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1 A CONCEPÇÃO DA GEOGRAFIA CRÍTICA A influência desta corrente de pensamento na Geografia só ocorreu após a 2ª Guerra Mundial... “É somente no limiar da crise do pensamento tradicional que as idéias de Marx virão à tona no debate da Geografia. Tal processo se inicia no pós-guerra, e adquire alguma intensidade nos anos cinqüenta, já no bojo de uma perspectiva de renovação da Geografia.” Segundo Horacio Capel, o aparecimento da Geografia Crítica nos Estados Unidos ocorreu em 1969, quando foi apresentado na reunião da Associação dos Geógrafos Americanos a revista Antipode. A Radical Journal of Geography editada por Richard Peet . Cinco anos mais tarde, houve a organização da Geografia Crítica americana através da criação da Union of Socialist Geographers e da associação Socially and Ecologically Responsible Geographers ( SERGE ). ( 1981, p. 427 ). Capel ainda afirma que a Geografia Crítica surgiu na Europa, em parte, dadas as condições internas e também ao influxo da escola americana, que teve forte influência em países como a França. Neste país, a Geografia Crítica teve, a partir de Yves Lacoste e a criação da revista Herodote, em 1976, uma intensificação na formação de um expressivo grupo de geógrafos críticos. Matriz teórica 2 O pensamento de Marx surgiu como uma visão geral da história humana, detendo-se com maior profundidade nas características da sociedade capitalista, e visualizou a partir das contradições inerentes a esta sociedade, uma profunda transformação social. Enfim, o marxismo caracteriza-se por um pronunciamento teórico radical. Pretende ser uma cosmovisão e uma revolução completa. Esta corrente não pode ser caracterizada por uma ética ! O ponto de partida do marxismo é o de ter uma concepção da sociedade e história humana que explicita os grandes movimentos destas mesmas sociedade e história e, com isso, acredita ter condições de vizualizar o cenário futuro. Horacio Capel indica que o marxismo foi considerado até a Primeira Guerra Mundial como um pensamento que proporcionava uma visão completa da sociedade e da natureza, ( 1981, p. 439 ) tendo assim proporcionado uma espécie de um novo padrão científico, pelo qual seria possível um forma global de se analisar a realidade. Após a Grande Guerra, a interpretação sobre o marxismo primou por uma discussão histórica; já não se alimentava a pretensão desta corrente ser considerada uma nova forma de fazer ciência, mas fundamentalmente uma nova forma de ver a sociedade. Por este enfoque a história humana seria compreendida por trocas nos sistemas sociais decorrentes do esforço humano em dominar a natureza, e esta mudança seria permeada por um progresso que levaria a um fim. 3 A Geografia Radical alega que os elaborados métodos quantitativista, em função de sua base de apoio, são enfoques que não trazem contribuições para a compreensão da sociedade, além de ter uma função mitificadora sobre a realidade; por trás da “parafernália” tecnológica há um subjacente objetivo de não revelar os processos sociais, as dinâmicas das lutas travadas no bojo da sociedade. ( Mendoza et alli, 1982, p. 143 ) A Geografia Crítica no Brasil Acredita-se que o grande gestor da Geografia Crítica foi o momento histórico que compreendeu o início de abertura política, a volta dos exilados políticos e a realização de várias greves de operários, sobretudo no Estado de São Paulo ( o principal pólo industrial do país ), enfim, uma época propícia à contestação ! Com o estabelecimento da abertura política brasileira a partir da década de setenta, o marxismo tornou-se um verdadeiro ponto de referência na Geografia para ajudar a compreender o que se passava e o que passou. Cabe destacar, no entanto, que este vigor da Geografia Crítica foi mais fácil ser verificado no ambiente universitário e muito menos nos órgãos de planejamento do governo. Numa primeira avaliação, percebe-se que a Geografia Crítica, que atraiu tantos quadros jovens à época, era emulada por um processo político que procurava restabelecer a ordem democrática e lutar pela justiça social. 4 No entanto, verifica-se, ao longo da década de 1980, que ocorreu uma inflexão neste processo, o que levou Oliveira ( 1997, p. 155 ) a observar: “A partir de 1989, esta Geografia (a Crítica) começou a apresentar seus primeiros sinais de esgotamento diante da realidade em transformação, expondo seus limites teórico-metodológicos. A queda do muro de Berlim, o fim da URSS, aliados à crise do marxismo e à falência dos paradigmas da modernidade na explicação da nova realidade em mudança, inclusive o da teoria social crítica, revolucionam o pensamento e a produção geográfica em todos os sentidos e direções.” GEOGRAFIA CRÍTICA OS GEÓGRAFOS E A CONJUNTURA SOCIAL A partir da segunda metade da década de 70, os geógrafos passaram a ter preocupação maior com a problemática social, considerando que o desenvolvimento industrial passou a exercer grande impacto sobre a natureza e a sociedade, degradando e dilapidando os recursos naturais; A situação tornou-se grave nos países desenvolvidos e muito pior no países subdesenvolvidos; Assim, diante de tal situação, os cientistas em geral e os geógrafos em particular não poderiam ficar de “braços cruzados” como meros espectadores. Os geógrafos deveriam ser combatentes das causas, comprometidos com os interesses da sociedade; 5 Duas correntes fortes surgiram: a Geografia Ecológica e a Geografia Crítica (ou radical); A Geografia Ecológica tinha como objetivo a defesa do meio ambiente, sendo esta o ponto principal de sua argumentação, de seu trabalho; A Geografia Crítica (ou radical) não apresenta uniformidade de pensamento, não forma propriamente uma escola. Costuma- se catologar neste grupo geógrafos que se conscientizaram da existência de problemas muito graves na sociedade em que vivem e compreenderam que toda a Geografia, tanto a tradicional, quanto a Quantitativa e a da Percepção, embora apregoando de neutras, tem um sério compromisso com o status quo, com a sociedade de classe. A neutralidade científica apregoada é uma forma de esconder os compromissos políticos e sociais. São chamados de radicais pois tomam uma atitude que, ao analisar as injustiças sociais e os bloqueios e um desenvolvimento social, vão às raízes, às causas verdadeiras destes problemas; e de críticos por assumirem os seus compromissos ideológicos, sem procurarem se esconder sob falsa neutralidade. Neste grupo, observam-se grandes subdivisões, como a corrente formada por geógrafos não marxistas, mas comprometidos com reformas sociais, geógrafos com formação anarquista, com suas críticas à sociedade burguesa e defendem uma evolução libertária, e os geógrafos de formação marxista. 6 Em relação aos geógrafos marxistas, há aqueles que aceitaram Marx como um pensador, como um filósofo e procuram aplicar a práxis1 ao analisar as situações que são apresentadas a eles para estudo. Estão preocupados com os problemas da totalidade, dão grande importância à análise das formações econômico - sociais e dos modos de produção, mas levam em conta que Marx viveu e estudou a Europa do séc. XIX, não podendo haver transposição dos seus pensamentos sem uma adaptação (espacial e temporal). Outro grupo aceita Marx como um doutrinador e o marxismo como uma doutrina procurando transferir as categorias de Marx para a realidade atual e para todos os continentes. São os marxistasortodoxos. 1 o conjunto das atividades humanas tendentes a criar as condições indispensáveis à existência da sociedade e, particularmente, à atividade material, à produção. 7 Orlando Valverde, Manuel Correia BRASIL Não Marxistas Harvey, William Bunge EUA França é o expoente máximo Lacoste (HERODOTE), Tricart, Pierre George, Dresch e outros. EUROPA Armando Correia, Milton Santos BRASIL Marx como pensador Brasil: Caio Prado Júnior Marxistas Ortodoxos Marxistas Geografia Crítica ou Radical 8 EM BUSCA DE UM OBJETO A Geografia, desde os seus primórdios, foi mais uma ideologia que mesmo uma filosofia; em segundo lugar, não somente a Geografia Alemã foi utilizada com finalidades políticas. O problema é muito mais geral. J. Dresh reconhece, embora implicitamente, ao escrever na mesma página que a Geografia “não dispondo de métodos próprios, sofreu, mais que qualquer outra ciência, a influência das ideologias correntes”; Foi assim com a Geografia Tradicional e com a geografia Quantitativa. Esta última prestou-se maravilhosamente ao jogo de certo número de geógrafos aplicados exageradamente à tarefa de manutenção de todo tipo de status quo (as técnicas quantitativas somente servem para medir o que não pode ser mudado). A New Geography representou uma involução. Excluiu o movimento social e dessa forma eliminou de suas preocupações o espaço das sociedades em movimento permanente. A Geografia tornou-se viúva do espaço. Daí o rebaixamento da Geografia a um conjunto informe e incoerente, um puzzle a armar conforme o interesse do freguês. Isso é tanto mais chocante porque, se em outras disciplinas sociais certos especialistas também não se recusaram a servir de maneira cega aos interesses de grupos, todavia trabalharam com um mínimo de teoria geral. Não é de se estranhar que a crise geral das ciências sociais tenha se manifestado com tanto vigor no caso da Geografia. 9 EM BUSCA DE UM PARADIGMA Os geógrafos poderiam ignorar as novas conquistas do saber e prosseguir fazendo o que vinham fazendo. Porém, houve uma necessidade de se quebrar os antigos paradigmas. A nova ordenação dos fatos encerra ela própria uma nova escala de valores e obriga a criação de uma nova teoria. Nova Geografia -> fazia o oposto: tentou contribuir à geração de fatos segundo uma certa ideologia. Quantos grupos humanos existiam sobre a face da terra e tantas eram as formas de comandar, tantas geografias particulares existiam; Agora, problema é o de saber como os grupos humanos mudando, alterando suas relações com a Natureza, mudam dessa forma a história; outro problema é o de também localizar as respectivas e múltiplas cadeias de causas e efeitos; AS CAUSA MOTORAS DAS TRANSFORMAÇÕES SÃO NUMEROSAS. As maneiras de produzir mudam, as relações entre o homem e a natureza mudam; a distribuição dos objetos criados pelo homem para poder produzir e assim reproduzir a sua própria vida pode igualmente mudar. Cada vez que o uso social do tempo muda, a organização do espaço muda igualmente. 10 As transformações espaciais provém da intervenção simultânea de redes de influência operando simultaneamente em uma multiplicidade de escalas, desde a escala local até a escala mundial. Chegamos, finalmente a um mundo onde, melhor do que em qualquer outro período histórico, podemos falar em espaço total. O espaço total é o espaço mundialmente “solidário”. 11 O espaço total e o local são aspectos de uma única e mesma realidade – a realidade total. ESTAS TRANSFORMAÇÕES DEVEM SER ESTUDADAS E COMPREENDIDAS PELA GEOGRAFIA!!!!! A noção de totalidade ganha importância e aparece mesmo como uma imposição do momento atualmente vivido pela história do sistema capitalista. Santos (1978) já percebia esta importância, quando referia-se em seu trabalho sobre a noção de totalidade: O que se propôs, naquele momento de discussão sobre a Geografia Renovada (idos de 70) é que a Geografia fosse o estudo das sociedades humanas em sua obra de permanente reconstrução do espaço herdado de gerações precedentes, através das diversas instâncias da produção; 12 Essa geografia renovada ocupar-se-ia do espaço humano transformado pelo movimento paralelo e interdependente de uma história feita em diferentes níveis – internacional, nacional e local. EM BUSCA DE UM OBJETO EM BUSCA DE UM PARADIGMA
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