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BRACHT, Valter. Educação física e aprendizagem social

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Prévia do material em texto

O AUTOR
Valter Bracht nasceu em To­
ledo (PR).
Realizou seu curso de gra­
duação em Educação Física na Uni­
versidade Federal do Paraná.
Na mesma Universidade con­
cluiu o curso de Especialização em 
Treinamento Desportivo.
Ingressou na Universidade 
Estadual de Maringá, onde atua ain­
da hoje como docente da disciplina 
de Fundamentos da Educação Físi­
ca, no curso de Graduação em Edu­
cação Física.
Obteve o grau de mestre em 
Educação Física na Universidade 
Federal de Santa Maria (RS).
EDUCAÇÃO FÍSICA 
E
APRENDIZAGEM SOCIAL
EDITORA MAGISTER LTDA 
1997
VALTER BRACHT
COORDENAÇÃO: JOSÉ PEREIRA RODRIGUES
REVISÃO DE TEXTOS: IARA HAUBERT RODRIGUES
COMPOSIÇÃO E DIAGRAM AÇÃO: LEANDRO AUGUSTO DOS S. LIMA
©VALTER BRACHT
TODOS OS DIREITOS DESTA OBRA ESTÃO RESERVADOS À 
LIVRARIA E EDITORA MAGISTER LTDA
IMPRESSO EM OUTUBRO DE 1997
VALTER BRACHT
EDUCAÇÃO FÍSICA 
E 
APRENDIZAGEM SOCIAL
2ª EDIÇÃO
LIVRARIA E EDITORA MAGISTER LTDA 
PORTO ALEGRE 
1997
Dados de Catalogação na Publicação: 
Nilvea Schapke - CRB 10/784
ISBN 85-85275-05-7
LIVRARIA E EDITORA MAGISTER LTDA. 
AV. WENCESLAU ESCOBAR, 2667/204 
FONE (051) 249-5054 
PORTO ALEGRE - RS - BRASIL 
EDITOR 
JOSÉ PEREIRA RODRIGUES
SUMÁRIO
Carta-Prefácio......................................................................................................... 9
Prefácio à 2a edição.............................................................................................. 10
Introdução............................................................................................................ 11
PARTEI
Em torno da Autonomia e da Legitimidade da Educação Física.........................13
Capítulo I
1. Educação Física: a busca da autonomia pedagógica.......................................15
1.1 Introdução.................................................................................... ................. 15
1.2 Instrumento teórico da análise.......................................................................18
1.3 Educação Física - Instituição Militar - Instituição Esporte...........................19
1.4 A busca de um referencial teórico.................................................................24
Capítulo II
2. Educação Física: a busca da legitimação pedagógica..................................... 33
2.1 Introdução...................................................................................................... 33
2.2 Excurso acerca da pergunta “o que é Educação Física?”...........................34
2.3 Crise e legitimação........................................................................................ 36
2.4 Os modelos de legitimação da Educação Física............................................36
2.5 A produção do conhecimento na e para a Educação Física.......................... 37
2.6 A crítica e a superação dos modelos de legitimação vigentes...................... 42
PARTE II
Aprendizagem social na Educação Física............................................................ 55
Capítulo III
3. A criança que pratica esportes respeita as regras do jogo... capitalista ......... 57
3.1 Introdução...................................................................................................... 57
3.2 O Conteúdo sócio-educativo do esporte........................................................58
3.3 Princípios de uma pedagogia crítica para a Educação Física........................65
Capítulo IV
4. A Educação Física Escolar como Campo de Vivência Social.........................71
4.1 Introdução............................................................................................... ...... 71
4.2 A socialização através do jogo e do esporte .................................................74
4.3 A aprendizagem social no ensino dos esportes nas escolas.......................... 77
4.4 O fenômeno do jogo na sua relação com o esporte.......................................81
4.5 A metodologia do ensino do basquetebol......................................................82
4.6 Objetivos do estudo..................... ..................................................................83
4.7 Materiais e métodos....................................................................................... 84
4.7.1 Instrumentos de medida..............................................................................84
4.7.1.1 Sistema de registro de comportamentos de interação social.................. 85
4.7.1.2 Questionário............................................................................................ 87
4.7.2..Coleta de dados...........................................................................................87
4.7.3 Metodologia Funcional-Integrativa (MFI).................................................88
4.7.4 Metodologia Tradicional (MT).................................................................. 92
4.8 Resultados e Discussão..................................................................................92
4.9 Discussão dos resultados............................................................................. 100
4.10 Conclusão................................................... ............................................... 106
Bibliografia..........................................................................................................111
O AUTOR
Valter Bracht nasceu em Toledo (PR) no ano de 1957. Realizou seu 
curso de graduação em Educação Física na Universidade Federal do Para­
ná, concluindo o curso no ano de 1980. Na mesma Universidade concluiu, 
no ano seguinte, 1981, o curso de Especialização em Treinamento Despor­
tivo. Neste mesmo ano, ingressou na Universidade Estadual de Maringá, 
onde atua, ainda hoje, como docente da disciplina de Fundamentos da Edu­
cação Física, no curso de Graduação em Educação Física. Em 1983, obteve 
o grau de mestre em Educação Física na Universidade Federal de Santa 
Maria (RS). Em 1984, obteve o primeiro lugar no Prêmio MEC de Literatura 
Desportiva na modalidade de Estudos Pedagógicos. Em 1990, doutorou-se 
pela Universidade de Oldenburg (R.F.A). Publicou, como co-autor, o livro: 
Autores Coletivos, Metodologia do Ensino da Educação Física (Coleção 
Magistério), editado pela Cortez Editora em 1992. Atualmente é Presidente 
do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte, e desenvolve estudos nas 
áreas da Pedagogia da Educação Física e Sociologia do Esporte.
PREFÁCIO À 2a EDIÇÃO
Dirijimo-nos aos leitores por ocasião desta 2a edição do "Educação 
Física e Aprendizagem Social”, para agradecer a boa acolhida que este livro 
vem tendo junto aos colegas da área.
Decorridos quase cinco anos desde sua 1a edição, cabe ressaltar o 
fato do livro ter sido editado, em 1996, também em língua espanhola no país 
vizinho, a Argentina (Editorial Vellez Sarsfield). É importante frisar, tam­
bém, que decidimos manter a versão original por entendermos que as ques­
tões aqui discutidas não foram esgotadas, ou seja, continuam a oferecer ele­
mentos importantes para a discussão pedagógica da Educação Física.
Foi e continua sendo nossa expectativa, a de contribuir para o debate 
em torno de uma teoria da Educação Física, que encare esta como uma prá­
tica pedagógica; reitero o convite aos colegas para participar deste projeto.
Vitória (ES), julho/l997 
Valter Bracht
CARTA-PREFÁCIO
Companheiro Valter,
Tudo bem? Acabo de fazer um levantamento, em nível nacional, bus­
cando os textos que mais repercutiram - nos anos 80 - entre estudantes e 
professores de Educação Física. O resultado revelou uma antiga desconfi­
ança. Você é um dos articulistas mais lidos em nossa área. A profundidade e 
o rigor científico, bem como o seu poder de comunicação escrita encarrega­
ram-se de colocá-lo nessa invejável posição.
Conhecemo-nos em 1984, por ocasião da II Semana de EducaçãoFísica promovida pela UEM. Desde então, tenho acompanhado com muito 
carinho a sua carreira e a sua militância. Tenho certeza de que o sucesso 
deveu-se ao fato de você não desarticular Educação Física e Sociedade. E 
mais. Pensar, não qualquer Educação Física em uma sociedade qualquer. 
Pensar, sim, esta Educação Física nesta sociedade.
Nesta sociedade onde 45% de todos bens produzidos coletivamente 
estão nas mãos de 1% de proprietários. Onde as empresas multinacionais 
detêm quase o dobro das terras dos nossos lavradores. Só faltava, mesmo, 
ganhar uma medalha na competição da miséria. Não falta mais. Somos me­
dalha de bronze, de acordo com o Banco Mundial. Será que a Educação 
Física não tem nada a ver com isso? Amigo Valter, você bem sabe que omis­
são identifica-se com cumplicidade. Você não se omite e daí a sua importância.
Apesar e por causa disso tudo, fica uma lacuna. A publicação - em 
forma de livro - dos artigos que melhor representem o seu pensamento. 
Aguardamos.
Rio de Janeiro, 19 de fevereiro de 1992.
Do seu amigo e admirador,
*Vitor
P.S. Sucesso na presidência do CBCE.
*PROF.: Vitor Marinho de Oliveira
INTRODUÇÃO
Este livro compõe-se de uma série de artigos e ensaios, três deles já 
publicados anteriormente em periódicos da área, e um ainda inédito. A de­
cisão de publicá-los agora na forma de livro, adveio da constatação de que, 
no âmbito da Educação Física, os periódicos ainda não têm a mesma pene­
tração dos livros, levando-nos a crer que grande parte da comunidade da 
Educação Física ainda não teve acesso a este conteúdo. Por outro lado, o 
incentivo do Prof. Vitor Marinho de Oliveira representou o empurrão final 
para que levássemos à frente a idéia.
O título “Educação Física e Aprendizagem Social”, num primeiro 
momento, pode parecer estar apenas relacionado com o conteúdo da segun­
da parte, mas, na verdade, contém uma categoria que é característica para 
uma corrente que surge na Educação Física brasileira no início da década de 
80. Esta corrente, influenciada pela discussão que era levada a efeito no 
âmbito mais geral da pedagogia no Brasil, começa a refletir o papel social 
da Educação Física, contextualizando-a no sistema educacional, e este, na 
sociedade capitalista brasileira, operando estas análises com um referencial 
teórico de orientação marxista.
Assim, o conteúdo deste livro reflete também diferentes momentos 
desse movimento, e diferentes momentos do próprio autor. Contém tanto 
um ensaio que possui um forte caráter de denúncia (Cap, 3 - "A criança que 
pratica esportes respeita as regras do jogo ... capitalista"), como um ensaio 
onde já a auto-crítica tem seu espaço (Cap. 2 “Educação Física: a busca da 
legitimação pedagógica”). Embora algumas das posições defendidas na época 
em algum destes artigos precisassem hoje ser relativadas, e outras tivessem 
sido superadas pelo autor, decidiu-se pela publicação sem alterações 
significativas, de vez que, na essência, as posições permaneçam inalte­
radas.
A segunda parte, que cronologicamente antecede a primeira, contém 
dois artigos onde a questão central é o tipo de aprendizagem social propici­
ada pelas aulas de Educação Física. Em “A criança que pratica esportes 
respeita as regras do jogo ... capitalista”, procuramos analisar que repercus­
são política teria o tipo de aprendizagem social típica das aulas de Educação
Física, e, no capítulo seguinte - “Educação Física escolar como campo de 
vivência social” procuramos ir além, buscando desenvolver uma alterna­
tiva metodológica que levasse a um tipo de aprendizagem social que se 
colocasse na perspectiva de uma educação transformadora.
A primeira parte contém dois artigos, cuja preocupação central é o 
desenvolvimento de elementos de uma teoria pedagógica de Educação Físi­
ca articulada discursivamente com uma teoria crítica da educação. No capí­
tulo um, analisamos até que ponto podemos falar da Educação Física en­
quanto prática pedagógica que desfrute de autonomia, ou seja, que se paute 
por princípios e códigos próprios e não de sistemas, afora a escola, com os 
quais se relaciona, como por exemplo, o sistema esportivo. No capítulo dois, 
levamos a efeito reflexões iniciais em tomo da razão de ser da Educação 
Física, ou seja, da questão da legitimidade da Educação Física no currículo 
escolar.
Esperamos, com a publicação deste livro, propiciar o acesso de seu 
conteúdo a um número maior de colegas, e contribuir para incrementar o 
debate em torno desta prática pedagógica que é a Educação Física.
Maringá, 12 de janeiro de 1992.
Valter Bracht
PARTE I
EM TORNO DA AUTONOMIA E DA 
LEGITIMIDADE DA EDUCAÇÃO FÍSICA
L
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 15
CAPÍTULO I
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica
1.1 Introdução
Parece-me necessário, antes de mais nada, realizar um esforço no 
sentido de estabelecer uma certa clareza terminológica quanto à expressão 
Educação Física. Este termo tem sido utilizado no Brasil, concomitante- 
mente, num sentido restrito e num sentido amplo, o que tem gerado um 
verdadeiro caos conceituai, que dificulta a comunicação científica e a refle­
xão teórica.
No seu sentido “restrito”, o termo Educação Física (1) abrange as 
atividades pedagógicas, tendo como tema o movimento corporal e que toma 
lugar na instituição educacional. No seu sentido “amplo” tem sido utilizado 
para designar, inadequadamente a meu ver, todas as manifestações culturais 
ligadas à ludomotricidade humana, que, no seu conjunto, parecem-me me­
lhor abarcadas por termos como cultura corporal ou cultura de movimento 
(2).
1 Segundo Marinho, I.P. (1984, p. 217), é a J. Locke (1632-1704) que devemos a 
utilização/sedimentação do termo Educação Física. No entanto, o autor mesmo, 
em obras anteriores não opera a diferenciação dos sentidos amplo e restrito.
2 Poderia aqui ser contra-argumentado que o termo Educação Física é tão adequa­
do quanto o de cultura corporal para designar o conjunto das atividades corporais 
de movimento. O inconveniente, a meu ver, é que teríamos que substituir o termo 
Educação Física no seu sentido restrito, já que me parece urgente eliminar a am­
bigüidade. Por outro lado, não gostaria de adentrar aqui na questão da im­
propriedade do próprio termo Educação Física, que seria, na opinião de Sérgio 
(1986, p. 24), com vantagens substituído por Educação Motora, devido ao maior 
peso e densidade ontológica deste.
16 Educação Física e Aprendizagem Social
Em parte, a confusão se deve ao fato do profissional denominado 
Professor de Educação Física ou Licenciado em Educação Física (3), re­
querer para si o direito de atuação profissional com todas as atividades cor­
porais de movimento - da Educação Física, passando pelo esporte, pela 
dança, até a ginástica de academia. Essas atividades estavam desde logo 
presentes nos currículos de formação de professores de Educação Física no 
Brasil, donde a célebre afirmação de que o esporte, a dança, os jogos a 
ginástica, etc., são os meios da Educação Física - até aí nada de mais, - 
derivando-se daí a falsa conclusão de que o termo Educação Física seria 
mais “abrangente” do que os de Esporte, Ginástica (recreação [4]), etc., 
porque os compreendia. Neste escrito, portanto, a expressão Educação Físi­
ca será utilizada no seu sentido restrito, definido acima.
O tema Educação Física, como mencionado anteriormente, é o movi­
mento corporal — é o que confere especificidade à Educação Física no inte­
rior da Escola. Mas o movimento corporal ou movimento humano que é seu 
tema, não é qualquer movimento, não é todo movimento. É o movimento 
humano com determinado significado/sentido, que por sua vez, lhe é confe­
rido pelo contexto histórico-cultural. O movimento que é tema da Educação 
Física é o que se apresenta na forma de jogos, de exercícios ginásticos, de 
esporte, de dança, etc.Esses movimentos não são propriedade exclusiva 
desta área ou desta prática pedagógica, muito pelo contrário, a Educação 
Física apoderou-se em maior ou menor grau (ou foi ela que foi instrumenta­
lizada?) dessas atividades corporais, pedagogizando-as (ou pretendendo pe- 
dagogizá-las). Estas atividades, como disse, possuem um determinado có-
3 É interessante notar que, em 1939, foi criada, integrando a Universidade do Bra­
sil, a Escola Nacional de Educação Física e Desportos, cujos egressos recebiam, 
no entanto, o título de Professor de Educação Física (Marinho, 1984, p. 220).
4 O entendimento da recreação como uma forma específica de atividade que pu­
desse figurar ao lado da ginástica, do esporte, etc., foi apenas recentemente des- 
mistificado por RL. Moro, num artigo recomendável: Redimensionando a Recre- 
acão em Educação Física. In: Comunidade Esportiva, nov./dez. 1986, n. 40. p. 2- 
7.
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 17
digo que denuncia seu condicionamento histórico, expressam/comunicam 
um sentido, incorporam-se a um contexto que lhes confere sentido (5).
Por exemplo, os movimentos na forma de exercícios ginásticos, de 
corridas, etc., que incorporam os programas de preparação militar no inte­
rior desta instituição, expressam e possuem um sentido, um determinado 
código que só pode ser apreendido, se considerados o sentido e os códigos 
que vigoram na própria instituição militar como um todo. Isto é, o movi­
mento corporal, na forma de ginástica, foi aí instrumentalizado.
Se analisarmos, através da literatura específica, a forma cultural do 
movimento corporal que tem sido objeto da Educação Física no Brasil, ve­
remos que inicialmente (pelo menos até a década de 40 deste século), havia 
o predomínio do exercício ginástico - principalmente o de orientação mili­
tarista - que, a partir de então, cede lugar progressivamente ao movimento 
na forma cultural de esporte. É lógico que outras expressões da cultura corpo­
ral ou de movimento, estiveram/estão presentes ou são tematizados na Educa­
ção Física, como a dança, jogos e brincadeiras populares. Parece-me, no entan­
to, que essas expressões constituem minoria, e que podemos falar da ginástica 
e posteriormente de esporte, como as atividades, nos respectivos momentos 
históricos, que se apresentam como hegemônicos na Educação Física.
Por outro lado, a Educação Física, em se realizando na instituição 
educacional, presume-se, assume o estatuto de atividade pedagógica e como 
tal, incorpora-se aos códigos e funções da própria escola. Assim sendo, pa­
rece-me que a Educação Física, no Brasil, vai desenvolver sua identidade 
(?), seus códigos, a partir da relação que estabeleceu/estabelece com um 
meio ambiente que compreende, fundamentalmente, a instituição escola, a 
instituição militar e a instituição esporte. E é neste conjunto de relações que 
buscaremos, inicialmente, as bases para a discussão de dois pontos que nor­
tearão nossas reflexões daqui por diante:
a) O grau de autonomia pedagógica (identidade da Educação Física) 
alcançada na sua relação com as instituições referidas acima;
5 Não existe um salto em distância que seja em si capitalista e um que seja em si 
socialista. Somente sua contextualização permitirá identificar possíveis sentidos 
significados diferentes nesta ação.
18 Educação Física e Aprendizagem Social
b) As bases de legitimação como integrantes do sistema formal de ensi­
no - o que compreende a questão dos objetivos-conteúdos da disciplina.
1.2 Instrumento teórico de análise
Antes de adentrar a análise propriamente dita, gostaria de, antecipa­
damente, explicitar alguns elementos teóricos que utilizarei na análise.
Um destes elementos é a teoria da diferenciação dos sistemas soci­
ais, como ela tem sido desenvolvida pela moderna teoria dos sistemas na 
sociologia (6). Os sistemas sociais, em função de sua especialização funci­
onal, desenvolvem uma lógica própria que se objetiva na forma de valores, 
normas, códigos e semânticas. Um exemplo típico é o apresentado por K. 
Marx em relação à lógica própria desenvolvida pelo sistema econômico do 
capitalismo (7). Isto não significa que um sistema social que se diferenciou 
de um meio-ambiente, que desenvolvou uma lógica própria, não mantenha 
mais relações com este meio-ambiente. Pelo contrário, autonomia não sig­
nifica, neste caso, isolamento ou autarquia: “A autonomia pressupõe uma 
determinada interdependência, e expressa o grau de liberdade com a qual as 
relações entre o sistema e o meio-ambiente podem, através dos critérios seleti­
vos do sistema, ser por ele próprio reguladas” (LUHMANN, 1970, p. 157).
Na teoria dos sistemas, parte-se do princípio da unidade da diferença 
entre o sistema e o meio-ambiente (CACHAY, 1986). Assim, a identidade 
de um sistema desenvolve-se em íntima relação com o seu meio-ambiente.
Se nos distanciarmos agora da teoria dos sistemas (funcional-estru- 
turalismo) ou a complementarmos com categorias do materialismo históri­
co, poderíamos dizer que os sistemas sociais não podem ser simplesmente 
colocados lado a lado, e sim, para superar o caráter meramente descritivo da 
análise, precisamos, através da análise histórica, identificar a gênese dos 
sistemas, as suas determinações, ou seja, através da categoria antropológica
6 Um dos mais importanies defensores desta teoria é o sociólogo alemão Niklas 
LUHMANN (1970). Para uma crítica a Luhmann ver HABERMAS (1983).
7 A respeito ver SCHIMANK (1987).
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 19
do trabalho, introduzir a questão do poder nas relações inter-sistemas. Isso 
significa perguntar, por exemplo, em que medida um sistema não tem sua 
identidade ou o sentido norteador das ações, determinadas por outros siste­
mas (que constituem o seu meio-ambiente) mais “poderosos”? “É preciso 
analisar o desenvolmento em função de sua posição na hierarquia global” 
(BRUHL, 1987, p. 35).
Um dos critérios que identificam a diferenciação de um sistema diz 
respeito à diferenciação dos papéis (8). Isso é, em que medida os diferentes 
papéis que precisam ser cumpridos no interior de um sistema, não se con­
fundem com outros de outros sistemas. Os papéis podem ser analisados a 
partir de diferentes características como: suas funções, qualificação neces­
sária, o processo de socialização para o desempenho do papel, habilidades 
técnicas que envolvem o papel, etc.
É a partir deste instrumental que pretendemos, a seguir, discutir a 
questão do grau de autonomia pedagógica da Educação Física, o problema 
de sua identidade (9).
1.3 Educação Física - Instituição Militar - Instituição Esporte
A instituição educacional é produto de um processo de complexifi- 
cação da sociedade - produzido fundamentalmente pelo desenvolvimento 
das forças produtivas - que determinou uma diferenciação de sistemas, os 
quais cumprem, no conjunto das relações sociais, determinadas funções: a 
transmissão do saber social acumulado exigiu o surgimento de uma institui­
ção para cumprir tal tarefa - o sistema educacional.
A Educação Física nasce praticamente junto com a Escola, com os 
sistemas nacionais de ensino, típicos da sociedade burguesa emergente dos
8 “Papéis são conjuntos ou padrões de expectativa de comportamentos (compor­
tamentos esperados)” (JOAS, 1978).
9 É importante frisar que a questão que perseguimos é menos a de se a Educação 
Física constitui um sistema diferenciado no sentido da teoria dos sistemas, e sim, 
que grau de autonomia pedagógica ela alcançou, as perspectivas de desenvolvi­
mento de tal autonomia, bem como as influências que sofre na formação de sim 
identidade.
20 Educação Física e Aprendizagem Social
séculos XVIII e XIX. Foram inicialmente os Filantropos como Guths Mu- 
ths (1759-1839) e Pestalozzi (1746-1827), que buscaram introduzir as ati­
vidades corporais no currículo escolar. Noentanto, a influência destes pe­
dagogos na Educação Física brasileira é claramente superada pelos chama­
dos métodos ginásticos, como o desenvolvido por P.H. Ling na Suécia, ou o 
Regulamento Geral da Educação Física conhecido no Brasil como método 
francês. Uma outra característica marcante da Educação Física brasileira 
tem sido a influência da instituição militar em seu desenvolvimento. Assim, 
os métodos inicialmente adotados foram, via-de-regra, os adotados pela ins­
tituição militar, como foi o caso do já citado método francês (10).
Mas não somente os métodos ginásticos de inspiração militar foram, 
principalmente nas quatro primeiras décadas de nosso século, levadas à es­
cola, como também os próprios instrutores ou “aplicadores” dos métodos. 
Ora, a preparação militar inclui historicamente a exercitação corporal com 
o objetivo do desenvolvimento da aptidão física e do que se convencionou 
chamar de “formação do caráter” - auto-disciplina, hábitos higiênicos, ca­
pacidade de suportar a dor, coragem, respeito à hierarquia.
O importante a ressaltar é que a instituição escola, neste caso, é mais 
ou menos palco de uma ação “pedagógica“ que se legitimava a partir de sua 
presumível contribuição para a saúde, ou seja, com função higiênica (inici­
almente com um conceito anatômico e posteriormente anátomo-fisiológico), 
e formação do caráter, e o seu conteúdo baseado fundamentalmente na exer­
citação corporal através de exercícios analíticos, corridas, saltos, etc. Isto é, 
assume, através do conteúdo e da forma como ele é apresentado, através das 
características dos papéis desempenhados pelos instrutores e alunos, os có­
digos/símbolos/linguagem/sentido da instituição militar. O que aliás, em li­
nhas gerais, não estava em dissonância com o projeto da ditadura do Estado 
Novo (ver ALMEIDA CABRAL, 1987), e portanto, com o papel atribuído 
à Escola naquele período da história do Brasil.
Analisemos ainda um pouco as características dos papéis dos dois 
principais sujeitos envolvidos nesta atividade: o instrutor e o aluno. As fun­
ções atribuídas ao instrutor eram as de apresentar os exercícios, dirigir, a 
manter a ordem e a disciplina. Ao aluno competia repetir e cumprir a tarefa
10 Ver a respeito MARINHO (1980).
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 21
atribuída pelo instrutor. A socialização do instrutor, ou seja, o processo pelo 
qual o sujeito assumia o papel de instrutor de ginástica consistia, fundamen­
talmente, num treinamento no interior da instituição militar ou numa Escola 
de Educação Física militar.
Poderíamos ainda analisar, por exemplo, a característica do fenotipo 
típico para o instrutor de ginástica, as habilidades técnicas necessárias, a 
relação entre instrutor e aluno. Parece-me no entanto claro que, a nível da 
caracterização dos papéis, fica explícita a transferência mecânica dos códi­
gos da formação física militar para a Educação Física.
A pergunta é se neste quadro acabou sendo desenvolvido algo como 
uma ação teórico-prática que propiciasse a recepção crítica da influência 
militar, do papel atribuído à escola e à Educação Física pelos interesses 
dominantes. Tudo indica que não, ou seja, a Educação Física não desenvol­
veu a este tempo, um corpo de conhecimentos que a diferenciasse funda­
mentalmente da instrução física militar. A Educação Física não é ela mes­
ma; em maior ou menor grau ela é a instrução física militar. A sua identida­
de e o seu desenvolvimento são totalmente determinados a partir de fora. 
Seu entendimento como atividade eminentemente prática colabora também 
para impedir a reflexão teórica em seu interior. A figura do professor, ou seja, o 
sujeito que poderia desempenhar tal tarefa, também não está ainda presente.
A "desmilitarização” da Educação Física brasileira dá os seus primeiros 
passos com a criação das primeiras escolas civis de formação de professores no 
final da década de 30 e início da de 40. Vale observar, para evitar equívocos, 
que tal desmilitarização não alcançou em nossos dias o nível desejável tanto na 
Educação Física quanto ao nível da sociedade em geral (11).
Após a II Guerra Mundial, que coincide a grosso modo com o fim da 
ditadura do Estado Novo, a influência do esporte cresce rapidamente. Tam­
bém temos a influência neste período, do Método Natural Austríaco, desen­
volvido por Gaulhofer e Streicher na Áustria e do Método da Educação 
Física Desportiva Generalizada, divulgado no Brasil pelo Prof. Augusto 
Listello. Mas, como observado em outro momento, parece-me possível re­
11 A respeito ver FARIA JR (1987) e BRIGAGÃO (1985).
22 Educação Física e Aprendizagem Social
nunciar à análise da influência destes dois métodos em favor da influência 
do esporte ou da instituição esporte.
O esporte sofre, no período do pós-guerra, um grande desenvolvimento 
quantitativo. Afirma-se paulatinamente em todos os países sob a influência da 
cultura européia, como o elemento hegemônico da cultura de movimento. No 
Brasil as condições para o desenvolvimento do esporte, quais sejam, o desen­
volvimento industrial com a conseqüente urbanização da população e dos 
meios de comunicação de massa, estavam agora, mais do que antes, presen­
tes. Outro aspecto importante é a progressiva esportivização de outros elemen­
tos da cultura de movimento, sejam elas vindas do exterior, como o judô ou o 
karate, ou genuinamente brasileiras como a capoeira (ver JORGE, 1980).
Mais uma vez a Educação Física assume os códigos de uma outra 
instituição, e, de tal forma, que temos então, não o esporte da escola, e sim 
o esporte na Escola, o que indica sua subordinação aos códigos/sentido da 
instituição esportiva. O esporte na escola é um braço prolongado da própria 
instituição esportiva. Os códigos da instituição esportiva podem ser resumi­
dos em: princípio do rendimento atlético-desportivo, competição, compara­
ção de rendimentos e recordes, regulamentação rígida, sucesso esportivo é 
sinônimo de vitória, racionalização de meios e técnicas. O que pode ser 
observado é a transplantação reflexa destes códigos do esporte para a Edu­
cação Física. Utilizando a linguagem sistêmica, poder-se-ia dizer que a in­
fluência do meio-ambiente (esporte) não foi/é selecionada (filtrada) por um 
código próprio da Educação Física, o que demonstra sua falta de autonomia 
na determinação do sentido das ações em seu interior.
É importante citar que o desenvolvimento da instituição esportiva 
não se dá independentemente do da Educação Física: condicionam-se mu­
tuamente. A esta é colocada a tarefa de fornecer a “base” para o esporte de 
rendimento. A Escola é a base da pirâmide esportiva. É o local onde o talen­
to esportivo vai ser descoberto. Esta relação, portanto, não é simétrica. Por 
outro lado, a instituição esportiva sempre lançou mão do argumento de que 
esporte é cultura, é educação, para legitimar-se no contexto social, e princi­
palmente para conseguir apoio e financiamento oficial.
Na literatura específica, temos uma disseminação de livros que con- 
centram-se no desenvolvimento de estratégias do aprendizado do esporte, 
centrados quase que exclusivamente nos elementos técnico-táticos do apren­
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 23
dizado e nas pré-condições fisiológicas e neuro-motoras para a prática de 
determinado esporte. Estas estratégias são trazidas para a escola com funda­
mentalmente uma única adaptação, qual seja, a divisão do processo em fun­
ção dos tempos escolares e dos graus de ensino.
Os papéis do agora professor de Educação Física e do educando como 
se apresentam? Os papéis desses sujeitos também não são diferenciáveis 
nos seus aspectos fundamentais dos de treinador e de atleta na instituição 
esportiva. Isto é, passou-se do professor-instrutor e o de aluno-recruta para 
o de professor-treinador e de aluno-atleta. A diferenciação entre o “bom” 
treinador e o “bom” professornão é possível. A socialização do professor é 
marcada pela atividade esportiva. Os próprios professores dos cursos supe­
riores de Educação Física, que, aliás, possuem um currículo predominante­
mente esportivo, foram e são contratados em função do seu desempenho no 
mundo esportivo. A conservação da divisão de turmas para as aulas de Edu­
cação Física por sexo (M e F) é também, em parte, um reflexo da divisão 
existente na instituição esportiva, pelo menos justificada a partir de seus 
códigos (12).
Os professores não operam a diferenciação dos papéis de treinador e 
professor, em parte, porque a própria Educação Física, não tendo autono­
mia ou uma identidade pedagógica, não fornece um referencial, um conjun­
to fundamentado e institucionalizado de expectativas de comportamento. 
Isto é, a própria definição do papel do professor de Educação Física inexiste. 
Esta falta de referência é fator de perpetuação da indiferenciação destes papéis.
Esta orientação parece, mais uma vez, adequar-se bem à orientação 
tecnicista que, principalmente nas décadas de 60 e 70 predominam no sis­
tema educacional brasileiro, sob a égide da ditadura militar, do projeto “Bra- 
sil-Grande”. É a época dos, objetivos operacionais, do primado do planeja­
mento, da tecnologia do ensino. Menos o professor e o aluno têm importân­
cia no processo de ensino, e mais o planejamento (SAVIANI, 1984, p. 15- 
9). Sob esta orientação, ocorreram reducionismos, ou uma segunda redução 
do movimento corporal nas aulas (a primeira redução já havia ocorrido atra­
12 Nunca é demais observar que, num esforço teórico de síntese como este escrito, o 
grau de diferenciação necessário não pode ser observado. Falo, portanto, em ten- 
dências hegemônicas, o que não exclui tendências desviantes.
24 Educação Física e Aprendizagem Social
vés da assimilação dos códigos do esporte), pela necessidade de operacio- 
nalizar os objetivos, o que levou, pelo menos na tendência, à substituição do 
lúdico em favor de tarefas mecânicas (13).
Com isto gostaria de chamar a atenção para o fato de que não basta 
autonomizar-se em relação à instituição esportiva e à instituição militar vol­
tando-se totalmente à Escola. É preciso que a autonomização pedagógi­
ca da Educação Física compreenda uma reflexão crítica do próprio papel 
da Escola em nossa sociedade de classes. Isto é, não só uma relação crítica 
(filtragem crítica) para com o conjunto de atividades corporais (por ex. o 
esporte) deve ser elemento constituinte do desenvolvimento da sua identi­
dade pedagógica, mas também para com a instituição educacional.
1.4 A busca de um referencial teórico
Sem dúvida, a questão dos objetivos-conteúdos (métodos de ensino) da 
Educação Física é um dos pontos centrais do desenvolvimento da sua identida­
de pedagógica que, no entanto, tem sido negligenciada, enquanto tema, pela 
investigação em Educação Física no Brasil, ou, quando muito, discutida assis- 
tematicamente. Muito mais, parece-me predominar, quanto a esta questão, um 
consenso funcional-latente, cuja existência deve-se, pelo menos em parte, à já 
discutida subordinação da Educação Física à instituição esportiva. E esta situa­
ção persiste sobretudo porque é funcional no conjunto das relações sociais, ou 
seja, é fator de reprodução das relações sociais dominantes, é, assim, somente 
serão - os objetivos e conteúdos da Educação Física - radicalmente ques­
tionados quando as próprias relações sociais vigentes o forem.
Nesse contexto, a questão da legitimação da Educação Física na Es­
cola também não é objeto da investigação em Educação Física, também não 
é problematizada. Aceita-se a imposição do seu sentido a partir de fora (14).
13 O lúdico é dificilmente reduzível a objetivos operacionais: o aluno deverá, no 
final da aula, ser capaz de rir corretamente pelo menos 3 vezes em 5 tentativas - 
sic!!!.
14 Suspeito, nesse aspecto, de um certo oportunismo, como aquele da instituição 
esportiva que manteve uma relação de "compadrio” com a ditadura militar do 
pós 64.
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 25
É interessante notar que, num regime autoritário, a legitimidade confunde- 
se com a legalidade. A última tende a subsumir a primeira e, assim, esta 
questão é reduzida a um problema de legalidade da Educação Física (se por 
decreto ou não, não é o problema!).
O referido consenso funcional-latente quanto aos objetivos - 
conteúdos da Educação Física - que permanece latente enquanto não for 
problematizado - pode ser caracterizado, a partir da análise desenvolvida 
das práticas hegemônicas, ainda que de forma grosseira, da seguinte forma:
Conteúdo: esporte, isto é, esporte federado, suas técnicas, regras, 
táticas, etc. A ginástica e a corrida, por ex., são praticadas com vistas a 
“parte principal”. Os jogos populares são denominados e tematizados como 
‘‘jogos pré-esportivos” (15).
Objetivos: aprendizagem dos esportes e desenvolvimento da apti­
dão física (para a saúde).
É claro que a Educação Física lançou mão, para buscar legitimidade 
na escola, de um amplo leque de objetivos, como: desenvolvimento do sen­
timento de grupo, de cooperação, da sociabilidade, da auto-confiança, do 
conhecimento de si, etc. etc. (ou bla, bla, bla?), objetivos que, no entanto, 
exercem função ideológica porque a ação pedagógica não está centrada na 
sua consecução, relegando-os, de fato, a “efeitos paralelos desejáveis” (16). 
A Educação Física fez seu o discurso pedagogicista da Educação Integral. 
A este respeito convêm citar o prof. MELO DE CARVALHO (1987, p. III): 
“a fundamentação do educador tem de recusar o discurso pedagogicista mais 
ou menos mistificador para assentar-se na análise honesta e lúcida das bases 
objetivas que sustentam a escola. Qualquer esforço fora deste quadro para 
afirmar a disciplina é pura ilusão, quando não é puro e simples oportunismo 
de caráter político e ideológico”.
Parece-me que o início da década de 80 marca o momento em que a 
visão hegemônica descrita anteriormente começa a sofrer os primeiros aba-
15 A respeito ver a importante análise de PARLEBAS, P. (1980).
16 A dicotomia entre este discurso e a prática pedagógica ficou exemplarmente evi­
dente na investigação de FERREIRA (1984).
26 Educação Física e Aprendizagem Social
los - talvez possamos falar em início de uma crise, no sentido atribuído por 
MEDINA (1983). Talvez seja proveitoso caracterizar, ligeiramente, essas 
novas interpretações (propostas), que, via-de-regra, fazem a crítica da Edu­
cação Física estabelecida. Vale ressaltar que, devido à sua fragmentação e 
interpenetrações, estas novas interpretações resistem ainda a uma tipologia 
mais precisa (ver CAVALCANTI 1985 e TAFFAREL 1985).
- Uma destas novas interpretações está baseada na crítica ao be- 
haviorismo, à pedagogia tecnicista, e pode ser caracterizada como o da Edu­
cação Física Humanista. Esta proposta desloca a prioridade dada ao pro­
duto para o processo de ensino, introduzindo o princípio do processo de 
ensino não-diretivo. Os objetivos da Educação Física situam-se mais no 
plano geral da Educação Integral. O conteúdo é muito mais instrumento 
para promover as relações inter-pessoais e facilitar o desenvolvimento da 
natureza, em si boa, da criança (17). Esta interpretação ou proposta mantém 
íntima relação com uma outra que surge a partir do chamado Esporte para 
Todos. Embora surgido menos como crítica à Educação Física e mais como 
movimento alternativo ao esporte de rendimento, o EPT acaba influencian­
do-a. Sua concepção é baseada numa crítica humanista, de cunho existenci­
alista, ao esporte de rendimento (18). O objetivo central da Educação Física 
torna-se, nesta concepção, a instrumentalização do aluno para ocupar suas 
horas de lazer com atividades. E, de maneira que tal ocupação possa ocorrer 
de forma autônoma, crítica e criativa, existe a necessidade de utilizar for­
mas variadasde movimentos corporais, diferenciando-as das atividades es­
tereotipadas do esporte de alto nível. Adaptar, modificar, criar novas formas 
de movimento são as palavras de ordem. No entanto, “o social é entendido 
como uma extensão do individual, ou seja, trata-se de desenvolver atitudes 
de cooperação e solidariedade a fim de inserir-se de maneira positiva no 
meio social já dado, jamais questionado” (LIBANEO, 1985, p. 65).
17 Para esta concepção ver OLIVEIRA (1984).
18 Claramente identificável, por exemplo, no trabalho de DIECKERT (1987, p. 134): 
“O Esporte para Todos, desenvolvido neste meio tempo no Brasil, representa 
muito desta nova antropologia, que coloca a autonomia do ser humano no centro. 
Não é o esporte que faz o homem, mas o homem que faz o esporte! Ele determina
o que, como, onde, quando, por quanto tempo, com quem, sob que regras, com 
que objetivo e sob que condições o pratica”.
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 27
- A Psicomotricidade. Baseada na interdependência do desenvol­
vimento cognitivo e motor, critica o dualismo predominante na Educação 
Física, e propõe-se, a partir de jogos de movimento e exercitações, con­
tribuir para a Educação Integral. O autor de maior influência no Brasil é, 
sem dúvida, o francês J. LE BOULCH, para quem “a Educação Psicomoto­
ra assenta no desenvolvimento de algumas aptidões de natureza perceptiva 
e de natureza motora, em relação com as funções mentais” (apud SOBRAL, 
1976, p. 93). Sua proposta está expressa no título de um de seus livros: a 
Educação pelo movimento. Isto é, e a tentativa de instrumentalizar o movi­
mento com vistas às tarefas “fundamentais” da Escola. Embora considere a 
crítica ao dualismo um grande avanço, parece-me que sua base teórica ainda 
não apresenta os fundamentos de uma teoria pedagógica da Educação Físi­
ca (parece-me também que não é esta a intenção dos seus autores). A con­
cepção de Educação Física presente nesta proposta “resulta de uma pers­
pectiva desencarnada socialmente” (MELO DE CARVALHO, 1987, p. III). 
Com a Psicomotricidade, temos um deslocamento da polarização da Educa­
ção do movimento para a Educação pelo movimento, ficando a primeira 
nitidamente em segundo plano: “a Educação Psicomotora considera as ati­
vidades como algo secundário, devendo subordinar-se ao desenvolvimento 
de algumas capacidades e relacionadas com as funções mentais” (SOBRAL, 
1976, p. 94). A motricidade ou movimento corporal (por ex. na forma cul­
tural de esporte) não é um saber a ser transmitido, e sim meio, instrumento. 
Por outro lado, a sua base de argumentação, a íntima relação do desenvolvi­
mento de estruturas cognitivas com o desenvolvimento motor, é generalizá­
vel para depois dos 10-11 anos de vida somente com restrições. Ou seja, a 
“qualidade” da relação entre cognição e motricidade assume conotação to­
talmente diferente. Se nos primeiros anos de vida a aprendizagem de no­
ções como a lateralidade, a estruturação espaço-temporal, etc. desenvol­
vem-se em íntima relação com o próprio desenvolvimento da motricidade, 
de tal maneira ser quase impossível identificar os limites entre um e outro, 
parece-me difícil afirmar o mesmo do aprendizado, por ex., de operações 
matemáticas mais complexas. Bem observado, a relação entre cognição e 
motricidade (e afetividade) não desaparece, mas assume outra “qualidade”.
- A assim chamada Educação Física Revolucionária. Como bem 
lembra CAVALCANTI (1985), a concepção crítica ou revolucionária da 
Educação Física vem ensaiando os primeiros passos, porém ainda de forma 
bastante difusa, apresentando-se ainda muito fragmentada. O que diferen­
cia esta tendência de todas as outras descritas anteriormente é o fato dela
28 Educação Física e Aprendizagem Social
realizar a crítica da Educação Física a partir de sua contextualização na 
sociedade capitalista, operando tal crítica a partir da tradição teórica do 
marxismo e, assim, ressaltando a dimensão política da Educação e da Edu­
cação Física. Seus adeptos colocam como elemento norteador de uma “nova” 
Educação Física, um compromisso político com as classes oprimidas, com 
vistas a transformações estruturais na sociedade, condição indispensável 
para um com-viver Humano. Dois pontos têm sido objeto de análise crítica:
a) a ideologia burguesa veiculada pela Educação Física (19); e b) a “domes­
ticação do corpo” na Educação Física (crítica realizada a partir das teorias 
de M. Foucault e também W. Reich (20). Como bem lembra KUNZ (1991), 
estas novas concepções estão ainda numa fase crítico-teórica que precisa 
ser superada em favor de alternativas pedagógicas, para que o próprio dis­
curso não perca sua ressonância crítica. Se, na análise e avaliação da função 
que a Educação Física tem cumprido em nossa sociedade, não ocorre disso­
nância maior entre estas duas correntes, o mesmo não pode ser dito das 
poucas propostas alternativas de ação pedagógica que delas tem emanado. 
Enquanto a primeira centra sua proposta mais na transmissão crítica do sa­
ber, mesmo do esporte, e na luta contra-ideológica, a segunda centra-se 
na experiência ou vivência corporal, nas práticas de conscientização 
corporal.
Nenhuma destas novas tendências parece, no entanto, ameaçar seria­
mente a hegemonia da “tendência esportiva”. Não fornecem também, até o 
momento, à ação pedagógica em Educação Física um quadro referencial 
teórico consistente.
Identificando-me com a concepção revolucionária de Educação Físi­
ca - preferiria denominá-la de tendência progressista - gostaria de, finali­
zando e obedecendo ao caráter exploratório deste escrito, tentar uma peque­
na contribuição à tarefa enunciada acima, abordando o complexo: Educa­
ção do movimento - Educação pelo movimento? Antes de mais nada, é 
importante evitarmos aqui o “pedagogismo”. SOARES (1987) aponta o ca­
minho: “cabe às disciplinas que constituem o currículo (conjunto de ativi-
19 Entre outros: CASTELLANI FILHO (1983); BRACHT (1986); CARMO (1987).
20 Entre outros: MEDINA (1987) e FREIRE DA SILVA (1987).
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 29
dades nucleares da Escola), transmitir, enquanto partes constitutivas de uma 
totalidade de conhecimentos, o seu particular, sem entretanto estabelecer 
uma posição com o geral. Entretanto, para que possamos realizar esta tare­
fa, é preciso examinar atentamente o que fundamenta cada disciplina curri­
cular e o porque de sua existência. É preciso captar o que a definiu como tal, 
a que necessidade pedagógica veio atender”. Nesta perspectiva, parece-me 
necessário negarmos a oposição entre Educação pelo Movimento e Educa­
ção do Movimento em favor de uma unidade dialética: Educação pelo, do e 
para o Movimento. A Educação Física possui um conteúdo, um saber, cuja 
transmissão deve ser assumida como tarefa pela Escola.
A Educação Física, na transmissão deste saber e em função das 
características, deste elemento da cultura, pode contribuir para com os 
objetivos da Escola (que transcendem a especificidade de uma dada dis­
ciplina).
A desconsideração da Educação do e para o movimento, em favor da 
Educação pelo movimento correria o perigo de negligenciar o fator históri- 
co-cultural do movimento (e com ele as contradições sociais). Por isso, con­
sidero que as formas culturais de movimento que se apresentam no mundo 
vivido de nossa população alvo, precisam ser tema e problematizadas na 
Educação Física. Isto implica, por exemplo, a tematização da vida de movi­
mento das camadas populares (ver KUNZ, 1991).
Mas como podemos legitimar a Educação Física na Escola? Em que 
consiste a importância da Educação Física? Para que Educação Física? Pa- 
rece-me que a tendência progressista da Educação Física tem negligenciado 
esta questão em favor da questão: para quem serve a Educação Física? Na 
visão da Educação Física como atividade, com o objetivo do desenvolvi­
mento da aptidão físicacom vistas à saúde, a legitimação ocorria pela sua 
vinculação ao mundo do trabalho, pela sua importância para a produção 
(força de trabalho). Como vimos, com a afirmação do esporte também como 
conteúdo hegemônico na Educação Física- e as modificações estruturais a 
nível da sociedade que co-determinaram esta mudança - ocorre um certo 
deslocamento em direção ao lazer. A Educação Física passa a ser relaciona- 
da, agora, menos diretamente com o mundo da produção, mas de forma 
imediata através da mediação do lazer, o que, em função do maior status 
social do trabalho (atividade “nobre”) em relação ao lazer (atividade "su-
30 Educação Física e Aprendizagem Social
pérflua”), não deixa de constituir-se numa dificuldade para tal legitimação 
(21). No entanto, o lazer e a educação para o lazer parecem, cada vez mais, 
serem considerados um tema e uma tarefa também da Escola (22).
Para alguns autores (KURZ [1985] e BENTO [1987]), a importância 
quantitativa que o esporte assumiu em nossa sociedade é considerada já 
como argumento justificador para a sua consideração por uma escola que 
não é “cega” frente à realidade social. No entanto, para a legitimação da 
Educação Física, a alusão à dimensão quantitativa do esporte não me parece 
condição suficiente pois, antecedendo ou complementando a avaliação da 
importância quantitativa do esporte, seria necessária uma avaliação do sen­
tido e funções do esporte (por ex. como elemento do lazer) para o Homem e 
nossa sociedade; portanto, uma avaliação qualitativa (normativa) do espor­
te. E, neste sentido, uma teoria pedagógica da Educação Física, para além 
da consideração do aspecto histórico-cultural concreto ou de como o movi­
mento se apresenta culturalmente, não pode renunciar a uma análise antro­
pológica do fenômeno da ludomotricidade humana, pois, para além das ca­
racterísticas e códigos que os movimentos corporais e os jogos assumem a 
partir da sua contextualização histórico-cultural, parece-me impossível ne­
gar seu caráter universal e constituinte da natureza humana. Permanecer 
nesta análise antropológica, fazendo dela a base única de uma teoria (da 
legitimação) da Educação Física é condená-la a um abstratismo ideológico 
e ao a-historicismo. No entanto, se não é condição suficiente, é, pelo menos, 
condição necessária.
Finalizando, gostaria de dizer que o desenvolvimento de um corpo 
teórico da Educação Física que intermedie a sua relação com o “meio-am- 
biente” é tarefa nossa, ou seja, dos sujeitos que constituem a Educação Físi­
ca. A autonomia pedagógica, da qual se falou aqui, necessita da investiga­
ção pedagógica, que não e uma tarefa meramente técnica, que não exclui 
mas não pode também ser confundida com a pesquisa em aprendizagem
21 O preconceito burguês em relação ao ócio acentua-se quando este diz respeito as 
atividades corporais, o que vale combater. Ver a respeito LAFARGUE (1983).
22 Importantes a respeito são os trabalhos de MARCELLINO (1983, 1987).
motora, em crescimento e desenvolvimento, em socialização, etc., pois, se 
esta pode fornecer elementos para a realização dos objetivos da Educação 
Física, não descobrirei, com o seu auxílio, o compromisso político para com 
os oprimidos de nossa sociedade (23).
Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 31
23 A falta de respostas neste escrito às muitas das questões levantadas, deve-se não 
só, em parte às minhas próprias limitações, ao caráter deste texto, mas também ao 
próprio estágio de desenvolvimento da Teoria da Educação Física.
h
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica
CAPÍTULO II
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 
2.1 Introdução
Este ensaio pretende ser um prolongamento de outro publicado ante­
riormente e que leva o título “Educação Física: a busca da autonomia peda­
gógica” (BRACHT, 1989). Ambos circunscrevem-se no âmbito do esforço 
que faz o autor para desenvolver elementos para uma teoria (crítica) da Edu­
cação Física.
Naquele texto procurei demonstrar que aquela prática pedagógica 
chamada de Educação Física, e que tem como característica diferenciadora 
a tematização do movimento corporal, manteve e mantém uma relação his­
tórica com instituições como a militar e a esportiva, que pode ser caracteri­
zada como de subordinação e que, portanto, não logrou desenvolver sua 
autonomia, vale dizer, reger-se por princípios e códigos próprios.
Embora considere que várias questões (1) importantes - para o de­
senvolvimento de um corpo teórico que fundamente a prática pedagógica 
em Educação Física - estejam sendo discutidas em diferentes fóruns, como 
simpósios e congressos, entendo que uma tem estado, estranhamente, au-
1 Por exemplo: O que é Educação Física? É comum ouvir-se, (nós nem sabemos o 
que é Educação Física)!, o que é interpretado como sinal de uma “crise de identi­
dade”. A Educação Física seria uma (nova) ciência? ou, formulado de outra for­
ma: a Educação Física deveria assumir o estatuto de ciência? Tem sido denuncia­
do (se é que isto ainda pode ser considerado uma denúncia?!), que a função so- 
cial da Educação Física, assim como da Educação como um todo, e a de reprodu­
zir o nosso sistema societal, portanto, de reproduzir também, entre outras coisas, 
a injustiça social, etc.
3 3
34 Educação Física e Aprendizagem Social
sente (para não dizer que tem sido evitada). Refiro-me à questão da legiti­
midade da Educação Física na Escola, ou seja, a razão de ser da Educação 
Física no currículo escolar (2).
Pretendo, portanto, me ater mais especificamente a esta problemáti­
ca, sem contudo me furtar de abordar questões que a tangenciam ou que 
com ela estão intimamente relacionadas. Um exemplo, é a citada pergunta: 
mas afinal, o que é Educação Física?
2.2 Excurso: acerca da pergunta, o que é Educação Física?
Uma resposta a esta questão só é possível se tivermos claro o que na 
verdade estamos perguntando. Entendo que parte das dificuldades no en­
frentamento desta pergunta, decorre da falta de clareza quanto ao “o que 
estamos perguntando com esta pergunta”, portanto, residem na raiz da pró­
pria pergunta. Senão, vejamos: é comum buscar-se elucidar a essência (3) 
da Educação Física, como se esta existisse independentemente da Educação 
Física concreta e situada historicamente, que conhecemos. É desta busca 
que derivam expressões do tipo: “mas esta não é a verdadeira Educação 
Física”. Ora, a “verdadeira Educação Física” é aquela que acontece concre- 
tamente, e não uma entidade metafísica que estaria hibernando em algum 
recanto à espera de sua descoberta. Se é isto que estamos perguntando (pela 
essência no sentido metafísico), estamos perguntando errado, pois a “ver­
dadeira” Educação Física é aquela que nós construímos no nosso fazer diá­
rio. Entendo que, para apreender a Educação Física enquanto fenômeno, é 
preciso, num primeiro momento, desvencilhar-se daquilo que desejamos
2 Esta foi a questão que levantei no ensaio anteriormente citado, no momento que 
fazia a (auto)crítica às “tendências progressistas” da Educação Física, que até 
então haviam se omitido em relação a este problema.
3 Leia-se, “essência metafísica”.
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 35
que ela seja (4). Além disso, é importante atentar para o que nos diz V I E I ­
RA PINTO (1979, p. 90-1): “o conteúdo de todo conceito é a sua história”. 
Acreditando estar respaldado pela história, entendo que a Educação Física 
é a prática pedagógica que tem tematizado elementos da esfera da cul­
tura corporal/movimento. Este conceito, reconheço, é ainda meramente 
descritivo; além disso, seria necessário complementá-lo com a elucidação 
do entendimento da expressão “prática pedagógica” (5). A resposta que 
ofereci aqui, e que tomo como base para minhas reflexões, tem um ca­
ráter descritivo, uma vez que entendo que um conceito de Educação 
Física é uma teoriada Educação Física, e isto estamos tentando desen­
volver.
Relembrando, no Brasil os elementos da cultura corporal/movimen­
to predominantes na Educação Física foram, num primeiro momento, a gi­
nástica e, num segundo - e esta é a situação atual - o esporte (6). É impor-
4 Não estou ignorando a necessária dialetização entre o velho e novo, no sentido 
de que existem diferentes “projetos” para a Educação Física (que refletem dife­
rentes projetos de sociedade e visões de mundo). Mas enquanto projetos, eles 
ainda não são a Educação Física.
5 Eu acentúo, a Educação Física é antes de tudo uma prática pedagógica, que como 
toda prática social não é obviamente destituída de pensamento - eu quero com 
isso me contrapor àquelas posições que a denominam preferencialmente como 
uma área do conhecimento. Ela elabora um corpo de conhecimentos que tendem 
a fundamentá-la, pois toda prática exige uma teoria que a constitua e dirija. Mas 
a Educação Física é uma prática social de intervenção imediata, e não uma práti­
ca social cuja característica primeira seja explicar ou compreender um determi­
nado fenômeno social ou uma determinada parte do real.
6 Aqui faz-se necessária uma rápida observação: não posso derivar daí que o Es­
porte é Educação Física. Não, o esporte é um fenômeno social que tem um desen­
volvimento, embora relacionado, relativamente autônomo em relação à Educa­
ção Física, assim como a dança já compunha a nossa cultura corporal/movimen­
to, muito antes que o próprio termo Educação Física tivesse sido usado pela pri­
meira vez.
36 Educação Física e Aprendizagem Social
tante ressaltar que a eleição ou a tematização na Educação Física de deter­
minado elemento ou manifestação da cultura corporal/movimento, está re­
lacionada, direta ou indiretamente, com as necessidades do projeto educa­
cional hegemônico em determinada época, e com a importância daquela 
manifestação no plano da cultura e política em geral. A tematização privi­
legiada da ginástica por exemplo, tem a ver com o papel higienista atri­
buído à Educação Física no projeto educacional do início deste século 
no Brasil (ver a respeito os estudos de (CASTELLANI 1989; SOARES, 
1990).
2.3 Crise e legitimação
É cada vez mais comum ouvir-se nos meios da Educação Física que 
ela se encontra em crise. É de M. SÉRGIO (1988, p. 12) a afirmação de que 
“o discurso da Educação Física é, desde a década de 60, declaradamente de 
crise”. São aludidas diferentes causas para explicar a referida crise, além de 
diferentes interpretações do seu caráter. Uma delas, por exemplo, parte do 
argumento de que não existe uma profissão regulamentada de Professor de 
Educação Física, o que causaria uma falta de respeito profissionais bem 
como uma indefinição do mercado de trabalho. Outros entendem que a crise 
é de cunho epistemológico. Considero que, neste contexto de crise, a legiti­
mação da Educação Física no sistema de ensino, assume um caráter funda­
mental (a questão epistemológica não está aí excluída).
Contra uma possível falta de legitimação, o professor de Educação 
Física não soube, até o momento, articular nada muito além de "altos brados 
de indignação” e um discurso, na maioria das vezes, teoricamente inconsis­
tente, isto quando não se apega ou faz um discurso “legalista", confundindo 
legalidade com legitimidade.
2.4 Os modelos de legitimação da Educação Física
Como lembra HABERMAS (1983, p.220), “somente ordenamentos 
políticos podem ter legitimidade e perdê-la; somente eles têm necessidade 
de legitimação”. “Legitimidade significa que há bons argumentos para que 
um ordenamento político seja reconhecido como justo e equânime; um or­
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 37
denamento legítimo merece reconhecimento. Legitimidade significa que um 
ordenamento político é digno de ser reconhecido” (Idem, p. 219-220). E 
neste sentido, como lembra WEFFORT (1988), “um regime de legitimida­
de política só pode ser a democracia. ... E isso porque a democracia é o 
único regime que organiza, isto é, institucionaliza, o consentimento popu­
lar. sem o qual a legitimidade perece” (p. 24). Eu diria, trazendo a discussão 
para o nosso tema, que é só na democracia (ou seja, na luta democrática 
entre grupos/partidos para a realização de sua proposta de democracia), 
que a questão da legitimidade pode vir à tona e ser efetivamente coloca­
da (7).
Legitimar a Educação Física significa, então, apresentar argumentos 
plausíveis para a sua permanência ou inclusão no currículo escolar, apelan­
do exclusivamente para a força dos argumentos, declinando do argumento 
da força (que é o que acontece quando um regime autoritário “legaliza” 
alguma prática social). Esta legitimação precisa integrar-se e apoiar-se dis- 
cursivamente numa teoria da Educação.
Na verdade, a legitimação de uma matéria se dá em função do papel 
que uma determinada época lhe atribui. Que funções, que papéis foram atri­
buídos à Educação Física nos diferentes momentos, e que função social/ 
humana a (pouca) teoria da Educação Física tem advogado para esta prática 
pedagógica?
Antes de apresentar especificamente as tentativas de legitimação da 
Educação Física na Escola, gostaria de discutir brevemente a questão da 
produção do conhecimento na e para a Educação Física.
2.5 A produção do conhecimento na e para a Educação Física
A produção do conhecimento nesta área esteve pautada por proble­
máticas que se derivaram dos entendimentos das funções atribuídas histori­
7 Por isso não estranha que a questão da legitimidade da Educação Física enquanto 
componente curricular, comece a ser discutida após a ditadura militar
38 Educação Física e Aprendizagem Social
camente à Educação Física. Quais sejam: quais as contribuições do exercí­
cio físico sistemático e racionalizado para a saúde, entendida enquanto saú­
de biológica (higiene, funções orgânicas, etc.). Tratava-se de evidenciar tam­
bém, os efeitos sobre o desenvolvimento do “caráter”, numa visão funcio- 
nalista da sociedade. Já sob o paradigma esportivo, a problemática passa a 
incluir, além da possível influência de determinado esporte sobre vari­
áveis relacionadas com a saúde (e com o desenvolvimento motor e or­
gânico), a investigação da variável melhoria do desempenho atlético- 
esportivo.
Vale registrar que a teoria do conhecimento ou a concepção de 
ciência que predominou no âmbito da produção do conhecimento na 
área, foi o das ciências naturais de matriz positivista. Uma das princi­
pais características desta concepção de ciência, e que vai nos interessar 
mais de perto, é que ela radicaliza a separação entre teoria e prática: 
“ela apresenta como medida absoluta da cientificidade, os critérios da 
comprobabilidade intersubjetiva e da consistência lógica. A prática hu­
mana dirigida por decisões é denunciada como a-científica por escapar 
ao alcance experimental e à fixação empírica como validade universal, 
como tudo que não pode ser subsumido a este esquema” (SCHMIED- 
KOWARZIK 1983, p. 21).
Isto nos remete ao problema da relação entre o conhecimento (cien­
tífico) produzido na “área” e a prática pedagógica em Educação Física.
São várias as conseqüências da adoção da concepção de ciência pró­
pria do positivismo pela comunidade acadêmica que se propunha a produzir 
conhecimento “científico” na área da Cultura Corporal/movimento. Uma 
delas é a de que o conhecimento produzido é, via-de-regra, inútil para a 
prática pedagógica em questão. Outra é de que o conhecimento produzido 
não enfrenta a questão do sentido da prática.
Para APEL (1988, p. 24), é justamente o conceito de racionalidade 
que domina no interior da ciência analítica, no seu sentido de objetividade 
sem julgamento de valor, que coloca a impossibilidade de fundamentar ra­
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica
cionalmente decisões normativas intersubjetivamenteválidas, pois esta te­
ria que submeter-se às seguintes premissas:
a) Fundamento racional significa dedução lógico formal de senten­
ças a partir de sentenças mais básicas.
b) Validade intersubjetiva de sentenças (afirmações) é igual a valida­
de objetiva, no sentido da constatação não valorativa ou da dedução lógico- 
formal.
c) A partir de tal verificação ou constatação (de fatos) não é possível, 
com o auxílio da dedução lógica, derivar nenhum julgamento de valor ou 
afirmação normativa.
Mas a teoria pedagógica, bem lembra SCHMIED-KOWARZIK 
(1983, p. 130), tem uma dupla tarefa: “pois na medida em que a Educação é 
a produção do homem em homem através do homem (educador), o educa­
dor necessita tanto da diretriz do “como” de sua ação educativa, como da 
determinação de sentido desta ação dirigida ao homem em seu quê. Numa 
das tarefas da pedagogia sobressai uma motivação prática, já que a teoria se 
coloca inteiramente a serviço da destinação prática do educador em sua prá- 
xis futura; na segunda tarefa sobressai uma motivação teórica, pois a teoria 
se esforça em desvelar ao educador o horizonte de tarefas da prática educa­
cional a partir da totalidade da humanização do homem. Entretanto, a teoria 
nem é ensinamento artesanal puramente prático na sua primeira forma, nem 
na segunda, simples sabedoria teórica; pois em ambos os casos a motivação 
prática e a teórica são mediatizadas em direção à unidade de teoria e prática 
no processo educacional”.
Acontece que, nas ciências analíticas de orientação positivista, não 
se colocam as questões práticas onde decisões sobre o sentido da prática 
humana são solicitadas. Estas são recusadas em nome da neutralidade e 
objetividade científicas. Mas, como sabemos, a prática pedagógica exige 
tais decisões. Se a “ciência” não se responsabiliza por tais decisões, se ela
39
40 Educação Física e Aprendizagem Social
somente se preocupa com o que é objetivamente, ou com o como (questões 
técnicas), quem, e a partir de que bases vão ser tomadas estas decisões de 
cunho normativo?
HABERMAS (1988, p.11) lembra que “questões técnicas colocam- 
se no sentido da organização de meios racionais com vistas a objetivos, e da 
escolha racional entre meios alternativos tendo em vista objetivos dados 
(valores e máximas). Questões práticas no entanto, colocam-se no sentido 
da aceitação ou rejeição de normas, especialmente de normas de ação, cuja 
aspiração de validade nós podemos fundamentar ou rejeitar racionalmente. 
Teorias que pela sua estrutura servem para esclarecer questões práticas, são 
estruturadas para entrar no âmbito da ação comunicativa”. O que é impor­
tante ressaltar, é que “os interesses orientadores do conhecimento técnico e 
prático não são condutores da cognição, que em função da aspiração de 
objetividade do conhecimento, precisariam ser colocados fora de ação. Eles 
muito mais determinam o aspecto.sob o qual a realidade pode ser objetivada 
e assim tornada acessível à experiência" (Idem. p. 16).
Como a primeira pergunta com a qual uma teoria pedagógica (como 
uma teoria da Educação Física) é a do seu sentido, e a concepção de ciência 
predominante no âmbito da Educação Física exclui esta questão do rol de 
suas competências, a (pouca) teoria da Educação Física desenvolvida até 
então preocupou-se fundamentalmente com as questões técnicas, instrumen­
tais, não enfrentando a questão dos valores. Na abordagem chamada de de- 
senvolvimentista (ver TANI et al. 1988) há inclusive, uma tentativa de fun­
damentar “cientificamente” a Educação Física a partir das necessidades 
obviamente “naturais” das crianças, e porque leis naturais, passíveis de se­
rem determinadas objetivamente, pois independem dos seres humanos con­
cretos, na esperança de contornar a questão dos valores.
Estamos aí frente a uma das características de uma teoria da Educa­
ção Física. Enquanto teoria de uma prática pedagógica, ela precisa enfren­
tar a questão dos valores (penetrar no âmbito da ética). Ou seja, ela vai 
refletir (e fazer opções conscientes) em torno de uma visão (projeto) de 
mundo, de Homem e de sociedade.
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 41
Retomando a "abordagem desenvolvimentista” de TANI et al. 
(1988), gostaríamos de exemplificar as limitações das abordagens em- 
pírico-analíticas no que diz respeito à formulação de uma teoria peda­
gógica para a Educação Física. Para os autores acima citados, “a Edu­
cação Física Escolar pode ser estruturada através de abordagens ma­
croscópicas, de características filosóficas e administrativas, e também 
de abordagens mais microscópicas, que parte do estudo das caracterís­
ticas dos alunos em diferentes níveis de análise” (TANI et al., 1988. p. 
135). Os autores optaram pela abordagem microscópica, considerada 
uma entre várias outras possíveis. Ora, o equívoco é patente, na medida 
em que as abordagens macroscópica (filosófica) e microscópica (des­
crição dos processos de desenvolvimento da criança) não são indepen­
dentes entre si, de tal maneira que pudéssemos a posteriori apenas so­
mar uma à outra. Elas muito mais se interpenetram, pois as decisões 
chamadas de filosóficas vão valer-se das informações sobre o desen­
volvimento da criança, assim como aquelas decisões vão determinar, 
como diz HABERMAS (1988), o aspecto sob o qual aquele desenvolvi­
mento será objetivado e tornado acessível à experiência. Os objetivos 
da Educação Física na Escola não podem ser simplesmente deduzidos 
logicamente dos conhecimentos sobre o desenvolvimento da criança. É 
preciso para tanto, elucidar qual o papel desejável para a Escola em 
nossa sociedade. Isto por sua vez implica, tanto em fazer uma leitu­
ra da sociedade em que vivemos, como implica em projetar a socie­
dade que almejamos. Portanto, para uma teoria para a prática pe­
dagógica em Educação Física, o “porquê” (decisões normativas) não 
pode ser discutido isoladamente do “como” (questões técnico-me- 
todológicas).
Assim, as diferentes disciplinas científicas que se ocupam do movi­
mento humano, enquanto não envolvidas com a prática pedagógica em Edu­
cação Física, e ocupando-se com dimensões parcelares desta prática, são 
apenas fornecedoras de informações em estado bruto, que precisarão passar 
por um processo de teorização da pedagogia da Educação Física, e não po­
derão jamais substituí-la. A pedagogia da Educação Física enquanto ci­
ência prática, tem seu sentido não na “compreensão, mas no aperfeiço­
amento da práxis”. Assim, seria necessário que a produção do conheci
42 Educação Física e Aprendizagem Social
mento para sustentar/orientar a prática pedagógica em Educação Física, se 
pautasse no específico do “educativo”, isto é, a problemática a ser objeto de 
investigação, seria determinada pelas questões que a prática educativa em 
Educação Física coloca.
Quais são então as expectativas em relação a uma teoria da Edu­
cação Física? A quais perguntas deveria uma teoria da Educacão Física 
responder? Basicamente a duas: o porque (sentido) e o como (instru­
mental).
Estas duas questões de cunho geral devem ser precisadas. Uma teo­
ria da prática pedagógica Educação Física, precisa: a) poder fundamentar 
esta prática no currículo escolar, isto é, precisa dizer a quais necessidades 
vem atender e da indispensabilidade de sua função, caracterizando assim o 
seu objeto - ou seja, precisa se defrontar com a pergunta do porque Educa­
ção Física na Escola, legitimá-la (implica discutir os fundamentos filosófi- 
co-antropológicos, o significado humano e social da ludomotricidade hu­
mana); b) desenvolver e apoiar-se numa concepção de currículo, defi­
nindo, entre outras coisas, a função da Escola no contexto societal, o 
saber ou o conteúdo de que vai tratar, bem como dos critérios para a 
seleção e sistematização destes conteúdos; c) em consonância com os 
objetivos e as características dos conteúdos, propore fundamentar uma 
metodologia do ensino; d) explicitar uma proposta para o problema da 
avaliação do ensino.
2.6 A crítica e a superação dos modelos de legitimação vigentes
Mas retornemos à questão da legitimação da Educação Física na Es­
cola. Busquei condensar num esquema, os modelos legitimadores ou que 
buscam fundamentar a Educação Física na Escola, e que estão presentes 
excluindo-se, complementando-se, em diferentes momentos. Em abstrain­
do desta forma (construindo tipos ideais), estou correndo o risco de genera­
lizar excessivamente, como por exemplo, não levar em consideração as es- 
pecificidades dos diferentes graus de ensino.
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 43
Eu classifiquei estas tentativas em modelos heterônomos e autôno­
mos(8). As tentativas de fundamentação autônomas são aquelas que situam 
a razão ou importância pedagógica das atividades corporais de movimento 
nelas mesmas. Nesta perspectiva, estas atividades encerrariam elementos 
humanos fundamentais. As tentativas heterônomas, ao contrário, buscam 
tal razão muito mais fora das atividades, em suas repercussões sociais. É 
importante observar, mais uma vez, que são tipos ideais que criei, e que não 
aparecem de forma pura e, sim, na maioria das vezes, combinados e intere- 
lacionados.
A base teórica das legitimações autônomas tem sido basicamente a 
antropologia filosófica e a fenomenologia (as diferentes teorias fenomeno- 
lógicas do jogo como as de HUIZINGA, BUYTENDJIK, MERLEU PON- 
TY e também SANTIN), ao passo que as legitimações heterônomas têm nas 
disciplinas científicas de cunho biológico e nas teorias sociológicas funcio- 
nalistas ou na sociologia funcionalista, sua base. É importante observar que 
são os pedagogos que se valem destas teorias para fundamentar a Educação 
Física na Escola, e não como muitos gostariam de insinuar, de que aqueles 
autores estariam propondo a Educação Física na Escola.
8 Transformar o saber elaborado em saber escolar. “Essa transformação é o poces- 
so através do qual seleciona-se, do conjunto do saber sistematizado, os elementos 
relevantes para o crescimento intelectual dos alunos e organiza-se esses elemen­
tos numa forma, numa seqüência tal que possibilite a sua assimilação” (SAVIA­
NI, 1991, p. 79).
* O autor holandês Bart CRUM (1988) resumiu as tentativas de legitimação (In 
Educação Física enquanto atividade curricular, também em duas vertentes há:.i 
cas: a) A concepção biologista (biologistische Fachkonzept), c b) n contvpçmi 
formativa (bildungstheoretische Fachkonzept).
44 Educação Física e Aprendizagem Social
Enquanto, na perspectiva heterônoma, acentua-se a funcão social, 
ligada principalmente ou tendo como referência básica o mundo do trabal­
ho, isto é, uma função em última instância, “séria” ou “produtiva”, na pers­
pectiva autônoma, acentua-se a dimensão lúdica do humano.
GRUPE (1976. p. 35), um pedagogo que busca fundamentar a Edu­
cação Física via Antropologia Filosófica, entende que a primeira questão 
com a qual uma teoria da Educação Física precisaria se confrontar é exata­
mente de cunho antropológico. Neste sentido, entende que a legitimação da 
Educação Física é resultado de dois princípios independentes: em primeiro 
lugar, do fato de que a existência humana é radicalmente “um ser corporal 
no mundo” (não existe consciência sem corpo); e, em segundo, de que o 
jogo (junto com o trabalho) pertence às formas originais (até agora não ple­
namente conhecidas) da existência humana. Ora, uma educacão que está 
voltada para o humano, que se volta para as dimensões essenciais do Ho­
mem, não pode negligenciar a corporeidade e a ludicidade, pois estas são 
formas humanas básicas de comunicacão com o mundo (o discurso pedago- 
gicista da Educação Integral também vai nutrir-se nesta trilha de argumen­
tação).
Mas, na verdade, o que tem predominado entre nós é a fundamenta­
ção heterônoma. Aqui predomina uma visão instrumentalista da Educação 
Física. A Educação Física é fomentadora da saúde (via aptidão física), cria 
e desenvolve hábitos higiênicos, desenvolve o sentimento cívico, etc.
Usando uma classificação desenvolvida por MARCELLINO (1987) 
para o Lazer, poderíamos dizer que as funções atribuídas à Educação Física 
neste plano são de ordem:
a) compensatória;
b) utilitarista e
c) moralista.
Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 45
Compensatória, na medida em que a Educação Física colabora para 
compensar a insatisfação e alienação do trabalho intelectual em sala de aula. 
Uma atividade que compensa o desgaste na atividade séria e a implacável 
materialização do mundo contemporâneo (coisificação das relações huma­
nas).
Utilitarista porque prepara para o trabalho (aptidão física e habili­
dades motoras), ao mesmo tempo que prepara o indivíduo para uma ativida­
de que tem a função de recuperar a força de trabalho.
Moralista porque é uma atividade que ajuda a suportar a disciplina e 
as imposições obrigatórias da vida social, pela ocupação do tempo livre em 
atividades equilibradas, socialmente aceitas e moralmente corretas (enquanto 
a criança pratica esporte está ocupada com uma atividade socialmente acei­
ta e não pensa em “bobagens”).
A abordagem funcionalista vê a Educação Física e a Educação como 
elementos que garantem a funcionalidade do sistema como um todo, e aju­
dam a prevenir disfuncionalidades ou conflitos. O fundamento científico 
desta perspectiva advém das ciências biológicas e da saúde de orientação 
positivista. Daí advém também grande parte de suas limitações e seus redu- 
cionismos, que, em termos de concepção pedagógica, tem sido denominada 
e denunciada como "biologista". Na verdade, a concepção positivista da 
ciência não pode fornecer o fundamento para a prática pedagógica, porque 
ela radicaliza a separação entre teoria e prática. “Ela apresenta, como medi­
da absoluta da cientificidade, os critérios dacomprobabilidade intersubjeti- 
va e da consistência lógica. A prática humana dirigida por decisões (como é 
o caso da prática pedagógica V.B.) é denunciada como a-científica por esca­
par ao alcance experimental e à fixação empírica como validade universal, 
como tudo que não pode ser subsumido a este esquema” (SCHMIED- 
KOWARZIK 1983, p. 21). A partir deste modelo teórico, questões com­
plexas, como por exemplo a da saúde, sofrem uma redução de cunho 
biologista.
Neste contexto, surge, mais recentemente, uma nova versão para le­
gitimar a Educação Física na Escola. Esta tem a ver com a dimensão que
46 Educação Física e Aprendizagem Social
assumiu o fenômeno esportivo em nossa sociedade. A dimensão quantitativa 
do esporte parece ser razão suficiente para que a escola assuma a tarefa de 
transmitir este elemento da cultura. Define-se, nesta perspectiva, a tarefa da 
Educação Física como a de desenvolver a capacidade de ação no desporto” 
(BENTO, 1987).
A legitimidade das práticas corporais, principalmente o esporte, nas 
sociedades modernas, pode ser deduzida da praticamente unanimidade que 
o esporte hoje alcança. Ser esportivo, aparentar boa forma física, já quase 
não é mais uma opção, mas sim uma imposição social. Ligada a este “boom” 
do corpo ou das práticas corporais, temos o “boom” da indústria do lazer e 
dos materiais esportivos. Assim, embora os pedagogos resistam em utilizar 
esta nova dimensão do cotidiano de boa parte da população como elemento 
de legitimação da Educação Física na Escola, é bem provável que a Esco­
la, concretamente, já esteja, através das aulas de Educação Física, ser­
vindo a esta nova indústria, e a Educação Física esteja recebendo reco­
nhecimento a partir do reconhecimento tácito (9) destas práticas corpo­
rais na sociedade como um todo.
Poderíamos citar também a vertente da “psicomotricidade”, que ins­
trumentaliza o movimento para as tarefas “fundamentais da escola”, e que 
tem sido utilizada pelos

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