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Química Orgânica Florence M. Cordeiro de Farias Este documento tem nível de compartilhamento de acordo com a licença 3.0 do Creative Commons. http://creativecommons.org.br http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/br/legalcode . 1 . Sala de Leitura Química Orgânica Química Orgânica Histór ico até a def in ição f inal A utilização de compostos orgânicos é descrita desde a antiguidade. Pesquisas arqueológicas recentes comprovaram a presença de vinhos em jarros encontrados em tumbas de faraós (3150 a.C.). Os papiros egípcios de Ebers (cerca de 1500 a.C.), de Edwin Smith (cerca de 1600 a.C.) e de Brugsch (cerca de 1300 a.C.) descrevem inúmeras fórmulas medicinais cujos constituintes eram principalmente ervas. Os próprios papiros eram feitos da celulose obtida a partir dos talos da planta papiro do Egito, planta aquática da mesma família da tiririca, abundante nas margens do Rio Nilo. A Bíblia, no episódio de Noé (Gênesis), fala no vinho. Os romanos e egípcios utilizavam os corantes índigo e alizarina. O índigo era obtido a partir de plantas do gênero Indigofera (anil do campo, timbozinho) e atualmente é obtido por síntese e utilizado principalmente para a coloração de “jeans”. A alizarina era retirada de raízes da rubia . A alizarina foi o primeiro corante a ser sintetizado (obtido em laboratório) e hoje em dia é utilizado principalmente como reagente químico. Apesar dessa grande utilização, até o século XVIII era pouco o conhecimento que se tinha sobre as propriedades e composição dos compostos orgânicos. A Química já era bastante estudada, mas a parte que envolvia a composição e estrutura (átomos que existiam nas moléculas e as formas com que se arrumavam nelas) dos compostos orgânicos era pouco conhecida. A importância da Química Orgânica estava muito mais em sua fonte de obtenção (na época, animal ou vegetal) e em sua aplicabilidade em medicina, do que na sua parte estrutural. Havia pouca produção de materiais orgânicos e, na maioria das vezes, eram feitos domesticamente ou em pequena escala. Poucas coisas como, por exemplo, a fabricação de sabão, o refino do açúcar, processos de tingimento e destilação (separação de duas ou mais substâncias por aquecimento) eram feitas em escalas maiores. Poucos compostos orgânicos eram conhecidos em sua forma pura. Valerius Cordus (médico e botânico alemão,1515-1544) descreveu, em 1540, a obtenção do éter por tratamento do álcool com ácido sulfúrico – método ainda usado –, dentre outros. Em 1780, Scheele (químico farmacêutico sueco, 1742- 1786) desenvolveu um método químico para obter ácidos orgânicos a partir de plantas ou animais e assim descobriu vários ácidos orgânicos, tais como, por exemplo, os ácidos benzoicos (isolados da resina balsâmica obtida do benjoim: Styrax benjoin), utilizado hoje em dia para a preservação de alimentos, e o ácido tartárico (Figura 1), isolado de extratos de uvas fermentadas. . 2 . Sala de Leitura Química Orgânica COOH Ácido Benzóico HOOC COOH OH OH Ácido tartárico Figura 1: Estruturas do ácido benzoico e ácido tartárico. O que podemos notar é que os compostos orgânicos eram obtidos, até então, de plantas ou animais. As técnicas existentes na época não permitiam sua caracterização (isto é, como eram constituídos). Lavoisier (químico francês, 1743-1794) já havia relatado que, diferente dos compostos químicos do “reino mineral”, os compostos orgânicos eram constituídos principalmente de carbono e hidrogênio e, frequentemente, também de nitrogênio e fósforo. Passou a ocorrer uma tendência a achar que a Química Orgânica, embora fosse uma parte integrante da Química, era diferente. Na medida em que era relacionada aos organismos vivos e aos compostos orgânicos, acreditava-se, eram produzidos apenas por esses organismos. A Química Orgânica, como uma divisão da Química, foi proposta em 1777 por Bergman (físico e matemático sueco, 1735-1784) e foi definida como a “Química dos organismos vivos”. Em 1797, pela primeira vez, é tratada diferencialmente quando Gren (químico alemão,1760-1798) publica um livro no qual os compostos orgânicos são tratados em um capítulo à parte. Nesse capítulo, essas substâncias são definidas, na linguagem da época, “como princípios presentes em organismos animais e vegetais e que não poderiam ser sintetizados artificialmente”. Essa ideia permaneceu por várias décadas. Vários químicos achavam que a origem desses compostos (seres vivos) os diferenciava dos compostos minerais. Esses últimos eram obtidos frequentemente em estados mais puros e obedeciam à Lei das Proporções Constantes (também denominada Lei de Proust, ela diz que, independente do modo pelo qual uma substância é obtida, a proporção, em massa, dos elementos que participam de sua composição é sempre a mesma). Como, na época, as técnicas existentes dificultavam a obtenção de compostos orgânicos puros, a presença de impurezas diversas levava a resultados diferentes de análise elementar (proporção de cada átomo presente na molécula) para um mesmo composto, então achou-se que não obedeciam à Lei das Proporções Constantes. A origem do termo “Química Orgânica” vem da proposta de Berzelius (1779-1848), médico e químico sueco, em 1807, para referir-se a todos os compostos descobertos a partir de organismos vivos. Acreditava-se – teoria denominada de Vitalismo – que os compostos orgânicos eram obtidos pela intermediação de uma força vital que existia apenas em plantas e animais. Esses compostos poderiam ser extraídos e transformados uns nos outros, mas não poderiam ser obtidos a partir de outros elementos do reino mineral (que não possuíam a força vital). . 3 . Sala de Leitura Química Orgânica A ideia do vitalismo começou a declinar quando Wöhler (1800-1882), médico e químico sueco, em 1828, sintetizou a ureia (substância anteriormente isolada da urina de animais) a partir do cianato de amônia, reação que ficou conhecida como Síntese de Wöhler (Figura 2). Na realidade, Wöhler desejava obter cianato de amônia e, para isso, tratou cianato de chumbo com hidróxido de amônia. Para sua surpresa, obteve um material sólido, que não mostrou as propriedades típicas dos cianatos. Ao analisar o que havia ocorrido, descobriu que havia obtido ureia, idêntica àquela anteriormente isolada de urina. Na realidade, a reação do cianato de chumbo com hidróxido de amônia forma cianato de amônia que, por aquecimento, gera ureia: Figura 2: Síntese de Wöhler Wöhler, então, escreveu para Berzelius dizendo: “Devo contar-lhe que eu posso fazer ureia sem o uso de rins animais ou humanos”. Realmente, a experiência de Wöhler foi de grande importância, mas ainda houve o questionamento do fato de que, na realidade, esses compostos deveriam ter a força vital, pois o hidróxido de amônia e o ácido ciânico (fonte do cianato de chumbo) eram obtidos de fontes animais (origem orgânica). O reconhecimento de que a teoria da força vital não tem grande aplicabilidade na Química Orgânica foi ocorrendo gradualmente, na medida em que novos compostos orgânicos foram sendo reconhecidos e sintetizados. À medida que o vitalismo perde forças, aquela definição anterior proposta por Bergman (química dos organismos vivos) deixa de ser adequada e, então, Kekulé (1829-1896), químico alemão,(químico alemão, 1829-1896) propõe a definição da Química Orgânica como o ramo da Química que estuda os compostos de carbono. Essa afirmação está correta, contudo, nem todo composto que contém carbonoé orgânico. Por exemplo, o dióxido de carbono, o carbonato de sódio, o ácido carbônico, dentre outros, não são orgânicos. Mas, todo composto orgânico contém carbono. Por conveniência, o termo orgânica se mantém até hoje, buscando classificar um grande número de compostos que possuem uma série de propriedades em comum. Diferente dos outros elementos, o . 4 . Sala de Leitura Química Orgânica átomo de carbono tem a capacidade de se ligar infinitamente entre si em um número ilimitado de combinações, gerando, com essas ligações, milhares de compostos diferentes. Deve-se enfatizar, contudo, que as divisões da Química nunca foram, nem se espera que venham a ser, mutuamente exclusivas, pois o campo da Química é um só, e há uma tendência natural para a unificação e remoção de barreiras artificiais. A divisão em Química Orgânica, inorgânica, analítica, físico-química e bioquímica se faz buscando uma finalidade didática e em função do enfoque que se deseja dar a um determinado problema. Importância A Química Orgânica está presente em qualquer atividade de nossas vidas. Nesse momento, por exemplo, ao ler esse texto, tudo está sendo mediado por compostos orgânicos. Para conseguir enxergar, seus olhos estão utilizando um composto orgânico (o cis-retinal) para converter a luz em um impulso nervoso. Quando você mexe no “mouse”, no teclado, enfim, faz qualquer movimento (até dormir) o seu organismo está fazendo uma reação química para transformar a glicose em energia. Para que você possa raciocinar e entender esse texto ou perceber o mundo, os impulsos nervosos são transmitidos entre os neurônios através da intermediação de moléculas orgânicas (neurotransmissores, como, por exemplo, a serotonina). A vida moderna está repleta de compostos orgânicos. A grande maioria dos medicamentos, vários pesticidas, as fibras têxteis, os polímeros, os corantes...são moléculas orgânicas. Como mostrado no breve resumo que se fez sobre a história da Química Orgânica, desde a pré-história até meados do século XIX, os compostos orgânicos eram obtidos de organismos vivos. Atualmente, apesar de muitas substâncias orgânicas naturais serem muito complexas e de difícil obtenção laboratorial e, assim, ainda serem obtidas a partir de plantas ou animais, a maioria dos compostos orgânicos são obtidos em laboratório. Os compostos são retirados dos organismos vivos (atualmente, o ambiente marinho também tem se mostrado uma grande fonte de produtos orgânicos), estudados e depois, se tiverem alguma aplicação, sintetizados. Assim, por exemplo, a gente já comentou que o índigo, corante azul utilizado em “jeans”, antigamente era obtido de plantas. Porém, sua aplicação industrial é tão grande que a obtenção da fonte natural não atenderia à demanda mundial. É aí que a Química Orgânica moderna exerce o seu papel: atualmente, o índigo é obtido através de uma síntese (chama-se síntese o processo de transformação de moléculas através de reações químicas para se obter a molécula que se deseja). Dessa mesma forma, tem se sintetizado uma variedade enorme de compostos orgânicos, cujo isolamento de fontes naturais tornaria o processo inviável economicamente. Assim, vários compostos obtidos por síntese são exatamente iguais àqueles existentes nos organismos vivos. Outras vezes, o químico faz algumas modificações nas moléculas naturais, obtendo . 5 . Sala de Leitura Química Orgânica compostos semelhantes (denominados derivados), mas que apresentam maior aplicabilidade do que o produto natural. Por exemplo, o ácido salicílico é isolado do salgueiro (família de plantas do gênero Salix) e apresenta atividade anti-inflamatória. No entanto, possui também um efeito corrosivo nas paredes do estômago. Assim, o derivado ácido acetil salicílico (AAS) foi sintetizado e é utilizado como medicamento anti-inflamatório que possui menos efeito colateral que o primeiro. Repare como eles são parecidos (Figura 3): OH COOH O COOH O ÁCIDO SALICILICO ÁCIDO ACETIL SALICILICO Figura 3: Estruturas do ácido salicílico e do AAS Com o crescimento da Química Orgânica e o acúmulo de informações obtidas hoje em dia, várias moléculas de grande utilidade são obtidas por síntese química, muitas vezes sem ter nenhuma correlação com produtos naturais. Fonte de compostos orgânicos Mas, se a maioria dos compostos orgânicos atualmente são obtidos por síntese, quais são as matérias- primas para a sua obtenção? Os compostos orgânicos utilizados como matéria-prima atualmente são obtidos de produtos naturais (por exemplo, no Brasil, o álcool é obtido da fermentação - reação química realizada por micro- organismos – do açúcar da cana e é utilizado para a síntese de éter) e, principalmente, de materiais fósseis. Até o século XX, a principal fonte de compostos orgânicos era o carvão mineral (denominado hulha). A destilação da hulha fornece três frações constituídas respectivamente de: 1) Um material gasoso constituído principalmente de hidrogênio e dióxido de carbono, que era muito utilizado para iluminação e aquecimento; 2) Material líquido, denominado de alcatrão da hulha, e que é a fonte de compostos orgânicos, e 3) Material sólido, denominado coque, utilizado em siderurgia para a obtenção . 6 . Sala de Leitura Química Orgânica do ferro gusa (liga de ferro e carbono – designa-se liga uma mistura homogênea de metais) matéria- prima utilizada para a produção do lingote de ferro. No século XX, o petróleo passa a constituir a principal fonte de compostos orgânicos. Além de carbono e hidrogênio, vários outros elementos também estão presentes nos compostos orgânicos. A tabela periódica a seguir mostra os principais elementos constituintes de compostos orgânicos, estando em vermelho os elementos presentes em maiores quantidades. 1 14 15 16 H C N O Si P S Cl Br I Tabela 1: Tabela Periódica Assim, o gás metano (principal constituinte do gás natural) possui apenas carbono e hidrogênio. A sacarose (açúcar comum) possui carbono, hidrogênio e oxigênio. A anfetamina, um estimulante do sistema nervoso central, possui, além de carbono e hidrogênio, nitrogênio. O colágeno, a elastina e as glicoproteínas são as fibras responsáveis pela sustentação da derme e contém silício em sua estrutura. O NAD (nicotinamida-adenina-dinucleotídeo) é um agente oxidante biológico que contém fósforo em sua estrutura. O cheiro desagradável exalado pelo gambá é devido a dois compostos orgânicos que contém carbono, hidrogênio e enxofre em sua estrutura. O policloreto de vinila (PVC) utilizado para a fabricação de canos é constituído de átomos de carbono, hidrogênio e cloro. O halomon é um composto que contém, além de carbono e hidrogênio, bromo e cloro em sua estrutura. Foi isolado de uma alga marinha e possui atividade antitumoral (possibilidade de uso na terapia contra o câncer). A tiroxina é o hormônio produzido pela tiroide e contém, além de carbono, hidrogênio, oxigênio, . 7 . Sala de Leitura Química Orgânica nitrogênio e iodo em sua estrutura. Daqui a pouco, quando a gente entender como as moléculas são representadas, vocês vão ver a estrutura desses compostos. Ligações Químicas Covalentes Antes de começarmos a analisar o átomo de carbono e os compostos orgânicos, devemos recordar sucintamente o processo pelo qual ocorrem as ligações químicas covalentes, isto é, aquelas que se fazem por compartilhamento de elétrons. Os elétrons em um átomo estão distribuídosnos orbitais atômicos (orbital é uma dedução matemática que define a região do espaço onde existe maior probabilidade de se encontrar elétrons). Os orbitais possuem tamanho e níveis energéticos diferentes (quanto mais afastado do núcleo, maior e mais energético é o orbital) e, em função disso, são subdivididos nos subníveis s, p, d e f. Para o estudo da Química Orgânica, vamos nos limitar aos subníveis s e p. Os orbitais s possuem a forma esférica, isto é, a probabilidade de encontrar elétrons é maior na região do espaço definida por uma esfera: Figura 4: a) ORBITAL 1s b) ORBITAL 1s (preto) e 2s (cinza) Os orbitais p tem a forma de um haltere e, como são três, orientam-se no espaço ao longo dos eixos cartesianos x, y e z (Figura 5): . 8 . Sala de Leitura Química Orgânica Figura 5: a) ORBITAL 2p b) ARRUMAÇÃO ESPACIAL DOS ORBITAIS 2px, 2py e 2pz Os orbitais 3p e 4p possuem a mesma forma de haltere, só que se encontram mais afastados do núcleo (e, então, são maiores e mais energéticos). A região do espaço entre os dois lobos do haltere é denominada nodo e, nessa região, não há probabilidade de se encontrar elétrons. Os orbitais dos subníveis s não possuem nodo. Para simplificar o desenho dos orbitais, normalmente eles são apresentados da seguinte forma (Figura 6): Figura 6: a) Representação dos orbitais s e p; b) Orbitais p orientados nos eixos cartesianos Quando ocorre uma ligação química covalente, os orbitais atômicos do último nível (orbitais ocupados pelos elétrons de valência) vão se aproximando, encontram-se, e formam um novo orbital (orbital molecular) onde vão se posicionar os dois elétrons, que, agora passam a ser compartilhados pelos dois núcleos dos átomos que se aproximaram, ou seja, os orbitais moleculares são ocupados pelos dois elétrons que formam a ligação. . 9 . Sala de Leitura Química Orgânica Por exemplo, vamos ver como ocorre a formação da ligação entre dois átomos de hidrogênio para formar a molécula do gás hidrogênio. Para obedecer a regra do octeto, cada átomo de hidrogênio deve ficar com dois elétrons. A distribuição eletrônica do átomo de hidrogênio (1H) é 1s1 e, consequentemente, vai ocorrer uma interação entre dois orbitais s: 1s σ ORBITAL MOLECULAR 1s Figura 7 Observe que a interação entre estes dois orbitais ocorre segundo um mesmo eixo, ou seja, ocorre uma interação linear dos dois orbitais. O orbital resultante desse tipo de interação é denominado orbital sigma (σ) e a ligação resultante é denominada ligação sigma (σ). A representação estrutural de uma ligação química é feita por um traço (-) e, assim, a molécula do hidrogênio é representada com a seguinte fórmula estrutural: H-H. Mas, se os orbitais são ocupados por elétrons e esses possuem carga negativa, como os orbitais se aproximam, se cargas iguais tendem a se repelir? Nota ao professor: Para uma melhor compreensão do aluno do Ensino Médio, as representações que se seguem não obedecem plenamente à TEORIA DA COMBINAÇÃO LINEAR DOS ORBITAIS ATÔMICOS (CLOA) e, portanto, conceitos relativos à formação de orbitais moleculares somente levam em conta os orbitais ligantes, descartando-se a formação de antiligantes que não se aplicam às necessidades dos alunos nessa fase de aprendizagem. . 10 . Sala de Leitura Química Orgânica O que ocorre é uma atração eletrostática (atração entre cargas opostas) entre o núcleo (carga positiva devido aos prótons) e os orbitais (cargas negativas porque os elétrons estão aí). Assim, o núcleo de um átomo atrai a nuvem eletrônica do outro até o momento em que a aproximação dos dois orbitais gera uma repulsão eletrostática, e aí acaba o processo de formação da ligação. Nessa situação, há um equilíbrio entre as forças de atração e repulsão, resultando numa distância internuclear de maior estabilidade Essa distância internuclear é o que denominamos de comprimento (ou distância) da ligação, cuja unidade mais utilizada é o Angstron (Ao; 1 Ao = 10 –10 m). O comprimento da ligação H-H é de 0,74 Ao. Em um segundo exemplo, vamos ver como ocorre a formação da ligação da molécula do cloro, onde a interação acontece entre dois elétrons que ocupam os orbitais 3p (17 Cl: 1s2 2s2 2p6 3s2 3p5) : σ ORBITAIS ATÔMICOS 3p ORBITAL MOLECULAR 3p 3p Figura 8 Observe que, assim como para a formação da molécula de hidrogênio, a interação dos orbitais é linear, segundo um mesmo eixo. Logo, a ligação que se forma também é uma ligação σ. O comprimento dessa ligação é de 1,42 Ao. Na formação da molécula de ácido clorídrico (HCl) ocorre a interação entre um orbital 1s do hidrogênio com um 3p do cloro: . 11 . Sala de Leitura Química Orgânica 1s σORBITAL MOLECULAR3p Figura 9 Como para os outros exemplos, a interação dos orbitais ocorre linearmente, formando uma ligação σ. O comprimento da ligação H-Cl é de 1,27 Ao. Nos exemplos vistos acima, todas as ligações ocorreram segundo um mesmo eixo, ou seja, foram realizadas interpenetrações lineares de orbitais gerando ligações σ. Entretanto, nem sempre isso é possível, pois quando mais de uma ligação é realizada entre dois átomos, uma delas ocorre segundo um mesmo eixo, porém as demais, em função do próprio arranjo espacial dos orbitais, não podem ocorrer dessa forma, visto que os demais orbitais envolvidos não estão alinhados segundo esse mesmo eixo, mas sim em eixos normalmente paralelos. Sendo assim, a interpenetração não ocorre de forma linear e as ligações são estabelecidas segundo eixos paralelos, distinguindo-se da sigma (σ) e são denominadas de ligações pi (π): Como exemplo, vamos ver a formação da molécula de nitrogênio (7N: 1s2 2s2 2p3). Pela configuração eletrônica do átomo, há três orbitais p, cada um com um elétron: 2px1 2py1 2pz1. Os orbitais 2px1 (essa escolha 2px foi arbitrária. A ligação poderia ser feita entre os 2py ou 2pz) se superpõem ao longo do eixo x (eixo internuclear) e formam uma ligação σ: . 12 . Sala de Leitura Química Orgânica σORBITAIS ATÔMICOS2p ORBITAL MOLECULAR Figura 10 E as outras duas ligações? As outras duas ligações são feitas por entrosamento orbitalar paralelo, perpendicular ao eixo da ligação σ, formando duas ligações π: ORBITAIS ATÔMICOS2py ORBITAIS ATÔMICOS2pz Figura 11: a) Representação dos orbitais na molécula de N2; b) Representação da molécula de N2. Observem que, nesse entrosamento paralelo dos orbitais p, cria-se dois orbitais moleculares π que originam, na molécula, regiões ricas em elétrons (orbitais π) que se posicionam acima e abaixo do plano da ligação σ (Figura 11). Portanto, uma das ligações covalentes entre dois átomos é chamada de sigma (σ) e as demais, entre esses mesmos átomos, é chamada de pi (π). Assim, numa dupla ligação, é encontrada uma ligação sigma (σ) e uma pi (π); numa tripla ligação, é encontrada uma ligação sigma (σ) e duas pi (π). Quando não há presença de duplas ou triplas ligações nas moléculas todas são classificadas como sigma. . 13 . Sala de Leitura Química Orgânica Ligações Covalentes Polares e Apolares Os elétrons nas ligações covalentes não são necessariamente compartilhados igualmente entre os dois átomos que formam a ligação. Se um átomo for mais eletronegativo (eletronegatividade é a tendência que possuem determinados átomos de atrair elétrons) que o outro, o átomo mais eletronegativovai puxar os elétrons para mais perto dele. Quando isso ocorre, dizemos que a distribuição eletrônica é polarizada e a ligação é dita covalente polar. Por exemplo, na molécula de H-F, como o flúor é mais eletronegativo que o hidrogênio, os elétrons da ligação vão estar mais próximos do flúor. Assim, a ligação H-F é uma ligação covalente polar, na qual o flúor possui uma carga parcial negativa (a carga é denominada parcial para distingui-la da carga formal, que é a carga real presente nos cátions e ânions). As formas mais utilizadas para representar essa polarização são os símbolos δ+ δ‐ para representar cargas parciais ou uma seta orientada no sentido do átomo menos eletronegativo para o mais eletronegativo: H F δ+ δ- H Fou Figura 12 Na tabela periódica, a eletronegatividade cresce da esquerda para a direita e de baixo para cima. Linus Pauling (químico americano, 1901-1994) estudou muito as ligações químicas. A tabela da escala de eletronegatividade de Linus Pauling é muito utilizada cotidianamente: E E F 4,0 I 2,5 O 3,5 C 2,5 N 3,0 S 2,5 Cl 3,0 H 2,1 Br 2,8 Tabela 2: Tabela de eletronegatividade de Linus Pauling . 14 . Sala de Leitura Química Orgânica O Átomo de Carbono Hibridização Hibridização sp3 O carbono encontra-se situado na família 14 da classificação periódica e possui número atômico igual a 6. Portanto, possui seis prótons em seu núcleo e seis elétrons em sua eletrosfera. Na natureza, são encontrados três isótopos (isótopos são elementos químicos de um mesmo átomo, cuja diferença entre eles está no número de nêutrons) do carbono de números de massa 12, 13 e 14, cada um deles com número de nêutrons igual a 6, 7 e 8, respectivamente. O isótopo 12C está presente em 99% dos átomos de carbono existentes na Terra, enquanto o 13C é encontrado no 1% restante. O 14C é um radioisótopo (um radioisótopo é um isótopo instável que emite energia ao se transformar no isótopo mais estável), que ocorre na Terra na proporção de 1 para 1 trilhão (0,0000000001%) e é muito utilizado em processos de datação de fósseis. A distribuição eletrônica por subníveis, em ordem crescente de energia para esse elemento é 1s2 2s2 2p2. en er gi a 1s 2s 2px 2py 2pz ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO (Distribuição Eletrônica) Figura 13 Se analisarmos a distribuição eletrônica do carbono (acima), e formos fazer o tratamento que estamos habituados para as ligações químicas (regra do octeto), haveria duas possibilidades: 1) O carbono faria duas ligações usando os orbitais mono-ocupados e aí seria divalente e não obedeceria a regra do octeto (ficaria com seis elétrons no último nível). 2) O carbono faria três ligações, sendo que em uma delas ambos os elétrons seriam cedidos por outro átomo. . 15 . Sala de Leitura Química Orgânica Entretanto, Kekulé, em 1857, já havia mostrado experimentalmente que nos compostos orgânicos o carbono é sempre tetravalente (isto é, faz quatro ligações) e essas quatro ligações são covalentes. Assim, a molécula do metano (CH4) é formada por quatro ligações σ C-H idênticas, como mostrado na fórmula estrutural plana (fórmula estrutural plana é uma representação molecular em que não nos preocupamos em mostrar os ângulos que os orbitais moleculares fazem entre si): C H H H H Figura 14 Como explicar, então, essa tetravalência do carbono? O modelo que usamos para isso é o que se denomina hibridização de orbitais. Nesse processo, ocorre uma combinação dos quatro orbitais atômicos do último nível (2s + 2px + 2py + 2pz) formando quatro novos orbitais atômicos idênticos. Como essa combinação ocorreu entre um orbital s e três orbitais p, esses novos orbitais são designados sp3: + + + 2s 2px 2py 2pz sp3 sp3 sp3 sp 3 Figura 15 Analogicamente, esse processo pode ser comparado ao significado do termo hibridização em Biologia. Por exemplo, uma mula é um híbrido resultante do acasalamento de duas espécies diferentes: jumento . 16 . Sala de Leitura Química Orgânica e égua. Ela não é um jumento, nem uma égua. É uma mula, espécie diferente, resultante da hibridização de outras duas espécies. Os orbitais atômicos híbridos sp3 não são orbitais s nem p, mas novos orbitais advindos da hibridização daqueles. A distribuição eletrônica nesses novos orbitais segue a regra de Hund (físico alemão, 1896-1997): ao ser preenchido um subnível, cada orbital desse subnível recebe apenas um elétron. O orbital só receberá um segundo elétron quando todos os orbitais daquele subnível já possuírem um elétron. Assim, após a hibridização, cada orbital sp3 do carbono possuirá um elétron: en er gi a 1s 2s 2px 2py 2pz ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO HIBRIDIZAÇÃO e ne rg ia 1s 2sp3 ORBITAIS ATÔMICOS HÍBRIDOS DO CARBONO 2sp3 2sp 3 2sp3 Figura 16 Com essa nova distribuição eletrônica fica fácil entender que na molécula do metano formam-se quatro ligações σ resultantes da interação orbitalar de cada um dos orbitais híbridos do carbono com um orbital s do hidrogênio. C H H H H Quatro ligações σ C-H resultantes da interação do orbital sp3 do C com o s do hidrogênio. Figura 17 . 17 . Sala de Leitura Química Orgânica Mas, de que forma (arranjo espacial) esses orbitais se posicionam em torno do núcleo do átomo de carbono? Os elétrons têm carga negativa e, por conta da repulsão eletrostática, os quatro orbitais vão querer estar o mais afastados possível. A figura geométrica com quatro vértices onde estes estão o mais afastados possível um do outro é o tetraedro e, assim, os quatro orbitais sp3 estão arrumados ao redor do átomo de carbono em um arranjo tetraédrico: Figura 18 A interação dos átomos de hidrogênio ocorrerá com o átomo de carbono nesse arranjo e daí resultará que a molécula do metano possuirá, também, este arranjo: Figura 19 Assim, a molécula do metano arranja-se espacialmente como um tetraedro e os ângulos formados por suas ligações são de 109,5o, característico de um tetraedro regular. Isso é bem visualizado no modelo vareta e bola mostrado abaixo: . 18 . Sala de Leitura Química Orgânica 109,5o Figura 20 Para facilitar o desenho dessa representação estrutural do metano, usamos uma fórmula estrutural conhecida como modelo cunha e traço, em que os dois vértices do tetraedro situados no plano do papel são desenhados como uma linha comum. O vértice que se projeta para frente desse plano é desenhado por uma cunha em negrito e o que se projeta para trás é representado por uma cunha pontilhada: H C H H H " para atrás" do plano do papel "para a frente" do plano do papel Figura 21 Finalmente, deve-se ressaltar que esse modelo de hibridização orbitalar e arranjo tetraédrico em torno do carbono é aplicável para qualquer composto orgânico no qual o carbono realiza quatro ligações σ. Isso pode ser visto nos modelos vareta e bola e em cunha e traço para as moléculas do etano e propano (Figura 22): . 19 . Sala de Leitura Química Orgânica H C C H H H H H H CCC H H H H H H H ETANO PROPANO Figura 22: Modelo vareta e bola e cunha e traço para as moléculas do etano e propano. Hibridização sp2: Assim como já vimos para a molécula de nitrogênio, existem compostos orgânicos que possuem em sua estrutura ligações π . Esse é o caso, por exemplo, dos gases etileno e acetileno: H CC H H H C C HH σσσ σσσ σ σππ π ETILENO ACETILENO Figura 23 Mas, a ligação π ocorre pelo entrosamento paralelo de orbitais p. No modelo de hibridização proposto para moléculas do metano, e válido para todos os compostos que possuem carbono que só faz ligação σ – ou seja, o modelo de formação de orbitais atômicos sp3 – não resta nenhum orbital p com apenas um elétron, condição necessária para fazer uma ligação π. Como ocorre a formação dessa ligação? Vamos iniciar explicando a molécula do etileno (com uma ligação π): Agora, ocorre uma hibridização entre o orbital 2s e apenas dois dos três orbitais p, gerando três orbitais atômicos híbridos sp2 (repare que é a combinação de um orbital s com dois p, daí a designação sp2) e restando um p já ocupado anteriormente: . 20 . Sala de Leitura Química Orgânica + + 2s 2px 2py 2pz sp2 sp2 sp2 2pz Figura 24 Na figura acima, o processo foi mostrado sem o envolvimento do orbital 2pz. Essa escolha foi aleatória e pode ocorrer com qualquer um dos três orbitais p. Após a distribuição eletrônica nos orbitais híbridos fica fácil entender como ocorre a ligação C=C no etileno: en er gi a 1s 2s 2px 2py 2pz ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO HIBRIDIZAÇÃO e ne rg ia 1s 2sp2 ORBITAIS ATÔMICOS HÍBRIDOS DO CARBONO 2sp2 2sp 2 2p Figura 25 Dos três orbitais sp2, dois vão se ligar ao orbital s do hidrogênio e o terceiro vai se ligar ao outro átomo de carbono, gerando as ligações σ. O orbital p vai se ligar ao outro orbital p, formando a ligação σ C‐C. . 21 . Sala de Leitura Química Orgânica Figura 26 Observe que o entrosamento paralelo dos orbitais p gera uma nuvem eletrônica acima e abaixo do plano definido pela ligação σ C-C. Da mesma forma que vimos para o arranjo espacial dos orbitais sp3, os orbitais sp2, devido à repulsão das cargas entre seus elétrons, posicionam-se no centro de um triângulo equilátero (ângulo de 120o entre eles) e o orbital p fica perpendicular ao plano desse triângulo. A esse tipo de arranjo designamos trigonal planar e a ligação C=C terá sempre esse arranjo (Figura 27): Figura 27: a) Representação do C sp2: três orbitais sp2 arrumados em um triângulo equilátero e um orbital p perpendicular a esse triângulo; b) Ângulo de 120º entre os orbitais sp2 e de 90º entre um orbital sp2 e o orbital p; c) Arranjo orbitalar na molécula do etileno: H2C=CH2 Por que a ligação C=C é planar? Já comentamos que a ligação p ocorre por um entrosamento paralelo de orbitais p. Para que fiquem paralelos, eles têm de estar no mesmo plano. Esse paralelismo tem uma consequência importante para todas as moléculas que têm ligação π. Repare que na formação de ligações σ o entrosamento orbitalar é linear, resultando em uma ligação que dizemos possuir simetria cilíndrica, como podemos ver para a ligação C-C do etano: ACHO QUE NÃO DAR PARA EXCLUIR O SÍMBOLO SIGMA POIS SÓ NESSA LIGAÇÃO O ENTRPOSAMENTO DA LIGAÇÃO È LINEAR. . 22 . Sala de Leitura Química Orgânica C C H H H H H H Figura 28 As ligações que possuem simetria cilíndrica possuem rotação livre e é isso o que ocorre, na realidade. As moléculas não são entidades estáticas, estão sempre em constante movimento e as ligações simples giram o tempo todo. Mas, o que ocorreria se a ligação C=C girasse? Os orbitais p perderiam seu paralelismo, ou seja, não aconteceria entrosamento orbitalar. Em outras palavras, a ligação química se quebraria (Figura 29). Por conta disso, as ligações π não possuem rotação livre. Figura 29: Quebra da ligação π em um suposto movimento de rotação Hibridização sp: Vamos ver agora o que ocorre com a molécula do acetileno que possui uma ligação tripla CΞC: Como já vimos, uma ligação tripla significa uma ligação � e duas �. Para isso ocorrer, dois orbitais p devem ficar fora do processo de hibridização, ou seja, a combinação orbitalar (hibridização) deve ocorrer entre um orbital s e um orbital p. Por conta disso, os dois orbitais híbridos resultantes são designados sp. C C HH . 23 . Sala de Leitura Química Orgânica + 2s 2px 2py 2pz sp sp 2pz2py Figura 30 A distribuição eletrônica do átomo de carbono após a hibridização sp mostra que existem dois orbitais híbridos sp que farão duas ligações σ (no caso do acetileno, uma será com o carbono e a outra com o hidrogênio) e dois orbitais p, que por entrosamento paralelo dois a dois formarão as duas ligações π. Lembre-se que os dois orbitais p são perpendiculares entre si e, consequentemente, após a formação das duas ligações π essas também serão perpendiculares entre si. Assim, a molécula do acetileno possui duas nuvens eletrônicas abaixo e acima do plano da ligação σ e outras duas nuvens eletrônicas localizadas na frente e atrás desse plano: Figura 31 Por analogia ao arranjo tetraédrico do carbono com orbitais híbridos sp3 e trigonal planar do carbono com orbitais híbridos sp2, os orbitais híbridos sp se arranjam de forma linear, um do lado oposto ao outro, pois é nessa arrumação que as duas nuvens eletrônicas estarão o mais afastadas possível. Já comentamos sobre a característica peculiar do átomo de carbono de realizar ligações C-C infinitamente, gerando compostos diferentes ou, como costumam dizer os químicos, com uma variedade enorme de cadeias carbônicas. É importante ficar claro que em uma mesma cadeia carbônica podemos ter ligações simples (orbital sp3), duplas (orbital sp2) e triplas (orbital sp). Não . 24 . Sala de Leitura Química Orgânica precisamos fazer toda a análise orbitalar para prever como essas cadeias estão arrumadas no espaço. Basta observar os tipos de ligações que os átomos de carbono estão fazendo: se o carbono só possuir ligações simples, essas são todas σ e o carbono é tetraédrico (sp3); se o carbono possuir ligação dupla, uma é σ e a outra π e o carbono é trigonal planar (sp2); se o carbono possuir ligação tripla, uma é σ e as outras duas são π e o carbono é linear (sp). Por exemplo, na molécula ao lado, os carbonos que eu chamei de 1 e 2 são sp2 e trigonal planares. Os carbonos 3 e 6 são sp3 e tetraédricos, enquanto os carbonos 4 e 5 são sp e lineares. Figura 32 Não é apenas no átomo de carbono que ocorre a hibridização de orbitais. O modelo de hibridização pode ser aplicado para explicar a ligação em qualquer átomo. Por causa disso, outros átomos ligados ao carbono também podem estar hibridizados. Na molécula da supercola, por exemplo, o carbono e o nitrogênio da ligação CΞN são sp, o oxigênio e o carbono da ligação C=O são sp2 e o carbono e oxigênio da ligação C-O são sp3. O comprimento das ligações também é diferente, em função do tipo de ligação. Observe que uma esfera (orbital s) está mais próxima do núcleo atômico que um haltere (orbital p). Por conta disso, quanto maior for o caráter s do orbital híbrido, mais curta vai ser a ligação (vai estar mais perto do núcleo). Assim, as ligações triplas onde a ligação σ (é ela quem define o comprimento da ligação por conta do entrosamento linear) é formada pelo carbono sp (50% de s + 50% de p) são mais curtas que as ligações duplas (sp2: 33,3% s + 66,7% p), que, por sua vez, são mais curtas que as ligações simples (sp3: 25% de s + 75% de p). Observe abaixo o comprimento (emvermelho) e os ângulos (em azul) das ligações para o etano, etileno e acetileno: O QUE FOI EXCLUÍDO? H C H C H C C C H C H H H H 1 2 3 4 5 6 H C H C C N O O C H H H Super-cola Figura 33 . 25 . Sala de Leitura Química Orgânica Figura 34 Resumindo, em termos de comprimento de ligação: C-C > C=C > C�C Representação dos Compostos (“Desenhando As Moléculas”) Quando estudamos Química Orgânica, o que buscamos é entender a maneira pela qual os átomos se encontram nas moléculas (arranjo molecular), ou seja, como eles estão ligados entre si, as propriedades químicas que são consequência dessa arrumação e a maneira pela qual as estruturas moleculares se modificam quando ocorre uma reação química. Para alcançar esses objetivos, o primeiro passo deve ser o entendimento das representações que utilizamos para tentar descrever as moléculas. Em outras palavras, precisamos entender e aprender o que queremos dizer quando representamos as moléculas por fórmulas. Devemos nos lembrar sempre que a representação de uma coisa não é a coisa. Assim, por exemplo, a foto do namorado ou da namorada não é o namorado ou a namorada: é a representação dele ou dela. Os químicos utilizam diversas maneiras para representar as moléculas. Não existe uma mais correta que a outra. O tipo de representação que usamos vai depender do problema que estamos analisando. A fórmula molecular, por exemplo, apenas informa quais são e a quantidade dos átomos presentes em uma molécula. Ela não informa nada sobre a estrutura (como os átomos estão ligados na molécula) molecular. Por causa disso, é muito comum que duas moléculas diferentes possuam a mesma fórmula molecular. Por exemplo, o álcool etílico (aquele que nós conhecemos simplesmente por álcool) e o éter metílico são dois compostos completamente diferentes. Mas, repare que os dois possuem a mesma fórmula molecular (C2H6O). Compostos diferentes que possuem a mesma fórmula molecular são denominados isômeros. . 26 . Sala de Leitura Química Orgânica Figura 35 Como a fórmula molecular não informa nada sobre a estrutura molecular, não conseguimos, a partir dela, entender o comportamento da molécula. Mas ela é muito útil quando, por exemplo, estamos realizando cálculos estequiométricos (cálculo das quantidades de substâncias envolvidas em uma reação química). No entanto, na maioria das vezes em que estamos lidando com a Química, precisamos tentar entender como as moléculas se comportam e, para isso, é fundamental que se represente como os átomos estão unidos entre si dentro da molécula, isto é, precisamos representar a conectividade dos átomos. As fórmulas que mostram essa conectividade são denominadas fórmulas estruturais. Compostos que possuem fórmulas estruturais diferentes são diferentes. Existem várias maneiras de se representar a fórmula estrutural de uma molécula. As mais usadas estão mostradas a seguir para o álcool etílico: Figura 36 . 27 . Sala de Leitura Química Orgânica As fórmulas estruturais condensadas e as fórmulas de traços mostram a conectividade dos átomos, mas não mostram a geometria molecular (as moléculas são entidades tridimensionais e têm uma arrumação no espaço). Observe, ao analisarmos a fórmula em traços, que a cadeia carbônica é apresentada linearmente e não nos preocupamos com os ângulos das ligações. As fórmulas condensadas e de traços nos dão basicamente as mesmas informações sobre a molécula. A fórmula estrutural plana nos fornece mais informações sobre a geometria da cadeia carbônica. Na realidade, tendo em vista os ângulos de 109,5º do carbono sp3, as cadeias carbônicas se arrumam como um zigue-zague (“sobe e desce”) e esse tipo de fórmula estrutural representa isso. Na fórmula estrutural espacial, além da representação em zigue-zague das cadeias carbônicas, são também mostradas as cunhas que representam os átomos que estão se posicionado nos outros dois vértices do tetraedro. Nesse tipo de representação estrutural buscamos mostrar toda a geometria molecular. A fórmula estrutural em traços (também chamada fórmula em bastão) é centrada na representação das ligações e não dos átomos (repare que na representação do álcool etílico usando essa fórmula só desenhamos o oxigênio e o hidrogênio ligados a ele). As fórmulas em traços são desenhadas da seguinte maneira: 1a etapa: Desenhe a cadeia de carbono como traços e em zigue-zague. Não represente o símbolo do carbono (C) nem do hidrogênio (H) quando ele estiver ligado ao carbono. Entretanto, você não pode esquecer nunca que o carbono é tetravalente. Assim, cada vértice da cadeia em zigue-zague representa o átomo de carbono e se mais nada estiver escrito nela, significa que ali existem dois hidrogênios, sendo um localizado para frente do plano criado pela cadeia e outro para trás desse plano, de acordo com a geometria do tetraedro. 2a etapa: Todos os átomos que não são carbonos devem ter os seus símbolos mostrados, bem como o hidrogênio que não está ligado ao carbono. Vamos entender isso com a fórmula em traços do álcool etílico: . 28 . Sala de Leitura Química Orgânica O H As extremidades da cadeia representam um átomo de carbono Cada vértice do zigue-zague representa um átomo de carbono Este átomo de carbono tem três hidrogenios ligados a ele, pois só estamos mostrando uma ligação (traço) e 4-1=3 Este átomo de carbono tem dois hidrogenios ligados a ele, pois estao sendo mostradas duas ligaões : C-C e C-O e 4-2=2 Este hidrogênio deve ser desenhado porque ele não está ligado ao carbono. Figura 37 Por uma questão de simplificação, é muito comum a gente não desenhar o traço que representa a ligação do hidrogênio com o heteroátomo (chamamos de heteroátomo a todo átomo da cadeia carbônica que não é carbono ou hidrogênio): As ligações duplas devem ser representadas por dois traços e as triplas por três traços: OH O H H H O O H H H H C C H H H H H Figura 38 Preste atenção que, no caso da ligação dupla, a cadeia foi desenhada em zigue-zague e, na ligação tripla, fomos fiéis ao ângulo de 180o (repare que desenhamos essa parte da molécula linearmente). Isso porque é muito difícil distinguir desenhando um ângulo de 109,5o de um de 120o. O Importante é você sempre lembrar que nessa parte da cadeia os carbonos possuem um arranjo trigonal planar. OH Observe que não desenhamos o traçoque representa a ligação O-H . 29 . Sala de Leitura Química Orgânica É muito comum a gente misturar a forma de representação em traços com a condensada na parte da molécula que temos os heteroátomos: H H H O OH H H COOH ou CO2H Figura 39 Outra coisa que você vai ver muito são representações deste tipo: NH2 , e aí fica a pergunta: ué, o carbono não é tetraédrico? Esse nitrogênio não está para frente ou para trás do plano da cadeia carbônica? A resposta é: está sim. O que estamos dizendo nessa representação é: 1) Não sabemos se o arranjo espacial desse nitrogênio (mais tarde vamos entender que ele estar para a frente ou para trás do plano pode gerar compostos diferentes); ou 2) Para o estudo que estamos fazendo não faz diferença saber para que lado está o átomo de nitrogênio. As cadeias carbônicas não são sempre abertas. Elas também podem ser cíclicas e os ciclos também são representados em traços: C C C C C H H H H H H H H H H C C CC C C H H H H H H Figura 40 As representações em traços possuem a vantagem de facilitar os desenhos das moléculas. Em virtude da propriedade do carbono de realizar ligações C-C infinitamente, existem moléculas enormes e se fossemos desenhar todos os átomos, além da perda de tempo, o resultado ia ser extremamente confuso. Por exemplo, a molécula da palitoxina (Figura 41), uma toxina marinha extremamente . 30 . Sala de Leitura Química Orgânica venenosa isolada de corais da espécie Palythoa (ainda bem que até hoje não encontramos esse coral nos nossos mares!), tem fórmula molecular C129H221O54N3: Figura 41: a) Corais marinhos da espécie Palythoa caribaeorum; fórmula estrutural em traços da palitoxina. Imagine o trabalho que daria desenhar a fórmula estrutural espacial dessa molécula. Tente e veja... você vai desistir rapidinho! Agora que já sabemos interpretar a representação das moléculas orgânicas, podemos visualizar (e entender o que as representações querem dizer) as fórmulas estruturais das substâncias citadas no início desse texto (Figura 42), quando aprendemos sobre os átomos que aparecem com mais frequência nos compostos orgânicos (lembra, foi quando vimos os elementos da tabela periódica que mais aparecem nos compostos orgânicos). . 31 . Sala de Leitura Química Orgânica Cl Cl Cl Cl Policloreto de vinila (PVC) Polímero utilizado para a fabricação de canos O N H O NH2 OH HH OH H O P O P O H HH OH H O OH N N N N O O O O NH2 Nicotinamida-adenina-dinucleotídeo (NAD) Cl Cl Br Br Cl Halomon Medicamento utilizado em quimioterapia (tratamento de cancer) OI HO I I I CO2H NH2 Tiroxina Hormônio produzido pela tiróide O O OH OH HO HO O HO OH OH OH Sacarose (açucar comum) NH2 Anfetamina (estimulante do SNC) SH SH 2-buteno-tiol 3-metil-2-buteno-tiol (substâncias exaladas pelo gambá) Figura 42: Exemplos de representações de algumas moléculas orgânicas importantes. Toda ciência, talvez para que as pessoas que trabalham com ela possam se identificar como um grupo, possui uma linguagem própria. Com a Química não é diferente. Daqui a pouco nós vamos aprender a nomear os compostos orgânicos. Mas, antes disso, devemos saber como se classificam as cadeias orgânicas: - Em função da presença ou não de ciclo (também chamamos de anel), a cadeia é classificada em cíclica ou acíclica (ou aberta): . 32 . Sala de Leitura Química Orgânica Figura 43 - Em função da presença de ligações π entre os átomos de carbono, as cadeias são classificadas em saturadas ou insaturadas. As cadeias insaturadas são as que possuem ligação π entre átomos de carbono. Figura 44 . 33 . Sala de Leitura Química Orgânica Esta definição causa certa polêmica entre os químicos. A molécula de cadeia aberta constituída apenas por átomos de carbono e hidrogênio tem sempre a fórmula molecular CnH2n+2, isto é, o número de hidrogênios é sempre o dobro do de carbonos: Figura 45 As moléculas desse tipo são ditas saturadas. A partir daí, insaturadas seriam aquelas que não obedecem a essa regra. Observe nas moléculas: Figura 46 A presença de uma ligação π diminui em 2 (C4H10 x C4H8) o número de hidrogênios e diz-se que a molécula tem uma insaturação. A presença de duas ligações π (duas ligações duplas ou uma tripla) diminui em 4 o número de hidrogênios e a molécula tem duas insaturações. Mas, observe uma cadeia cíclica: Figura 47 . 34 . Sala de Leitura Química Orgânica Também diminui em dois o número de hidrogênios, ou seja, a molécula tem uma insaturação e essa cadeia cíclica seria dita insaturada, embora não tenha nenhuma ligação π. Afinal, insaturação é quando tem ligação π entre átomos de carbono ou é diminuição do número de hidrogênios em relação à molécula saturada? Para evitar essa confusão, tem sido uma tendência designar cadeia insaturada apenas aquelas que possuem ligações π entre carbonos e, para o enfoque de diminuição de hidrogênios, dizemos “cadeias com deficiência de hidrogênio”, caso em que se incluem as cadeias cíclicas. - Quanto à presença ou não de heteroátomos (lembrem-se: heteroátomos são átomos diferentes de carbono e hidrogênio) na cadeia, estas são chamadas de cadeias homogêneas ou heterogêneas: Figura 48 Normalmente, os ciclos contendo heteroátomos chamamos de heterociclos. Os outros seriam os homociclos, que em geral a gente se refere apenas como ciclos (não usamos o prefixo “homo”). . 35 . Sala de Leitura Química Orgânica - As cadeias carbônicas podem ainda ser classificadas em ramificadas ou não ramificadas. Analise a molécula abaixo: Figura 49 Observe que o segundo carbono possui ligado a ele – além, é claro, do resto da cadeia – uma cadeia menor, constituída de dois átomos de carbono. Essa cadeia menor nós chamamos de ramificação (em analogia aos ramos de uma árvore que saem do tronco principal), e as cadeias que as contêm são designadas ramificadas. A cadeia maior é chamada de cadeia principal. Não é obrigatório que se desenhe a cadeia principal na horizontal. Essa é apenas a forma mais comum. O importante é você saber que a cadeia principal é sempre a que contém maior número de átomos de carbono. Abaixo, por exemplo, estão mostradas três representações da mesma molécula cuja cadeia principal (destacada em vermelho) tem 6 átomos de carbono: Figura 50 É importante que se tenha claro que só chamamos de ramificação cadeias carbônicas. Heteroátomos ligados à cadeia carbônica não são considerados ramificações: Cadeia ciclica insaturada ramificada ( o ciclo é a cadeia principal) OH Cadeia ciclica insaturada não ramificada N Cadeia aciclica saturada não ramificada Figura 51 1 2 3 4 5 . 36 . Sala de Leitura Química Orgânica Em função do número de ramificações, o carbono sp3 é classificado em metílico, primário, secundário, terciário ou quaternário. Carbono metílico não está ligado a nenhum carbono. Carbono primário está ligado a um carbono, o secundário a dois, e assim sucessivamente: OP P P P Q TS P M O O O P S S S S Q M M = METÍLICO P = PRIMÁRIO S= SECUNDÁRIO T = TERCIÁRIO Q = QUATERNÁRIO Figura 52 Forças Intermoleculares Até agora nós conversamos sobre as ligações que constituem as moléculas orgânicas. Mas, vamos lembrar que nunca a gente se depara com uma única molécula. Quando eu pego um vidro de uma substância qualquer, orgânica ou inorgânica, lá dentro, mesmo que o vidro seja bem pequenino, tenho milhares de moléculas. Por exemplo, um mol de água pesa 18g. Como a densidade da água é igual a 1, então 18g correspondem a 18 mL, ou seja, em 18 mL de água eu tenho 6,02 x 1023 (o no de Avogrado) moléculas de água! E aí vem a pergunta: será que essas moléculas interagem entre si ou uma não está nem aí para a outra? As moléculas interagem entre si através do que chamamos de forças ou ligações intermoleculares. Para que a gente possa entender o que são essas forças, precisamos estudar o que vem a ser polaridade de uma molécula. Nós já vimos que uma ligação covalente polar é aquela em que o compartilhamento de elétrons não é igual para os dois átomos porque o mais eletronegativo puxa os elétrons para mais pertodele. Com isso, é criado um dipolo interno (uma parte fica com caráter positivo e outra com caráter negativo) na ligação e, consequentemente, na molécula: . 37 . Sala de Leitura Química Orgânica O H O Hδ+ δ− δ+C-O O-H LIGAÇÕES POLARES ÁLCOOL ETÍLICO : MOLÉCULA POLAR Figura 53 Observe que nós não consideramos a ligação C-H como um dipolo interno. A diferença de eletronegatividade dos dois é tão pequena que praticamente não se cria esse dipolo. Na linguagem química, a gente diz que a ligação C-H é apolar. Entretanto, nem toda molécula que tem ligação polar é uma molécula polar. Nesse caso, nós temos que avaliar dois aspectos: o arranjo espacial e o tamanho da molécula. Arranjo espacial: vamos ver o que acontece com a molécula de CO2: O sentido de um dos dipolos é oposto ao do outro. Assim, os dipolos se anulam e a molécula, apesar de ter ligações polares, é apolar. Lembre-se que no CO2 o carbono faz duas ligações π (uma com cada oxigênio) e, então, é hibridizado sp, logo, linear. Na molécula CCl4 (tetracloreto de carbono) acontece uma coisa parecida. O arranjo da molécula é tetraédrico e, lembrando-se da forma com que somamos vetores, os dois vetores resultantes estão em sentido oposto, e assim se anulam. Então, embora ela tenha quatro ligações polares, é uma molécula apolar: Cl ClCl Cl Os vetores resultantes das duas somas vetoriais se anulam Figura 55 Outro fator que devemos analisar é o tamanho da molécula. Às vezes, uma molécula tem ligações polares, mas a cadeia carbônica é tão grande que a molécula acaba se comportando como uma O C O Figura 54 . 38 . Sala de Leitura Química Orgânica molécula apolar. As gorduras (triglicerídeos), por exemplo, têm propriedades apolares, apesar de possuírem várias ligações C-O e C=O (polares): O O O O O O Triglicerídeo Figura 56 Bem, agora que a gente já sabe reconhecer se uma molécula é polar ou apolar, podemos entender as forças intermoleculares. Essas forças ocorrem devido à interação entre as cargas reais ou parciais (aquelas advindas da polaridade) de uma molécula interagindo com as cargas reais ou parciais de outra molécula. Essa interação ocorre pela atração de uma carga positiva com uma negativa e ela é maior quanto maior for a magnitude da carga e menor for a distância entre elas. Essas forças intermoleculares são de cinco tipos: interação íon-íon, interação íon-dipolo, interação dipolo-dipolo, interação dipolo-dipolo induzido, interação dipolo-induzido-dipolo-induzido. A interação íon-íon é aquela que nós conhecemos como ligação iônica. Ela ocorre, por exemplo, entre os íons cloreto e sódio no NaCl (sal de cozinha) e no lauril éter sulfato de sódio, um agente de limpeza muito usado em xampus. São interações muito fortes: Figura 57 O S O O- Na+ Lauril eter sulfato de sodio interação ío-íon Na+ Na+ Na+ Na+ Na+ Cl- Cl- Cl- Cl- . 39 . Sala de Leitura Química Orgânica As interações íon-dipolo induzido são as que ocorrem entre uma espécie com carga real (cátion ou ânion) e a carga parcial de outra molécula, como mostrado na interação do cátion de sódio com a carga parcial negativa do átomo de oxigênio da água. Essas interações são moderadamente fortes. Na+ O H H δ− δ+ δ+ Figura 58 As interações dipolo-dipolo, como o próprio nome diz, são as que ocorrem entre o polo criado pela carga parcial positiva de uma molécula com a carga parcial negativa de outra. É uma interação fraca. É a que ocorre entre duas moléculas polares, mas sem carga. Veja na acetona: δ− δ+ δ+ O Oδ− Figura 59 Um tipo especial de atração dipo-dipolo é chamada de Ligação Hidrogênio. Nessa interação, o hidrogênio é ligado a um átomo muito eletronegativo: F, O ou N é o polo positivo que é atraído pelo polo negativo F, O ou N, de outra molécula (para ajudar a memorizar, lembrem-se de uma buzina: fon- fon!): O H H O H H Figura 60 . 40 . Sala de Leitura Química Orgânica Por exemplo, a dupla hélice do DNA é estabilizada pelas ligações hidrogênio entre as bases nitrogenadas presas às duas cadeias: Figura 61: a) Ligação hidrogênio entre as bases nitrogenadas (guanina e citosina) do DNA. Como o hidrogênio é um átomo pequeno, as cargas parciais conseguem se aproximar muito, resultando em uma atração mais forte que a dipolo-dipolo clássica. A interação dipolo-dipolo induzido ocorre quando uma molécula polar se aproxima de uma outra, apolar. Ao se aproximar, o dipolo da molécula polar faz com que ocorra uma distorção da nuvem eletrônica da molécula apolar, induzindo um dipolo instantâneo: O H H δ− δ+δ + I Iδ− δ− δ+ δ+ Figura 62 É uma interação mais fraca que a dipolo-dipolo. A interação dipolo-induzido-dipolo-induzido (também chamada Força de London) ocorre entre moléculas apolares e é a mais fraca delas. Como os elétrons estão em movimento constante, em um determinado momento, uma molécula apolar – por exemplo, o etano (CH3CH3) – pode ter uma distribuição não igualitária dos elétrons na ligação, ou seja, pode ser criado um dipolo momentâneo. Esse dipolo pode, então, criar outro dipolo em uma molécula vizinha e esses dipolos se atraem: . 41 . Sala de Leitura Química Orgânica δ− δ+ δ− δ− δ+ δ+ H3C CH3 δ− δ+ δ− δ− δ+ δ+ H3C CH3 Figura 63 Essas duas últimas interações, que envolvem a formação de dipolo induzido, são chamadas juntas de Forças de van der Waals. Essas forças são mais fracas, mas em moléculas grandes, isto é, com grande superfície de contato entre elas, as Forças de van der Waals tem efeitos importantes. Por exemplo, são Forças de van der Waals que seguram a lagartixa na parede (Figura 64): os dedos das lagartixas terminam em milhões de filamentos pequenos, cada um com comprimento de cerca de 100 milionésimos do metro. Essas pequenas estruturas, por sua vez, estão subdivididas em mil partes ainda menores, invisíveis a olho nu. Quando os répteis pressionam suas patas contra uma superfície, os filamentos se espalham e cobrem uma área relativamente grande. Como os filamentos aumentam a superfície de contato, um número maior de Forças de van der Waals atua entre a pata do animal e a parede, garantindo uma adesão segura. Figura 64: Filamentos existentes na pata da lagartixa . 42 . Sala de Leitura Química Orgânica Propriedades Físicas: Ponto De Fusão, Ponto De Ebulição E Solubilidade. Ponto de fusão Ponto de fusão (P.F.) é a passagem de uma substância do estado sólido para o líquido. Quando estão no estado sólido, as substâncias estão arrumadas ordenadamente em um cristal, ou seja, estão bem pertinho umas das outras. Em outras palavras, as atrações entre elas estão maximizadas. Para que elas fundam (passem para o estado líquido), as atrações intermoleculares devem ser enfraquecidas (o que ocorre com o aquecimento), para que elas se mexam mais livremente, embora continuem sendo atraídas entre si. Assim, quanto mais fortes forem as interações intermoleculares, mais difícil vai ser separar as substâncias umas das outras, e então temos que aquecer mais, ou seja, maiorvai ser o ponto de fusão. Por causa disso, os sais (compostos com ligações iônicas) tipicamente fundem em temperaturas muito maiores que compostos polares (com interações dipolo-dipolo), que, por sua vez, fundem em temperaturas maiores que compostos apolares (com interações do tipo van der Waals). Isso pode ser visto na tabela abaixo: NaCl P.F. = 801oC Ligaçoes iônicas H2O P.F.= 0 oC Ligação hidrogênio H O P.F. = ‐99oC Dipolo‐Dipolo P.F. = ‐130oC Forças de van Der Waals. Tabela 3 Ponto de Ebulição Já o Ponto de Ebulição (P.E.) é a temperatura em que um composto passa do estado líquido (no qual as moléculas estão mais afastadas) para o gasoso (no qual as moléculas estão mais afastadas ainda. No estado gasoso praticamente não existem interações intermoleculares), isto é, é a temperatura em que o composto ferve. Novamente, o que vai definir o grau de aproximação entre as moléculas são as interações intermoleculares. Quanto mais fortes forem essas interações, mais alto vai ser o ponto de ebulição. Observe os dois compostos mostrados na figura abaixo: . 43 . Sala de Leitura Química Orgânica P.E. = 39oC P.E. = 117oC O OH Figura 65 Repare que os dois têm o mesmo no de átomos de carbono, oxigênio e hidrogênio (lembrem-se: têm a mesma fórmula molecular – C4H10O e, então, são isômeros), mas o primeiro tem um ponto de ebulição muito menor que o segundo. Por quê? Porque no primeiro caso, as interações intermoleculares são principalmente do tipo dipolo-dipolo, mais fracas que no segundo exemplo, no qual as moléculas interagem entre si principalmente por ligações hidrogênio. Ora, se as moléculas estão unidas por uma ligação mais forte, eu vou ter que dar mais calor para romper essas interações. Em outras palavras, o seu ponto de ebulição é maior. Solubilidade Solubilidade é outra propriedade física que depende das interações intermoleculares. Mas, a coisa aqui é um pouco diferente do que a gente viu para os pontos de fusão e ebulição, pois agora vamos misturar moléculas de tipos diferentes, as moléculas do soluto e do solvente. Por exemplo, quando a gente prepara “água com açúcar” o que fazemos é misturar as moléculas do açúcar (o soluto) com a água (o solvente). A esse processo nós damos o nome de dissolução. O que ocorre no processo de dissolução é que as interações intermoleculares existentes entre as moléculas do soluto-soluto são substituídas por interações entre as moléculas do soluto - solvente. Vamos então imaginar as situações que podem ocorrer: 1. Se o meu soluto é polar, ele deve fazer entre si interações, por exemplo, dipolo- dipolo. Será que um solvente apolar, que faça tipicamente ligações tipo van der Waals vai conseguir separar as interações dipolo-dipolo, mais fortes? Não. 2. Mas, se o meu soluto polar for misturado com um solvente polar que faça os mesmos tipos de interações intermoleculares, aí provavelmente as interações dipolo-dipolo das moléculas do soluto podem ser separadas e eu teria a dissolução. 3. Se o meu soluto é apolar e eu coloco um solvente polar, será que aí eu consigo dissolver um no outro? Não, pois agora é o meu soluto que não vai conseguir vencer as interações intermoleculares da molécula do solvente (não esqueça que as moléculas do solvente também interagem entre si!). . 44 . Sala de Leitura Química Orgânica 4. Já no caso em que tanto o soluto quanto o solvente são apolares ocorre a dissolução, pois as interações devem ser do mesmo tipo. A partir dessas observações, pode-se, com cuidado, aplicar uma regra que diz: “semelhante dissolve semelhante” ou, em outras palavras, “polar dissolve polar e apolar dissolve apolar”. Mas, por que a gente deve ter cuidado ao aplicar essa regra? Olhe, por exemplo, a molécula abaixo, chamada ácido linoleico: O OH Ácido Linoleico Figura 66 O óleo de soja é constituído principalmente de ácido linoleico e mais outras moléculas bem parecidas, com uma cadeia carbônica grande e um grupo polar no final da cadeia. Aí, a gente poderia pensar: bom, como tem aquele grupo polar e que faz ligação hidrogênio (repare que tem um hidrogênio ligado ao átomo de oxigênio), então vai se dissolver em água que também é polar e também faz ligação hidrogênio. Mas a gente sabe muito bem que se eu misturar água com óleo eles não vão se dissolver! Ora, o que acontece é que a cadeia carbônica é muito grande e praticamente sem nenhuma polaridade. Só um pedacinho da molécula tem polaridade, o que não é suficiente para separar as moléculas de água umas das outras. Temos que nos lembrar sempre (como a gente já falou quando estudamos polaridade das moléculas) que o tamanho das moléculas tem de ser analisado sempre que formos avaliar a questão de polaridade e apolaridade. Bom, até agora nós já estudamos as ligações químicas, o átomo de carbono, as ligações intermoleculares e, no decorrer disso, vimos vários exemplos de moléculas orgânicas. Já citamos várias vezes, também, que existe uma infinidade de moléculas orgânicas. Aí, a gente pode se perguntar: como é que eu vou fazer para estudar e entender as propriedades químicas de todos estes compostos? Não dá!!! Felizmente, não é necessário aprender as propriedades químicas de cada composto orgânico isoladamente. Os químicos orgânicos já perceberam que uma determinada arrumação de átomos leva a propriedades químicas muito parecidas, independente de como a cadeia carbônica se arruma. Por exemplo, os dois compostos mostrados na figura abaixo são diferentes, mas tem propriedades muito parecidas. . 45 . Sala de Leitura Química Orgânica OH OH Figura 67 Por exemplo, a polaridade da ligação O-H e sua capacidade de realizar ligação hidrogênio faz com que eles tenham pontos de ebulição parecidos e maiores do que, por exemplo, de compostos similares, mas que só tenham carbono e hidrogênio na sua estrutura. À medida que formos estudando mais Química Orgânica, vamos perceber que as interações entre cargas positivas e negativas são um dos fatores mais importantes para que ocorram as reações químicas. Assim, normalmente as reações ocorrem nos locais polares das moléculas. No exemplo que estamos discutindo, as reações ocorrem nas ligações O-H e C-O. As ligações C-C e C-H não são muito reativas. Na realidade, em termos de reações químicas, não faz muita diferença o número ou a forma com que estão arrumadas as ligações C-C e C-H. De fato, os compostos mostrados na figura abaixo tem comportamento químico muito semelhante. OH OH OH OH Figura 68 Com isso, em termos de propriedades químicas, as moléculas devem ser vistas como compostas por duas partes: Com isso, em termos de propriedades químicas, as moléculas devem ser vistas como compostas por duas partes: 1) A cadeia carbônica, que como já vimos, tem grande influência nas propriedades físicas (P.E.,P.F., solubilidade), mas não interfere muito nas propriedades químicas (como vão reagir, isto é, na reatividade); . 46 . Sala de Leitura Química Orgânica 2) O grupo funcional, que é a parte da molécula responsável pela sua reatividade química. Nos exemplos que a gente está discutindo todos os compostos têm o grupo funcional O-H, mas diferentes cadeias carbônicas (que a gente vai representar por R). Assim, todos os compostos do nosso exemplo são alcoóis (compostos orgânicos cujo grupo funcional é o OH) e são representados como ROH. Todos os alcoóis têm reatividade química semelhante. Esse conceito é muito importantee geralmente organizamos o estudo da Química Orgânica por grupo funcional. Assim, a partir de agora vamos estudar com mais detalhes os principais grupos funcionais. A tabela abaixo mostra os grupos funcionais que vão ser apresentados a partir de agora: FÓRMULA GENÉRICA EXEMPLO NOME RH ALCANOS (na realidade, alcanos não possuem grupo funcional). RCH=CHR (estes R podem ser hidrogênio) ALCENOS (o grupo funcional é a ligação dupla C=C). RR (estes R podem ser hidrogênio) ALCINOS (o grupo funcional é a ligação tripla CΞC). ArH ARENOS (um ciclo de seis átomos de carbono com três ligações duplas tem reatividade química diferente dos alcenos e assim são outro grupo funcional, representados por Ar. Arenos, também chamados de anéis aromáticos, podem ter grupos alquil ou outros grupos funcionais ligados ao anel aromático). RX (X é a letra que usamos em Química Orgânica para representar os halogênios) Cl HALETOS DE ALQUILA (O grupo funcional é a ligação C- Halogênio). ROH OH ALCOÓIS (o grupo funcional é o O- H). ArOH OH FENÓIS (quando o O-H está ligado a um anel aromático, a reatividade muda muito em comparação com os alcoóis e então é outro grupo . 47 . Sala de Leitura Química Orgânica funcional). ROR O ÉTERES (o grupo funcional é C-O- C). RNH2 NH2 AMINAS (o grupo funcional é o NH2. Estes dois hidrogênios podem ser substituídos por outros grupos alquil). R O H O H ALDEÍDOS (o grupo funcional é o C=O, com pelo menos um hidrogênio ligado ao carbono). R O R O CETONAS (o grupo funcional é o C=O, com dois grupos alquil – ou anel aromático - ligados ao carbono). R O OH H O OH ÁCIDOS CARBOXÍLICOS (o grupo funcional é o COOH). R O Cl O Cl CLORETOS DE ÁCIDO (o grupo funcional é o COCl). R O O O R O O O ANIDRIDOS DE ÁCIDOS (o grupo funcional é COOCO). R O OR O O ÉSTERES (o grupo funcional é COOR). R O NH2 O NH2 AMIDAS (o grupo funcional é o CONH2. Os hidrogênios ligados ao nitrogênio podem ser substituídos por alquil ou anel aromático). RCΞN C N NITRILAS (o grupo funcional é o CN). Tabela 4 . 48 . Sala de Leitura Química Orgânica Funções Orgânicas 1. Hidrocarbonetos Hidrocarbonetos, como o próprio nome já diz, são compostos que possuem apenas carbono e hidrogênio em sua estrutura. O esquema abaixo mostra a classificação dos hidrocarbonetos: HIDROCARBONETOS ALIFÁTICOS ALCANOS (ou parafinas) CnH2n+2 ALCENOS (ou alquenos ou olefinas) CnH2n ALCINOS (ou alquinos) CnH2n-2 ALICÍCLICOS CICLOALCANOS CICLOALCENOS CICLOALCINOS R-H AROMÁTICOS Ar-H Figura 69 A gente conhece por aromáticos um grupo especial de hidrocarbonetos, que tem propriedades muito diferentes devido às suas características estruturais. Daqui a pouco nós veremos um pouco mais quais são essas características. Por enquanto, aqui estão duas regras que devemos aplicar para saber se um composto é aromático: - Os compostos aromáticos sempre são cíclicos e têm ligações duplas alternadas com ligações simples em toda a volta do anel E: - Todo composto aromático tem um número tal de elétrons π (cada ligação dupla tem dois elétrons π), que se a gente aplicar a fórmula 4n+2 = no de elétrons π, a resolução dessa equação deve dar, para os compostos aromáticos, um valor de n inteiro (essa regra a gente conhece por Regra de Huckel). . 49 . Sala de Leitura Química Orgânica Analise, por exemplo, a Figura 70. Os dois primeiros compostos são aromáticos, enquanto o terceiro, apesar de ser cíclico e possuir ligações duplas alternadas, não é aromático, pois n na regra 4n+2 = no de elétrons π não é um no inteiro. Já o quarto exemplo não é aromático, porque as ligações duplas não estão em toda a volta do anel. 3 ligações duplas = 6 elétrons π 4n + 2 = 6 4n = 4 n = 1 (no. inteiro) 5 igações duplas = 10 elétrons π 4n + 2 = 10 4n = 8 n = 2 (no. inteiro) 4igações duplas = 8elétrons π 4n + 2 = 8 4n = 6 n = 6/4 (no. não inteiro) AROMÁTICO AROMÁTICO ALIFÁTICO 3 ligações duplas = 6 elétrons π 4n + 2 = 6 4n = 4 n = 1 (no. inteiro) ALIFÁTICO Figura 70: Exemplos de aplicação da regra de Hückel. Alcanos Os alcanos são os hidrocarbonetos saturados de fórmula geral CnH2n+2. Os alcanos ocorrem na natureza em depósitos de gás natural e no petróleo. O gás natural é constituído principalmente de metano (CH4) e o petróleo é uma mistura complexa de vários hidrocarbonetos. Como esses hidrocarbonetos presentes no petróleo têm aplicações muito diferentes, a gente precisa separar o petróleo em misturas mais simples (dizemos que separamos o petróleo em várias frações, cada uma delas com utilizações diferentes). Essa separação é feita por destilação e, no caso do petróleo, essa destilação recebe o nome específico de refinação (refinaria de petróleo é o local onde se faz essa destilação). Todas as frações obtidas no refinamento do petróleo contêm alcanos. . 50 . Sala de Leitura Química Orgânica Os alcanos são compostos apolares e estão entre os menos reativos diante dos reagentes mais comuns de um laboratório de Química (lembrem-se que nós já comentamos que a reatividade normalmente está associada à existência de ligações polares nas moléculas). O próprio nome parafina, outra designação usada para os alcanos, vem de uma expressão latina que significa “pouca afinidade”. Mas a gente tem que tomar cuidado quando dizemos “pouco reativos”. Estamos nos referindo basicamente a reações químicas nas quais misturamos duas ou mais substâncias com o intuito de obter outras substâncias diferentes. Para isso, realmente, os alcanos não são muito utilizados. Por outro lado, os alcanos sofrem reações de combustão – queima na presença de oxigênio –– (Esquema 1), e essa é uma das reações mais praticadas por todos nós. Realizamos reações de combustão quando acendemos um fogão a gás, ligamos um motor a gasolina, acendemos um isqueiro Mas, reparem: o “produto” que a gente quer nessas reações é o calor (ou melhor dizendo, a energia) e não o dióxido de carbono (CO2) e água. CnH2n+2 + O2 CO2 + H2O + CALOR Esquema 1: Reação de combustão Outra reação que a indústria petroquímica (indústria que utiliza as frações do petróleo como matéria- prima) realiza muito com os alcanos é a chamada pirólise (quebra pela ação do calor) ou craqueamento. Como a gente já viu, o petróleo dá origem a muitos produtos diferentes, mas a quantidade em que esses produtos se encontram no petróleo em geral não atendem às necessidades do mundo atual. Assim, as indústrias pegam as frações do refino que têm hidrocarbonetos mais pesados (frações que destilam com P.E. maior que o da gasolina) e quebram esses hidrocarbonetos em moléculas menores (mais leves), isto é, fazem o craqueamento para obter mais gasolina e outros hidrocarbonetos menores e assim atender à demanda do sistema de consumo atual. Bem, agora, antes da gente começar a ver as outras funções orgânicas, precisamos aprender a dar nomes aos compostos orgânicos. Por quê? Vamos imaginar como nós nos comunicaríamos se as coisas não tivessem nomes. Seria impossível transmitir nossas ideias ou dúvidas ou esclarecimentos! E lógico, os nomes têm que ser palavras. Mas a gente podia pensar: já que as fórmulas estruturais constituem uma perfeita identificação para cada substância, por que os químicos não dispensam os nomes formados por palavras e utilizam as fórmulas . 51 . Sala de
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