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CHOQUE E DISTURBIOS HIDROELETROLÍTICOS NO PACIENTE POLITRAUMATIZADO Gregori Francescon CHOQUE NO PACIENTE POLITRAUMATIZADO Choque é uma alteração no sistema circulatório que causa perfusão inadequada dos órgãos e da oxigenação tecidual. O diagnóstico inicial baseia-se na avaliação clínica da presença de perfusão e oxigenação tecidual inadequadas. A partir da identificação da presença de choque, o segundo passo é identificar a causa, o que está diretamente relacionado ao mecanismo do trauma (Na maioria das vezes, os traumatizados em choque apresentam hipovolemia; entretanto, podem eventualmente apresentar também choque cardiogênico, obstrutivo, neurogênico e, ocasionalmente, séptico). • Choque hipovolêmico: hemorragias. • Choque obstrutivo: pneumotórax hipertensivo, tamponamento cardíaco • Choque neurogênico: lesão extensa da medula espinhal (hipovolemia relativa) • Choque séptico: infrequente, atendimento postergado (por exemplo, ferimentos penetrantes de abdome com contaminação peritoneal por conteúdo intestinal.) O reconhecimento do estagio de choque deve ser precoce a fim de evitar o colapso hemodinâmico e lesão à órgãos-alvo. Nesse sentido, todo doente traumatizado que está frio e taquicárdico está em choque, até prova em contrário (a taquicardia e a vasoconstrição cutânea são os sinais mais precoces de perda de volume sanguíneo na maioria dos pacientes, mas cuidado: doentes jovens e saudáveis podem ter compensação por períodos prolongados e deteriorar subitamente). CHOQUE HEMORRÁGICO Por ser a causa mais comum de choque no trauma, na presença de sinais de choque, o paciente é tratado com reposição volêmica. Os objetivos básicos são: identificar prontamente e interromper rapidamente a hemorragia. A classificação de hemorragia em quatro classes baseada em sinais clínicos (tabela 1.1) é uma ferramenta útil para estimar a porcentagem da perda aguda de sangue. Hemorragia Classe I: nessa fase os sintomas são mínimos, a taquicardia é leve. Assim sendo, não exige reposição para doentes saudáveis, que tendem a restabelecer o volume sanguíneo dentro de 24 horas. Hemorragia Classe II: os sinais clínicos dessa fase são: taquicardia, taquipneia e diminuição da PA. Alguns desses doentes acabam necessitando de transfusão sanguínea, mas podem ser estabilizados inicialmente pela reposição de soluções cristalóides. CHOQUE E DISTURBIOS HIDROELETROLÍTICOS NO PACIENTE POLITRAUMATIZADO Gregori Francescon Hemorragia Classe III: Os doentes quase sempre apresentam os sinais clássicos de perfusão inadequada, incluindo taquicardia acentuada, taquipneia, alterações significativas do estado mental e queda mensurável da pressão sistólica. Doentes com esse grau de perda sanguínea quase sempre requerem transfusão. Entretanto, a prioridade no tratamento inicial é interromper a hemorragia por meio da realização de cirurgia de emergência ou embolização se necessário. A decisão de transfusão de sangue é baseada na resposta do doente à reposição líquida inicial. Hemorragia Classe IV: os sintomas incluem taquicardia acentuada, diminuição significativa da pressão sistólica e presença de pressão do pulso muito pinçada ( ou de pressão diastólica não mensurável), o débito urinário é desprezível e o nível de consciência está notadamente deprimido. Tais doentes usualmente exigem transfusão rápida e intervenção cirúrgica imediata Para um homem de 70 kg, o volume de sangue corresponde a 5 litros em média. . Abordagem Inicial do choque hemorrágico As prioridades são controle da hemorragia externa, obtenção de acesso venoso adequado e avaliação da perfusão tecidual. O sangramento de feridas externas usualmente pode ser controlado com pressão direta sobre o local, embora hemorragia maciça em uma extremidade possa requerer um torniquete. Pode ser necessário o controle cirúrgico ou angiográfico de hemorragias internas. Na reanimação inicial são utilizadas soluções eletrolíticas isotônicas aquecidas, como Ringer lactato ou soro fisiológico. Um volume de líquido aquecido inicial é administrado. A dose habitual é de um a dois litros no adulto e de 20 ml/kg em crianças. Volumes absolutos de fluidos para a reanimação devem ser baseados na resposta do doente. É importante lembrar que a quantidade inicial de fluidos inclui qualquer fluido administrado no pré-hospitalar. É importante avaliar a resposta do doente à reposição volêmica e identificar a evidência de· uma adequada perfusão e oxigenação orgânica finais {por exemplo, débito urinário, nível de consciência e perfusão periférica). Se, durante a CHOQUE E DISTURBIOS HIDROELETROLÍTICOS NO PACIENTE POLITRAUMATIZADO Gregori Francescon reanimação, a quantidade de líquido necessária para restaurar ou manter a perfusão orgânica for muito maior que essa estimativa, torna-se necessária uma reavaliação cuidadosa da situação, assim como a pesquisa de uma lesão não diagnosticada e de outras causas de choque. Os mesmos sinais e sintomas de perfusão inadequada utilizados para o diagnóstico de choque são guias úteis para avaliar a resposta do doente. Os padrões prováveis de resposta à administração inicial de fluidos podem ser divididos em três categorias: resposta rápida, resposta transitória e resposta mínima ou ausente 1. Resposta rápida: Usualmente, esses doentes tiveram uma pequena perda da volemia (inferior a 20%) e permanecem hemodinamicamente normais após o término da reposição inicial, quando a velocidade de infusão é reduzida para níveis de manutenção 2. Resposta transitória: Os doentes deste grupo respondem à reposição inicial rápida. Entretanto, alguns doentes, à medida que se reduz a velocidade de infusão para níveis de manutenção, mostram deterioração da perfusão periférica, indicando sangramento persistente ou reanimação inadequada. A maioria desses doentes teve perda sanguínea inicial estimada entre 20 e 40% do volume sanguíneo. Sangue e derivados são indicados, mas o fato mais importante é reconhecer que este doente requer controle da hemorragia por cirurgia ou angiografia 3. Resposta mínima ou ausente: A falta de resposta na sala de emergência à administração adequada de cristaloide e de sangue indica a necessidade de intervenção definitiva imediata (por exemplo, cirurgia ou angioembolização) para controlar uma hemorragia exsanguinante Os sinais vitais e os protocolos para tratamento desses doentes nessas categorias estão na Tabela 3.2. CHOQUE E DISTURBIOS HIDROELETROLÍTICOS NO PACIENTE POLITRAUMATIZADO Gregori Francescon Reposição de sangue Doentes com resposta transitória ou mínima I sem resposta - aqueles em hemorragia classe III ou IV - necessitarão de sangue e derivados como parte precoce de sua reanimação. Quando não está disponível sangue tipo específico, indica-se o uso de concentrados de hemácias tipo O para doentes com hemorragia exsanguinante. Assim que estiver disponível, o uso de sangue tipo específico é preferível ao tipo O. A maneira mais eficiente e fácil de prevenir a hipotermia em qualquer doente que receba volume maciço de cristaloides é o aquecimento do líquido a 39°C antes de usá-lo Situações especiais a) Gravidez: Tendo em vista a hipervolemia fisiológica da gravidez, torna-se necessária uma perda sanguínea maior para que se manifestem anormalidades de perfusão na mãe que também repercutam na perfusão fetal, reduzindo-a. b) Idoso: O processo de envelhecimento produz uma diminuição relativa da atividade simpática no que diz respeito ao sistema cardiovascular. Contrariamente ao jovem, o idoso não consegue aumentar a frequência cardíaca ou a eficiência das contrações miocárdicas quandosubmetido a perda de volume sanguíneo. Muitos doentes idosos apresentam uma depleção de volume preexistente, devida a uso crônico de diuréticos ou a um estado subclínico de desnutrição, além disso, uso de bloqueadores beta-adrenérgicos pode mascarar a taquicardia como indicador precoce do choque. A mortalidade e a morbidade decorrentes de lesões leves ou moderadamente graves aumentam diretamente com o envelhecimento e com a presença de doenças crônicas. c) Atletas: As rotinas de treinamento rigoroso adotadas por este grupo de doentes alteram sua dinâmica cardiovascular. O volume sanguíneo pode aumentar de 15 a 20% e o débito cardíaco pode aumentar até seis vezes. O volume de ejeção sistólica pode aumentar 50% e o pulso de repouso é, geralmente, em torno de 50. A capacidade desse grupo em compensar a perda sanguínea é verdadeiramente surpreendente. A resposta habitual à hipovolemia pode não se manifestar em atletas, ainda que tenha ocorrido perda volêmica significativa. CHOQUE E DISTURBIOS HIDROELETROLÍTICOS NO PACIENTE POLITRAUMATIZADO Gregori Francescon Distúrbios hidroeletrolíticos no politraumatizado 1. Acidose metabólica Os doentes com choque hipovolêmico precoce têm alcalose respiratória devido à taquipneia. A alcalose respiratória é seguida frequentemente por acidose metabólica leve nas fases precoces do choque e não necessita de tratamento. A acidose metabólica grave pode surgir quando o choque é prolongado ou grave. A acidose metabólica decorre do metabolismo anaeróbio devido à perfusão tecidual inadequada e à produção de ácido láctico. Sua persistência reflete, habitualmente, uma reanimação inadequada ou perdas sanguíneas continuadas e, em doentes normotérmicos em choque, deve ser tratada com a infusão de líquidos e de sangue. O bicarbonato de sódio não deve ser usado rotineiramente para o tratamento da acidose metabólica secundária ao choque hipovolêmico. 2. Hipercalemia: Caracterizada por K+ > 5 mEq/l, frequentemente é assintomática, embora nos casos graves possa cursar com sérias alterações da função muscular e do ritmo cardíaco. De um modo geral, está presente no trauma tecidual maciço, rabdomiólise. O tratamento da hipercalemia vai depender da gravidade do quadro, embora, de um modo geral, em todos os casos deva-se sempre restringir ou suspender a administração de potássio e corrigir os fatores causais. Nos quadros leves, essas medidas bastam, podendo- se associar furosemida nos casos com insuficiência renal ou suprarrenal. Nos casos moderados e graves, segue-se o seguinte roteiro: 1. Restringir ou suspender o potássio e corrigir os fatores causais; 2. Antagonizar os efeitos neuromusculares da hiperpotassemia (reduz a toxicidade cardíaca, mas não reduz os níveis de K+), com gluconato de cálcio a 10% (0,5 a 1,0 ml/kg, EV em 15 minutos, com monitorização do ECG); é a primeira medida terapêutica nos pacientes já com toxicidade cardíaca; 3. Redistribuir o K+ internamente: a) bicarbonato de sódio (1 a 2 mEq/kg, EV), atua rapidamente, constituindo-se na forma mais rápida de diminuir o potássio (efeito persiste em torno de 2 horas); b) glicoinsulinoterapia (glicose 0,5 a 1 g/kg + 1 UI de insulina para cada 4 g de glicose, EV, em 60 minutos), reduz o K+ em 1 a 2 mEq/l em 30 a 60 minutos e o efeito persiste por 4 a 6 horas; 4. Aumentar a eliminação do K+: a) diuréticos de alça (furosemida); b) resinas de troca: 0,5 a 1,0 g/kg de 6/6 ou 4/4 horas, diluídos em água ou sorbitol (3 ml/g de resina), de preferência por via oral ou SNG (utilizar a via retal em caso de vômitos); c) diálise (hemodiálise ou diálise peritoneal). CHOQUE E DISTURBIOS HIDROELETROLÍTICOS NO PACIENTE POLITRAUMATIZADO Gregori Francescon REFERÊNCIAS ATLS – Manual do Curso de Alunos – 8ª. Edição – Colégio Americano de Cirurgiões – 2012 http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/HOSPSUS/ProtocolotraumaMG.pdf https://www.researchgate.net/publication/261025728_Disturbios_hidroeletroliticos_Fluid_ and_electrolyte_disorders
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