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DIREITO PENAL I Aluna: Maria Carolina Ribeiro Daniela Portugal Aulas 1. CONCEITOS INICIAIS: 1.1. Introdução: O direito penal é um ramo do Direito Público. Expõe seu sistema por meio de normas jurídicas, exigindo o seu cumprimento sem reservas, estendendo-se a todos (imputação). Possui uma natureza peculiar de meio de controle social formalizado, uma vez que os demais meios de controle mostram-se ineficazes (insuficientes para harmonizar o convívio social). Para resolver conflitos e suturar eventuais rupturas produzidas pela ação do homem: “o fato social que contrariar o ordenamento jurídico constitui um ilícito jurídico (transgressão da norma), cuja modalidade mais grave é o ilícito penal, que lesa os bens mais importantes do membro da sociedade”. 1.2. Conceito: É o conjunto de normas e princípios jurídicos que tem por objetivo a determinação de infrações de natureza penal e suas sanções correspondentes – através de penas e medidas de segurança. “É o conjunto de normas que liga ao crime como fato, a pena como consequência, e, disciplinam também as relações jurídicas daí derivadas, para estabelecer a aplicabilidade de medidas de segurança e a tutela do direito de liberdade em face do poder punitivo do Estado”. – Frederico Marques 1.3. Carácteres: - A relação existente entre o “autor e a vítima” é secundária, uma vez que a vítima não possui direito de punir (jus puniendi), somente de acusar (jus accusations). Consequentemente, o Estado, mesmo nas acusações privadas (ação exclusiva de iniciativa privada) é o titular do poder punitivo. - Possui finalidade preventiva, pois, antes de punir o infrator da ordem penal, procura motivá-los a não cometer tal infração por meio de normas proibitivas. - “Direito Penal é uma ciência cultural, normativa, valorativa sancionatória e finalista” – Magalhães Noronha. Cultural, pois pertence às classes do “dever ser”. É ciência normativa porque tem como objeto o estudo da norma, e, atualmente as causas do fenômeno criminal. É valorativo, pois valoriza a própria norma, que se dispõe em escala hierárquica. Finalista, pois visa a proteção dos bens jurídicos fundamentais. Sancionatória, pois comina sanções em seu texto. - Tem caráter primário e constitutivo, uma vez que não atua de forma simplesmente acessória, pois protege bens e interesses não protegidos por outros ramos do direito e, mesmo quando tutelado por outros ordenamentos, ainda assim, faz de forma diferente, dando distintiva valoração. 1.4. Terminologias: - Direito Penal Objetivo x Direito Penal Subjetivo: - Objetivo: Conjunto de normas positivadas na esfera penal. - Subjetivo: “Jus puniendi” – é o direito de atribuição da pena como consequência jurídica diante do cometimento de um crime. Em que pesem excepcionais hipóteses nas quais se autoriza a “auto tutela”, o “jus puniendi” é de titularidade do Estado. - Direito Penal Comum x Direito Penal Especial x Direito Penal Complementar: - Direito Penal Comum: É aquele concentrado no próprio Código Penal, destinado a todos os integrantes da sociedade (questão do principio da reserva do código). - Direito Penal Especial: se refere a matéria especializada do Direito Penal (Exemplo: Direito Penal Militar). - Direito Penal Complementar: São condutas adicionadas ao Código Penal devido a sua defasagem. São leis esparsas que atualizam o código no tempo, disciplinando novos crimes, destinados em geral a todos da sociedade (Exemplo: Lei 11.343/06 – Lei de Drogas). - Direito Penal Substantivo x Direito Penal Adjetivo: - Direito Penal Substantivo: É o Direito Penal de caráter material. Reunião de todas as normas incriminadoras, permissivas e explicativas de matéria penal. - Direito Penal Adjetivo: Terminologia ultrapassada para se referir ao Direito Processual Penal. O processo é instrumento necessário para a satisfação do Direito Penal Material. 2. FINALIDADES DA PENA: 2.1. Teorias legitimadoras: Reconhecem, sob os mais diversos fundamentos, a legitimação do Estado para intervir na liberdade dos cidadãos por meio do Direito Penal. 2.1.1. Teorias absolutas: A pena seria um fim em si mesma, pune-se por punir, para castigar. Para alguns estudiosos, institucionaliza a vingança, pois o Estado exerceria o seu poder de legislar da maneira que fosse conveniente. A pena seria a negação da negação do direito. 2.1.2. Teorias relativas: Possuem utilidade social. A pena seria um meio a serviço de determinados fins, considerando-a, portanto utilitariamente. O fim da pena em suas versões seria a prevenção de delitos. • Prevenção geral negativa: FEUERBACH. Todos os crimes têm por causa ou motivação psicológica a sensualidade, na medida em que a concupiscência do homem é o que o impulsiona, por prazer, a cometer a ação. A este impulso pois, aplica-se um contra impulso, que a certeza da aplicação da pena. A punição do criminoso gera um temor social que funcionará como contraestimulo. • Prevenção geral positiva: JACKOBS. Por meio da punição do criminoso a sociedade passa a ter conhecimento das consequências do cometimento de um delito. • Prevenção especial negativa: Pune-se o indivíduo para que se possa garantir que ele não cometa novos delitos enquanto cumpre a pena (neutralização). • Prevenção especial positiva: A pena serve para a ressocialização. Prefere trabalhar com medidas ao invés de penas (ressocialização). 2.1.3. Teorias ecléticas ou mistas: O Código Penal brasileiro adotou a teoria mista ou eclética ou unitária (atr. 59), agregando mais de uma das referidas funções ao dispor que o juiz aplicará pena suficiente para a reprovação (retribuição) e prevenção do crime. A teoria eclética funcionaria como um meio de mediar a teoria absoluta e a teoria relativa. Dentro da teoria eclética existem duas teorias as quais se vale a pena destacar, a teoria dialética unificadora de Claus Roxin e a teoria agnóstica da pena de Zaffaroni. • Teoria dialética unificadora: ROXIN. A finalidade básica do direito penal é a prevenção geral subsidiária de delitos. A pena de fato cumpre uma função, mas esta depende da fase em que se observa a aplicação da pena. - Pena prevista: É a pena prevista em lei – abstrata. - Pena aplicada: O quantum de pena aplicada pelo juiz – em concreto. - Pena executada: Refere-se ao apenado de fato encarcerado cumprindo a pena – de fato. Pena prevista (abstrata) Pena aplicada (em concreto) Pena executada (de fato) Fins Prevenção geral Retribuição Prevenção especial Limites Proporcionalidade Culpabilidade Humanização das penas • Teoria agnóstica da pena: ZAFFARONI. Identifica a incapacidade do Estado em cumprir quaisquer das finalidades teóricas que legitimariam a privação de liberdade, todavia, paradoxalmente, sustenta a manutenção da pena privativa de liberdade, porque não se sabe o que fazer com o criminoso. • Teoria do garantismo “neoclássico”: LUIGI FERRAJOLI. A única função capaz de legitimar a intervenção penal é a prevenção geral negativa exclusivamente, mas não apenas a prevenção de futuros delitos e sim, sobretudo, a prevenção de futuras reações informais públicas ou privadas, pois a pena não serve apenas para prevenir os injustos delitos, mas também os castigos injustos. 3. CIÊNCIAS PENAIS: CRIMINOLOGIA E POLÍTICA CRIMINAL: 3.1. Criminologia: É a ciência que estuda a causa dos crimes e suas origens. • Criminologia etiológica: Século XVIII. Enfoca o criminoso e não somente as penas e antecedentes históricos. Acaba trazendo um status majoritariamente cientifico. O maior percussor foi LOMBROSO, com a “Teoria do Criminoso Nato”, onde defenderia a ideia de um gene criminoso. A Etiologia traz uma abordagem essencialista, pois, o “ser criminoso” corresponderia a características de alguns sujeitos considerados defeituosos (determinismo social).• Criminologia crítica: Observa que a origem do crime está associada ao processo político de criminalização, que torna tal ação crime e quem a comete, criminoso. A criminologia crítica sustenta que o “ser crime” não é um atributo do ato, mas sim uma qualidade atribuída ao ato. Trabalha com a ideia de seletividade penal (Teoria do Entiquetamento ou Labelling Approach). O processo de criminalização não é um processo neutro (controle social selecionado). • Criminologia radical: Tem como base a Teoria Criminológica Crítica, porém, faz acréscimos a ela: entende que o processo de Entiquetamento é reflexo de um problema social ainda maior; qual seja a luta de classes e o capitalismo (seletividade x dinâmica econômica). • Criminologia psicanalítica: Associada às Escolas Clássicas do Direito Penal, trás a ideia de que a violência é um fenômeno cíclico. Segundo Salo de Carvalho, “o processo civilizatório corresponde a um processo de desumanização, que afastaria o homem dos seus impulsos bárbaros naturais”. O homem em seu subconsciente, guarda a culpa de seus ímpetos violentos e na ocasião de cometimento de crime por outrem, transfere para este a sua culpa por meio do clamor social por pena (Exemplo: Caso Nardoni). O apenado por sua vez, ao retornar à sociedade, retribui para esta violência sofrida no cárcere (essência humana x origem do crime). 3.2. Dogmática penal: Ciência voltada à decidibilidade de conflitos, motivo pelo qual sua intervenção é sempre tardia. 3.3. Política Criminal: É a ciência de selecionar os bens jurídicos (ou direitos) que devem ser tutelados penalmente, e escolher os caminhos para efetivar a tutela desses bens jurídicos, o que iniludivelmente irá implicar a crítica dos valores e caminhos já eleitos. Orienta-se a busca de formas de controle da violência e combate à criminalidade. • Movimentos legitimadores: Relacionam o controle da violência pela via da legitimação da intervenção penal, deste modo, encontra-se aqui terreno fértil para a própria hipertrofia do direito penal associada à práticas de intervenção máxima e construção de um Estado policialesco. - Teoria das Janelas Quebradas: Teoria de abordagem sociológica que demonstra que uma desordem, mesmo que pequena, gera uma desordem maior. Serviu de base para o pensamento da política criminal norte americana dos anos 80 e 90, como uma forma de criminalizar certos comportamentos (pichar muros, prostituição...) – Movimento Tolerância zero. - Movimento de Lei e Ordem: Associação direta entre o numero de leis penais e a organização social. Assim o Direito Penal passa a ser a primeira esfera de controle social (Exemplo: A Lei de Crimes Hediondos legitimou a intervenção penal mais severa). • Movimentos deslegitimadores: Possuem como pressuposto de debate, a falência do sistema prisional, a ineficiência do Estado nas reduções dos índices de criminalidade para propor a redução da violência por via da deslegitimação da intervenção penal (direito penal simbólico). - Minimalismo: ZAFFARONI. Funcionalismo Reducionista. Propõe a redução do direito penal como forma de reduzir os índices de criminalidade já que o direito penal simbólico é ineficaz e enganoso. Propõe uma esfera de controle reduzida, direito penal como “ultima ratio”. Um rol menor de crimes daria uma maior eficiência ao direito penal (descriminalização e descarcerização). - Abolicionismo: LOUK HULSMANN. No movimento abolicionista defende-se a derrubada do sistema penal juntamente com seus atributos para a implantação de um novo sistema. Juarez Cirino dos Santos trata do minimalismo como um caminho necessário ao abolicionismo. Na visão do autor, deve-se manter a proposta abolicionista como um ideal inafastável, orientando o próprio caminho minimalista. OBS: Criminologia Crítica e a Teoria do Entiquetamento e a seletividade penal: “Criar crimes é colocar etiquetas” – Não há diferença ontológica entre condutas criminosas e condutas não criminosas, a questão é em qual conduta será posta uma “etiqueta” e quem possui o poder de colocá-la. Estigmatização do sujeito ativo – As leis nunca são neutras. 4. A NORMA PENAL E SUA INTERPRETAÇÃO: 4.1. Conceitos básicos: • Tipos penais: É um molde, um dispositivo penal. Divide-se basicamente entre: a) Tipos incriminadores: os que preveem um delito; b) Tipos permissivos: autorizam um dado comportamento (Exemplo: legítima defesa); c) Tipos explicativos: elucidam conceitos, orientando o próprio intérprete (art. 59, CP). • Preceito primário: É a descrição da conduta. • Preceito secundário: É a descrição da pena. • Sujeito ativo: É o autor da conduta criminosa – somente pode ser pessoa física (com exceção de crimes ambientais que admitem pessoa jurídica como sujeito ativo). • Sujeito passivo: É a vítima, sujeito ofendido; para além da vítima imediata, entende-se que o Estado pe pelo menos vítima mediata de todos os crimes – Todas as pessoas podem ser sujeito passivo. • Objeto jurídico: É o bem jurídico tutelado (Exemplo: patrimônio, vida, liberdade, honra...). • Objeto material: É a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta. 4.2. Jurisprudência e norma penal: Modernamente entende-se que para além da lei, a jurisprudência poderá criar norma penal. DWORKIN: “interpretar é como escrever um romance em cadeia (sequência)”. MÜLLER: “não existe norma jurídica senão enquanto norma jurídica interpretada”. Rompe-se a designação entre texto (ponto de partida) e norma (ponto de chegada). 4.3. Conflito aparente (ou antinomia) e critérios de solução: Antinomias de primeiro grau, segundo Bobbio, são as aparentes para as quais de sabe a solução. • Critério hierárquico: Norma superior prevalece sobre norma inferior. • Critério de especialidade: Norma especial prevalece sobre norma geral. • Critério cronológico: Norma posterior prevalece sobre norma anterior. Antinomias de segundo grau são aquelas aparentes que correspondem em ultima análise, a um conflito entre os próprios critérios de solução. Segundo o autor, o critério mais fraco é o cronológico, não prevalecendo quando em confronto com os critérios hierárquico e da especialidade. - Norma superior geral diante de norma inferior especial = antinomia real. O direito penal possui critérios próprios para a solução de conflitos. • Critério da consunção ou absolvição: Verificando-se uma relação entre o meio e o fim de um crime envolvido dentro de um mesmo contexto fático, prevalece, conforme o critério, o crime fim. O agente responderá apenas pelo crime fim que absolve o crime meio. (Exemplo: Arrombamento de residência para a realização de um furto). Jurisprudencialmente o principio da consunção é aplicado, todavia há casos em que se afasta o referido princípio, punindo o agente tanto pelo crime meio como pelo crime fim, considerando o concurso de crimes. • Critério da subsidiariedade: O tipo penal subsidiário é, de acordo com Nelson Hungria: “um soldado reserva”, isto é, conflitando crime mais grave com crime menos grave, prevalece pelo critério de subsidiariedade o crime mais gravoso. A subsidiariedade pode ser expressa no próprio ordenamento (art. 132, inciso 154, parágrafo 3º) ou tácita (Exemplo: crime de constrangimento ilegal; art. 146, subsidiário a uma série de outros crimes como o roubo ou o estupro). • Critério da alternatividade: Afastará o conflito aparente sempre que o tipo incriminador contiver mais de um núcleo verbal, deste modo, mesmo quando o agente pratica mais de um verbo, responderá por crime único (tipos mistos alternativos). 4.4. Analogia e interpretação analógica: • Analogia é um recurso que se dá diante da necessidade de solucionar uma lacuna jurídica. (Exemplo: Caso de furto de energia elétrica (art. 155) > analogia > captação clandestina de sinal fechado de TV). O direito penal admite analogia em bonam partem.Ao contrário do direito penal, o direito processual penal admite amplamente a analogia, seja para benefício, seja para malefício do réu. • Interpretação analógica : verifica-se quando uma norma penal é estruturada de modo a apresentar um conteúdo parcialmente definido em lei, nesse sentido, formula-se um conteúdo exemplificativo, seguido de uma cláusula geral, admitindo-se uma interpretação analógica para que situações não exemplificadas sejam também alcançadas, uma vez que compatíveis com as cláusulas gerais. (Exemplo: Fórmula exemplificativa = veneno, fogo, explosivo; cláusula geral: ou outro recurso). Ao contrário da analogia, a interpretação analógica é admitida pelo direito penal em bonam partem, ou em malam partem. 5. PRINCÍPIOS PENAIS: 5.1. Princípio da legalidade: O princípio da legalidade é a base do garantismo penal. O Estado só pode exercer o seu poder punitivo através da lei. No sentido geral, define-se que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude da lei. No sentido geral do Código Penal, o princípio da legalidade ganha um conteúdo especial. Dispõe o Artigo 1º, que não crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. • Lei prévia: a lei deve estar em vigor antes da prática do ato. A lei penal não pode alcançar fatos praticados antes da sua vigência, salvo para beneficiar o réu (retroatividade benéfica). • Lei escrita: é impossível criminalizar algo através de costumes. - Consectários lógicos ou subprincípios: • Reserva legal: significa dizer que para instituir crime, não basta a existência de lei em sentido material, sendo indispensável que a instituição do delito se dê por lei em sentido formal ou lei em sentido estrito, portanto, não se admite que portarias, regulamentos, medidas provisórias (...) criem delitos. • Anterioridade: significa dizer que a criação do tipo incriminador deve necessariamente ser anterior ao alcance das condutas consideradas criminosas (irretroatividade da lei penal prejudicial). • Taxatividade: a lei penal deve ser certa e determinada, não deixando duvidas quanto ao comportamento que se está criminalizando. • Normas penais em branco: carecem de complementação para que consigam ser efetivamente aplicadas. - Homogêneas ou impróprias: são complementadas por norma de igual hierarquia (Exemplo: Código Civil complementando o Penal no caso do crime de bigamia). - Heterogêneas ou próprias: o complemento se dá por norma de hierarquia inferior (Exemplo: Lei 9.605, art. 35, inciso II – o complemento se dá via regulamentos, portarias... / Lei 11.343 – não conceitua droga, a definição encontra-se em uma portaria da ANVISA). - Inversa ou às avessas: o complemento será necessário no preceito secundário da norma (pena). Questiona-se a constitucionalidade das normas penais em branco em face do principio da legalidade. No caso das homogêneas ou impróprias, aponta-se ofensa a taxatividade, no caso das heterogêneas ou próprias, aponta- se ofensa a taxatividade e a reserva legal. O entendimento da jurisprudência e da doutrina, predominantemente sustenta a constitucionalidade das normas penais em branco, para as hipóteses em que a existência desta se mostrarem necessárias, exigindo-se, todavia, que o núcleo do tipo incriminador seja dado em sentido formal. E que o preceito secundário esteja plenamente preenchido. Alguns autores brasileiros dizem que possuímos normas penais em branco inversas homogêneas; seriam os tipos penais remetidos: norma que faz a remessa do texto a outro tipo penal em seu preceito secundário. 5.2. Princípio da insignificância: Também chamado de princípio da bagatela, destaca-se pela ausência de previsão legal aliada à ampla aplicação jurisprudencial. Primeiramente, o referido princípio tinha a sua aplicabilidade relacionada a crimes contra o patrimônio cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, todavia modernamente os tribunais vêm ampliando significativamente o seu alcance, que vem sendo estendido para diversos outros crimes, a exemplo de crimes ambientais, tributários, ou mesmo crimes militares. Uma vez aplicado o princípio, exclui-se a própria tipicidade da conduta, sob o fundamento de inexistência de tipicidade material (ou seja, inexistência de lesão significativa à bem jurídico). A lesão insignificante é, portanto, considerada atípica. A aplicação do referido princípio é de incumbência do Ministério Público ou do magistrado, não cabendo ao delegado de polícia a sua aplicação. O delegado emite somente um exame da tipicidade formal da conduta. Para ser aplicado o princípio da insignificância é necessário que haja: a) mínima ofensividade da conduta: nenhuma violência ou grave ameaça; b) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do agente: a conduta do autor deve ser observada. A reincidência e maus antecedentes não impedem por si sós a aplicação do referido princípio, todavia, deverão ser ponderados. c) inexpressividade da lesão jurídica: leva em consideração as características da vítima: furto de pequeno valor x furto insignificante: o primeiro é causa de diminuição da pena (conduta típica – art. 155, §2º). Pequeno valor é o valor inferior a um salário mínimo. Já a segunda conduta é causa de exclusão de tipicidade material. Insignificante é um valor inexpressivo para a vítima. d) nenhuma periculosidade social da ação: analisa se a conduta gerou risco para a sociedade. O STJ não aplica o principio da bagatela para crimes contra a administração pública. 5.3. Princípio da lesividade (ofensividade): Com base neste princípio, a intervenção penal somente se legitima diante da ocorrência de lesão, ou pelo menos perigo concreto de lesão. • Lesão e perigo concreto de lesão: Exemplo: crime de lesão corporal, crime de ameaça (lesão concreta à liberdade). • Questiona-se com base no princípio da lesividade, a constitucionalidade dos tipos penais de perigo abstrato. Neles a acusação sequer precisa demonstrar que o risco concretamente existiu, pois ele é automaticamente depreendido por presunção da própria realização do comportamento descrito no tipo incriminador. 5.4. Princípio da fragmentariedade: O direito penal é fragmentário porque não tutela todo e qualquer bem jurídico, mas somente os mais relevantes, extraídos dos mais variados ramos do direito. 5.5. Princípio da subsidiariedade: O direito penal é também subsidiário, isto é, corresponde a ultima ratio de proteção do bem jurídico. Significa dizer que o direito penal é a ultima esfera de controle do direito, justamente por ser a mais gravosa (porque limita o direito à liberdade). Com base nesse princípio, o legislador só pode criminalizar uma conduta quando notar que os outros ramos do direito não são suficientes para dar a esse bem uma proteção devida, ocasião em que o direito penal funcionará como um duplo sistema de jurisdição. 5.6. Princípio do “ne bis in idem”: De acordo com este princípio, o direito penal veda a dupla punição e o duplo processo. Ainda que o acusado tenha sido absolvido por insuficiência de provas, não será possível que, mesmo diante da descoberta de nova prova, seja oferecida nova denúncia, pois tal fato representa um “bis in idem”. Tal situação não se confunde com descoberta de nova prova, referida na súmula 524 do STF, já que em tal caso, não houve efetivamente processo penal. Outra hipótese que tem causado discussão quanto a aplicação do referido princípio é o concurso de crimes entre o art. 157, §2º, II, e o art. 288, caput. Para os tribunais superiores, é perfeitamente possível a cumulação das referidas imputações, já que os mencionados delitos resguardam bens jurídicos distintos. 5.7. Princípio da confiança: Para a estabilização das relaçõessociais no âmbito de uma sociedade complexa, atua-se com a confiança no fiel cumprimento por parte do outro, daquilo que se espera do seu comportamento. Nesse sentido, eventual quebra de confiança, legitima a intervenção penal, e de outro lado, não havendo esta quebra, não há razão para a imposição de pena (Guntner Jackobs). 5.8. Princípio da adequação social: Não se pune conduta socialmente aceita e adequada, pois ela não integra o suporte fático no qual incidirá a norma penal. Esta exclusão da tipicidade, no entanto somente é possível se o juízo de adequação social emanar da sociedade, pouco importando a opinião pessoal do magistrado (súmula 502, STJ). 5.9. Princípio da responsabilidade pessoal: Com base nesse princípio, ninguém poderá ser responsabilizado por conduta de terceiro. Daqui decorre o princípio da intranscendência da penas, conforme o qual, nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo todavia, a obrigação de reparar dano ser estendida aos sucessores do agente, até o limite que lhes foi transferido. Lei 9.605/98, prevê responsabilidade de pessoa jurídica. 5.10. Princípio da responsabilidade subjetiva (culpabilidade): Ninguém será responsabilizado criminalmente, sem que antes seja analisado o seu elemento subjetivo para fins da própria tipificação da conduta. Dolo ou culpa: o dolo é a intenção, e a culpa é quando não há intenção. O tipo doloso é regra geral, o tipo culposo é extensão legal. 5.11. Princípio da presunção de inocência: Significa dizer que todos são presumidamente inocentes enquanto não se prove o contrário por meio de sentença transitada em julgado (aquela que não cabe mais recurso – se deu coisa julgada). Prevista no Pacto de San José da Costa Rica. A Constituição brasileira trás a previsão de que ninguém será considerado culpado antes do transito em julgado de sentença penal condenatória – para alguns autores, a referida previsão legal consagra o princípio da presunção de inocência no ordenamento brasileiro. Um segundo grupo de autores, acredita que tal previsão consagraria o principio da presunção de não culpabilidade. 5.12. Princípio da humanização das penas: Possui previsão no art. 5º, inciso 47 da Constituição Federal, conforme o dispositivo penal não admitirá penas de morte, salvo em casos de guerra declarada, penas de caráter perpétuo, penas de trabalhos forçados, penas de banimento, nem penas cruéis. • Pena de morte ou capital: Caso seja aprovada, deve ser feita por fuzilamento. • Pena de caráter perpétuo: CP, art. 65, o limite da pena será de 30 anos (por bloco de condenação). • Pena de trabalho forçado: a Lei de Execução Penal diz que o trabalho é um dever do preso, logo, serve como atenuante de pena, dessa forma, o texto da Lei de Execução Penal não é um texto inconstitucional. • Pena de banimento: ninguém pode ser banido do Brasil (reflexo pós-ditatorial). • Penas cruéis: as penas deverão respeitar a dignidade do preso. 5.13. Princípio da alteridade: Desenvolvido por Roxin, materializa o entendimento de que o direito penal não se ocupará daquilo que não transcender a esfera do íntimo, do interno, devendo haver pelo menos o atingimento do(s) outro(s). Com base neste princípio, não se pune a autolesão. 5.14. Princípio da proporcionalidade: Por este princípio, as normas devem ser interpretadas de modo a otimizar (máxima efetividade possível) a realização dos direitos fundamentais. Deste modo, a intervenção penal (ofensiva aos direitos fundamentais) só pode ser aplicada na medida em que se observe três dimensões fundamentais da proporcionalidade. Necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito. A medida da pena deverá ser proporcional à medida do crime. Este princípio orienta o legislador para que construa tipos incriminadores que possuam proporcionalidade entre a conduta praticada e a pena imposta. “A lei só deve cominar penas estritamente necessárias e proporcionais ao delito”. 6. APLICAÇÃO DA LEI PENAL: 6.1. Lei penal no tempo: Para tempo de crime, o Código Penal brasileiro adotou a teoria da atividade ou da conduta, conforme a qual o momento do crime é o momento da ação ou omissão, ainda que seja outro o momento do resultado (art. 4º). Lei A Pena de 6 a 10 anos CRIME Lei B Pena de 8 a 12 anos JULGAMENTO 6.1.1. Irretroatividade: A lei penal prejudicial é irretroativa, ou seja, não poderá alcançar fatos praticados antes do inicio de sua vigência. 6.1.2. Retroatividade: A lei penal em benefício é retroativa, ou seja, sempre poderá se aplicar a fatos passados, ainda que já e tenha iniciado o processo, ou mesmo que já tenha havido transito em julgado da sentença condenatória, ou que o agente esteja no curso de sua pena. Lei A Pena de 8 a 12 anos CRIME Lei B Pena de 6 a 10 anos JULGAMENTO Lei A Pena de 6 a 10 anos CRIME Lei B Pena de 8 a 12 anos JULGAMENTO Ultratividade benéfica OBS: Ultratividade benéfica: Note que da irretroatividade da lei prejudicial deriva, logicamente, a ultratividade benéfica da lei revogada, uma vez que, ela manterá o sua aplicação mesmo não estando mais em vigor, desde que, para os crimes cometidos durante a sua vigência. A lei B é uma “novatio legis in prejus” logo, a pena aplicada será a de acordo com a lei A. *Abolitio criminis A lei B neste caso será uma “novatio legis in melius”, logo, ela será aplicada, mesmo que no momento do crime, a lei vigente fosse a A. 6.1.3. Crimes permantentes e continuados: Crimes pemanentes são aqueles cuja consumação se prolonga no tempo, durando o tempo que durar a permanência (Exemplo: sequestro e algumas modalidades de tráfico). Na contiuidade delitiva de outro lado, estamos diate de uma pluralidade de crimes que o legislador por razões de política criminal, resolveu chamar de crime único (ficção jurídica). Para que se reconheça a continuidade delitiva é indispensável que essa pluralidade se refira a crimes de mesma espécie (mesmo tipo penal) praticados dentro de circunstancias de tempo, lugar e maneira de execução semelhantes. Lei A Pena de 6 a 10 anos Lei A Pena de 1 a 4 anos Lei B Pena de 8 a 12 anos Lei B Pena de 2 a 6 anos 6.1.4. Leis excepcionais e temporárias: O Código Penal trata das leis excepcionais e temporárias no seu art. 3º. Leis excepcionais são aquelas que só irão viger no curso de uma situação de anormalidade (exemplo: estado de sítio), já as temporárias também cuidam de situação especial, a diferença é que já indicam a data de inicio e de término de vigência antecipadamente (exemplo: Lei 12.663/2012 – Lei da Copa). O tratamento de ambas é o mesmo, apesar de serem espécies legislativas distintas. De acordo com o Código Penal, leis excepcionais e temporárias gozam de ultratividade, isto é, são aplicadas aos crimes praticados durante a vigência, mesmo após o encerramento desta, e ainda que de forma prejudicial. O questionamento doutrinário para da seguinte linha de orientação: A Constituição Federal não faz nenhuma menção à ultratividade prejudicial, logo, não caberia ao Código Penal fazê-lo, pois neste caso o Código Penal estaria dando uma leitura mais estrita a uma garantia fundamental que está posta na Constituição. O argumento utilizado pelos tribunais é de que, caso não houvesse ultratividade prejudicial, a lei não seria respeitada. 6.1.5. “Lex tertia”: Diante do conflito de leis penais em que ambas apresentes parcelas benéficas e prejudiciais, jamais se admitirá a combinação destas, sob o fundamento de que a combinação de leis feita pelos juízes, usurpa função legislativa, criando uma terceira espécie, uma “lex tertia”. Lei A Pena de 6 a 12 anos CRIME Lei B Pena de 8 a 10 anos JULGAMENTO Lei C / ////// / = datada ocorrência de um crime Para o STF, nos termos da súmula 711, a lei penal que se aplica na hipótese de sucessão de leis em crimes continuados ou permanentes será a lei vigente no momento em que cessa a permanência ou continuidade, seja ela benéfica ou gravosa. Não se trata, conforme o STF, de uma exceção ao princípio da retroatividade benéfica, uma vez que, depois de cessada a permanência ou a continuidade, caso sobrevenha uma nova lei benéfica, ela retroagirá. Pena de 6 a 10 anos (?) = não é admitida. Pena de 2 a 4 anos Lei D Pena de 8 a 12 anos JULGAMENTO Lei A Pena de 1 a 4 anos Lei B Pena de 4 a 6 anos CRIME 6.1.6. Lei intermediária: OBS1: Sobre o vacatio legis: se a lei estiver em vacatio legis não irá se aplicar, ainda que mais benéfica, pois será necessário antes aguardar a sua entrada em vigor. A vacacio legis tem como sentido teológico a proteção da sociedade para que não cause uma surpresa. É o período em que a sociedade está se adaptando a uma garantia criada para o destinatário da prória norma, poderia este destinatário abrir mão da sua garantia em eu próprio benefício (não ocorre). OBS2: sobre a retroatividade jurisprudencial: para a doutrina majoritária, não seria possivel falar em retroatividade benéfica de jurisprudência por ferir a segurança juridica. Além disso, a Constituição menciona retroatividade benéfica da lei, e não do entendimento sobre esta. Muito embora não declarem operar retroatividade de jurisprudência, os nossos tribunais de forma desordenada e casuística, em algumas situações, assim procedem (exemplo: cancelamento da súmula 714 do STJ). 6.2. Lei penal no espaço: 6.2.1. Lugar do crime: É onde o crime aconteceu, onde é considerado praticado. O direito penal brasileiro, como regra geral, só irá ser aplicado a crimes praticados dentro do Brasil. Somente para casos excepcionais, que admite-se que a lei brasileita seja utilizada para crimes praticados fora do território. Conflitos entre jurisdições podem ser reguados por acordos ou pelo direito internacional. Nos termos do artigo 6º do Código Penal, lugar do crime é tanto o local em que se deu a ação ou omissão, quanto o local em que se produziu ou deveria ter sido produzido o resultado. Adotou-se portanto teoria da ubiquidade. Note que essa teoria só tem utilidade para crimes cometidos a distância, isto é, entre mais de um Estado soberano. A ação ou omissão pode acontecer na integra ou parcialmente dentro de um território. 6.2.2. Territorialidade: É a regra geral de aplicação da lei brasileira já que, somente excepcionalmente será aplicada a lei brasileira para que crime que tenha acontecido integralmente em território estrangeiro. O principio em territorialidade não é absoluto, e pode ser mitigado em acordos, tratados e normas de direito internacional (territorialidade mitigada ou matizada). Existem crimes cometidos 100% no Brasil, mas para os quais não se aplicarão a lei brasileira, são situações excepcionais, regulamentadas em normas de direito internacional (exemplo: imunidades diplomáricas e consulares). * Não confunir lugar do crime com territorialidade. Um navio da marinha brasileira onde quer que esteja, é território brasileiro. Sobre o conceito de território nacional, o art. 5º do Código Penal prevê duas espécies de território: território natural e território brasileiro por extenção ou equiparação. Quando falamos de território natural brasileiro, falamos do solo brasileiro, subsolo, mar territorial e espaço aério correspondente. Considera- se território por extensão ou equiparação as embarcações e aeronaves brasileiras públicas ou a serviço do poder público, onde quer que se encontrem, bem como aeronaves e embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada que tracem respectivamente o espaço aéreo correspondente ou em alto mar. Será aplicada a lei C, que é uma lei intermediária, pois, enquanto vigeu, o réu adquiriu direito à sua aplicação. 6.2.3. Extraterritorialidade: Criemes praticados fora do Brasil. É considerado uma exeção. • Incondicionada: Incondicionada porque não apresenta obstaculos para sua aplicação. As hipóteses de extrarritorialidade incondicionada estão previstas no art. 7º, I, e atendem a previsão do §1, segundo o qual aplica-se a lei brasileira ainda que o agente tenha siso absolvido ou condenado no estrangeiro. Hipóteses de extraerritorriedade incondicionada são mais gravosas, relacionadas ao exercício da soberania brasileira. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora tenham sido cometidos no estrangeiro, os seguintes crimes: a) Contra a vida ou liberdade do Presidente da República (crimes de latrocínio, extorsão mediante sequestro e todos os outros crimes previstos no título II do Código Penal, são patrimoniais, mesmo que atinjam a vida ou liberdade). b) Contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, do Estado, de territórios, de municípios, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo poder publico. *Fé pública = moedas e documentos brasileiros. c) Contra a administração pública, por quem está a seu serviço. Somente são hipóteses de extraterritorialidade incondicional crimes praticados contra a administração públicas por funcionário público brasileiro – crime de corrupção passiva, corrupção ativa (art. 317 e art. 333, CP). d) De genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil. Crime de genocídio refere-se a intenção de destruir no todo ou em parte grupo nacional, étnico, religioso ou racial. Esta previsão está contida na Lei 2889/56. Se o crime de genocídio é tentado ou consumado, só reflete na aplicação da pena. A tentativa é uma causa de diminuição de pena, o tipo penal é o mesmo. O sujeito pode ser punido por tentativa de genocídio sem que haja lesão alguma. - Princípio da justiça universal ou cosmopolita: Tentar de algum modo criar uma cooperação entre os povos para coibir determinadas práticas. Cooperação de diversos Estados soberanos no combate de determinadas práticas. • Condicionada: A extraterritorialidade tem suas hipóteses previstas no art. 7º, II, e a lei brasileira só pode se aplicar depois de preenchidas cumulativamente as condições do §2º, e no caso de crime praticado contra brasileiro, fora do Brasil, além das condições do §2º, também as do §3º. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro, os crimes: a) Que por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir (exemplo: tráfico de entorpecentes e de pessoas). Também se utiliza o principio da justiça universal ou cosmopolita (necessidade de cooperação entre os povos). b) Praticados por brasileiro, onde quer que ele se encontre (principio da nacionalidade ativa). c) Praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro, e ali não sejam julgados. *A preferencia é do Estado estrangeiro, caso este não o queira, o Brasil julga. d) Praticados contra brasileiro: (principio da defesa ou da proteção + principio da nacionalidade passiva) – Art. 7º, §3º. - Condições gerais: São cumulativas, estão previstas no art. 7º, §2º, CP. Nos casos do inciso II, a aplicação da lei penal brasileira depende do concurso das seguintes condições: 1) Entrar o agente em território nacional (Brasil): Essa entrada não precisa ser espontânea; pode ser forçado, extraditado, exportado, pouco importa. Entrada não significa necessariamente permanência, a entrada em si já atende a condição processual. *O Ministério Público já estará autorizado a oferecer denúncia, e tal oferecimento dá inicio ao processo. O fato de o sujeito não se encontrar no Brasil,irá impedir que ele seja citado. Como a citação não ocorre pessoalmente haverá uma citação ficta (por edital), logo na sequencia, suspende-se o processo, logo, suspende-se o curso dos processos prescricionais. Fica suspenso no tempo máximo da pena cominada, segundo súmula do STF (STF e STJ convergem). 2) Ser o fato punível também no país em que for praticado – dupla tipicidade. O fato deve ser considerado criminoso tanto no Brasil quanto no exterior (exemplo: conjunção carnal forçada). 3) Estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza extradição (pena mínima superior ou igual a um ano). O Brasil deve pedir a extradição do agente, via de regra, para a entrada no território nacional. O Brasil disciplina no Estatuto do Estrangeiro as hipóteses em que ele extraditará estrangeiro para o país que esteja pleiteando. 4) Não ter sido o agente absolvido no estrangeiro, o não ter cumprido ali a sua pena. Consagra o princípio do “ne bis in idem” – grande diferença entre a extraterritorialidade condicionada e incondicionada. 5) Não ter sido o agente perdoado no estrangeiro, ou por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável – extinção de punibilidade = perda da possibilidade do Estado de punir (art. 107, CP). - Condições para crimes contra brasileiro fora do Brasil: previstas no art. 7º, §3º - vão além das condições gerais. A lei brasileira também se aplica ao estrangeiro que comete crime contra um brasileiro fora do Brasil, se reunidas as condições previstas no parágrafo anterior. 1) Não foi pedida ou foi negada a extradição – se o crime foi praticado por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, a condição mais elementar é a entrada do agente no território nacional. Necessidade de exame por vontade política. 2) Houve requisição do ministro da justiça – condições de procedibilidade. O processo nem se instaura caso não haja a requisição do ministro da justiça. 6.3. Lei penal com relação às pessoas: Imunidades penais: 6.3.1. Imunidades parlamentares: Possuem fundamento constitucional (art. 53). Os deputados e senadores não serão punidos pelos chamados crimes de opinião. Não serão punidos, por exemplo, pelos crimes de injúria, calúnia e difamação, ou até pelo crime de racismo, dentro de um entendimento tradicional. O que se discute é a eficiência ou não de limites a imunidade material ou absoluta em relação ao racismo. - Argumentos a favor da imunidade: Exercício da democracia. Função representativa. Opinião do deputado ou senador sobre o racismo, nem que seja para que a população negue, para que seja rechaçado. - Argumentos contra a imunidade: Limitar o direcionamento à determinada pessoa. No que diz respeito aos vereadores, a Constituição não disciplina uma inviolabilidade tão ampla. A imunidade dos vereadores se limita a circunscrição do município (art. 29, VIII, CF). Doutrinária e jurisprudencialmente essa imunidade se amplia para além dos casos dentro do município. No exercício de sua função traz consigo a sua imunidade. 6.3.2. Imunidades diplomáticas e consulares: Estão previstas na convenção de Viena. Embaixadas e consulados estrangeiros no Brasil são territórios brasileiros. A Polícia Federal não entra lá, pois está relacionado à inviolabilidade territorial, para que não haja ofensa a outra jurisdição. - Funções desempenhadas pelos consoles: Tem sua atividade voltada a questões e interesses privados, por exemplo, a retirada do visto. - Funções desempenhadas pelos diplomatas: Suas atividades são voltadas estritamente a uma atividade política representativa. As imunidades são mais amplas, abrangendo tanto o diplomata quanto os familiares que com ele convivem. Abrangerá também todo o corpo diplomático, não se estendendo, todavia, a empregados. As imunidades consulares são mais restritas, abrangendo o cônsul e os demais funcionários do consulado, porém não se estendendo nem a funcionários/empregados particulares, nem a familiares. 6.3.3. Outras imunidades: Previstas no Código Penal. Art. 181: É isento de pena (imunidade material) nos crimes contra o patrimônio. Não pune o crime patrimonial contra cônjuges, ascendentes e descendentes. Art. 183: Não se aplica quando o crime é de roubo ou extorsão, ou quando há emprego de grave ameaça ou violência. Também não abarca estranho que participar do crime. Se o crime for contra pessoa com idade igual ou superior a 60 anos, não se aplica. Art. 182: Somente de procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo do cônjuge desquitado, de irmão (legítimo ou ilegítimo), de tio ou sobrinho. A imunidade não é absoluta. • OBS1: Direito de passagem inocente: A lei 8617/93 reconhece o direito de passagem inocente no mar territorial brasileiro a navios de toda nacionalidade. Significa dizer que se durante a passagem inocente ocorre um crime, este em princípio não será julgado pelo Brasil, a menos que seja considerado prejudicial à paz, boa ordem e segurança nacional. • OBS2: O crime de genocídio está definido na lei 2889/56. A diferença entre genocídio e a pluralidade de crimes contra a vida e/ou integridade física está na intenção do agente. No genocídio, a intenção é necessariamente destruir no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso. • OBS3: Aplica-se o princípio da bandeira nos casos dos crimes praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou privadas quando no estrangeiro, e lá não sejam julgados. 7. ESCOLAS PENAIS: 7.1. Introdução: O direito penal historicamente pode ser dividido em três fases: vingança divina (Idade Antiga e Média), vingança privada (homem contra homem) e vingança pública (institucionalização do poder punitivo). 7.2. Direito Penal comum: Cuida-se do direito penal dos Estados Absolutistas. Chama-se direito penal comum, porque marca efetivamente a ascensão do poder de punir por parte do Estado, assemelhando-se com isso ao modelo institucionalizado punitivo, ainda visto nos dias de hoje. Marca a superação da vingança privada. É marcado todavia, pela concessão de grande poder ao príncipe, que fazia uso do sistema punitivo para satisfação de seus interesses, caracterizando um sistema de controle pautado no arbítrio, na insegurança jurídica e no temor social. 7.3. Direito Penal humanitário: A doutrina normalmente se refere ao marco inicial como sendo a Revolução Francesa. Fala-se humanitário porque este período é marcado pela consagração das ideias de igualdade, liberdade e fraternidade, repercutindo na esfera penal para a elaboração do sistema de controle crescentemente pautado no abandono das penas corporais em prol da pena privativa de liberdade e limitação do jus puniendi à lei penal. Nesse período a consagração da legalidade é marcada em sua fase final, pelo movimento codificador. 7.4. Escola Clássica: Denominação criada por teóricos da Escola Positiva para quando se referiam ao estudo penal produzido antes do advento da Escola Positiva. Essa escola é marcada por uma abordagem, sobretudo teórica, com a formulação de conceitos básicos, definição de princípios, configurando uma abordagem metafísica. - Teóricos da Escola Clássica: * Marquês de Beccaria: Na obra “Dos delitos e das penas”, o autor desenvolve um estudo de proporcionalidade que funciona como fundamento para a consagração da privação de liberdade como forma de punir, muito embora se admitisse a aplicação de sanções corporais e aflitivas. Apesar de grande parte dos autores da época justificarem a aplicação da pena num ideal de retribuição, Beccaria fundamentava tal consequência jurídica no ideal de prevenção. * Bentham: Responsável pelos primeiros estudos de arquitetura prisional e por desenvolver o sistema panóptico. * Carrara:Sua principal contribuição foi a elaboração do conceito de crime. Para o autor, crime é “a infração da lei penal do Estado, promulgada para promover a segurança dos cidadãos, resultante de ato externo do homem, positivo ou negativo, moralmente imputável e politicamente danoso”. 7.5. Escola Positiva: Sua grande preocupação/contribuição foi atribuir o status científico ao estudo do direito, o que repercutiu n esfera penal para o desenvolvimento dos estudos de Lombroso. Preocupação prática. A pena tinha o intuito de prevenir futuros delitos. Substitui-se a ideia de culpabilidade (livre arbítrio), por periculosidade (determinismo). - Teóricos da Escola Positiva: * Enrico Ferri: Responsável por construir a ideia de criminoso, pautando-se no determinismo social. *Garofalo: Responsável pela sistematização dos estudos e experimentos realizados pela Escola Positiva. 7.6. Escola Moderna Alemã: Sintetiza contribuições das duas escolas anteriores. Utiliza o conceito de livre arbítrio e o de periculosidade para fundamentar o tratamento jurídico e a caracterização de imputáveis e inimputáveis. 8. CRIMES: TEORIA GERAL E CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA: 8.1. Crime x contravenção: Adotamos o conceito bipartido. Ambos são espécies do gênero infração penal. Não há diferença ontológica entre as espécies, o que difere é a pena: Infração Penal (gênero) CRIME = DELITO PENA: Reclusão ou detenção – Na reclusão, o início do regime pode ser fechado, semiaberto ou aberto; na detenção o início do regime pode ser semiaberto e aberto, com a previsão de regressão para regime fechado. CONTRAVENÇÃO (crime anão ou delito lilicutiano) PENA: Prisão simples – O início do regime pode ser semiaberto ou aberto, se previsão de regressão para regime fechado. 8.2. Conceito analítico – teorias: • Conceito legal: LICP – Crime é infração legal com pena de reclusão ou detenção. • Conceito material: Crime é ofensa a bem jurídico. • Conceito analítico: a) Teoria bipartida: crime é fato típico + ilicitude; b) Teoria tripartida: crime é fato típico + ilicitude + culpabilidade. CRIME: CONCEITO ANALÍTICO TRIPARTIDÁRIO FATO TÍPICO ILICITUDE OU ANTIJURIDICIDADE – Não estar em: CULPABILIDADE 1. Conduta 1. Estado de necessidade 1. Imputabilidade 2. Potencial consciência da ilicitude 3. Exigibilidade de conduta diversa 2. Resultado 3. Nexo de causalidade 4. Tipicidade 2. Legítima defesa 3. Estrito cumprimento de um dever legal 4. Exercício regular de um direito 8.3. Classificação doutrinária de crimes: 8.3.1. Crime formal x crime material: Diz respeito a espécie de resultados que se precisa produzir para que o crime seja considerado consumado. Crime formal: É aquele que para ser considerado consumado deve produzir resultado jurídico (atingimento à bem jurídico), que se verifica em um plano ideal/metafísico. Em tais espécies, o resultado naturalístico (se houver), será mero exaurimento. À luz da teoria do bem jurídico, entende- se modernamente que todo crime que se consuma, seja ele formal ou material, produz pelo menos resultado jurídico. Crime material: Consuma-se com a produção do resultado naturalístico descrito no tipo. 8.3.2. Crime instantâneo x crime permanente: Classificação que diz respeito ao momento consumativo do crime. Crime instantâneo : Consuma-se em um instante preciso. Crime permanente : Aquela cuja consumação se prolonga no tempo durando o tempo que durar a permanência. 8.3.3. Crime unissubjetivo x crime plurissubjetivo: Diz respeito à quantidade máxima de autores para a execução do delito. Crime unissubjetivo : Aquele passível de ser executado por uma só pessoa, portanto, o concurso de agentes (se houver) é meramente eventual. Crime plurissubjetivo : É um crime de concurso necessário, é impossível a prática dessas espécies delitivas por uma pessoa somente. 8.3.4. Crime plurissubsistente x crime unissubsistente: Diz respeito à existência do delito e a sua possibilidade ou não de fracionamento quanto ao curso causal: Crime plurissubsistente : A existência, em tese, pode ser fracionada, motivo pelo qual admitem tentativa, desistência voluntária ou arrependimento eficaz. Crime unissubsistente : São aqueles cuja execução na íntegra se perfaz em um único ato, de modo que, ou o crime não aconteceu, ou ele já se consumou, não admitindo, portanto, tentativa, desistência voluntária ou arrependimento eficaz (exemplo: injúria verbal). 8.3.5. Crimes comuns x crimes próprios: Diz respeito a qualidade do sujeito ativo. Crimes comuns : Podem ser praticados por qualquer pessoa. Crimes próprios : O sujeito ativo desse tipo de delito apresenta necessariamente uma qualidade pessoal descrita no próprio tipo. OBS: Os crimes próprios admitem tanto coautoria quanto participação de sujeito ativo comum, que responderá pelo crime próprio. Já os chamados crimes de mão própria não admitem coautoria, mas tão somente participação.
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