Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Carlos Roberto Oliveira Souto Humberto Conrado Duarte Química da VidaD I S C I P L I N A Biomoléculas I Autores aula 14 Aula 14 Química da Vida 15 Carboidratos arboidratos são biomoléculas com funções vitais para os reinos animal e vegetal, tais como reserva de energia química (amido, glicogênio), componentes estruturais em paredes celulares (celulose), componentes essenciais dos ácidos nucléicos, mediação na interação entre células (definição do tipo sanguíneo). Exercem forte influência sobre a economia de algumas nações e crescem em importância mundial como matriz energética renovável na produção de álcool combustível. São ainda insumos vitais na indústria de papel, alimentos, fármacos e polímeros, entre outras. O termo carboidrato é aplicado às moléculas orgânicas cuja fórmula molecular geral expressa uma relação entre o número de átomos de carbono e um número correspondente a moléculas de água Cn(H2O)m, embora sem significado para a estrutura molecular. Exemplos: glicose C6(H2O)6 e sacarose C12(H2O)11; é como dizer que são “hidratos de carbono”. São chamados de sacarídeos, do latim saccharum, açúcar, ou glícides, relativo à glicose. Veja que os nomes dos carboidratos são caracterizados pelo sufixo -ose. Carboidratos são definidos como poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas, ou substâncias que por hidrólise resultam nestes. Portanto, observe que a química dos carboidratos combina a dos álcoois com a dos carbonilados. Carboidratos são classificados em: monossacarídeos (os mais simples, não podem ser subdivididos); dissacarídeos (2 monossacarídeos combinados); trissacarídeos (3 monossacarídeos combinados); oligassacarídeos (4 a 10); polissacarídeos (>10). Por sua vez, os monossacarídeos são classificados: pelo número de átomos de carbono na cadeia em triose, tetrose, pentose, hexose e heptose; pela função em aldose ou cetose. Ambas classificações podem ser expressas combinadas, como aldopentose, cetoexose e assim por diante. C H OH CH O OHH OHH CH CH2 OHH O OH CH2 OH HO H H OH CH O OHH OHH CH2 OH HO H O OHH OHH CH2 OH CH2 OH D-(+)-Gliceraldeído D-(-)-Ribose D-(+)-Glicose D-(+)-Frutose Aldotriose Aldotetrose Aldoexose Cetoexose CH2 OHH OH CH2 OH OHH CH O CH2 OHH OH HHO CH O H OH CH O CH2 OHH OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH OHH HO H CH O CH2 OHH OH OHH HO OH CH O CH2 OHH OH OH H HO HO H CH O CH2 OHH OH H H OH CH O H OH OHH OHH HHO CH O H OH OHH OHH H OH CH O HHO OHH OHH H CH O HHO HO OHH OHH H OH H OH OHH HHO CH O H H OH OHH HHO HO CH O HHO HO HO CH O H OHH H H OH CH O HO H OHH HHO CH O HH O D-(-)-Eritrose D(-)-Treose D-(+)-Alose D-(+)-Altrose D-(+)-Glicose D-(+)-Manose D-(-)-Gulose D-(-)-Idose D-(+)-Galactose D-(+)-Talose D-(-)-Ribose D-(-)-Arabinose D-(+)-Xilose D-(-)-Lixose D-(+)-Gliceraldeído Aula 14 Química da Vida16 As aldoexoses têm quatro carbonos quirais e 16 possibilidades estruturais, oito delas naturais com a designação D. E como você representa um açúcar L? Lembre-se de que L é a imagem especular de D, com todas as quiralidades invertidas e, portanto, a hidroxila do penúltimo carbono à esquerda, conforme você confere a seguir. Os monossacarídeos naturais têm a designação D (veja aula 9 – Estereoisomeria I) como padrão estrutural, definida pela hidroxila do carbono quiral de numeração mais alta, ou seja, o quiral mais distante da carbonila. Veja que o último carbono da cadeia é aquiral! As ilustrações a seguir representam essas definições. Carboidrato natural com a designação L é raríssimo, como a L-Fucose em um dos componentes dos antigênicos determinantes de grupos sanguíneos humanos. A designação D,L refere-se especificamente à quiralidade de um dos carbonos. É uma convenção para representação gráfica e não tem relação com a atividade ótica, dextrógira (+) ou levógira (-), que é um resultado experimental. Atente para esse fato. Conheça na seqüência a família das D-aldoses. HOH CH O H OH OH H OH H H OH CH O HOH OHH OHH L-GlicoseD-Glicose H OH CH O CH2 OHH OH OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH H HOH CH O OH H OH H D-Ribose L-Ribose H OH CH O OH H OH H HOH CH O OHH OHH D-Arabinose L-Arabinose O HOH OHH OHH O H OH OH H OH H D-Frutose L-Frutose OH OH OH O OH O H HO HO HO HO O OH OH OH OH O OH OH D-Glicose ~ 0,02 % D-D-Glicopiranose ~ 36 %E-D-Glicopiranose ~ 64 % 1 2 3 4 5 6cis trans hemiacetal hemiacetalcarbonilado carbono anomérico O OHHO OHH OHH O OHH HOH O H OH OHH HOH O OH H OHH HOH CH2 O OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH H OH OHH OHH O HOH OHH OHH O 1,3-Diidroxicetona D-Eritrulose D-Ribulose D-Xilulose D-Sorbose D-TagatoseD-Psicose D-Frutose Aula 14 Química da Vida 17 As cetoses são isômeros constitucionais das aldoses. Suas hexoses têm apenas três carbonos quirais e portanto oito esteroisômeros, quatro deles com a designação D. Observe a família das D-cetoses a seguir. Dois monossacarídeos diferentes entre si apenas na quiralidade de um dos carbonos são chamados de epímeros. Assim, D-glicose é epímero da D-manose com relação à C2, da D-alose à C3 e da D-galactose à C4. Embora os monossacarídeos sejam definidos como poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas, na realidade, existem como hemiacetais e não carbonilados! Isso porque na cadeia com carbonos sp, devido ao ângulo tetraédrico, as hidroxilas alcoólicas e nucleofílicas dos carbonos 4 e 5 aproximam-se muito da carbonila eletrofílica em C1, ou em C2, resultando na adição nucleofílica e formação do hemiacetal. Confira a seguir a representação para o equilíbrio da D-glicose em solução aquosa. E -D-Frutopiranose ~ 57 % E-D-Frutofuranose ~ 31 % D-D-Frutofuranose ~ 9 % D-FrutoseD-D-Frutopiranose ~ 3 % OH OH OH CH2 OH2 OOH 1 2 34 65 OH OH OH OOH 1 2 34 65 CH2 OH OH OH O OHHO H 1 234 65 CH2 OH OH OH OHHO O 1 2 34 6 5 CH2 CH2 OH OH OH OH O 1 2 3 4 6 5 CH2 OHHO CH2 H HO OH O OHHO 1 234 65 CH2 OH CH2 O HOH OHH OH OHH 1 2 3 4 6 5 CH2 OH OH OH OHOOH 1 2 3 4 6 5 CH2 CH2 OH OH OH OH OOH 1 2 34 6 5 CH2 CH2 OH Aula 14 Química da Vida18 Na glicose, a adição nucleofílica da hidroxila de C5 à carbonila em C1 resulta em dois hemiacetais cíclicos de seis membros, sistema que, conforme você já estudou, é livre de tensão angular e torcional. Como conseqüência, C1 passa de sp a sp e torna- se também quiral. A nova hidroxila resultante em C1 e originária da carbonila pode permanecer cis ou trans com o C6 exocíclico, e essas estruturas são designadas como formas E e D, respectivamente! O carbono 1, originalmente carbonílico, no hemiacetal é denominado anomérico por sua quiralidade referenciar duas formas hemiacetálicas ou anômeros de um monossacarídeo. Por analogia com o éter cíclico de seis membros chamado pirano, os hemiacetais de seis membros são chamados de piranoses. Portanto, quando você emprega o nome D-glicose, está referindo-se à forma carbonilada, ou cadeia aberta. Glicopiranose refere-se à forma hemiacetálica cíclica D ou E. Cristais das formas piranosídicas D e E apresentam os pontosde fusão 146oC e 150oC e as rotações óticas iniciais 112,0o e 18,7o, respectivamente. Em solução, ambas entram em equilíbrio com a forma carbonilada e, através desta, com a sua anomérica, predominando a forma E. Como conseqüência, as concentrações variam com o tempo até atingir o equilíbrio, indicado na representação anterior. A rotação ótica acompanha essa variação da composição em ambas as soluções até chegar ao valor comum de 52,7o, fenômeno conhecido como mutarrotação. Observe que a forma carbonilada participa da solução apenas como traços no equilíbrio entre os hemiacetais. D-frutose, uma cetoexose, apresenta a carbonila no carbono 2. A adição nucleofílica ocorre tanto com a hidroxila do carbono 5 quanto com a do carbono 6, resultando em ciclos de cinco e de seis membros. O hemiacetal de cinco membros recebe o nome genérico de furanose por analogia com o furano, éter cíclico de cinco membros. Observe as relações estruturais entre a D-frutose e seus hemiacetais furanosídicos e piranosídicos. Observe que tanto para as frutopiranoses quanto para as frutofuranoses C2 é o carbono anomérico. OH OH OH OH OHOH OH OH O OHO HO HO HO HO HO HO HO HO HO OO O - H2O SacaroseA-D-Glicopiranose B-D-Frutofuranose + ligação glicosídica B-D-Galactopiranose A,B-D-Glicopiranose + Lactose ligação glicosídica O OH OH HO HO HO O OH OH HO HO HO O OO OH OHOH HO HO HO HO HO- H2O Aula 14 Química da Vida 19 Dissacarídeos onossacarídeos condensam-se através do carbono anomérico, de um deles ou de ambos, eliminando água e estabelecendo a ligação glicosídica. A hidrólise é o processo inverso, ou seja, a quebra da ligação glicosídica que libera os monossacarídeos para o equilíbrio entre seus anômeros. A seguir, você observa a representação para dois dissacarídeos comuns no nosso dia-a-dia. M Sacarose, o açúcar comum extraído da cana, apresenta os resíduos da D-D-glicopiranose e da E-D-frutofuranose. Lactose, o açúcar do leite, apresenta os resíduos da E-D-galactopiranose e da D-glicopiranose (E e D). O primeiro passo no processo digestivo é a hidrólise enzimática da ligação glicosídica para liberar os monossacarídeos. Algumas pessoas são deficientes nas enzimas para hidrolisar a lactose e sofrem transtornos intestinais, a chamada intolerância à lactose. Polissacarídeos olissacarídeos são os carboidratos formados pela condensação de muitos monossacarídeos. Hexosanos são formados por hexoses e pentosanos por pentoses.Os três polissacarídeos naturais da glicose mais importantes são amido, celulose e glicogênio, sendo os dois primeiros os carboidratos mais abundantes do planeta. O amido é composto por dois hexosanos, a amilose (10–20%) e amilopectina (80–90%). É a principal reserva energética nas plantas, armazenado como grânulos microscópicos nas raízes, tubérculos e sementes. Também é o principal componente da nossa alimentação. A celulose é o material estrutural das plantas. Cerca de 50% da madeira é celulose e cerca de 25% pentosanos incluindo resíduos de hexoses, as hemiceluloses. P OH OH OH OH OH OH OH OH OH OH OH OH OH OH OH OHOH OH OH OH HO HO HO HO HO HO HO HO HO O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O O OO OO OO OO O O O O O O O O O O O O O O O Glicogênio O O O O O O OO OO OO O ligação D 1,4 1,6ramificação D amilopectina O CH2 OH CH2 OH CH2 OH O OO OHO HO HO HO HO HO HO HO HO HO HO HO HO HO HO HO HO OH HOligação E 1,4 n celulose n = até 3.000 CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 CH2 OH CH2 OH Aula 14 Química da Vida20 Glicogênio é reserva energética nos animais, armazenado nos músculos e fígado. Por ser muito hidrofílico, seu armazenamento é limitado pela quantidade de água que o acompanha. Essa é uma das razões pelas quais o organismo converte o excedente de glicose em gordura hidrofóbica como reserva concentrada. Revise esses conceitos, os quais você já estudou nas aulas 7 (Álcoois) e 13 (Derivados de ácido carboxílico). Embora os três sejam polissacarídeos da glicose, diferenciam-se entre si por características estruturais na cadeia polimérica. A amilose apresenta-se como cadeia linear, com ligações glicosídicas denominadas D1,4 porque une C1 de um resíduo D-piranosil (sem OH) ao oxigênio de C4 em outro resíduo. O número de unidades chega a milhares e a massa molar a 600.000. A cadeia, extensa, assume a forma de uma espiral. A amilopectina difere da amilose por apresentar centenas de ramificações D1,6 a cada 20 ou 25 unidades, e a massa molar pode chegar a 6.000.000. E o glicogênio assemelha-se à amilopectina, porém mais ramificado. A celulose, polissacarídeo linear, difere dos três anteriores por apresentar ligações E1,4. Essa ligação possibilita que as cadeias da celulose se empacotem fortemente pelo número elevado de ligações hidrogênio, o que justifica a resistência da madeira e a impossibilidade de nosso organismo digeri-la, por exemplo. Observe nos modelos a seguir as ligações glicosídicas desses polissacarídeos. su a re sp os ta1. 2. Atividade 4 1 2 Aula 14 Química da Vida 21 Represente as estruturas: D-D-manopiranose, E-D-alopiranose e D-D-frutofuranose. Represente o dissacarídeo formado a partir de 2 moléculas de D-glicose, com ligação glicosídica D1,4. Resumo 1 2 3 Aula 14 Química da Vida22 Nesta aula, estudamos que os aminoácidos, unidades fundamentais das proteínas, são compostos que apresentam os grupos amino, ácido carboxílico e uma cadeia lateral ligados ao carbono D na forma L; que são classificados em polares, apolares, ácidos e básicos pela cadeia lateral; e apresentam anfotericidade e capacidade de polimerização. Vimos que: íon dipolar ou zwitterion é um sal interno sem carga elétrica líquida; ponto isoelétrico é o valor de pH no qual todas as moléculas encontram-se na forma de íon dipolar; eletroforese é o processo de separação de compostos com base em suas cargas elétricas; ligação peptídica (uma amida) une dois resíduos de aminoácidos nos peptídeos; peptídeos são classificados em função do número de resíduos de aminoácidos e representados com o resíduo N-terminal à esquerda e o C-terminal à direita. As proteínas podem ser representadas por uma única cadeia polipeptídica ou por aglomerados destas; são classificadas em função da cadeia, da composição e da conformação, a estrutura protéica é descrita em quatro níveis: primária, secundária, terciária e quaternária. Os carboidratos são poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas com a fórmula genérica Cn(H2O)m. Os nomes têm o sufixo –ose, sendo os mais simples, os monossacarídeos, classificados em função da cadeia carbônica (3 a 7) e da função em aldoses e cetoses em combinação com o prefixo numérico; todos os naturais têm a designação D e apresentam-se como furanoses ou piranoses, hemiacetais cíclicos anoméricos. Por fim, as combinações de monossacarídeos formam dissacarídeos, trissacarídeos oligossacarídeos e polissacarídeos, sendo a celulose e o amido, polissacarídeos da D-glicose, os carboidratos mais abundantes do planeta. Auto-avaliação Explique as características fundamentais dos aminoácidos protéicos e como estes são classificados. Determine o pH para separar por eletroforese sobre papel os aminoácidos Glu, Arg e Leu. Represente todas as fórmulas estruturais que esses aminoácidos assumem em função da variação do pH como suporte para justificar seus cálculos. Represente, ainda, a eletroforese em um diagrama. Comente e justifique as característicasde uma ligação peptídica. 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 Aula 14 Química da Vida 23 Escreva a estrutura Leu.Phe.Pro.Asn, classifique-a e indique os aminoácidos C-terminal e o N-terminal. Demonstre como calcular o ponto isoelétrico desse peptídeo. Explique como as proteínas podem ser classificadas. Defina e ilustre o termo “grupo prostético”. Explique os significados dos termos: estrutura primária, secundária, terciária e quaternária de proteínas. Defina os termos “carboidrato” e “monossacarídeo” e explique como eles são classificados. Ilustre as formas D e L para uma aldoexose e uma cetoexose. Defina os termos: epímeros, piranose, furanose e anômeros. Ilustre com estruturas e os nomes correspondentes. Explique o fenômeno da mutarrotação, representando as estruturas envolvidas. O amido é composto por dois polissacarídeos. Descreva, represente e comente suas diferenças estruturais. Amido e celulose, polissacarídeos da D-glicose, apresentam propriedades e funções completamente diferentes. Que funções são essas e como se justificam essas diferenças? Química I Química II Aula 14 Química da Vida24 Referências ALLINGER, Norman L. et al. Química orgânica. 2. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1976. BARBOSA, Luiz Cláudio de Almeida. Introdução à química orgânica. São Paulo: Prentice Hall, 2004. BARBOSA, Luiz C. de Almeida. Introdução à química orgânica. 2. ed. São Paulo: Prentice Hall, 2004. MCMURRY, John. Química orgânica. 4. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1996. SOLOMONS, T. W. Graham. Química orgânica. 7. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 2003. VOLLHARDT, K. P. C.; SCHORE, N. E. Química orgânica, estrutura e função. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2004. WADE JÚNIOR, L. G. Organic chemistry. 4. ed. Upper Saddle River: Prentice Hall, 1999.
Compartilhar