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Sistema Musculoesquelético: Estrutura, Função e Avaliação Margo N . Orlin, PT, PhD, PCS, e Linda Pax Lowes, PT, PhD, PCS Este capítulo tem como objetivo apresentar informação a respeito do sistema musculoesquelético na infância e adoles-cência, e relacionar essa informação aos transtornos pediá- tricos comumente observados pelo fisioterapeuta. O capítulo está rjvidido em três seções principais. A primeira seção contém infor- mação a respeito do desenvolvimento biomecânico, incluindo os rrlncípios de crescimento e des,en.voivimssrt.o durante a infância t adolescência. A segunda seção revisa a histologia e a anatomia r.os principais sistemas tissulares musculoesqueléticos — tecidos conjuntivo, ósseo e muscular — relacionados a distúrbios pediá- tricos específicos. A terceira seção discute um processo amplo de ivaliação musculoesquelética, incluindo os procedimentos especí- ícos e sua avaliação. ^Desenvolvimento Biomecânico Desenvolvimento biomecânico é definido como "os efeitos de forças io sistema musculoesquelético durante toda a vida" (LeVéau & Bernhardt, 1984, p. 1874). Compreender como o sistema musculoes- quelético se modifica e reage a forças internas e externas fornece uma orientação para avaliar dados da avaliação desse sistema e desenvolver : programa de tratamento. Esta seção destaca os princípios funda- mentais do crescimento musculoesquelético e discute as modificações que ocorrem a partir do nascimento por toda a infância. Princípios de Crescimento e Desenvolvimento Durante o desenvolvimento e, menos intensamente, ao longo da ••ida, tecido biológico é criado, modelado e remodelado por forças internas e externas. Os tecidos respondem não apenas a tipos dife- rentes de forças a que são expostos nos ambientes intra-uterino e extra-uterino, mas também à direção e à quantidade de força. A força é apenas um dos fatores que influenciam o tamanho do corpo; forma, herança genética, nutrição, medicamentos e hormô- nios influenciam a estrutura corporal. A estrutura e função básicas dos três tecidos fundamentais do sistema musculoesquelético — tecidos conjuntivo, ósseo e muscular — são discutidas à medida que afetam o desenvolvimento e a função da criança. Uma avaliação da sequência habitual de desenvolvimento e o impacto de influên- cias patológicas auxiliam o fisioterapeuta a identificar desvios do desenvolvimento normal e podem permitir a prevenção ou controle de comprometimentos e limitar a incapacidade. Nesta seção, prin- cípios do crescimento e desenvolvimento também serão aplicados aos tecidos fundamentais do sistema. Tecidos do Sistema Musculoesquelético Tecido Conjuntivo Existem dois tipos de tecido conjuntivo — tecido conjuntivo denso geral e cartilagem. Tecido conjuntivo denso geral pode ter organi- zação regular ou irregular. Tendões e ligamentos apresentam arranjos regulares de tecido conjuntivo denso geral, o que melhor permite resistir à tensão apenas na direção de suas fibras. Isso faz com que eles sejam resistentes ao alongamento da musculatura. O tecido conjun- tivo que envolve os ossos, músculos, coração e outras estruturas é irregular em organização e suporta tensão em diversas direções. Os tendões são compostos por feixes firmemente fixados de fibras de colágeno em paralelo. Se o tendão se enrola ao redor de um osso ou de outra superfície que produza atrito, a sinóvia (líquido sinovial) atua como lubrificante. A bainha sinovial é formada por 114 Sistema Musculoesquelético: Estrutura, Função e Avaliação um folheto interno que está aderido ao tendão e um folheto externo que se fixa à superfície que provoca o atrito do tendão. O líquido sinovial preenche o espaço entre os folhetos e permite que as super- fícies deslizem suavemente entre si. Os ligamentos são basicamente constituídos de feixes paralelos de fibras de colágeno firmemente fixados, mas que também apre- sentam alguma fibra elástica entre si. Essa construção fornece maior estabilidade de sustentação articular, enquanto apresenta certa flexi- bilidade para permitir o movimento articular apropriado. Tanto os tendões como os ligamentos podem cicatrizar após lesão ou cirurgia. A regeneração do tendão é mediada por fibroblastos no folheto interno da bainha ou do tecido conjuntivo frouxo ao redor. Os fibroblastos jovens se orientam ao longo do eixo de compri- mento do tendão e, então, colágeno é produzido. Uma complicação comum na regeneração do tendão é o desenvolvimento de aderên- cias fibrosas entre o tendão e os tecidos vizinhos. Essas aderên- cias impedem o retorno ao movimento normal. Trabalho suave na amplitude de movimento (ADM) pode evitar a formação de aderên- cias e apressar a recuperação (Mortensen, Skov, & Jensen, 1999). Cartilagem, o segundo tipo de tecido conjuntivo, é encontrada nos locais de articulação dos ossos e permite movimento suave, sem atrito. A cartilagem forma o molde pré-natal para o desen- volvimento dos ossos. A cartilagem é uma substância semelhante a um gel com finas fibras de colágeno distribuídas nesse gel para dar resistência à tensão. Ossos O osso é semelhante à cartilagem, embora apresente mais colágeno, seja fortemente mineralizado e recoberto por um tecido fibroso denominado periósteo. Essas diferenças tornam o osso mais rígido e menos flexível que a cartilagem. Células ósseas, ou osteócitos, são encontradas nas lacunas (pequenas cavidades) em todo o osso rígido. A forte mineralização impede a difusão de nutrientes a longa distância; assim, os osteócitos precisam permanecer próximos aos capilares sanguíneos. Canalículos são estreitos canais que inter- conectam as lacunas dos osteócitos com os nutrientes vindos dos capilares. A maior parte dos ossos se desenvolve a partir de um molde cartilaginoso formado por mesênquima no período embrionário. Mesênquima é a parte da camada mesodérmica do embrião encon- trada entre o ectoderma e o endoderma. Osso, cartilagem e músculo derivam do mesoderma. O crescimento ósseo ocorre por aposição ou deposição de material ósseo adicional sobre superfícies ósseas já existentes. Existem dois métodos de crescimento por aposição. A clavícula, a mandíbula e os ossos chatos da face e do crânio se desenvolvem diretamente sobre o mesênquima vascularizado através de um processo denominado ossificação intramembranosa. A ossi- ficação intramembranosa se inicia por volta do final do segundo mês de gestação. Os demais ossos se formam através de um processo denomi- nado ossificação endocondral, ou deposição de tecido ósseo sobre o molde de cartilagem. Um broto de membro, ou proeminência mesodérmica, desenvolve-se no embrião onde as extremidades irão formar-se. As células mesenquimais se condensam e determinam a forma do futuro osso e, então, iniciam o processo de ossificação, diferenciando-se em condroblastos que produzem a matriz de carti- lagem hialina. As células mesenquimais podem se diferenciar em condroblastos ou osteoblastos. A determinação do tipo de células depende da vascularização. A diferenciação das células mesenqui- mais em osteoblastos, ou células precursoras do osso, é dependente da disponibilidade de oxigénio. Assim, o osso é produzido apenas em áreas vascularizadas, enquanto a cartilagem pode ser produzida em áreas avasculares. Por volta do final do segundo mês de gestação, capilares periosteais invadem o molde de cartilagem próximo a seu centro, trazendo consigo células osteogênicas. Essa área inicia o processo de deposição da matriz óssea sobre a cartilagem do molde e é o centro primário de ossificação. A medida que a matriz óssea e depositada, a porção central do modelo inicia a reabsorção óssea e a cavidade medular se forma. A porção central, ou diáfise, ossifica-se antes das extremidades do osso, as epífises, que ainda permanecem cartilaginosas. A calcificação dos ossos faz com queo feto aumente de peso. Os recém-nascidos prematuros apresentam ossos signifi- cativamente menos calcificados (Walker, 1991). Os ossos longei desenvolvem, então, centros secundários de ossificação na regia: epifisária. Em sua maior parte, os centros secundários de ossificação se desenvolvem no período pós-natal. Os centros secundários da extremidade inferior do fémur e superior da tíbia estão presentes ac nascimento. Acompanhando o desenvolvimento dos centros secun- dários de ossificação, as epífises iniciam o processo de conversãc para osso, exceto a cartilagem, que permanece nas superfícies arti- culares do osso, e do disco de cartilagem hialina, que permanece no limite com a diáfise. Essas regiões de cartilagem, denominadas discos epifisários, permitem que o osso cresça em comprimento ate que a altura da idade adulta tenha sido alcançada. O crescimento pós-natal em comprimento dos ossos ocorre em ambos os lados do disco epifisário. Durante esse processo, capilares são formados e invadem os espaços deixados pelos condrócitos. Os capilares podem sofrer lesão enquanto estão em formação, e pequena quantidade de sangue extravasa para as lacunas. Se a criançi apresentar uma infecção bacteriana em outra parte do corpo, essa pode ser transmitida para o osso e causar osteomielite juvenil, que comumente se inicia na diáfise. A largura das epífises é maior do que a largura da diáfise. A regiãc estreita que conecta a região de epífise à região da diáfise é deno- minada metafi.se. A metáfise mantém sua forma levemente cônici. durante o processo de reabsorção. À medida que a diáfise se alonga o osso é reabsorvido na área de epífise para se ajustar ao diâmetro cu diáfise (Figura 4.1). A reabsorção também ocorre durante o processe de crescimento em largura. Sucessivas camadas de osteoblastos sãc depositadas na superfície externa da diáfise. Esse processo é acom- panhado por absorção de osso na superfície interna, de modo i permitir o alargamento da cavidade medular, o que evita que o oss: se torne muito espesso e pesado. Forças mecânicas influenciam k taxa de deposição e reabsorção óssea. No início do período pré- natal, a atuação das forças mecânicas sobre o feto é mínima porque o líquido amniótico mantém o feto suspenso dentro do útero, em um ambiente "sem peso". A medida que o feto cresce, a limitaçãc imposta pelo útero pode ter impacto sobre o desenvolvimento, especialmente quando existe discrepância de tamanho entre um útero pequeno e um bebé grande, ou se a postura do feto é atípica Aspectos anormais e deformidade em equinovaro (pé torto congé- nito) são exemplos de estrutura óssea atípica por causa de restriçãc uterina (Walker, 1991). Postura de nádegas (sentada) também aplki estresse atípico sobre o feto e está relacionada a alterações muscu- loesqueléticas, como o torcicolo congénito e displasia do quadri. Sistema Musculoesquelético: Estrutura, Função e Avaliação 115 Metáfise Epífise Cartilagem articular Artéria epifisária Artéria metafisária Osso compacto Artéria nutrida Periósteo Artéria periosteal Cavidade medular Osso esponjoso Linha epifisária Cartilagem articular *\q. 4.1 Esquema das partes de um osso. (Retirado de Pratt, N. [1991]. Clinicai -,::uloskeletalanatomylp. 6]. Philadelphia: J.B. Lippincott. Copyright 1991 3y the J.B. Lippincott Company. Reimpresso com permissão.) Davids, Wenger, & Mubarak, 1993). Movimento diminuído das irriculações também pode afetar o desenvolvimento do feto e atrasar i formação dos centros secundários de ossificação (Trueta, 1968). Isso pode resultar em ossos frágeis e malformados. Após o desenvolvimento inicial, a forma do osso pode ser modifi- cada por um processo denominado modelagem, que inclui formação r reabsorção ósseas. Esses dois fatores servem para aumentar a quan- tidade de tecido ósseo e determinar sua forma. A remodelagem é um processo que substitui osso imaturo e osso "velho" sem ganho efetivo, mas possivelmente com diminuição óssea. Esses processos de formação E reabsorção óssea são influenciados por inúmeros fatores, incluindo- se nutrição e hereditariedade. Um outro fator é expresso pela Lei de Wolff, primeiramente proposta nos anos de 1870, e sugeria que os ossos desenvolvem uma estrutura trabecular interna específica de acordo com as forças mecânicas que atuam sobre eles (Mullender & Huiskes, 1995). O tipo de carga e tensão (ou força por área de osso) em diferentes situações afeta o osso de diferentes maneiras. Uma carga longitudinal, em paralelo à direção de crescimento, resulta em compressão ou tensão. Ambos os tipos de carga, apli- cadas de modo intermitente com a força apropriada de sustentação ou alongamento, estimula o osso a crescer. Forças intermitentes de compressão parecem estimular mais o crescimento do que as forças de alongamento (LeVeau & Bernhardt, 1984; Nigg & Grimston, 1994). Estudos em animais também demonstram que a sustentação de carga é benéfica para a consolidação de fraturas (0'Sullivan, Bronk, Chao, & Kelly, 1994) e aumenta a densidade da rede trabe- cular de ossos osteopênicos quando associada a exercícios ativos (Bourrin, Palie, Genty, & Alexandre, 1995). Carga estática constante ou excessiva, porém, causa diminuição de material ósseo e, assim, pode ser danosa à integridade e resis- tência óssea (Lanyon & Rubin, 1984). Isso é demonstrado pelo Princípio de Hueter-Volkmann de regulação do crescimento osscc. O princípio propõe que as áreas epifisárias produzem crescimento aumentado, em resposta ao alongamento, e crescimento diminuído, em resposta à compressão excessiva (Zaleske, 1996). Os discos epifi- sários se alinham de forma perpendicular às forças que atuam sobre eles, e, no caso de fratura mal alinhada, esse será o mecanismo para a remodelagem (Grasco & de Pablos, 1997). Assim, se as forças aplicadas sobre os discos epifisários são distribuídas de modo desi- gual ou anormal ao longo da área epifisária, então o crescimento poderá ser desigual, aumentando ainda mais o mal alinhamento. Nas extremidades inferiores, isso pode resultar em genu valgum (joelho "para dentro") ou em genu varum (joelho "para fora"). Na coluna vertebral, tem sido demonstrado que esse mecanismo contribui para crescimento desequilibrado das vértebras na escoliose, uma curvatura lateral da coluna vertebral (Stokes, 1997). Crescimento assimétrico também pode ocorrer durante a consoli- dação de fraturas. Porém, o osso é capaz de retificar algum grau de mal alinhamento por meio de um processo denominado retificação. Esse mecanismo de remodelagem foi descrito inicialmente por Foster em 1964, e descreve o processo em que a força de deformação aplicada em um osso encurvado através de cargas repetitivas tende a mover tecido ósseo na direção da concavidade para reforçar o osso (Cusick, 1990; Nigg & Grimston, 1994). O osso é reabsorvido do lado convexo e depositado do lado côncavo. Esse processo é observado no fémur e na tíbia durante o desenvolvimento à medida que a criança perde gradativamente a postura inicial em genu valgum (Figura 4.2). Além de estimular o crescimento, as cargas mecânicas dinâmicas aumentam a densidade óssea e a remodelagem normal. Crianças que não participam de atividades físicas habitualmente podem sofrer osteopenia, ou diminuição da densidade óssea, que leva a ossos frágeis (Apkon, 2002; Bourrin et al., 1995; King, Levin, Schmidt, Oestreich, & Heubi, 2003). Frequentemente, crianças com doenças neuromusculares, como a paralisia cerebral (PC), não participam das atividades de seus pares sem doença (Van Den Berg-Emons, Van Baak, Speth, & Saris, 1998). A falta de sustentação de carga também é um fator de risco para mal alinhamento de quadril na PC (Bleck, 1987). Doenças inflamatórias crónicas, tais como a artrite reumatóide, podem levar à osteoporose(Cimaz, 2002). Estratégias de tratamento para manutenção e aumento da mineralização são discutidas no Capítulo 5. Alinhamento Os princípios de remodelagem do sistema musculoesquelético podem ser aplicados agora ao desenvolvimento do feto e da criança. Um recém-nascido tem a estrutura esquelética e alinhamento dife- rentes, especialmente de um adulto. O posicionamento intra-uterino por 40 semanas e a postura em "flexão fisiológica" afetam profun- damente o alinhamento do recém-nascido. Flexão fisiológica se refere à postura normal em contratura em flexão de quadril, joelho e cotovelo, ou "limitação fisiológica de movimento" observada nos recém-nascidos (Walker, 1991, p. 887). O termo contratura é utili- zado aqui não no sentido patológico, mas para descrever a postura em flexão normal desenvolvida até o final da gestação à medida que o feto cresce e fica "apertado" dentro do útero. Compare o bebé da Figura 4.3, que nasceu prematuro, com o bebé da Figura 4.4, que nasceu a termo. O prematuro que não completou o período de 40 semanas de gestação não desenvolveu a postura em flexão do ' 'z Z::e~5 :es^-e.é:ico: Estrutura, Função e Avaliação Lado convexo: atividade osteoclástica remove células ósseas Fig. 4.2 Esquema mostrando o processo de encurvamento da diáfise utilizando exemplo de um fémur em varo. nascido a termo. Observe que as extremidades superiores e inferiores do bebe da Figura 4.3 estão mais estendidas, com menor "limitação normal" do que o bebe a termo. O fisioterapeuta precisa sempre estar alerta para a grande varia- bilidade de parâmetros normais das A D M para as diferentes popu- lações. Valores médios de A D M variam em diferentes amostras de crianças e com a metodologia de mensuração. Compreender o desenvolvimento musculoesquelético é mais importante do que conhecer valores específicos de A D M por articulação. Valores de A D M por idade estão disponíveis (Staheli, 1992) para que o fisio- terapeuta avalie os achados do exame físico em relação a amostras normais quando precisar fazer um diagnóstico diferencial para a construção de um programa de tratamento. Coluna Vertebral A coluna vertebral do bebe é inicialmente cifótica, mas, à medida que o bebé começa a levantar a cabeça e apoiar-se sobre os ante- braços na posição em prono, a lordose cervical e lordose lombar começam a desenvolver. A lordose lombar é mais acentuada à Fig. 4.3 Bebé prematuro. Observe a postura em extensão. medida que o bebé assume a posição quadrúpede com a força da gravidade "puxando" para baixo, o abdome normalmente fraco (LeVeau & Bernhardt, 1984). Pelve Ao nascimento, o quadril do recém-nascido é instável. Tanto o acetá- bulo quanto o fémur contribuem para essa instabilidade. O acetá- bulo ainda é bastante cartilaginoso e raso (Walker, 1991), enquanto a cabeça do fémur é achatada, apresenta um ângulo femoral alto entre a diáfise e o colo, e está anterovertida. Apesar da instabilidade, a cabeça femoral permanece encaixada no acetábulo ao nascimento por causa da estrutura óssea, assim como pela tensão de superfície do líquido sinovial (Weinstein, 1996). O processo de modelagem é descrito no Capítulo 5. Quadril e Fémur Os recém-nascidos apresentam uma postura em flexão de cerca de 30° como resultado da postura intra-uterina (Cusick, 1990; Drews, Vraciu, & Pellino, 1984). A amplitude da postura em flexão rela- tada ao nascimento varia entre 50 e 120° por conta de variações Fig. 4.4 Bebé a termo. Sistema Musculoesquelético: Estrutura, Função e Avaliação 117 ze mensuração e do examinador (Hensinger & Jones, 1982). Em estudo com 86 bebes saudáveis, a contratura fisiológica diminuiu i í um valor médio de 10° (SD=2,6°) aos 9 meses para o valor de - ; aos 12 meses, 4 o (SD = 3,2°) aos 18 meses e 3 o (SD = 3,0°) aos 24 meses (Phelps, Smith, & Hallum, 1985). E interessante observar :ue os desvios padrão aumentam com a idade das crianças, suge- rindo que a variabilidade possa aumentar com a idade. Sutherland aí. (1987) relatam que durante a marcha, para as crianças de 1 ano de idade, faltam 8 o da extensão do quadril, com 1 ano e meio raltam aproximadamente 4 o e, por volta de 2 anos, o quadril alcança 0 o de flexão. A mudança na A D M do quadril ocorre à medida que a criança tenta adquirir e manter posturas antigravitárias. A medida que o músculo iliopsoas se alonga, a cápsula anterior do quadril também se alonga, permitindo deslizamento anterior da cabeça do fémur e, assim, o aumento da extensão (Bleck, 1987; Cusick, 1990). Atuação do maior músculo extensor do quadril, o glúteo máximo, durante atividades contra a ação da gravidade, também é essencial para a diminuição da contratura fisiológica em flexão do quadril no bebé. No plano frontal, o recém-nascido realiza ampla abdução do quadril, mais uma vez por conta da influência do posicionamento intra-uterino. A amplitude da abdução varia conforme o quadril for mantido em maior extensão (considerando-se a amplitude dispo- nível) ou flexão. Na postura em flexão, maior amplitude de abdução é possível. Valores médios da amplitude de abdução do quadril variam entre 69 e 76° (Drews et al., 1984; Haas, Epps, & Adams, 1973). A amplitude de abdução do quadril decresce até, em média, 60° na idade de 2 anos (Phelps et al., 1985) e continua a decrescer ao longo do tempo até os 45° característicos da vida adulta. Essa ampli- tude de abdução extrema do quadril diminui como consequência da aquisição de posturas elevadas, como a postura em quatro apoios, ajoelhar, ficar de pé e caminhar, e da necessidade de a extremidade inferior se manter na posição de sustentação de carga (Hensinger & Jones, 1982) com a pelve estável. No plano transverso, maior amplitude de rotação lateral do que medial está presente nos primeiros meses de vida. O valor médio relatado para a rotação lateral do quadril no recém-nascido está entre 89 (Haas et al., 1973) e 114° (Drews et al., 1984). O valor médio de rotação medial relatado está entre 62 (Haas et al., 1973) e 80° (Drews et al., 1984). A maior amplitude de rotação lateral do quadril é mais evidente na posição de pé, quando uma criança fica de pé com os dedos hálux apontando para fora. Durante os 2 primeiros anos de vida, a rotação lateral decresce até o valor médio de 47°, e a rotação medial aumenta até um valor médio de 52° (Drews et al., 1984). A diminuição da rotação lateral é atribuída ao aumento da extensão do quadril. À medida que a articulação do quadril se alonga em extensão, a força em rotação lateral diminui (Phelps et al., 1985). O mecanismo para a diminuição da rotação lateral é o mesmo que da abdução. A medida que a criança fica de pé, a diminuição da rotação lateral permite que o trocanter maior assuma posição mais lateral, de modo que a abdução atue de forma mais eficiente para estabilizar a pelve na posição de pé (Pitkow, 1975). Ao nascimento, o fémur apresenta uma postura de coxa valga, definida por um ângulo de inclinação aumentado ou ângulo colo- diáfise. O ângulo de inclinação é o ângulo formado pelo eixo longo do fémur e o eixo que cruza a cabeça e o colo do fémur (Figura 4.5). O valor característico do neonato varia entre 135 e 145° (McCrea, Ângulo de inclinação Fig. 4.5 Ângulo femoral de inclinação. 1985), e decresce durante a adolescência até um valor entre 125 e 135° no adulto (Staheli, 1992). O ângulo decresce como resultado das forças de tensão e compressão que atuam sobre a epífise proximal do fémur durante a sustentação de carga e tração muscular normais (LeVeau & Bernhardt, 1984). Para se compreender a postura do fémur, os termos versão e torção precisam ser discutidos. Torção se refere ao grau normal de rotação presente em um osso longo (Figura 4.6). A torção femoral é o ângulo formado pelo eixo do colo do fémur e o eixo da diáfisedo fémur. A maneira mais fácil de visualizar esse ângulo é acompanhar o eixo maior do fémur. Alinhe a superfície posterior dos côndilos do fémur com uma superfície plana, como o tampo da mesa. Olhe, então, na direção da cabeça do fémur e você irá perceber que a cabeça e o ângulo do fémur se afastam aproximadamente 15° do tampo da mesa. Esse é o ângulo de torção. Antetorção ocorre quando a cabeça e o colo do fémur estão rodados para diante, no plano sagital em relação aos côndilos do fémur. Se a cabeça e o colo estão rodados posteriormente, diz- se que o fémur apresenta retrotorção. O fémur apresenta ante- torção máxima entre 30 e 40°, aproximadamente, ao nascimento (McCrea, 1985; Phelps etal., 1985; Rang, 1993c; Staheli, 1992). Esse ângulo decresce a partir do nascimento até a adolescência. A retificação evolui rapidamente durante o primeiro ano de vida, mais lentamente entre o primeiro e oitavo ano de vida, e rapidamente, mais uma vez, durante a adolescência até alcançar o valor médio do adulto, de 16° entre 14 e 16 anos (Staheli, 1992). Pode-se dizer que o fémur "desenrola" pelo processo de crescimento, pela tração muscular, redução do ângulo de coxa valga e redução da contratura fisiológica do quadril em flexão (Bleck, 1987). : l s:e~"= '. r,es::..eiético: Estrutura, Função e Avaliação A) Torção Normal B) "Versão" Normal í E) Torção Normal em Adultos G) Antetorção & Anteversão "DENTRO" "FORA" Retroversão & Retrotorção Fig. 4.6 Esquema demonstrando versão femoral. F) Ao Nascimento antetorção: 30° anteversão: 60° rotação lateral: 30° A antetorção femoral pode levar à postura de dedos para dentro. A postura de dedos para dentro não é observada no bebé quando colocado de pé, com apoio, porque a rotação lateral excessiva do quadril e a anteversão compensam a rotação medial da diáfise do fémur, e o resultado é uma aparente postura de dedos para fora. Se antetorção normal não se reduz com o desenvolvimento, a criança pode apresentar um padrão de marcha com os dedos voltados para fora, quando a redução da rotação lateral ocorrer normalmente pela idade. A maioria das crianças com postura de dedos para dentro, causada pela "persistência da antetorção fetal", na ausência de outros processos patológicos, melhora à medida que o quadril se alinha espontaneamente (Rang, 1993c; Staheli, 1992). Em menos de 1% dessas crianças, a antetorção não resolve e a criança precisa de trata- mento (Staheli, 1992). Nas crianças com PC, porém, a persistência da antetorção fetal é um fator desencadeante de instabilidade de quadril. Isso será discutido adiante neste capítulo. Ao invés da persistência da antetorção fetal, na qual inicial- mente as crianças apresentam grau de antetorção normal, que não se reduz com o passar do tempo, alguns bebés apresentam excessiva antetorção femoral fetal. Em um grande estudo de coorte, essas crianças mantiveram esse ângulo aumentado de torção femoral por toda a maturação do esqueleto. Porém, a postura de dedos para fora, que acompanha a antetorção excessiva, desapareceu com o passar do tempo em 50% das crianças. Isso é atribuído ao desen- volvimento compensatório de torção tibial lateral (rotação lateral e diáfise da tíbia) mais do que um decréscimo da torção femoral (Fabry, MacEwen, & Shands, 1973). A rotação tibial compensa- tória tende a levar o pé para postura de dedos para fora mesmo que o fémur mantenha a antetorção excessiva. A versão femoral se refere à postura da cabeça do fémur no acetábulo em relação à pelve posterior (plano frontal). A anteversão posiciona a cabeça do fémur em situação anterior dentro do acetá- bulo e resulta em uma postura de rotação lateral da coxa. De modo inverso, a retroversão posiciona a cabeça do fémur posteriormente dentro do acetábulo e resulta em rotação medial da coxa. Ao nasci- mento, o neonato apresenta 60° de anteversão. Na vida adulta, essa se reduz para 12°. Ao nascimento, a anteversão (60°) é maior do que a antetorção (30°), o que resulta em uma rotação lateral do
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