do conhecimento humano. É 
desde ali que vem o que estava adormecido em seu ambiente ou em seus pais, que a 
criança nem podia imaginar, mas que se organizou e violentamente penetrou a paz 
mental da criança e a continuidade de seu ser.
O receptáculo que guarda um conteúdo em estado de putrefação
Em alguns dos assassinos em série existe, de fato, uma noção consciente da atuação de 
uma espécie de assassinato como sacrifício, que em um caso, ao menos, nos permite 
pensar sobre os efeitos psíquicos posteriores. Adolfo Constanzo praticava a magia 
negra e utilizava o que se conhece como “nganga” para os restos moídos dos cérebros 
de suas vítimas. A “nganga” é uma espécie de vasilha que provém da cultura 
congolesa e que foi levada para as Índias Ocidentais. Edward Lumes, jornalista 
ganhador do prêmio Pulitzer, estudou Constanzo e escreveu:
“ O verdadeiro poder da magia do Congo... reside em um universo mágico em 
miniatura de putrefação, deterioração e morte, criado dentro de um caldeirão negro, 
um temido e secreto receptáculo conhecido como “nganga”. Dentro deste caldeirão se 
pode aprisionar e escravizar o espírito de um homem morte... o único ingrediente, e o 
mais importante, é um crânio e um cérebro humanos, preferencialmente de alguém 
morto recentemente, fonte do espírito morto que será aprisionado”.
Imaginar o interior deste objeto – que é um correlato psíquico – é identificar uma 
área do self que armazena e aplasta os restos de sua vítima, agora em estado de 
decomposição. Alguns assassinos em série, por exemplo, parecem bizarramente 
identificados com o morto, com os pedaços esquartejados ou com os corpos 
enterrados e em decomposição das vítimas, e mantém, dentro do self, um receptáculo 
que obtém sua magia negra dos restos do objeto morto. Por certo, fazem a vítima 
passar por uma vivência condensada de sua própria passagem pela infância; a vítima 
em decomposição corresponde a uma característica importante presente na própria 
vivência de seu self, como entidade anteriormente viva e que agora existe somente 
como ser decomposto que trata de obter um poder mágico a partir de tal 
desintegração.
11
Este self depois da morte, em estado de putrefação e decomposição, vive dentro do 
mundo encarcerado do falso self, destinado a seguir sobrevivendo no mundo que o 
rodeia. É pouco provável que esta pessoa alguma vez possa saber conscientemente que 
isto é certo, Nilsen é uma das poucas exceções, pois tal indivíduo está, obviamente, 
profundamente separado de todo contato consigo mesmo e faz atuar partes de si no 
horripilante split ( cisão, divisão ) que constitui o ato de assassinato. Podemos nos 
perguntar, certamente, se a estrutura da maldade, como receptáculo latente, é uma 
espécie de “nganga” interno, construído com os restos dos selves mortos, que espera 
receber sangue fresco de uma vítima que será moída e misturada com este objeto 
interno. Mais tarde, ao analisar um exemplo clínico, veremos, creio, de que forma 
algumas pessoas contém um objeto interno que contém ( to hold ) os restos do self, um 
conteúdo que se sente malévolo e poderoso, que comprometerá os outros e converterá 
uma relação de vida em um assassinato, em que o outro ficará transformado em um 
objeto interno morto e em decomposição, um sacrifício à necessidade que tem esta 
pessoa de uma nova vítima que alimente o objeto interno.
Caso o assassino em série se identifique com um self malvado que emerge de um vazio 
moral, constituído a partir do assassinato do self, também se identificará com o 
verdadeiro self anterior que, sem dúvida, se identifica projetivamente com a vítima, 
que agora apodrece ou deteriora em algum caldeirão, sob as taboas de um assoalho.
Cenas primárias do morto
Em todos os sacrifício há um necrófilo, na medida em que as testemunhas observam a 
relação entre a morte e a vida. Algo desta dimensão é parte do erotismo do assassino 
em série, já que a maioria deles não somente cometem um ato de sexualidade 
póstuma, senão que o ato do assassino é, em si, orgasmático para alguns deles. Esta 
forma de sexualidade, o sexo com a morte, encontra seu ponto máximo em uma 
relação na qual um membro do casal é assassinado. Este sexo com a morte recria a 
idéia consciente que esta pessoa tem da procriação. Uma procriação na qual duas 
pessoas se comprometem em uma relação com o objetivo de que um deles seja 
assassinado. Este desejo de morte se relaciona com a história de uma infância na qual 
as relações com o meio ambiente resultaram nas repetidas mortes do self. A dimensão 
violenta de cena primária é hipercatexizada como uma má relação carnal que é boa 
para a morte.
Certamente que é horrendo ver estes lados “positivos” do ato de assassinato, na 
medida, por exemplo, em que o assassino inconsciente tenta ingressar no corpo vivo 
da outra pessoa cortando-a, um ato de análise que pode ser considerado como uma 
forma de empatia bizarramente concreta, em que o outro é conhecido somente se é 
cortado em pedaços para que o assassino possa olhar seu interior. Ainda que comer 
uma parte da carne da vítima seja uma ofensa para o sentido de decência de qualquer 
um de nós, o tabu do canibalismo pode ter muita relação com o atrativo inconsciente 
que tem aqueles que morreram fisicamente, pois permite uma alternativa violenta ao 
sujeito ( assassino ) que não teve uma relação geradora com seus objetos.
12
O que podemos chamar de sexo com a morte é, também, um esforço por misturar-se 
com o vivo, matar com o fim de ficar momentaneamente liberado em uma 
identificação com a vida que abandona o self. Este fato faz lembrar o mito teológico 
da saída da alma do corpo, que pode ser uma objetivação inconsciente dos momentos 
em que morre a via de um self e este abandona o corpo, quando alguém pode sentir o 
self como um receptáculo vazio que contém somente a lembrança da vida e que leva 
agora apenas restos em decomposição. O sexo da morte, o orgasmo em ato do 
assassinato, é uma curiosatransformação do momento de horror, quando o self da 
criança abandona o corpo e parte para sempre, um Eros que leva para sempre o 
impriting (marca) da excitação da extinção. O assassino, guiado por seus impulsos 
sexuais e que se sente levado a encontrar uma nova vítima, pode estar na borda de um 
terrível pânico, no qual o assassino se sente próximo do assassinato de seu próprio self 
e, assim, ao buscar uma vítima, não somente busca um objeto em que possa projetar a 
vivência ( por reversão ), senão alguém que servirá como um objeto da transformação 
do impulso de ansiedade em excitação e, finalmente, através do assassinato, ao 
desnudamento da excitação.
O sexo da morte é parte da estrutura da maldade. A medida que o sedutor arrasta sua 
vítima para um falso espaço potencial, cria, de maneira distinta, um vazio na cabeça 
da vítima. O momento de desilusão catastrófica é um ponto intermediário entre o 
vazio e a negação, na medida em que a vítima é, agora, partícipe de uma relação que é 
a própria morte. Ao suportar esta relação, o assassino em série se identifica com a 
pulsão de morte (ver “Dois breves comentários”, pg. 35), ainda que aparente ser uma 
pulsão de vida, para conseguir fazer emergir o desejo do outro e após “aplastá-lo”. 
Com uma reversão catastrófica da sorte. Mara a própria vida e a seu princípio e a 
submete aos termos da pulsão que Freud identificou como vinculada ao retorno dos 
seres vivos ao estado inorgânico de falta de excitação. Seu atrativo é matar a 
sexualidade. Seu ato conjugal é uma filiação com a morte, na medida em que encontra 
a vida e a mata; sexo com a morte que deixa sua seqüela de esqueletos, corações 
partidos e terríveis ansiedades em toda a comunidade.
O Dr.Jorge Palermo, que entrevistou Jeffrey Dahmer, declarou na corte:”... creio que 
Jeffrey Dahmer matou estas pessoas porque queria matar a fonte de sua atração 
homossexual... ao fazê-lo matava o que o incomodava” ( Washington Post, Fevereiro, 
no. 87, 1992 ). Talvez isto se deva a terrível dor causada pela vida pulsional, que cria 
objetos de desejo e coloca a pessoa em uma relação com um mundo em que a desilusão 
não é somente uma possibilidade, como, também, que as pulsões – que patrocinam as 
urgências e os gestos – provocam danos diretos através de outras maneiras. Em tal 
caso, a pulsão pode sentir-se como uma força perigosa dentro da pessoa. O erotismo 
do assassino é uma estranha condensação da pulsão e da morte da pulsão, na medida 
em que a urgência por ter relações carnais é negada ao matar a relação, o que resulta 
em um ato carnal que é, também, a morte. Alguns assassinos em série informar a 
chegada da urgência ( de matar ) como a chegada de uma horrível força que toma 
posse deles; porém, podemos perguntarmo-nos se isto não é o testemunho de seus 
esforços vãos por separar-se da vida pulsional, que se mistura, agora, com sua própria 
anticatexis, formando uma matriz de pulsões e morte ou uma combinação patológicas 
13
de pulsões de vida e de morte. Ao confundir o objeto com a fonte da pulsão, o 
assassino destrói o objeto com o fim de voltar a um estado de falta de excitação.
A cabeça oca
A inocência da vítima é, por certo, parte da economia da cena primária. É um 
absurdo sugerir que a vítima de um assassino em série é, de alguma forma, partícipe 
da intencionalidade do ato. Porém, o assassino em série geralmente usa como isca a 
necessidade do outro, que pode ser tão considerável que cause uma “cabeça oca” na 
vítima. Quando Henry Lucas escolhia suas vítimas, nas principais estradas 
americanas, cada pessoa que aceitava o risco o fazia deixando de lado o que conhecia; 
o fazia assumindo um certo nível de risco. Ele era, entretanto, encantador, e os 
“desarmava” uma vez que entravam em seu carro. Sem dúvida, muitos eram pobres e 
não podiam pagar uma passagem. Em outros casos seus carros haviam estragado na 
estrada, estavam cansados e assumiam os riscos. Não há dúvida de que atuar de 
forma encantadora e converter um ser humano, que é teoricamente inteligente, em um 
cabeça oca é, por certo, parte da subjetividade do assassino em série. 
Gostaria de sugerir que o cabeça oca é uma parte importante da estrutura da 
maldade, pois é eroticamente excitante para o assassino, que se sente atraído pela 
inocência, a estupidez e a falta de visão do outro. No que concerne ao assassino, as 
vítimas parecem merecer o que lhes acontece. E, como já foi colocado, quando o 
assassino anuncia sua intenção de matar a vítima, seu discurso esvazia a cabeça do 
outro , criando um vazio a partir da incompreensão muda. Esta cabeça oca é, porém, 
uma manifestação imprimida na criança (como o é o self outrora vivo do assassino) 
agora vítima, e, assim, acontece uma espécie de transferência de inconsciente, na qual 
a vítima experimenta, através do self infantil do assassino com sua força de matar, seu 
self tornar-se mudo e vazio.
Considerando-se que estes assassinatos são, com freqüência, atos de identificação, nos 
quais a vítima é colocada no lugar que antes vivia o assassino, seu componente erótico 
se converte em uma sexualidade onanista, na qual o assassino goza com seu próprio 
aniquilamento. A morte psíquica se torna algo excitante. Depois de descrever com 
grande detalhe de que forma obtinha ver-se a si mesmo como um cadáver frente ao 
espelho, Nilsen conclui: “Devo estar enamorado de meu próprio corpo”. O narcisismo 
patológico se vê, agora, mais claramente: o assassino nunca está com o outro, pois 
todos os demais são meramente cadáveres inocentes de seu próprio self a deriva, 
muito antes da queda.
Infantilização catastrófica
É interessante e pertinente que nos refiramos ao seqüestro de uma pessoa adulta por 
parte de outra como“kidnapping”(kid=criança +napping=desprevenido,adormecido).
Quando um adulto é seqüestrado, talvez para ser morto, existe nesta palavra o 
reconhecimento implícito do efeito do ato: submeter o outro a uma infantilização 
radical e catastrófica. Com freqüência a vítima é atada e imobilizada. Literalmente 
não pode caminhar e volta a adotar uma posição infantil. É comum que as vítimas 
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tenham os olhos vendados e não tenham sequer a capacidade visual de uma criança; 
se lhes ordena que não falem, são deixados a se sujar com suas fezes e urinas e 
também comem com as mãos. Uma jovem mulher, recém libertada depois de seu 
seqüestro, na Inglaterra declarou que “estava aprendendo de novo a caminhar”, e 
sabemos, que os reféns e as vítimas de seqüestros, pelo nível de infantilização ao que 
foram submetidos, necessitam de tempo para recuperar certas identificações adultas.
Talvez possamos ver, então, a raiva inconsciente dirigida em tais pessoas contra a 
vivência infantil. A vítima sofre agora uma infância terrorífica que parece não 
terminar nunca. Aqui, contida na vivência da vítima, no que os psicanalistas chamam 
de contratransferência, existe algo do inferno nfantil que o sujeito leva consigo, que 
agora se transfere à vivência do outro self. É uma infância que recria de forma 
interminável a sensação de uma época maligna em que a criança, na qual a dor 
mental e o sofrimento desconstroem o sentido de tempo como sensação e o transforma 
em um tempo sem saída, o tempo que caracteriza a vida no inferno. Em tais 
momentos, o sujeito pode estar transladando para a vítima algo de sua mentalidade; 
que nunca teve uma infância suficientemente boa e que tampouco nunca pode 
desenvolver uma capacidade adulta para manejar as diversas partes do self. O 
sofrimento do seqüestro, esta infância interminável, é um lugar bem conhecido para o 
estudo mental primitivo que ocupa a vida do vilão.
A criança que sofreabusos
Junto ao temor coletivo que inspira a imagem do assassino em série, existe outra 
ansiedade, que há cada tanto chega a constituir uma espécie de pânico em massa, que 
decorre da indagação que as pessoas fazem sobre quantas crianças são vítimas de 
abusos sexuais ou agressivos por parte de seus pais. O fato de que tais abusos não 
sejam pouco freqüentes alimenta o grau de alarma; porém, dada a impossibilidade de 
determinar exatamente o quanto eles ocorrem, se abrem as portas a um novo tipo de 
horror. Este tema será analisado em maior profundidade no próximo capítulo, mas 
por ora é importante definir o abuso da criança como centro de nosso estudo.
A estrutura da maldade, tal como a defini, se baseia na violação de uma fé que a 
criança tem na bondade de seus pais. Por mais que os processos projetivos da criança 
invistam a seus pais com qualidades infames, cada criança saberá, em última 
instância, a diferença entre suas fantasias sobre seus pais como monstros ( em seus 
sonhos, devaneios, ataques reivindicatórios deliberados, etc.) e o momento em que o 
pai faz algo que é verdadeiramente monstruoso, que imediatamente se diferencia da 
alternativa especular projetiva.
Como este tema é muito vasto, devido às suas múltiplas variáveis - segundo a idade da 
criança, o sexo do abusador e a natureza do abuso - somente posso analisá-lo de 
forma abstrata neste trabalho. Fundamentalmente a criança vivencia a estrutura da 
maldade tal como a apresenta o pai. O objeto bom no qual a criança confia muda 
subitamente sua natureza e trai a confiança. A criança fica estupefata e sua própria 
vulnerabilidade comum se volta contra ela.
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A criança é, agora, malignamente dependente do pai violador, pois com freqüência 
não existe ninguém a quem a criança possa recorrer. Como tal, a dependência da 
criança para com o pai violador pode aprofundar-se, ainda que ninguém perceba no 
comportamento da criança que está, cada vez mais manifestamente distante do pai. A 
psicanálise soluciona os aspectos psíquicos, não os do comportamento, e a criança 
abusada se sentirá malignamente atada ao pai violador, o que gerará uma relação 
“mais próxima” com o próprio objeto que a traiu.
A criança vivenciou algum tipo de morte em sua psique.No caso extremo, se as 
observações dos que tratam dos casos de personalidade múltipla são válidos, a criança 
não tem outra opção senão criar selves alternativos a cada momento, criar selves 
infantis que não estiveram presentes, por assim dizer, durante o momento da violação.
Entretanto, em sua vida adulta, esta pessoa sentirá uma permanente presença de uma 
forma especial de dor, que será, em alguns aspectos, interminável. Não se trata, 
simplesmente, de uma sensação de perda causada pela perda do pai bom, que se foi 
para sempre dado que se tornou malvado; tampouco, é a perda do self que morreu ao 
continuarem os atos de violação; tampouco; tampouco é a morte das possibilidades de 
futuro que poderiam ter sido vividas com o bom pai, se houvesse sido possível.
A inocência geradora é essencial para a vida de cada pessoa que se desenvolve. É 
importante ter dentro de si fé em uma “época boa”, uma época em que tudo estava 
bem, e esta idealização do passado, com freqüência, faz com que os indivíduos 
outorguem, retrospectivamente,`infância (e aos pais) uma simplicidade e uma 
bondade que realmente, em um exame mais detalhado, não é totalmente honesta. 
Porém, é um fator claro em nossas vidas que a “dita” inocência deve ser conjurada, 
como base para obter algum tipo de ilusão que seja essencial em nossa vida, ainda 
que saibamos que tal inocência seja um artifício psíquico artístico.
A inocência geradora cria uma “tela-em-branco” que se renova de forma permanente, 
na qual o sujeito pode projetar seu desejo. A criança, por exemplo, necessita cindir as 
partes más de sua própria personalidade, com o fim de disseminar o desejo, sem um 
encerramento prematuro devido às ansiedades persecutórias ou à culpa.
Ainda que a mãe ou o pai tenham sido “monstruosos em um momento”, a reparação 
da criança ou a reparação dos pais deve reconstruir um novo pai ou uma nova mãe. a 
quem agora se perdoa os acontecimentos do passado e o inocente pode caminhar 
livremente.
A criança que sofreu abusos não pode criar a inocência geradora que permite ao self 
crer nas “telas-em-branco”, nas quais o desejo pode projetar-se e reprojetar-se de 
forma permanente. A criança, tampouco, pode usar a mesma “tela-em-branco” para 
visualizar as identificações projetivas das partes monstruosas de sua própria 
personalidade, que, com freqüência, se alojam convenientemente nos pais. O paia que 
abusa da criança suja a “tela-em-branco”, que nunca mais poderá estar branca. Não 
pode haver uma relação íntima com um outro real, ou com os objetos internos da vida 
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projetiva cotidiana, que não sofra a tintura do real, que invadiu o imaginário e deixou 
uma cicatriz em seu lugar.
A criança violada é uma pessoa que perdeu, para sempre, a inocência geradora. Esta é 
uma profunda tragédia, e é um fato alarmantemente comum. É, talvez, por este 
motivo que aqueles que se convertem em protagonistas de um festival contemporâneo 
de vítimologia, subestimam os efeitos trágicos do abuso. Pode parecer que aqueles que 
insistem em provas absolutas e irrecuperáveis da inocência do self e não nas origens 
da inocência geradora, assim como aqueles que não suportam ter responsabilidade 
sobre sua própria destrutividade sem que possam somente projetá-la na mãe ou no 
pai, estão inconscientemente e histericamente falando de uma verdade. Os inocentes 
malignos, que insistem na inocência absoluta do self durante a vida e tem objetos 
( mães, pais, “homens”, homossexuais, etc.) de perpétua maldade, que ocupam suas 
mentes dia e noite, falam da necessidade e simpatia que todos temos pela crença na 
importância da inocência.
Ser violado mentalmente
Em um capítulo anterior ( ver história ), escrevi sobre o esforço de Harold por 
recuperar-se de seu passado recente, quando sua mulher desapareceu de sua vida, e 
sobre como seu discursos sobre os lindos detalhes de sua vida no passado recente 
constituía um esforço por transformar o passado em uma história. É agora possível 
continuar estudando sua situação à luz de um esforço muito particular de sua parte 
por recuperar-se do que havia sofrido.
Quando Juliet abandonou Harold, ele permaneceu durante meses sem indício algum 
de para onde ela havia ido. Porém, um dia, em uma convenção de construtores em 
Birmingham, viu uma mulher que o olhava com uma concentração pouco usual. 
Pensou que, talvez, já a conhecesse , porém não estava seguro. A sorte quis que, pela 
tarde, se encontrassem na cafeteria e à noite saíram para beber algo. Depois de haver 
conversado, durante mais de uma hora, sobre as empresas de construção e de seu 
interesse pela arquitetura, Isabel pareceu sugerir que conhecia a Juliet. Harold, 
inicialmente, penso que a havia escutado referir-se a Isabel, porém logo descartou a 
idéia.Havia imaginado Juliet tantas vezes, a havia visto em tantas mulheres que 
passavam a seu lado, havia escutado tanto sua voz a chamar-lhe, que estava certo de 
haver se enganado, apesar disto se gerou nele o estado mental alterado que lhe 
sobrevinha a cada vez que recordava de Juliet.
É fácil, assim, imaginar o profundo shock de Harold quando, um instante depois, esta 
mesma noite, tornou-se evidente que Isabel não somente conhecia Juliet senão, e ainda 
mais, que recentemente haviam trabalhado juntas em uma construção, na parte 
ocidental do país, em Cornwall. Harold ficou mudo durante um longo tempo. Foi 
ficando tarde, o casal foi a outro lugar, e já eram as primeiras horas da madrugada. 
Haroldtinha a sensação de que o tempo não passava, porém sabia que estava em 
outra dimensão de tempo e lugar.
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Cuidadosamente fez uma pergunta. Isabel sabia onde estava Juliet? Não perguntou 
diretamente porque sentia que não era possível fazê-lo nestas circunstâncias. Decidiu , 
então, dizer-lhe que supunha que Juliet havia ido ao noroeste de Gales, para visitar 
uma tia. Isabel disse-lhe que não sabia onde estava Juliet neste momento. Disse a 
Harold que não sabia se Juliet havia estado, em alguma ocasião, em Gales. De fato, a 
partir do que ela falou , e ele não sabia exatamente como soube, Harold sentiu que 
Isabel confirmava que em um certo momento Juliet havia estado em Gales; mas não 
estava ali agora.
Exausto, mas de todas as formas “enganchado” com Isabel, Harold saiu com ela todas 
as tardes durante duas semanas e, às vezes, suas conversações duravam seis ou oito 
horas seguidas. Em cada saída ele tentava falar sobre Juliet, ficava, porém, com uma 
sensação de rechaço, embora logo Isabel dizia-lhe algo mais; que Juliet havia estado 
em Edimburg há cerca de três meses para fazer uma exposição de seus trabalhos, que 
um amigo dela –Jeffrey – havia lhe enviado um catálogo de uma exposição de 
arquitetura na Noruega e que ficou surpresa ao ver o trabalho de Juliet estava em 
exposição. Harold perguntava-se como era possível que Isabel não soubesse do 
paradeiro de Juliet. Ela, somente agora, havia decidido fazê-lo saber de Edimburgo. 
Entretanto, a cada momento que chegava perto de revelar o paradeiro de Isabel, ela 
calava ou o fazia sentir que ele estava querendo o impossível. “ Se tu a conheces, se tu 
soubesses como ela é”, dizia, “ tu saberias por quê é inimaginável que eu te responda 
uma pergunta direta sobre Juliet”.
O tempo passou. A necessidade de Harold de ver Isabel se transformou em uma 
adição. Minha interpretação, de que era como se Isabel fosse portadora de mensagens 
de Juliet e de que ao falar com Isabel estava falando com Juliet, ele aceitava como 
lógica, cada vez que eu falava, porém necessitava de uma recordação fenomenológica 
quase constante, já que queria contato com este “fato” cada vez que ele ocorria. 
Entretanto sempre parecia lógico, e por certo que quase o resgatava de uma profunda 
confusão que o dominava. 
Uma ou outra vez Harold descreveu de que forma Isabel se sentia intrigada com ele, 
como ela se comovia com ele, e como lhe havia oferecido um lugar para ficar em seu 
apartamento na escócia. Depois de várias semanas de se sentir a prova, ele pode tomar 
consciência do aspecto ameaçador do oferecimento de Isabel e pode trazer o tema 
para a análise. Pois Isabel era, para orgulho dela, uma mulher que mantinha relações 
sexuais com qualquer homem que lhe caía nas mãos. Harold era atraente e a primeira 
vez que ela o encontrou, depois de descrever várias de suas últimas conquistas sexuais, 
lhe mostrou a diversos arquitetos, presentes na convenção, com quem havia tido 
relações sexuais nas últimas semanas. Disse que queria manter relações sexuais com 
ele. Harold respondeu negativamente, da forma mais sem libido possível, de tal 
maneira que Isabel, aparentemente, passou a ocupar um papel bastante curioso: ele 
necessitava ser cuidado e, portanto, isto seria o que lhe ofereceria. Entretanto, ela 
havia dito que se Harold e ela tivessem relações sexuais seria o fim da relação. “Nunca 
desejei o mesmo homem mais de uma vez. Me agrada foder por foder. Assim, quando 
termina, termina. Não gosto de sentimentos nem de lembranças, e somente penso na 
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próxima vez em que me deitarei com alguém. Assim que nos deitássemos, eu diria 
embora e passaríamos a ser história”.
Isto não tinha interesse para Harold. Acabaram tendo intimidades e parece que isto 
produziu pouca diferença; enquanto Isabel permaneceu na periferia de sua vida suas 
histórias sobre seus relacionamentos com homens que conquistava pareciam ser 
apenas bravatas; porém não era assim com seu conhecimento sobre Juliet. Qualquer 
detalhe que pudesse explicar para Harold o que havia acontecido era habilmente 
manipulado por Isabel. As informações sobre Juliet, como observou Isabel, deixavam 
Harold “pálido”.
Na análise, adotei a atitude que ele estava levando seu trauma por um caminho auto-
destrutivo. Em uma posição vulnerável, de fato em um estado de encantamento, ele 
estava se convertendo em um adito de Isabel, que se dizia boa mas utilizava sua 
necessidade e seu encantamento contra ele. Depois de um certo tempo ele estava 
consciente de que ela estava “fodendo sua mente” (dele), porém não entendia porque 
permanecia com ela. O que o fazia voltar sempre para ela?
Um fato do passado, um fato tão traumático como a devastadora desaparição de 
Juliet, ela o deixou sem nenhuma notícia, nem sequer uma pista, em torno da qual ela 
pudesse imaginar ou falar dela. O que ela havia feito estava além de seu conhecimento 
ou de suas crenças, e, como tenho sustentado, além do real; aquilo que está além do 
conhecimento , porém que está ali e se relaciona com a vida e com os vivos. Isabel 
parecia incorporar o real; ela sabia o que ele não podia saber. Entretanto ela não 
podia ser interrogada. Suas ocasionais informações sobre onde havia estado Juliet não 
eram informativas mas profundamente traumáticas. Dizia o que dizia para 
surpreendê-lo e para manter seu poder sobre ele. Somente graças a um intenso 
trabalho analítico pode Harold compreender que quando falava com Isabel ele 
estava falando do trauma, ao real que somente quebrava seu self; que Harold estava 
falando com a própria morte. Morte no sentido de término. Procurar falar com Isabel 
era pedir um significado a alguém cujo objetivo era destruir o significado; que 
oferecia conhecimento para violar sua mente e traumatizá-la.
Isabel não era uma assassina em série, isto era evidente, porém tinha um 
conhecimento inconsciente do campo da morte. E, de fato, incorporava o assassinato. 
Ela o alcançava ao foder com os homens e deixá-los. Uma “femme fatale”. Ao acordar, 
junto a ela, talvez mais de um homem tenha se perguntado, não apenas com quem 
estava mas com quem havia passado a noite. A lembrança do momento sexual seria a 
lembrança de haver dormido com a morte, com a destruição da intimidade. 
Entretanto,seu controle da relação com Harold sugere, desde meu ponto de vista, que 
ela conhecia a estrutura da maldade. Ela se oferecia como algo bom; explorava a 
necessidade do outro. Horrorizava o outro com um fato real, que com o tempo ela 
passava a incorporar. Ela se transformava em alguém incrível, embora não fosse 
impressionante como pessoa ( Harold comentava que ela não era mito interessante e 
não conseguia defender as atitudes que adotava em suas longas discussões sobre 
política e temas sociais e eróticos ) ela expressava presença de algo, algo poderoso. 
Afortunadamente para Harold, pude ver que ela era malvada, que era uma espécie de 
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parca (NT:morte, ser imaginário que tira a vida) que violava sua mente e que, neste 
sentido, era parte da linhagem inaugurada pelas ações de Juliet desde o real.
Harold também pode perceber que sua relação com Isabel não somente sustentava 
sua relação com Juliet, mas que também continuava sua busca por objetivar através 
da ação um trauma muito antigo com sua mãe. Estar com Isabel era falar-lhe da 
vivência de morte e de ser assassinado. Neste sentido, ao menos quando pode 
finalmente entender, sua repetição adquiriu significado para ele e pode abandonar o 
objeto que o havia traumatizado.
Analisei o caso de Harold porque sua situação combina várias das vivências mais 
comuns da estrutura da maldade. Existem certas pessoas que são amantes em série, 
quefodem o objeto com o fim de criar a antítese do significado.. Tais atos são uma 
espécie de assassinato. Assim são também as pessoas que levam dentro de si o 
conhecimento inconsciente de sua própria traumatização desde o real e transferem 
esta situação para as relações, explorando a vulnerabilidade de uma pessoa em 
particular, que sentem que tem necessidade de um certo tipo de oferecimento, um 
oferecimento que destrói a mente. Neste sentido, a compreensão por parte de Isabel da 
necessidade inconsciente de Harold sela um contrato sadomasoquista; porém é mais 
destrutiva que o ato perverso, pois Harold estava em uma posição em que poderia 
enlouquecer e o desejo inconsciente de Isabel era matar a saúde mental do outro e 
destruir sua mente.
A mulher agredida
A gente se pergunta porque uma mulher agredida por seu companheiro 
continuamente volta para ser vitimada uma vez mais. Indubitavelmente existem 
muitos fatores pelos quais a pessoa retorna para a cena: algumas por culpa 
inconsciente, outras para participar de uma cena de prazer masoquista, algumas 
porque se convertem em parasitas dependentes de seu companheiro, outras porque 
tem filhos e laços familiares. Fortes com o homem violento e, simplesmente, não 
podem fazer a separação que é necessária para sua sobrevivência a longo prazo. E, 
obviamente, muitas mulheres estão simplesmente tão aterrorizadas com o que pode 
acontecer se chegam a ruptura definitiva, imaginado que serão perseguidas até chegar 
a um resultado ainda mais violento. O refúgio é privilégio da classe média alta e das 
classes superiores. Poucas mulheres da classe média ou da classe trabalhadora podem 
economicamente dar-se o luxo de desaparecer com êxito da vida de um homem 
violento sem a proteção institucional de um centro para mulheres.
Marjorie começou sua análise com um leque de sintomas, muitos dos quais, em última 
instância, revelavam seu temor seu temor a uma perda de autocontrole que poderia 
pô-la em uma situação de perigo frente a seu ambiente familiar. Não andava de metrô 
porque tinha medo de desmaiar e portanto andava de ônibus. Não entrava em 
açougues porque temia ver sangue, poderia desmaiar e quebrar a cabeça; ninguém 
poderia agir suficientemente rápido para segurá-la e evitar a queda.
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Ao começar a análise vivia com um homem bem dotado e pitoresco que havia tido 
uma infância extremamente carente. Seu havia se suicidado, sua mão era maníaca-
depressiva e o estimulava sexualmente, a ele e a suas irmãs, desde pequeno. Tinha, 
ocasionalmente, horríveis ataques de violência quando agredia Marjorie. Ela vinha, às 
vezes, para a sessão com o rosto machucado e uma vez com uma fratura.
A análise deixou seu companheiro muito enciumado e Marjorie, por seus próprios 
motivos, o havia atiçado, convidando-o a imaginar-me como um “homem ideal” e, por 
certo, chamando atenção sobre sua inadequação. Não o deixava, entretanto por 
nenhum motivo. Sua “atração” por ele se converteu em um objeto da análise; 
inicialmente suas proezas fálicas, que eram parcialmente verdadeiras, e sua 
capacidade para ser “atroz” e os comportamentos que ela gostaria de ter mas que se 
não se animava e, finalmente, condutas mais insidiosas. Houve ocasiões em que ela 
realmente tentou separar-se dele, com freqüência nos dias seguintes em que ele a 
havia agredido. Depois, ele pedia perdão, não de uma forma abjeta, mas com dor, 
jurando que a amava, dizendo que nunca mais a iria agredir. Lembrava o passado em 
que viveram juntos e dizia-lhe o quanto era promissor o futuro que poderiam 
compartir; assim forjava um espaço potencial a partir das desditas dos últimos dias. 
Com o tempo ela começava a derreter-se. Ela o amava e ficariam juntos. Marjorie 
vivia dentro de uma nova confiança que procurava encontrar; e, então, um dia, como 
acontecia depois de haver bebido muito, ele perdeu a paciência e, numa mudança 
brusca de comportamento, deu-lhe uma surra. Golpeada, debilitada, desorientada, 
Marjorie vinha a análise tendo passado por um processo que cada vez era mais 
conhecido.
A esta altura da análise havíamos trabalhado de forma exitosa suas expressões 
sintomática: seu temor em desmaiar expressava o desejo de seu sustentada (to hold) e 
amparada pelas pessoas. Sua vivência era que isto não ocorria. Esta vivência se 
baseava, em parte, no estridente determinismo do self de sua mãe e na rivalidade da 
paciente com ela, a quem Marjorie superava sendo ainda mais confidente em seu self 
do que a mãe conseguira ser. Sua vivência de mim na transferência, entretanto, 
liberou um conjunto diferente de sentimentos e de representações do self e dos 
objetos, e, finalmente, pudemos chegar aos desejos subjacentes.
Afortunadamente Marjorie pode ver que sua participação, nas surras que levava de 
seu companheiro, era a atuação do desejo de estar sob o maravilhoso cuidado do 
outro, porém logo seu desejo infantil era violentamente desenganado. Sua 
vulnerabilidade para a sedução do outro expressava tanto o seu desejo de reconectar-
se com os prazeres infantís, depois de uma ruptura terrorífica, como sua lembrança 
da permanente disposição de sua mãe para com ela em certas formas e maneiras. 
Conseguia objetivar em forma crescente o processo em que se encontrava, e, após, 
comunicava a seu companheiro que, parcialmente furioso pelo insight, aceitava que 
agora havia um sentido e aceitou psicoterapia após uma longa luta. Finalmente 
puderam viver em uma relação turbulenta, mas sem violência.
Que isto tem a ver com a estrutura da maldade? Cabe lembrar que eu estou pondo 
ênfase no processo da maldade, que implica sedução, a promessa de um falso espaço 
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potencial, desenvolvimento de uma dependência estúpida que esvazia a mente, 
surpreende, trai, etc.. A vítima das agressões pode participar de uma relação de objeto 
inconsciente que constitui uma lembrança de suas mais primitivas relações objetais, 
nas quais trata de aceitar os aspectos curativos da sedução do outro para com ela a 
fim de viver durante um tempo um universo que a possa nutrir. Sugiro que a 
seqüência dos acontecimentos não nos diz nada sobre um contrato sadomasoquista, 
mas, sim, sobre a necessidade que é destruída pelo objeto de uma confiança sagrada.
E sobre o agressor? Como o assassino em série, se bem que – obviamente -em menor 
medida, esta pessoa vive através de sua própria vivência de uma surra ao self infantil, 
a experiência de que o encanto do falso self da mãe ou do pai é utilizado por eles para 
recuperar a criança de um abuso ritualizado. Em tal sentido, então, a sedução 
malvado que agride pode, às vezes, ser um ato inconsciente de negação. O 
companheiro de Marjorie construía um falso self, um self encantador e tortuoso, para 
manejar o potencial destrutivo de sua mãe e de outros familiares com quem vivera. 
Assim, encantava Marjorie para voltar a uma organização construída mediante falsas 
reparações (da mãe) com que se identificava (convertendo-se em um falso encantador, 
que busca a todo custo evitar sua fúria), ele punha em jogo um mundo de alianças sem 
sentido que esvaziavam o self de toda a paixão. O ato de “desmascarar” a si mesmo, 
quando andava como um trovão pela casa, jogando objetos e agredindo Marjorie, 
revelava o esforço por atravessar um falso self, um falso self que, certamente, liberava 
verdadeiros estados de self de forma primitiva e sem experiência.
Marjorie e o companheiro se beneficiaram com o tratamento analítico e as agressões 
cessaram. Porém, em minha opinião, algumas mulheres voltam ao objeto que as 
traumatiza porque ao fazê-lo re-visitam as experiências de suas própriasorigens 
individuais. Algo que não provém de nenhum lado, algo que chega sem avisar, que 
emerge como um ruptura violenta da presença confortável da mãe ou do pai. A 
criança pequena é golpeada com violência. Porém quando a tormenta familiar 
termina, a criança e o pai voltam a uma situação familiar que não deixa lembrança 
alguma do fato de acaba de ocorrer; de fato, e como se não houvesse acontecido. As 
mulheres que voltam aos homens que as agridem devem, ocasionalmente, fazê-lo 
devido à sua misteriosa re-criação daquela ruptura violenta que emerge de uma 
relação aparentemente segura, que é boa.
A situação de Marjorie é mais complexa. O trabalho psicanalítico com casais revela 
que os casais, habitualmente, projetam partes de suas próprias personalidade e as de 
seus pais no outro. As ações violentas de Gerry eram sua representação da mão não 
vista da violência paterna.
A aliança sadomasoquista
O reconhecimento psicanalítico de que as relações sadomasoquistas perversas são um 
meio de transformar os efeitos potencialmente traumáticos da vida pulsional, as 
vivências emotivas e as intimidades interpessoais em um fato controlado, em que não 
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ocorrem catástrofes, é, sei, bem reconhecido na bibliografia, já bastante vasta, a esta 
altura, sobre o tema. Não revisarei esta bibliografia, porém seria confuso excluir este 
fenômeno clínico do tema que estamos tratando.
É claramente óbvio que um casal perverso atua a estrutura da maldade. Em muitos 
dos rituais há um momento inocente orquestrado. Jacob, um analisando de pouco mais 
de vinte anos, me disse que ele convidava um a mulher para ir a seu apartamento com 
a sensação, bastante misteriosa, de que ela poderia andar no que ele andava. Mas 
nunca estava totalmente seguro. Suas aventuras noturnas sempre começavam com um 
Jacob que era um anfitrião muito amável e respeitoso. Gostava de cozinhar e, 
geralmente, preparava uma saborosa comida. Era um comediante por natureza, 
divertido e fazia piadas que produziam, em suas comensais femininas, risos femininos 
ou de menininhas.
Não acredito que suas amigas de fato se embriagavam, porém fingiam uma espécie de 
intoxicação e estabeleciam um ambiente de vulnerabilidade dentro delas que excitava 
a Jacob. Em algum momento da noite, geralmente depois da ceia, sentados no sofá ou 
olhando um livro juntos, ele, abruptamente e sem preparação alguma, dizia: 
“Gostaria de te atar. Te importas que eu o faça?”. Este enfoque extremamente direto 
nunca deixava de surpreender. A mulher o olhava surpresa e com movimentos de 
cabeça demonstrava concordar. Poucas vezes me comentava dos casos que falhavam. 
Estou seguro de que isto acontecia e ele devia ser rechaçado por algumas mulheres, 
terminando, assim, a noite por motivos muito claros. Ele nunca tocava a mulher antes 
de seu anúncio, nem tentava forçá-la fisicamente
 Como escreveu Smirnoff sobre a atividade sadomasoquista, Jacob só anunciava as 
possibilidades contratuais. Fiquei surpreso ao constatar quantas mulheres aceitavam. 
Certamente depois do shock inicial, havia pouca ou nenhuma dúvida sobre a 
passagem imediata ao ato. Jacob levava a mulher para o quarto e dava as instruções. 
Como é comum em tais casos, ele mudava sua personalidade de anfitrião da cena, 
divertido e animado, para uma presença ameaçadora; a ameaça, entretanto, estava 
contida no seu conhecimento das instruções. “Direi o que vais fazer. Te inclinarás 
sobre a cama, me dando ás costas. Bem... agora dá volta. Bem... agora senta e tira a 
roupa. Os sapatos primeiro. Bem ...agora a roupa de baixo” e, assim, seguia o ritual 
de tirar a roupa conforme suas ordens, enquanto ele também de despia e ia até sua 
cômoda e pegava as correias que utilizava para atar sua hóspede na cama, deitada de 
costas.
Quando a mulher estava nesta posição, ele dizia “... agora estás totalmente sob meu 
poder” e agregava “... não te preocupas?”, a partir do que a hóspede geralmente dizia 
“... não, tenho confiança em ti” ou “... bom, dependes do que vais fazer”. Para Jacob, 
uma vez que a mulher indicava que confiava nele e que ele poderia fazer o que 
desejava com ela, o ato terminava. Ás vezes, chorava; outras, somente se sentava ao 
lado da mulher, depois de tê-la desatado, e falava sem parar durante horas. Poucas 
vezes chegava a fazer amor neste primeiro encontro, mas, ocasionalmente, o fazia, e 
nunca sentiu que existisse conexão entre os dois atos, salvo, obviamente, que atar a 
mulher o excitava muitíssimo e que tinha a ver com estabelecer um campo de 
confiança, o que fazia com que a relação sexual fosse muito mais satisfatória para ele.
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Ele ficava confuso com sua necessidade de tudo isto, embora conseguisse visualizar 
que tinha fantasias inconscientes sobre o potencial daninho de uma relação carnal. 
Era uma relação na qual um podia estar à mercê do outro e suas ansiedades sobre a 
cena primária se converteram em um elemento importante de seu tratamento.
Havia idealizado seu pai e visto a mãe como uma mulher castradora e temível. Ele 
dizia ter vivido sua infância permanentemente aterrorizado por ela.. Jurava que 
quando ela entrava em seu quarto sentia que seu pênis se encolhia, e dizia que esta 
sensação era uma das lembranças mais precoces do efeito de sua mãe sobre ele. Nunca 
sabia a voz adequada para falar com ela; sua voz subia uma oitava. Mais ainda, era 
evidente para ele que ela considerava que a resposta dele à presença dela era irritante 
e a mãe lhe dizia “ ... por Deus, que se passa contigo?”, enquanto ele transpirava e 
tremia por sua presença. Ele nunca pode responder a esta pergunta que ela lhe fazia. 
Não sabia a resposta. Sua ma~e era muito atrativa, pitoresca e inteligente, que gostava 
de quase todos, incluindo a seus irmãos, e ele só podia chegar à conclusão de que algo 
realmente se passava com ele.
Considerações de ordem ética fazem que seja impossível descrever a natureza exata 
do que se passava, mas posso dizer que, lamentavelmente para esta dupla mãe e filho, 
houve uma série de acontecimentos chocantes entre eles, quando o filho tinha menos 
de um ano.. A mãe foi vitima de um grave trauma durante o primeiro ano da criança 
e, de fato, em várias ocasiões o matou e o ressuscitou através da culpa e de uma 
grande valentia pessoal, a medida que tratava de superar seu próprio trauma e poder 
cuidá-lo. Ela sabia, entretanto, como lhe diria muitos anos mais tarde, que seu estado 
mental havia sido atingido durante este primeiro ano de vida e que por mais que 
buscassem – e, de fato, encontraram uma solução de compromisso entre eles que era 
bastante comovedora – manterem-se calmos um frente ao outro, isto era simplesmente 
impossível.
Um dos aspectos mais interessantes desta análise foi a declaração do paciente de que a 
mãe freqüentemente o olhava com um olhar malvado, um mau olhado, que fazia lhe 
correr um calafrio pela espinha. Ainda que o leitor deva confiar em que os traumas de 
sua relação precoce com a mãe constituíram a violação da construção, imaginária e 
ilusória, de uma realidade compartida pela chegada do real, do que quebra a paz 
mental da criança, porque está mais além de seu olhar e de sua imaginação, esta era a 
base, em minha opinião, de sua reconstrução de tal tipo de eventos nos atos 
sadomasoquistas que exercia com suas hóspedes femininas.
Os termos da fenomenologia da maldade estavam presentes. O oferecimento de um 
self bom. A criação de uma espécie de dependência e vulnerabilidade. O súbito shock 
das vítimas pela surpresa. Uma espécie de infantilização. Porém, logo uma 
recuperação. As pessoas que atuam em um ato sadomasoquista ritualizam o “toque” 
do outro como uma vivência próxima à morte. Atuam os aspectos do assassinato do 
self, porém sobrevivem.

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