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Culpabilidade - teoria finalista

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1
CULPABILIDADE 
Uma leitura introdutória 
 
 
 
Edvaldo Costa Pereira Júnior1 
 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
 
Apesar das críticas que boa parcela da doutrina lhe dedica2, a noção contemporânea 
de culpabilidade ainda está ligada à ideia de livre-arbítrio. 
 
Sendo o homem um ser dotado de inteligência e conhecedor, ainda que 
empiricamente, de certas leis da Natureza, tem capacidade de previsão, podendo 
assim causar ou evitar um resultado e, principalmente, construir um juízo ético 
acerca de suas condutas, boas ou más, legais ou ilegais. 
 
Aristóteles3 já afirmava que virtude ou vício são opções do Homem, que, 
voluntariamente, pode ser probo ou perverso, sendo livre para formular seu querer e 
orientar sua conduta4. Nesse mesmo sentido defendia Tomás de Aquino: 
 
3. Demais. – É livre quem é causa de si, como diz Aristóteles (I 
Metaph. Lect. III) E não é livre o que é movido por outro.(...) 
SOLUÇÃO. – O homem tem livre arbítrio; do contrário seriam inúteis 
 
1
 Mestre em Ciências Penais pela UFMG. Professor de Direito Penal da Universidade Federal de 
Ouro Preto. Promotor de Justiça do Estado de Minas Gerais. 
2
 “A doutrina do livre-arbítrio. A concepção tradicional baseou-se na ideia do livre-arbítrio e considerou 
como pressuposto fundamental da responsabilidade penal o ‘poder atuar de outro modo’. Segundo tal 
doutrina, as causas que excluem a culpabilidade deveriam ter como fundamento a ausência da 
possibilidade de atuar de outra forma. Dois obstáculos opõem-se a esta concepção de culpabilidade. 
É ‘impossível demonstrar cientificamente’ a existência da pretendida desvinculação da vontade da lei 
da causalidade, segundo a qual todo efeito obedece a uma causa. Mesmo admitindo que a decisão 
humana não se explica como mero produto mecanicista, é ‘razoável pensar, entretanto, que se 
encontra determinada’ pela concorrência de distintos fatores (...)”. PUIG, Santiago Mir. Direito penal: 
fundamentos e teoria do delito. São Paulo: RT2007. p. 422. 
3
 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. (Coleção Os pensadores) São Paulo: Nova Cultural, s.d. 
4AQUINO, Tomás de. Suma teológica. Tradução: Alexandre Correia. Disponível em: 
http://www.permanencia.org.br/sumateologica/suma.htm. Acesso em: março 2009. 
 2
os conselhos, as exortações, os preceitos, as proibições, os prêmios, 
as penas. E isto se evidencia, considerando, que certos seres agem 
sem discernimento; como a pedra que cai e, semelhantemente, todos 
os seres sem conhecimento. (...) O homem, porém, age com 
discernimento; pois, pela virtude cogniscitiva, discerne que deve 
evitar ou buscar alguma coisa. Mas esse discernimento, capaz de 
visar diversas possibilidades, não provém do instinto natural, relativo 
a um ato particular, mas da reflexão racional. (...) E, portanto, é 
forçoso que o homem tenha livre arbítrio, pelo fato mesmo de ser 
racional. 
 
Tal visão recebeu críticas contundentes dos naturalistas, para os quais a liberdade 
humana estaria limitada e determinada pela própria Natureza, especialmente pela 
“lei da necessidade”. Em meados do século XIX, a corrente do pensamento 
denominada Positivismo Criminológico5, na esteira do pensador francês Auguste 
Comte6, propôs um novo método para a compreensão da criminalidade (método 
empírico-indutivo) e, também, criticou a ideia do livre-arbítrio, posto entender que o 
Homem estaria predisposto à prática de crimes em razão de suas características 
anatômicas, fisiológicas e mentais7; ou em razão de influências não apenas internas, 
mas também ambientais e sociais. Nesse sentido, a lição de Enrico Ferri8: 
 
A filosofia e a psico-patologia concorrem no efeito, a mostrar-nos que 
a vontade humana está completamente submetida as influências 
naturais, não só de ordem moral ou psicológico, senão também de 
ordem puramente físico, bem longe de dominá-las de uma maneira 
mais ou menos absoluta: a estatística, por sua parte, nos revela que 
as vontades individuais, tomadas coletivamente, obedecem as 
influências exteriores do meio físico e social. (sic) 
 
Em outras palavras, em razão de condições internas ou externas, o indivíduo estaria 
predestinado a delinquir (“determinismo”), daí porque não seria livre para optar entre 
o certo e o errado, o bem e o mal, a virtude e o vício, o legal e o ilegal. 
 
 
5
 Não confundir com positivismo jurídico, que é coisa absolutamente diversa. 
6
 COMTE, Auguste. Curso de Filosofia Positiva. (Coleção Os Pensadores). São Paulo : Nova Cultural, 
2005. 
7
 LOMBROSO, Cesare. O homem delinquente. Porto Alegre: Ricardo Lenz. 2001. 
8
 FERRI, Enrico. Sociologia criminal. Sorocaba: Minelli, 2006. p. 19. 
 3
Embora a perspectiva positivista-criminológica esteja, na sua concepção original, 
superada9, a discussão acerca do livre-arbítrio é ainda atual: seria o Homem 
totalmente livre para determinar suas ações? Ou estaria ele de alguma maneira 
condicionado por fatores alheios à sua vontade? Nessa hipótese, a pena deveria ser 
afastada ou tão-somente atenuada? 
 
São perguntas sem resposta definitiva, que dependerão da ideologia de cada um. 
Não à toa, talvez seja a culpabilidade o tema mais tormentoso e controvertido da 
ciência penal. Todavia, podemos afirmar que o Direito Penal brasileiro adota, ainda 
que implicitamente, a ideia de livre-arbítrio, mesmo não ignorando que as condições 
naturais e sociais possam influenciar o indivíduo. 
 
 
2. DEFINIÇÃO 
 
 
Não fornece a lei penal o conceito de culpabilidade, daí porque essa tarefa fica a 
cargo da doutrina. 
 
Hans Welzel10, que elaborou a teoria finalista da ação, assim definia a culpabilidade: 
 
Culpabilidade é a reprovabilidade da resolução de vontade. O autor 
podia adotar no lugar da resolução da vontade antijurídica – tanto se 
esta se dirige à realização dolosa do tipo como se não se aplica a 
direção final mínima exigida – uma resolução de vontade conforme a 
norma. Toda culpabilidade é, pois, culpabilidade de vontade. 
 
Segundo Mirabete11, seria “a reprovabilidade da conduta típica e antijurídica”; ao 
passo que Fragoso12 dizia que: 
 
 
9
 Modernamente, pesquisa-se a influência do componente genética no comportamento criminoso. 
Sobre o tema: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-81082008000100003&script=sci_arttext. 
Acesso em: março 2009. 
10
 WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução à doutrina da ação finalista. São 
Paulo: RT, 2001. p. 88. 
11
 MIRABETE, Júlio Fabbrinni. Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 2004, vol. I. p. 196. 
12
 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. Parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 
240. 
 4
A culpa [lato sensu] consiste na reprovabilidade da conduta ilícita 
(típica e antijurídica) de quem tem a capacidade genérica de 
entender e querer (imputabilidade) e podia, nas circunstâncias em 
que o fato ocorreu, conhecer a sua ilicitude, sendo-lhe exigível 
comportamento que se ajuste ao direito. 
 
Culpabilidade é, pois, o juízo de reprovação pessoal que recai sobre a conduta típica 
e ilícita praticada pelo agente que, sendo imputável, dispunha de potencial 
conhecimento da ilicitude e poderia agir conforme o Direito. 
 
Tendo em vista que a noção de “reprovabilidade” (no sentido de passível de 
censura, repreensão) é mais clara e assimilável do que a de “culpabilidade”, 
defendemos que a melhor conceituação analítica de crime seria: crime é a conduta 
típica, ilícita e reprovável. 
 
 
3. CULPABILIDADE COMO ELEMENTO DO CRIME 
 
 
Parcela minoritária dos doutrinadores brasileiros – como Damásio Evangelista de 
Jesus, Julio Fabbrinni Mirabete, René Ariel Dotti, Fernando Capez, etc. – sustenta 
que a culpabilidade não seria um dos elementos do crime, mas uma condiçãopara a 
imposição da pena. O delito existirá bastando que a conduta seja típica e ilícita; daí 
porque o próprio Código Penal, ao tratar da ausência de culpabilidade, utilizaria a 
expressão “isenção de pena”13. 
 
Assim, um menor de dezoito anos praticaria crime, ainda que não possa sofrer a 
pena (a ele aplicar-se-á medida socioeducativa); o mesmo se dizendo em relação ao 
doente mental que tenha afastada completamente a capacidade de entender a 
ilicitude do fato ou de se autogovernar segundo tal entendimento, a quem não se 
imporá qualquer sanção, mas medida de segurança. 
 
Todavia, para a grande maioria dos doutrinadores nacionais, como Francisco de 
Assis Toledo, Heleno Cláudio Fragoso, César Roberto Bitencourt e José Henrique 
 
13
 Cf. artigos 20, § 1º; 21, caput, 26; caput; 28, § 1º, do Código Penal. 
 5
Pierangeli, crime é a conduta típica, ilícita e culpável, sendo, dessa forma, a 
culpabilidade o terceiro elemento do crime e não pressuposto para a aplicação da 
pena. É o conceito que adotamos. 
 
 
4. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS TEORIAS DA CULPABILIDADE 
 
 
Deve-se à doutrina européia, sobretudo alemã, no século XIX, a gênese da moderna 
teoria do delito. A partir de então, numerosos doutrinadores deram suas 
contribuições à discussão, tais como Karl Binding, Rudolph von Ihering, Franz von 
Liszt, Ernst von Beling, Edmund Mezger, Hans Welzel, dentre outros, que 
contribuíram para a formação de diferentes correntes sobre o tema, destacando-se 
as três que se seguem: 
 
 
4.1 Teoria psicológica da culpabilidade, ou sistema Liszt-Beling, ou sistema 
objetivo-subjetivo (integrante do sistema causal-naturalista) 
 
 
Para esta teoria, o delito teria dois aspectos: um externo (ou objetivo), que 
compreenderia a conduta típica e antijurídica, e outro interno (subjetivo), que 
abrangeria a culpabilidade, vínculo psicológico que ligaria o agente ao fato típico por 
ele praticado. 
 
Em outras palavras, a culpabilidade seria a ligação psíquica entre o agente e o fato 
delituoso, sendo suas formas (ou graus) o dolo (querer o fato previsível) e a culpa 
(atingir involuntariamente o fato previsível). 
 
 6
A ação, despida de qualquer conteúdo de finalidade, era considerada um simples 
comportamento humano que causava a modificação do mundo exterior (resultado)14. 
Na lição de Beling15: 
 
Deve-se entender por ‘ação’ um comportamento corporal (fase 
externa, objetiva da ação) produzido pelo domínio sobre o corpo 
(liberdade de inervação muscular, voluntariedade), (fase interna, 
subjetiva da ação); isto é, um comportamento corporal voluntário, 
consistente em um fazer (ação positiva), isto é, um movimento 
corporal, por exemplo, levantar a mão, movimentos para falar etc., ou 
em um não fazer (omissão), isto é, distensão dos músculos. (sic) 
 
O tipo conteria meramente a descrição da conduta proibida; nele não existiriam 
elementos subjetivos, isto é, referentes à finalidade pretendida pelo sujeito/agente. 
 
A antijuridicidade se limitaria à comprovação de que a conduta contrariava a ordem 
jurídica do Estado. 
 
Já a culpabilidade seria o elemento psicológico (subjetivo) do delito. Dissentiam os 
elaboradores do sistema objetivo-subjetivo acerca das bases sobre as quais se 
erigia o conceito de culpabilidade. Beling16 sustentava que o Direito Penal só poderia 
ser construído sobre a ideia do livre-arbítrio, pois 
 
O Direito Penal só pode ser construído sobre a base do 
autodeterminismo (redutível a ‘indeterminismo condicionado ou 
relativo’), isto é, a doutrina segundo a qual o homem é livre no 
sentido de que, quando não concorrerem exceções nele, o agir não 
se explica plenamente pelo caráter e pelos motivos, mas sim, além 
disso, junto a estes, intervém um terceiro termo consistente no poder 
de resistência existente no homem, que o capacita a paralisar os 
motivos de impulsão com contramotivos, ou seja, a escolher e 
decidir-se. 
 
 
14
 “Comissão é a causação do resultado por um ato voluntário de vontade. Este se apresenta como 
movimento corpóreo voluntário, isto é, como tensão (contração) dos músculos, determinada não por 
coação mecânica ou psicofísica mas por idéias ou representações, e efetuada pela inervação dos 
nervos motores.” (sic) LISZT, Franz von. Tratado de direito penal alemão. Campinas: Russel, 2001, 
tomo I. p. 221. 
15
 BELING, Ernst von. A ação punível e a pena. São Paulo: Rideel, 2007. p. 11. 
16
 BELING, Ernst von. A ação punível e a pena. São Paulo: Rideel, 2007. p. 23. 
 7
A seu turno, Liszt17, determinista convicto, por óbvio rejeitava a ideia de livre-arbítrio, 
limitando-se a atribuir a imputabilidade a todo homem mentalmente desenvolvido e 
mentalmente são (sem maiores questionamentos de caráter moral), daí porque se 
daria a inimputabilidade diante da ausência de desenvolvimento mental (por 
menoridade ou por surdo-mudez) ou de saúde mental (idiotismo, imbecilidade, 
estados de degeneração mental, moléstias nervosas, etc.). 
 
Dolo e culpa em sentido estrito seriam os graus de culpabilidade, mas o primeiro 
representaria uma maior reprovação, e o segundo, uma menor reprovação. 
 
De acordo com tal sistema, que também ficou conhecido como “Liszt-Beling”, o tipo 
seria meramente descritivo e valorativamente neutro, absolutamente separado da 
ilicitude e tendo por função exclusiva definir delitos por meio da descrição objetiva da 
conduta proibida. Esta nova elaboração do conceito de tipo, embora ultrapassada 
modernamente, constituiu autêntica revolução do Direito Penal, permitindo 
reescrever-se o conceito analítico de crime. 
 
O conceito de delito elaborado por Liszt e Beling é denominado pela doutrina de 
conceito clássico, sendo influenciado, como já exposto, pelo positivismo científico 
que permeou o saber jurídico-penal da segunda metade do século XIX às primeiras 
décadas do século seguinte. 
 
Em síntese, seus quatro elementos são: 
 
a) a ação, definida como a enervação muscular (ou movimento corporal voluntário) 
produzida por energias de um impulso cerebral, que, comandadas pelas leis da 
natureza, provoca a transformação do mundo exterior; 
 
b) a tipicidade, entendida como a adequação à descrição objetiva da conduta 
proibida; 
 
 
17
 LISZT, Franz von.Tratado de direito penal alemão. Campinas: Russel, 2003, tomo I. 
 8
c) a antijuridicidade, considerada a contradição entre o resultado causado e a ordem 
jurídica; e 
 
d) a culpabilidade, que encerraria o caráter subjetivo do crime, ou seja, o vínculo 
psicológico entre a conduta e o resultado, cujos graus seriam o dolo e a culpa. 
 
 
4.2 Teoria psicológico-normativa ou sistema neoclássico (integrante do 
sistema causal-naturalista) 
 
 
A tese anterior suscitou muitas críticas, especialmente de Max Ernest Mayer, Alfred 
Hegles, Edmund Mezger e Wilhem Sauer, porque tais doutrinadores enxergavam no 
tipo elementos subjetivos, incompatíveis com a visão valorativamente neutra 
defendida por Ernst von Beling. 
 
Houve, com os chamados neokantianos, uma ruptura de paradigma científico: 
deixou-se de lado a ideia de observar e descrever, inerente às ciências naturais — e 
do pensamento positivista científico — para alocar a ciência do direito em seu devido 
patamar: ciência do dever-ser, partindo para um compreender e valorar, que é mais 
próprio das ciências do “espírito”. 
 
Com a intervenção dos neoclássicos (assim denominados porque retomavam as 
ideias de Kant, ditas clássicas), o conceito legado por Liszt-Beling sofreu um 
processo de transformação, pelo qual se admitiu a existência de elementos 
normativos e subjetivos no tipo (como o fim libidinoso no crime de sequestro 
qualificado, art. 148, § 1º, V do Código Penal brasileiro); ademais, aculpabilidade 
não mais se limitaria aos aspectos psicológicos, pois a sua essência seria a 
reprovabilidade, pela formação da vontade contrária ao dever. 
 
 9
Frank18 (1907) sustentava que a ideia de culpabilidade correspondia à de 
reprovabilidade, cujos elementos seriam imputabilidade, dolo ou culpa, e a 
normalidade das circunstâncias sob as quais a pessoa atua (ausência de coação). 
Assim, do agente que praticasse um crime sob coação irresistível - embora fosse 
imputável e agisse com dolo - não se poderia exigir conduta distinta. 
 
A tal doutrinador deveu-se a inserção da ideia de reprovabilidade como elemento da 
culpabilidade; e aos neoclássicos, a antevisão de que a tipicidade não pode ser 
meramente objetiva-descritiva, posto existirem no tipo, ainda, elementos de natureza 
subjetiva e normativa. 
 
Posteriormente, Berthold Freudenthal (1922) retomou a ideia de Frank sobre 
culpabilidade, elaborando o conceito (normativo) de exigibilidade de conduta 
conforme o direito19. 
 
A esta ideia denominou-se “teoria psicológica-normativa da culpabilidade”. 
 
Logo, os elementos da culpabilidade seriam: 
 
a) imputabilidade (ter o agente condição de entender o caráter ilícito do fato); 
 
b) dolo e culpa; e 
 
18 “Para que a alguém se possa fazer uma reprovação por seu comportamento, há um tríplice 
pressuposto: 1º uma aptidão espiritual normal do autor, à qual nós denominamos imputabilidade. Se 
ela existe na pessoa, então está dito que seu comportamento antijurídico pode ser convertido, em 
geral, em reprovação (...) 2º uma certa relação psíquica concreta do autor com o fato em questão ou 
a possibilidade disso, conforme aquele perceba seu alcance (dolo), ou bem o possa discernir 
(imprudência). (...) 3º a normalidade das circunstâncias sob as quais o autor atua. Quando uma 
pessoa imputável realiza algo antijurídico, consciente ou podendo estar consciente das 
consequências decorrentes de seu agir, pode estar sujeito, em geral, de uma reprovação, segundo a 
interpretação do legislador. Mas o que é possível genericamente, em um caso particular pode ser 
impossível: assim, não cabe a reprovabilidade quando as circunstâncias concomitantes hajam sido 
um perigo para o autor ou para uma terceira pessoa, e a ação proibida executada poderia salvá-los.” 
FRANK, Reinhard. Sobre la estructura del concepto de culpabilidad. Buenos Aires: Euros, 2004. p. 
40-41. Tradução nossa. 
18
 WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução à doutrina da ação finalista. São 
Paulo: RT, 2001. 
18
 FRANK, Reinhard. Sobre la estructura del concepto de culpabilidad. Buenos Aires: Euros, 2004. 
19
 FREUDENTHAL, Berthold. Culpabilidad y reproche en el derecho penal. Buenos Aires: Euros, 
2006. 
 10
 
c) exigibilidade de conduta conforme o Direito. 
 
Note-se, portanto, que apesar de os neoclássicos afirmarem a existência de 
elementos subjetivos na conduta típica (hoje, os denominamos elementos subjetivos 
especiais), dolo e culpa seguiam como elementos da culpabilidade, daí porque a 
teoria psicológico-normativa se insere na “teoria da ação causal” (também 
denominada “teoria causalista da ação”). 
 
 
4.3 Teoria normativa pura da culpabilidade (teoria da ação final ou teoria 
finalista da ação) 
 
 
A teoria normativa pura da culpabilidade se insere no conceito, mais amplo, da teoria 
finalista da ação, que nasceu a partir dos estudos do alemão Hans Welzel, na 
década de 30 do século XX. Para ela, não se concebia separar vontade de 
finalidade, posto que o homem, quando age, necessariamente busca certo fim, que 
pode ser lícito ou ilícito, criminoso ou não. Daí, dolo e culpa seriam o conteúdo 
finalístico da vontade, passando a integrar o fato típico, e não mais a culpabilidade. 
 
Para a teoria normativa pura, os elementos da culpabilidade são, portanto: 
 
a) imputabilidade; 
 
b) potencial consciência sobre a ilicitude do fato; e 
 
c) exigibilidade de conduta conforme o Direito. 
 
Ou seja, a culpabilidade perdeu seus elementos psicológicos e passou a ter tão-
somente elementos normativos. 
 
 11
Segundo a teoria finalista, a conduta não seria limitada a uma mera e mecânica 
enervação muscular, mas sim à ação ou omissão humana dirigida a uma 
determinada finalidade. 
 
Para Welzel20, no conceito de crime estariam insertos: 
 
a) a conduta, concebida como a ação ou omissão humana, voluntária e dirigida a 
determinada finalidade; 
 
b) a tipicidade, como a perfeita adequação da conduta a um tipo penal; 
 
c) a antijuridicidade, entendida como a contradição entre a conduta proibida 
descrita no tipo penal e o ordenamento jurídico; e 
 
d) a culpabilidade, agora considerada a reprovabilidade pessoal que se lança 
sobre o agente, por não atuar corretamente, apesar de ter podido obrar conforme 
a norma. 
 
Como se percebe, além da modificação na visão acerca da conduta, também se 
alterou o conceito de culpabilidade. Com efeito, dolo e culpa deslocaram-se da 
culpabilidade para o fato típico, pois, no plano da realidade, é impossível retirar-se 
da conduta seu elemento anímico (finalidade). 
 
A culpabilidade passou a ter concepção puramente normativa: é a reprovabilidade 
que recai sobre o injusto penal (ou seja, sobre a conduta típica e ilícita), de quem 
tinha potencial conhecimento da ilicitude e poderia, nas circunstâncias, agir de 
maneira conforme o direito. 
 
Em outras palavras, dolo e culpa não mais integrariam a culpabilidade, mas sim a 
conduta típica21. 
 
20
 WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução à doutrina da ação finalista. São 
Paulo: RT, 2001. 
21
 A duplicidade de termos assemelhados – culpa e culpabilidade -, provenientes da mesma raiz 
etimológica, acaba por gerar confusão. Daí, como afirmamos, melhor que se designasse 
“reprovabilidade” o terceiro elemento do crime. 
 12
 
Como afirmamos, à ideia de Welzel sobre a culpabilidade denominou-se teoria 
normativa pura. 
 
 
4.4 Síntese das teorias sobre a culpabilidade 
 
 
Em síntese, historicamente, há três teorias principais sobre a culpabilidade, sendo 
que as duas primeiras se inserem na teoria da ação causal, enquanto a terceira é 
um subsistema da teoria finalista da ação: 
 
a) Teoria psicológica (Liszt-Beling): a culpabilidade é a ligação psíquica entre o 
agente e o fato, sendo suas formas (ou graus) o dolo (querer o fato) e a culpa 
(atingir involuntariamente o fato previsível); 
 
b) Teoria psicológica-normativa: a partir de Frank, à culpabilidade agrega-se um 
terceiro elemento, além do dolo e da culpa: a reprovabilidade, que era de 
natureza normativa. 
 
c) Teoria normativa pura (Welzel): seus elementos seriam a imputabilidade, o 
potencial conhecimento da ilicitude e a possibilidade de conduta conforme o 
Direito. 
 
 
5. CULPABILIDADE E DIREITO POSITIVO BRASILEIRO 
 
 
Na reforma que introduziu a assim chamada nova Parte Geral do Código Penal 
brasileiro (Lei nº 7.209/84) adotou-se implicitamente a teoria finalista. 
 
 
6. ELEMENTOS DA CULPABILIDADE 
 
 13
 
Atualmente, entende-se que os elementos da culpabilidade são: 
 
a) Imputabilidade; 
 
b) Potencial conhecimento da ilicitude; 
 
c) Exigibilidade de conduta conforme o Direito. 
 
Doutrinadores há que apontam a imputabilidade como pressuposto da culpabilidade, 
e não como um de seus elementos. Não nos filiamos a essa corrente. 
 
 
7. IMPUTABILIDADE 
 
 
A lei não define o que seja imputabilidade, ficando essa tarefa a cargo da doutrina. 
 
Em termos bem simples, imputabilidade é a possibilidade de se atribuir, imputar, o 
fato típico e ilícito ao agente que tenha a capacidade de formar suas decisões de 
acordo com suas condiçõespsíquicas e com sua consciência. 
 
A princípio, todas as pessoas são imputáveis, apontando o Código Penal tão-
somente as causas excludentes da imputabilidade. Incidindo qualquer delas, não se 
poderá atribuir o injusto penal (conduta típica e ilícita) ao agente e, portanto, não 
estará caracterizada a culpabilidade e, por conseguinte, nem o crime. 
 
Em outras palavras, incidindo pelo menos uma causa que afaste a imputabilidade, 
não haverá crime. 
 
 
8. CAUSAS DE EXCLUSÃO DE IMPUTABILIDADE 
 
 
 14
O indivíduo será inimputável: 
 
a) por menoridade (art. 228, da Constituição Federal; art. 27, do Código Penal; art. 
104, do Estatuto da Criança e do Adolescente); ou 
 
b) por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, que 
afaste completamente a capacidade de entender a ilicitude do fato ou de comportar-
se segundo tal entendimento (art. 26, caput, do Código Penal); ou 
 
c) por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, que afaste 
totalmente a capacidade de entender a ilicitude do fato ou de se comportar segundo 
tal entendimento (art. 28, § 1º, do Código Penal). 
 
 
8.1 Menores de 18 anos de idade 
 
 
A presunção de inimputabilidade em relação aos menores de 18 anos é absoluta, ou 
seja, não admite prova em contrário. Desse modo, ainda que se demonstre, no caso 
concreto, que um adolescente de 17 anos, ao praticar o injusto penal, tinha plena 
consciência da ilicitude da sua conduta (admitamos, por exemplo, que já cursasse as 
cadeiras de Ética em faculdade de Filosofia), mesmo assim continuaria inimputável. 
 
É o que decorre da norma domiciliada no art. 228 da Carta da República: 
 
Art. 228. “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, 
sujeitos às normas da legislação especial. 
 
Nesse mesmo sentido, o Código Penal: 
 
Art. 27. Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente 
inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação 
especial. 
 
A “legislação especial” referida pelos textos acima é o Estatuto da Criança e do 
Adolescente (Lei nº 8.069/90), que assim dispõe em seus arts. 103 e 104: 
 15
 
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime 
ou contravenção penal. 
 
Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de 18 (dezoito) 
anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei. Parágrafo único: Para 
os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à 
data do fato. 
 
Aos adolescentes poderão ser aplicadas, conforme as circunstâncias, as medidas 
socioeducativas previstas no art. 112 da lei de regência: 
 
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade 
competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I – 
advertência; II – obrigação de reparar o dano; III – prestação de 
serviços à comunidade; IV- liberdade assistida; V – inserção em 
regime de semiliberdade; VI- internação em estabelecimento 
educacional; VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. 
 
Já às crianças ou aos seus pais poderão ser aplicadas as medidas previstas no art. 
101: encaminhamento dos pais ou responsável, mediante termo de 
responsabilidade; orientação, apoio e acompanhamento temporários; matrícula e 
frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; inclusão 
em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; 
requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar 
ou ambulatorial; inclusão em programa oficial para alcoólatras e toxicômanos; abrigo 
em entidade; colocação em família substituta. 
 
Por criança entende-se a pessoa de até doze anos incompletos, e por adolescente, 
aquela entre doze anos completos e dezoito anos incompletos (art. 2º do ECA).22 
 
Ressaltamos o teor da Súmula 74, do Superior Tribunal de Justiça: 
 
Súmula 74. Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do 
réu requer prova com documento hábil. 
 
 
22
 As pessoas maiores de 18 e menores de 21 anos na data do fato, embora imputáveis, serão 
beneficiadas com a atenuante genérica prevista no art. 65, I, do Código Penal. Os doutrinadores as 
denominam “jovens-adultos”. 
 16
Como sabido, muitas vozes nos meios jurídico, social e político vêm clamando por 
uma antecipação da maioridade penal (impropriamente denominada “redução da 
maioridade”), pleito que ganha força a cada novo ato infracional grave atribuído a 
crianças e adolescentes noticiado pela grande Imprensa. Há projetos de Emenda 
Constitucional em tramitação no Congresso visando alterar o art. 228 da Carta de 
1988, embora até hoje não exista um consenso entre os parlamentares para a 
análise final das propostas. 
 
O Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.001/69) apresenta uma interessante 
solução intermediária, que, todavia, não foi recepcionada pela Constituição de 1988: 
 
Art. 50. O menor de 18 (dezoito) anos é inimputável, salvo se, já 
tendo completado 16 (dezesseis) anos, revela suficiente 
desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e 
determinar-se de acordo com este entendimento. Neste caso, a pena 
aplicável é diminuída de 1/3 (um terço) a ½ (metade). 
 
 
8.2 Doença mental ou desenvolvimento incompleto ou retardado 
 
 
O Código Penal adotou o critério biopsicológico para aferição da inimputabilidade do 
agente, pois além da anomalia biológica (doença, déficit ou retardo mental) deve 
existir, concomitantemente, a incapacidade de entendimento ou determinação 
(aspecto psicológico). Diz o seu artigo 26: 
 
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou 
desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da 
ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter 
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. 
 
A expressão doença mental, modernamente, é criticada pela Medicina, por inexata e 
ultrapassada. Abrange os oligofrênicos (idiotas, imbecis, débeis mentais), os 
esquizofrênicos, os neuróticos, os alcoolistas (alcoolismo patológico), os portadores 
de sífilis cerebral, de arteriosclerose cerebral, de psicose maníaco-depressiva. É 
discutida a hipótese de sua incidência em relação aos epiléticos. 
 
 17
Desenvolvimento mental incompleto é aquele que ainda não se concluiu, 
abrangendo, segundo a doutrina majoritária, os surdos-mudos (com incapacidade de 
comunicação) e os silvícolas (indígenas). Esse entendimento é também criticável, 
uma vez que, modernamente, os surdos-mudos dispõem de recursos de educação 
que possibilitam, mais e mais, sua perfeita inserção social. Muitos alcançam postos 
importantes na Administração e empregos relevantes, não sendo adequado 
simplesmente presumi-los incapazes de entender a ilicitude de seus atos ou de se 
autogovernar. Porém, poderá incidir sobre o surdo-mudo sem capacidade de 
comunicação, que por tal permaneça incapaz de assimilar os valores da sociedade 
em que vive. 
 
Da mesma forma, uma grande parcela da população indígena está integrada à 
cultura ocidental, falando o Português, utilizando vestimentas comuns, estudando 
em escolas regulares, daí porque têm capacidade de entendimento e de 
autogoverno. Não se pode comparar o índio aculturado (ou seja, adaptado à cultura 
brasileira tradicional) àquele que ainda vive com pouco ou nenhum contato com a 
nossa civilização. 
 
Também não se pode equiparar um indígena a uma pessoa portadora de 
“desenvolvimento mental incompleto”. Pelo contrário, em contato com o seu 
ambiente e com a sua cultura ancestral, longe do stress da vida dita civilizada, os 
índios podem ser considerados indivíduos com desenvolvimento mental pleno. A 
culpabilidade em relação a eles deve ser afastada pela ausência do “potencial 
conhecimento da ilicitude” (postonão viverem sob os nossos mesmos valores), 
nunca devido a uma presumida incapacidade psíquica. O tema merece maior 
reflexão dos doutrinadores pátrios. 
 
Desenvolvimento mental retardado é o que não se concluirá, como no caso dos 
portadores de Síndrome de Down. 
 
Não basta, porém, a enfermidade mental. É necessário que, em razão dela, o 
agente, ao tempo do fato, não tenha inteiramente a capacidade de entendimento ou 
a capacidade de determinação. Em outras palavras, ainda que o indivíduo seja 
 18
doente, deficitário ou retardado mental, mas se tal condição não for determinante 
para a prática do injusto penal, não estará afastada a imputabilidade. 
 
A existência de doença mental que afaste a inimputabilidade deve ser aferida 
através de perícia médico-psiquiátrica, nos termos dos arts. 149 a 154 do Código de 
Processo Penal. 
 
Sendo comprovado que o agente que praticou a conduta típica e ilícita (injusto 
penal) é inimputável por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou 
retardado, ele será absolvido, mas lhe será aplicada medida de segurança (arts. 96 
a 99, do Código Penal e 171 a 179, da Lei de Execução Penal), cujas espécies são 
a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, e a sujeição a 
tratamento ambulatorial. É o que se denomina absolvição imprópria. 
 
Por outro lado, comprovando-se que o enfermo mental agiu, por exemplo, em 
legítima defesa (ou amparado por qualquer outra causa que afaste o injusto penal), 
a hipótese será de absolvição propriamente dita, não se lhe aplicando pena ou 
medida de segurança. 
 
Os inimputáveis por dependência de droga mereceram tratamento legal específico 
(arts. 45 e 46 da Lei nº 11.343/06), do qual não trataremos neste texto. 
 
 
8.2.1 Semi-imputabilidade ou culpabilidade diminuída 
 
 
Aplica-se tal instituto aos chamados “fronteiriços”. 
 
Em caso de perturbação da saúde mental ou desenvolvimento mental incompleto ou 
retardado que diminua a capacidade de entendimento ou determinação, não haverá 
inimputabilidade, mas sim a redução da pena (de um a dois terços), em razão da 
menor reprovabilidade que recai sobre a conduta do agente. É o que determina o 
art. 26, parágrafo único, do Código Penal. Embora a lei empregue a expressão 
“pode ser”, a redução é obrigatória. 
 19
 
Ou seja, caso o problema mental do indivíduo venha a afastar parcialmente: a) sua 
capacidade de entendimento sobre a ilicitude daquilo que faz; ou b) sua capacidade 
de autodeterminação, a pena deverá ser diminuída de um a dois terços. 
 
Mas note-se bem: não estará afastada a imputabilidade penal. O indivíduo 
continuará sendo considerado imputável, mas, como a reprovabilidade é menor, 
também a pena será menor. 
 
O vocábulo “semi-imputabilidade” é criticado na doutrina, por impróprio (ou o 
indivíduo seria imputável, ou não o seria; não havendo lugar para um meio-termo). 
Todavia, é utilizado à larga. 
 
 
8.3 Embriaguez 
 
 
O tema embriaguez está disciplinado principalmente no artigo 28, caput e parágrafos 
1º e 2º, do Código Penal. 
 
Embriaguez é a intoxicação aguda e transitória causada pelo álcool ou por 
substâncias de efeitos semelhantes, capaz de produzir desde um estado de 
excitação até o coma. Em regra, apontam-se quatro fases: excitação, depressão, 
letargia e coma. 
 
A embriaguez pode ser completa e incompleta. Para Ney Moura Teles23, será 
completa quando atingida, pelo menos, a segunda fase. Entendemos, todavia, que 
será completa quando retirar totalmente a capacidade de entendimento sobre a 
ilicitude do fato ou de determinação (o texto do Código Penal, de certa forma, é 
ocioso). 
 
A embriaguez pode ser acidental e não acidental: 
 
23
 TELES, Ney Moura. Direito penal. Parte geral. São Paulo: Atlas, 2006. p. 255. 
 20
 
 
8.3.1 Embriaguez acidental 
 
 
Haverá embriaguez acidental quando o indivíduo se embriagar em razão de: 
 
a) caso fortuito: ignorância sobre a natureza tóxica da substância que se está 
ingerindo (ex.: o pai ingere um comprimido de ecstasy pensando que era novalgina, 
pois não percebera que seu filho trocara o conteúdo do recipiente); ou ignorância 
sobre sua condição física, o que torna o estado imprevisível (ex.: o indivíduo, 
acostumado a ingerir um cálice de aguardente no almoço dominical, o que nunca 
alterara seu estado de consciência, não sabe que, naquele dia, estava acometido de 
grave lesão hepática, que o levaria ao estado de embriaguez); ou 
 
b) força maior: resultante de força física externa imprimida sobre o sujeito, o que 
torna o estado de embriaguez inevitável (ex.: os moradores de uma república 
estudantil obrigam o “bixo”24 a ingerir várias doses de absinto, embriagando-o). 
 
Apenas a embriaguez acidental (seja por caso fortuito, seja por força maior) e 
completa afasta a culpabilidade. Quando acidental e incompleta, gerará a 
diminuição da pena (de um a dois terços, segundo o art. 28, § 2º, do Código Penal). 
 
 
8.3.2 Embriaguez não acidental 
 
 
Já a embriaguez não acidental ocorrerá quando o agente quiser embriagar-se 
(voluntária); ou pelo menos chegar a tal estado por imprudência ou negligência no 
consumo de bebida alcoólica ou de substância de efeitos análogos (culposa); ou 
quando desejar embriagar-se com o fim de cometer um crime (preordenada). Nas 
duas primeiras hipóteses não se afastará a culpabilidade (art. 28, II, do Código 
 21
Penal); na última, além de não se afastar a culpabilidade, a pena imposta será 
agravada (art. 61, II, “l”, do Código Penal). 
 
Desta forma, a embriaguez não acidental divide-se em: 
 
a) embriaguez voluntária: o indivíduo quer ou assume o risco de embriagar-se; 
 
b) embriaguez culposa: o indivíduo quer ingerir bebida alcoólica, e embriaga-se em 
razão de sua ação imprudente ou negligente; 
 
c) embriaguez preordenada: o indivíduo quer embriagar-se para praticar o delito. 
Nesta hipótese, que também se denomina actio libera in causa, tal circunstância 
será levada em consideração na dosagem da pena, que deverá ser agravada (art. 
61, II, “l”, do Código Penal). 
 
d) Por fim, a embriaguez também pode ser patológica25, que se equipara a uma 
verdadeira psicose. Desde que comprovada tal condição, afastar-se-á a 
imputabilidade em razão de doença mental, nos termos do art. 26 do Código Penal. 
 
Em resumo: 
 
a) embriaguez acidental (caso fortuito ou força maior) completa: isenção de pena; 
 
b) embriaguez acidental (caso fortuito ou força maior) incompleta: redução da pena; 
 
 
24
 Neologismo ouropretano, que designa o aluno em “processo de seleção” para vaga de moradia em 
república estudantil. 
25
 “Embriaguez patológica: Ao contrário do que a maioria das pessoas não especializadas pensam, é 
um tipo de embriaguez que certos indivíduos experimentam após a ingestão de pequena quantidade 
de etílicos. Às vezes uma única dose já é o suficiente para colocar o doente em estado de 
embriaguez patológica. Esse quadro ocorre em indivíduos portadores de cérebro de constituição 
anatômica epiléptica (...) O quadro clínico é basicamente um estado crepuscular epiléptico, com 
estreitamento de consciência, liberação de automatismos motores e verbais, tendência aos atos 
violentos. Quase sempre, ao término do episódio, o doente cai em sono profundo e não se recorda do 
que se passou durante o período de embriaguez. Vale lembrar que na embriaguez comum as 
manifestações clínicas vão aparecendo e aumentando à medida em que cresce a quantidade de 
álcool ingerida, enquanto que na embriaguez patológica o quadro ocorre de modo súbito, logo nos 
primeiros tragos.” PALOMBA, Guido Arturo. Loucura e crime. São Paulo: Fiúza, 1996. p. 74.22
c) embriaguez não acidental completa: há imputabilidade; 
 
d) embriaguez não acidental incompleta: há imputabilidade; 
 
e) embriaguez preordenada: circunstância agravante genérica; 
 
f) embriaguez patológica: inimputabilidade ou semi-imputabilidade, por doença 
mental. 
 
 
8.3.3 Condução de veículo automotor em estado de embriaguez 
 
 
O art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97), alterado pela Lei nº 
11.705/08, criminaliza a conduta daquele que conduzir veículo automotor após haver 
ingerido drogas ou certa quantidade de bebida alcoólica: 
 
Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com 
concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) 
decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância 
psicoativa que determine dependência: 
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, multa e 
suspensão ou proibição de obter a permissão ou a habilitação para 
dirigir veículo automotor. 
 
Caso o agente tenha chegado ao estado de embriaguez completa em decorrência 
de caso fortuito ou força maior, assim praticando o tipo acima, também será afastada 
a culpabilidade. 
 
 
8.3.4 Outros ilícitos penais envolvendo a embriaguez 
 
Além da hipótese antes mencionada, a legislação extravagante prevê pelo menos 
dois tipos com referência expressa à embriaguez. 
 
 23
A Lei de Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688/41) assim dispõe em seu art. 
62: 
Embriaguez 
Art. 62. Apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, de 
modo que cause escândalo ou ponha em perigo a segurança própria 
ou alheia: 
Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou 
multa. 
Parágrafo único. Se habitual a embriaguez, o contraventor é 
internado em casa de custódia e tratamento. 
 
A seu turno, o Código Penal Militar (Lei nº Decreto-Lei nº 1.001/69) assim estabelece 
sobre a embriaguez em serviço: 
 
Embriaguez em serviço 
Art. 202. Embriagar-se o militar, quando em serviço, ou apresentar-
se embriagado para prestá-lo: 
Pena – Detenção, de seis meses a dois anos. 
 
 
8.4 Emoção e paixão 
 
 
O Código Penal brasileiro é expresso ao ressaltar que a emoção e a paixão não 
afastam a culpabilidade (art. 28, inciso I, do Código Penal). 
 
Emoção é “uma intensa perturbação afetiva, de breve duração e, em geral, de 
desencadeamento imprevisto, provocada como reação afetiva a determinados 
acontecimentos e que acaba por predominar sobre outras atividades psíquicas (ira, 
alegria, medo, espanto, aflição, surpresa, vergonha, prazer erótico etc.)” 
(Montovani). É uma viva excitação do sentimento. 
 
Paixão é um estado afetivo crônico, que perdura como um sentimento 
profundamente enraizado no psiquismo do indivíduo. 
 
 24
Para Kant, citado por Nélson Hungria26, “emoção é como ‘uma torrente que rompe o 
dique da continência’, enquanto a paixão é o ‘charco que cava o próprio leito, 
infiltrando-se, paulatinamente, no solo.” 
 
Como afirmado, a emoção e a paixão não afastam a imputabilidade. Porém, na 
hipótese do homicídio privilegiado, elas podem reduzir a pena (art. 121, § 1º, do 
Código Penal). Nos demais delitos, podem caracterizar circunstância atenuante 
genérica (art. 65, III, “c”, do Código Penal). Sustenta César Roberto Bitencourt27 que, 
em situações extremas, a emoção ou a paixão poderão constituir um estado 
emocional patológico, capazes de afastar ou diminuir a culpabilidade, em razão de 
anormalidade psíquica, nos termos do art. 26 e seu parágrafo único, do Código 
Penal. 
 
 
9. POTENCIAL CONHECIMENTO DA ILICITUDE 
 
 
O art. 21, do Código Penal, dispõe que o desconhecimento da lei é inescusável. 
Trata-se de princípio que incide não somente em sede penal, mas em todo o 
ordenamento jurídico brasileiro28. Contudo, um direito penal legitimado pelo Estado 
Democrático de Direito não poderia desconsiderar que certos indivíduos, em razão 
de suas condições pessoais, poderão ter suprimida ou diminuída sua capacidade de 
compreensão da ilicitude de um determinado fato. Ademais, considerando que os 
estudiosos do Direito Penal (magistrados, membros do Ministério Público, 
advogados, escritores, professores, alunos) nem sempre convergem sobre os limites 
da licitude e da ilicitude de determinada conduta, o que se poderia esperar de um 
leigo, pouco afeito às armadilhas da hermenêutica jurídica? Assim, o erro de 
proibição decorre justamente daí: o agente engana-se sobre a ilicitude de sua 
conduta. Vejamos os seguintes exemplos: 
 
 
26
 HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. Rio de Janeiro: Forense, 1958, vol. I, tomo 2. p. 
369. 
27
 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal. Parte geral. São Paulo: RT, 1999. p. 361. 
28
 Lei de Introdução ao Código Civil: “Art. 3º Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a 
conhece.” 
 25
a) Todos sabem que machucar alguém é crime. Mas a vítima que, vendo um ladrão 
dias depois do furto, com os seus objetos, resolve recuperá-los, batendo no 
criminoso, talvez desconheça que tal conduta não caracteriza a legítima defesa 
(dada a ausência do requisito atualidade da agressão). 
 
b) Um indivíduo de pouca ou nenhuma instrução formal, em seu sítio, planta várias 
mudas de uma árvore de madeira de lei, querendo contribuir para a preservação do 
meio ambiente. Porém, anos depois, quando as árvores já estavam crescidas, ele 
corta uma delas, para utilizá-la em seu fogão, sem solicitar autorização do órgão 
ambiental, pois acreditava sinceramente que, por havê-la plantado sem ajuda 
governamental, poderia também derrubá-la. Porém, assim agindo, incidiu no art. 45 
da Lei de Crimes Ambientais. Tal conduta, embora inequivocamente típica e ilícita, 
será culpável? 
 
Reafirmamos: mesmo pessoas que se dedicam ao estudo do Direito muitas vezes 
divergem sobre a adequada interpretação de determinada norma, quanto mais 
pessoas que são leigas sobre os termos jurídicos e, por conseguinte, mais 
suscetíveis à compreensão inexata do conteúdo das normas. 
 
Assim, dispõe o art. 21 do Código Penal que, embora o desconhecimento da lei seja 
inescusável, o erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena (em outras 
palavras, afasta a culpabilidade); se evitável o erro, a pena poderá ser diminuída de 
um sexto a um terço. É o que se denomina erro de proibição. 
 
Melhor explicando: havendo erro inevitável sobre a ilicitude do fato, ainda que exista 
uma conduta típica e ilícita, ela não será culpável (reprovável). Logo, não haverá 
crime. 
 
Sendo evitável o erro, haverá crime, mas a pena será diminuída de 1/6 a 1/3, em 
face da menor reprovabilidade da conduta. 
 
De acordo com o art. 21, do Código Penal, considera-se evitável o erro se o agente 
atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas 
circunstâncias, ter ou atingir essa consciência (ou seja, se era possível, nas 
 26
condições em que se encontrava, obter maiores esclarecimentos acerca da ilicitude 
da sua conduta). 
 
Distingue-se claramente o erro de proibição do erro de tipo: neste, o indivíduo não 
sabe exatamente o que faz; naquele, o agente sabe o que faz, mas acredita que sua 
conduta não é contrária ao Direito. 
 
Dessarte, o sujeito da cidade grande que matar um gambá (animal da fauna nativa, 
protegido pela lei ambiental) acreditando tratar-se de uma ratazana (animal exótico) 
não incidirá no art. 29, da Lei nº 9.605/98. Será erro de tipo que, quando invencível, 
afastará dolo e culpa; quando vencível, afastará o dolo, mas permitirá a punição por 
culpa, caso prevista a tipicidade culposa para aquela infração (no exemplo, como 
não há figura culposa, o fato será absolutamente atípico). 
 
Porém, o ribeirinho amazônico em visita à metrópole que vier a matar um gambápara comê-lo, acreditando que é lícito assim proceder, incidirá em erro de proibição, 
posto que, onde reside, é admitida tal conduta para fins de alimentação.29 
 
O desconhecimento da lei é circunstância atenuante genérica, prevista no art. 65, II, 
do Código Penal. 
 
A fórmula tradicionalmente proposta para distinguir erro de tipo e erro de proibição é 
a seguinte: no erro de tipo, o indivíduo não sabe o que faz; no erro de proibição, o 
indivíduo sabe o que faz, mas não sabe que é proibido. 
 
Em síntese: 
 
a) o erro sobre a ilicitude do fato (erro de proibição) inevitável afasta a culpabilidade; 
 
 
29
 “Art. 37. Não é crime o abate de animal, quando realizado: I - em estado de necessidade, para 
saciar a fome do agente ou de sua família; II - para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação 
predatória ou destruidora de animais, desde que legal e expressamente autorizado pela autoridade 
competente; III – (VETADO); IV - por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão 
competente.” 
 27
b) o erro sobre a ilicitude do fato (erro de proibição) evitável importa a redução da 
pena de 1/6 a 1/3; 
 
c) o erro sobre elemento do tipo (erro de tipo) invencível afasta o fato típico; 
 
d) o erro sobre elemento do tipo (erro de tipo vencível) permite a punição a título de 
culpa. 
 
 
10. EXIGIBILIDADE DE CONDUTA CONFORME O DIREITO 
 
 
O terceiro e último elemento da culpabilidade é a “exigibilidade de conduta conforme 
o Direito”, que recebe dos doutrinadores diferentes denominações, dentre elas 
“exigibilidade de obediência ao Direito” (Bitencourt30), “exigibilidade de conduta 
diversa” (Greco31, Damásio32, Teles33 e Capez34) e “inexigibilidade de outra conduta 
pela situação redutora da autodeterminação” (Zaffaroni e Pierangeli35). 
 
Em certas situações, embora o indivíduo conheça o caráter ilícito de sua conduta (ou 
seja, ele tem ciência de que aquilo que ele faz constitui um injusto penal), não pode 
o Estado dele exigir um comportamento diferente daquele adotado. São elas a 
coação moral irresistível; a obediência a ordem não manifestamente ilegal de 
superior hierárquico; e as descriminantes putativas (supostas). 
 
 
10.1 Coação moral irresistível 
 
 
 
30
 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal. Parte geral. São Paulo: RT, 1999. p. 343. 
31
 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. Parte geral. Niterói: Impetus, 2006. p, 443. 
32
 JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal. Parte geral. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 477. 
33
 TELES, Ney Moura. Direito penal, parte geral. São Paulo: Atlas,2006. p. 262. 
34
 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Parte geral. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 326. 
35
 ZAFFARONI, Eugenio Raúl e PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 
Parte geral. São Paulo: RT, 1997. p. 653. 
 28
Dispõe o art. 22, primeira parte, do Código Penal, que se o fato é cometido sob 
coação (moral) irresistível36, só é punível o autor da coação. O coato (ou coagido), 
embora tendo praticado um injusto penal, estará isento de culpabilidade, daí porque 
não terá praticado crime algum. 
 
É o exemplo, hoje recorrente, do pai de família, gerente ou tesoureiro do banco, que 
tem o filho sequestrado, exigindo os criminosos que ele subtraía malotes com o 
dinheiro da agência bancária onde trabalha. Muito embora o agente, ao obedecer 
ordens dos criminosos, pratique uma conduta típica e ilícita, ela não será reprovável 
(afasta-se a culpabilidade), porque não se poderia exigir uma conduta diferente 
daquela praticada pelo pai coagido. 
 
A coação mencionada pelo artigo em questão é a de natureza moral, que é o 
emprego de grave ameaça contra alguém, a fim de que ele faça ou deixe de fazer 
alguma coisa. 
 
Haverá, obrigatoriamente, um juízo de valor sobre a questão: é necessário, no caso 
concreto, que se verifique se a ameaça lançada sobre o coato é de tal gravidade que 
afaste qualquer censura sobre sua conduta. 
 
Por outro lado, concluindo o intérprete que a coação era resistível, haverá crime, 
mas o juiz poderá atenuar a pena, por força do art. 65, II, “c”, primeira parte, do 
Código Penal. 
 
 
10.2 Obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico 
 
 
 
36
 Não confundir com a “coação física irresistível”: denominada vis corporalis, é a força física que se 
exerce sobre a pessoa e a leva a agir ou a se omitir, ainda que resistindo. É o exemplo da mãe que, 
amarrada por terceiro a uma cadeira, não consegue amamentar seu bebê, que assim morre de fome. 
A mulher, neste exemplo, não praticou qualquer conduta, dada a ausência de vontade e finalidade. 
Ou seja, da sua parte não há conduta. Porém, o resultado poderá imputar-se àquele que a impediu 
de agir. Em outras palavras, a coação física irresistível leva à ausência de conduta; a coação moral 
irresistível, ao afastamento da culpabilidade. 
 29
No mesmo sentido do que foi acima exposto, a segunda parte do art. 65, II, “c”, do 
Código Penal estabelece que, sendo o fato cometido em estrita obediência a ordem 
não manifestamente ilegal de superior hierárquico, só é punível o autor da ordem. 
 
A relação hierárquica é, obrigatoriamente, decorrente de uma subordinação 
estabelecida pelo Direito Público, ou seja, é inerente à Administração. Não há 
subordinação hierárquica, por exemplo, entre empregado e patrão, entre filho e pai 
ou por outro vínculo de natureza privada. 
 
Sobre o requisito “ordem não manifestamente ilegal”, devemos observar o seguinte: 
 
a) a obediência às ordens legais não constituirão delito, ou seja, aquilo que se faz 
segundo o ordenamento jurídico não poderá ser, ao mesmo tempo, criminoso. 
 
b) não se pode obedecer às ordens manifestamente ilegais. Logo, aqueles que as 
executarem praticarão crime. Exs.: O Juiz de Direito determina ao oficial de justiça 
que dê uma surra na testemunha, porque ela mentiu durante depoimento; ou o 
Delegado de Polícia ordena ao detetive que ponha o preso num pau-de-arara e o 
torture. Em ambos os casos, tanto quem ordena quanto quem executa a ordem 
praticará crime. Todavia, aquele que obedeceu à ordem poderá ter a pena atenuada, 
tal como dispõe o art. 65, II, “c”, segunda parte, do Código Penal. 
 
c) as ordens não manifestamente ilegais são aquelas que, embora contrárias ao 
ordenamento jurídico, têm uma certa aparência de legalidade. É o caso do Juiz de 
Direito que determina ao oficial de justiça a prisão civil de alguém, sem proferir 
previamente decisão escrita e fundamentada37. Expedido o mandado de prisão, há 
uma aparência de legalidade e o oficial de justiça, ao cumprir a ordem, não agirá de 
maneira censurável. 
 
 
37
 Art. 5º, LXI, da Constituição Federal: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem 
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar 
ou crime propriamente militar, definidos em lei.” 
 30
Ainda que afastada a culpabilidade da pessoa que age sob coação ou em 
obediência à ordem do superior hierárquico, o coator e o autor da ordem serão 
puníveis. 
 
 
10.3 Descriminantes putativas 
 
 
A regulação das descriminantes putativas está domiciliada no art. 20, parágrafo 1º, 
do Código Penal, com a seguinte redação: 
 
Art. 20 - ............................................................................................... 
§ 1º É isento de pena quem, por erro plenamente justificável pelas 
circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a 
ação legítima. Não há isenção de pena se o erro deriva de culpa e o 
fato é punível como crime culposo. 
 
A primeira parte do dispositivo trata das chamadas“descriminantes putativas”, ou 
“erro sobre tipo permissivo”. Recorramos ao exemplo tradicional: 
 
Tício, acreditando que está na iminência de ser morto por Mévio - seu antigo 
desafeto, que muitas vezes prometera matá-lo a tiros e se aproxima levando a mão 
à cintura -, saca seu revólver e desfere um único tiro contra o suposto ofensor, 
matando-o. Todavia, apura-se que Mévio pretendia tão-somente entregar-lhe uma 
carta de reconciliação. Nesta hipótese, Tício supôs uma situação de fato (agressão 
armada) que, se existisse, ampararia a legítima defesa. Logo, ainda que tenha 
praticado uma conduta típica e ilícita, ela não será culpável (reprovável), pois o 
Estado não poderia censurá-lo por agir do modo como agiu. Em outras palavras, não 
se poderia exigir de Tício uma conduta diferente. Com efeito, Tício não praticou 
crime, mas apenas um injusto penal (conduta típica e ilícita)38. 
 
Nesta hipótese, Tício supôs uma situação inexistente (agressão iminente), 
plenamente justificável pelas circunstâncias (Mévio já prometera matá-lo e tudo 
 
38 Para Damásio e outros, como já explicado, Tício praticaria crime mas não sofreria pena, pela 
ausência de culpabilidade. 
 31
indicava que estava na iminência de concretizar tal promessa). Todavia, a iminência 
de agressão ocorreu apenas no plano psíquico, não no da realidade objetiva. Agiu 
Tício, por conseguinte, em “legítima defesa putativa”, também denominada legítima 
defesa suposta, que afasta a culpabilidade, dada a inexibilidade de conduta diversa. 
 
Caso Tício agisse culposamente (com imprudência ou negligência), ele poderia 
responder a tal título, desde que a lei previsse a tipicidade culposa para aquele fato. 
É o que se denomina “culpa imprópria”. Ex.: Um motorista de táxi, trabalhando em 
violenta capital, percebe que seu passageiro começa a mexer numa bolsa, como se 
estivesse dela retirando um revólver. Supondo sinceramente que seria assaltado, o 
motorista desfere no passageiro um violento golpe com uma chave de roda, ferindo-
o gravemente. Porém, a vítima estava simplesmente procurando seu telefone 
celular. Nesta hipótese, o taxista agiu com imprudência, respondendo por lesões 
corporais culposas (art. 129, § 6º, do Código Penal). Tal modalidade de culpa é 
denominada “imprópria” pois o agente quis lesionar, mas a pena será a prevista no 
tipo culposo. 
 
O erro de tipo permissivo também se aplica às demais excludentes de ilicitude (cf. 
art. 23 do Código Penal). 
 
Finalmente, se Mévio estivesse realmente prestes a atirar em Tício, que repele a 
injusta agressão com uso moderado dos meios necessários, a conduta deste estaria 
amparada pela excludente de ilicitude da “legítima defesa real”, que afasta a 
ilicitude. 
 
Sinteticamente: 
 
a) A incidência de excludente de ilicitude real afasta o segundo elemento do crime: 
não sendo o fato ilícito, não existirá delito; 
 
b) A incidência de excludente de ilicitude putativa inevitável afasta a culpabilidade, 
dada a inexigibilidade de conduta conforme o direito. Logo, não há crime; 
 
 32
c) A incidência de excludente de ilicitude putativa evitável não afasta a culpabilidade. 
Assim, agindo o sujeito por imprudência ou imperícia, haverá crime e poderá o 
agente ser punido desde que prevista a modalidade culposa para figura penal na 
qual incorrer. 
 
 
11. SÍNTESE SOBRE A CULPABILIDADE 
 
 
Segundo a regra geral, implicitamente extraída do sistema adotado pelo Código 
Penal brasileiro, as pessoas são culpáveis. Como exceção, são causas excludentes 
da culpabilidade: 
 
1) Inimputabilidade por: 
 
1.1 Menoridade – art. 27, do Código Penal e 228, da CF; 
 
1.2 Doença mental que, manifestando-se ao tempo do fato, afaste totalmente a 
capacidade de entendimento sobre a ilicitude da conduta ou de autogoverno – art. 
26, caput, do Código Penal; 
 
1.3 Embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou de força maior – art. 28, § 
1º, do Código Penal. 
 
2) Erro de proibição inevitável – art. 21, primeira parte, do Código Penal. 
 
3) Coação moral irresistível – art. 22, primeira parte, do Código Penal. 
 
4) Obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico – art. 
22, segunda parte, Código Penal. 
 
5) Erro de tipo permissivo inevitável (descriminantes putativas) – art. 20, § 1º, 
primeira parte, do Código Penal. 
 
 33
12. BIBLIOGRAFIA 
 
 
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finalista. São Paulo: RT, 2001. 
 
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal 
brasileiro. Parte geral. São Paulo: RT, 1999. 
 
 
13. LEITURAS COMPLEMENTARES RECOMENDADAS 
 
 
GUARAGNI, Fábio André. As teorias da conduta em direito penal: um estudo da 
conduta humana do pré-causalismo ao funcionalismo pós-finalista. Série As ciências 
penais criminais no século XXI. São Paulo: RT, 2005, vol. 12. 
 
RODRIGUES, Cristiano. Teorias da culpabilidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 
2004.

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