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Professor (para uma classe de alunos de 9 anos): Para a atividade de artes hoje, eu gostaria que cada um de vocês desenhasse a figura de uma pessoa com três olhos. Billy: Como? Ninguém possui três olhos! Se alguém lhe pedisse para relatar a reação desse menino de 9 anos, você poderia ser tentado a concluir que ou lhe falta imaginação ou estava sendo sarcástico. Na verdade, os sentimentos de Billy em relação ao trabalho de artes podem ser bastante típicos (veja o Quadro 7.4, na página 241), porque crianças de 9 anos pensam de forma diferente dos adultos e, muitas vezes, acham extremamente difícil refletir sobre propostas hipotéticas que não possuem qual- quer base real. pelos quais o ser humano adquire e usa o conhecimento para solucionar proble- mas. O processo cognitivo que nos ajuda a "entender" e nos adaptar ao ambiente inclui atividades tais como a atenção, a percepção, a aprendizagem, o pensamen- to e a memória - em resumo, os eventos inobserváveis que caracterizam a mente humana (Bjorklund, 2000). O estudo do desenvolvimento cognitivo - as mudanças que ocorrem nas habilidades mentais das crianças no curso de suas vidas - é um dos temas mais diversos e excitantes em todas as ciências do desenvolvimento. Neste capítulo, iniciamos nossa exploração da mente em desenvolvimento, focalizando primei- ro as contribuições importantes de um psicólogo suíço, Jean Piaget, que traçou o que ele (e outros) acreditou ser um padrão universal de crescimento intelectual que se estende durante a infância, meninice e adolescência. Então examinare- mos o ponto de vista sociocultural de Lev Vygotsky - uma teoria que afirma que o crescimento cognitivo é bastante influenciado pela cultura e que po- de não ser nem um pouco universal como Piaget e seus seguidores supuseram (Wertsch e Tulviste, 1992). O Capítulo 8 introduz a terceira perspectiva influente sobre o desenvolvi- mento da mente: o processamento de informação, um ponto de vista que surgiu, em parte, das questões que ficaram sem respostas pelo trabalho inicial de Piaget. Nossa atenção vai então mudar para a psicometria, ou testes de inteligência, no Capítulo 9, onde discutiremos muitos fatores que contribuem para as diferenças individuais na performance intelectual infantil. Nos próximos três capítulos iremos examinar o cres- cimento da cognição - um termo usado por psicólogos para se referir à atividade do saber e aos processos mentais A TEORIA DE PIAGET SOBRE o DESENVOLVIMENTO COGNITIVO De longe o teórico mais influente na história do desenvolvimento infantil, Jean Piaget combinou seus interesses iniciais em zoologia e epistemologia (o campo da filosofia que estuda a origem do conhecimento), para desenvolver uma nova ciência que ele denominou epistemologia genética: o estudo experimental sobre a origem do conhecimento. (Piaget usou o termo genético no sentido antigo, que significava basicamente desenvolvimental.) Piaget iniciou seus estudos observando cuidadosamente seus próprios filhos: como eles exploravam novos brinquedos, resolviam problemas simples que ele lhes apresentava, e geralmente passavam a entender a si mesmos e o mundo ao seu redor. Mais tarde, Piaget estudou grandes amostras de crianças por meio do método clínico, uma técnica flexível de perguntas e respostas que ele usava para descobrir como crianças de diferentes idades pensavam sobre tópicos que variavam de regras de jogos a leis de física. Dessas observa- ções, Piaget formulou sua teoria desenvolvimental cognitiva do crescimento intelectual. 0 Que É Inteligência? A formação de Piaget em zoologia é bastante evidente em sua definição de inteligência como uma função vital básica que ajuda o organismo a adaptar-se a seu ambiente. Pode- mos observar essa adaptação quando vemos uma criança descobrindo como ligar a tele- visão, uma criança em idade escolar decidindo como dividir seus doces com os amigos, ou um adolescente esforçando-se para resolver um problema difícil de geometria. Piaget propôs que a inteligência é "uma forma de equilibração para a qual todas as estruturas cognitivas tendem" (1950, p. 6). Sua visão era simplesmente a de que toda a atividade in- telectual acontece com um objetivo em mente: produzir uma relação equilibrada ou har- moniosa, entre os processos de pensamento do indivíduo e o ambiente. (Tal conjuntura equilibrada é chamada equilibração cognitiva, e o processo no qual é alcançado é deno- minado equilibração) Piaget enfatizou que as crianças são exploradores ativos e curiosos constantemente desafiados por novos estímulos e eventos que não são compreendidos de imediato. Ele acreditava que esses desequilíbrios (ou desequilibração cognitiva) entre os modos de pensamento das crianças e os eventos ambientais as levavam a realizar ajustes mentais que lhes permitiriam a relação de novas experiências e dessa forma restaurar a equilibração cognitiva. Assim vemos que a opinião de Piaget sobre a inteligência é um modelo "interacionista", que implica que desencontros entre os esquemas mentais inter- nos (conhecimento existente) e o ambiente externo estimulam a atividade cognitiva e o crescimento intelectual. Uma suposição bastante importante acompanha a visão de Piaget sobre a inteligência: se as crianças podem saber alguma coisa, então devem construir esse conhecimento elas mesmas. De fato, Piaget descreveu a criança como construtivista - um organismo que age sobre novos objetos e eventos e assim adquire alguma compreensão de suas características essenciais. As construções das crianças sobre a realidade (ou seja, sua interpretação sobre objetos e eventos) dependem do conhecimento disponível para elas naquele momento: quanto mais imaturo o sistema cognitivo da criança, mais limitada será a sua interpretação sobre um evento. Considere o seguinte exemplo (Cowan, 1978, p. 11): Uma criança de 4 anos e seu pai estão assistindo ao pôr-do-sol. "Veja papai, ele está se escondendo atrás da montanha! Por que ele está indo embora? Ele está bravo?" O pai aproveita para explicar a seu filho como o mundo funciona. "Bem, Mark, o sol na verdade não tem sentimentos. E não se move de verda- de. É Terra que está se movendo. Ela gira ao redor de seu eixo de modo que a montanha se mova na frente do sol...". O pai continua a falar sobre movimentos relativos, corpos interplanetários e coisas afins. O menino responde de modo firme e definitivo, "Mas nós não estamos nos movendo. Veja, o sol está se mo- vendo para baixo". Esquemas Operacionais Segundo Piaget, o pensamento das crianças de 7 anos ou mais é caracterizado por esquemas operacionais. Uma operação cog- nitiva é uma atividade mental interna que a pessoa realiza para chegar a uma conclusão lógica. ne ficou observando-o em estupefação, pois nunca havia presenciado uma cena como essa. No dia seguinte, ela co- meçou a gritar em seu cercadinho e tentou movê-lo, batendo os pés (...) diversas vezes seguidas (Piaget, 1951, p. 63). Nitidamente Jacqueline estava imitando as respostas de seu colega agora ausente, mesmo que não tenha realizado essas ações no momento em que estas eram modeladas. Parece que ela formou uma representação mental, ou imagem, da birra do menino, manteve essa cena e a guiou em sua imitação posterior. Jacqueline recebeu a visita de um menino (de 18 meses de idade) que, no correr da tarde, demonstrou um temperamento terrível. Ele gritava enquanto tentava sair do cercadinho e o empurrava para trás, batendo com seus pés. Jacqueli- Essa criança está fazendo uma importante suposição que domina sua tentativa para compreensão - a saber, o modo como ela vê as coisas deve corresponder à maneira como elas são. Obviamente, é o Sol quem está se movendo, escondendo-se atrás da montanha como se fosse um ser vivo que estivesse expressando algum tipo de sentimento ou servindo determi- nado propósito ao se esconder. Entretanto, o pai conhece as características que distinguem objetos animados de inanimados (e um pouco de astronomia), de modoque é capaz de construir uma interpretação bastante diferente da ''realidade" testemunhada por seu filho. Esquemas Cognitivos: A Estrutura da Inteligência Piaget utilizou o termo esquema para descrever os modelos, ,ou estruturas mentais, que nós criamos para representar e interpretar nossas experiências. Um esquema (algumas vezes denominado schema no singular, schemata no plural) é um padrão de pensamento ou ação similar em alguns aspectos ao que uma pessoa leiga chama estratégia ou concei- to. Piaget (1952, 1977) descreveu três tipos de estruturas intelectuais: esquemas compor- tamentais (ou sensório-motores), esquemas simbólicos e esquemas operacionais. Esquemas Comportamentais (ou Sensório-motores) Um esquema comportamental é um padrão organizado de comportamento que a crian- ça usa para representar e responder a um objeto ou experiência. Essas são as primeiras estruturas intelectuais que emergem e, na maior parte dos 2 primeiros anos de vida, o conhecimento da criança sobre os objetos e eventos está limitado àquilo que ela pode representar por meio de ações. Assim, para uma criança de 9 meses, uma bola não é con- ceitualizada como um brinquedo redondo com um nome formal; em vez disso, uma bola é simplesmente um objeto que ela e seus companheiros podem lançar e rolar. Esquemas Simbólicos Durante o segundo ano de vida, as crianças alcançam um ponto em que são capazes de resolver problemas e pensar sobre objetos e eventos sem ter atuado sobre eles. Em outras palavras, elas agora são capazes de representar experiências mentalmente e usar esses símbolos mentais, ou esquemas simbólicos, para alcançar seus objetivos. Considere a seguinte observação do comportamento de Jacqueline, a filha de 16 meses de Piaget: 220 Psicologia do Desenvolvimento • Editora Thomson Figura 7.1 A reversibi- lidade é uma operação cognitiva importante que se desenvolve em meados da infância. Organização: tendência inata para combinar e integrar esquemas disponíveis em sistemas coerentes ou corpos de conhe- cimento. Adaptação: tendência inata para ajustar-se às demandas do ambiente. Assimilação: termo usado por Piaget para o processo pelo qual as crianças interpre- tam novas experiências incorporando-as a seus esquemas já existentes. Acomodação: termo usado por Piaget para o processo pelo qual as crianças modi- ficam seus esquemas existentes para poder incorporar ou se adaptar a novas experiências. Para ilustrar, um menino de 8 anos que esvazia uma bola de plástico inflável e a transforma em um disco não será enganado pensando que agora possui mais bola como resultado de havê-la estendido. Por quê? Porque ele pode facilmente reverter em sua mente essa transformação, reconhecendo assim que a bola inflável será a mesma se a encher novamente. Em contraste, crianças de 5 anos, que não podem "operar" sobre seus objetos de pensamento, são forçadas a realizar julgamentos tendo como base aquilo que vêem. Dessa forma, se testemunhassem a transformação da bola em disco, geralmente elas assumiriam que no disco há mais massa, pois cobre uma área maior que a bola. E mesmo que possam imaginar (com alguma estimula- ção) que a bola possa ser cheia novamente, elas ainda não são capazes de reconhecer as conseqüências lógicas de tal ato; ou seja, elas continuam a achar que há mais massa no disco. Segundo Piaget, as operações cognitivas mais comuns são as atividades mentais implicadas pelos símbolos matemáticos tais como +, - , ~, < e >. Note que cada uma dessas operações é uma atividade reversível (Figura 7.1); adições mentais, por exem- plo, podem ser desfeitas rapidamente por subtrações mentais. Piaget acreditava que essas habilidades operacionais fluidas permitiam às crianças do ensino fundamental e adolescentes a construírem esquemas intelectuais bastante elaborados que lhes pos- sibilitassem pensar lógica e sistematicamente, primeiro em relação a suas próprias experiências e eventualmente sobre eventos abstratos ou hipotéticos. Como Adquirimos o Conhecimento: 0 Processo Cognitivo de Piaget Como as crianças constróem e modificam seus esquemas intelectuais? Piaget acreditava que todos os esquemas, todas as formas de entendimento, são criados por meio do trabalho de dois processos intelectuais inatos, os quais ele chamou organização e adaptação. A organização é o processo pelo qual as crianças combinam os esquemas existentes em estruturas intelectuais novas e mais complexas. Por exemplo, uma criança pequena que possui os reflexos de "olhar fixamente", "alcançar" e "segurar" logo organiza esses esquemas inicialmente não-relacionados em estruturas mais complexas - alcanço visu- almente direcionado - que lhe permitem alcançar e descobrir novas características de muitos objetos interessantes do ambiente. Apesar de os esquemas intelectuais poderem assumir formas radicalmente diferentes nas diversas fases do desenvolvimento, o processo de organização é imutável. Piaget acreditava que as crianças organizam constantemente os esquemas que elas possuem em estruturas mais complexas e estruturas mais adaptativas. O objetivo da organização é promover a adaptação, o processo de ajuste às de- mandas do ambiente. Segundo Piaget, a adaptação ocorre por meio de duas atividades complementares: a assimilação e a acomodação. A assimilação é o processo pelo qual as crianças tentam interpretar novas experiên- cias nos termos de seus modelos existentes de mundo, os esquemas que elas já possuem. A criança pequena que vê um cavalo pela primeira vez pode tentar assimilá-lo em um de seus esquemas existentes para animais de quatro patas e pode assim considerar essa criatura como um "au au". Em outras palavras, a criança tenta adaptar-se a esse novo estímulo pela construção deste como algo familiar. Entretanto, objetos, eventos e experiências realmente novos podem ser de difícil in- terpretação em termos dos esquemas existentes. Por exemplo, uma criança pequena pode logo perceber que esse grande animal que ela considerou como um "au au" possui pés engraçados e um rabo bastante peculiar, e ela pode tentar encontrar uma maneira melhor para entender as observações feitas por ela. A acomodação, o complemento da assimila- ção, é o processo de modificação de estruturas existentes para dar conta das novas expe- riências. Assim, a criança que reconhece que um cavalo não é um cachorro pode inventar um nome para essa nova criatura ou talvez dizer "O que é?" e adotar a nomenclatura usada por seus companheiros. Ao fazer isso, ela modificou (acomodou) seu esquema de animais de quatro patas para incluir uma nova categoria de experiência - cavalos. Piaget acreditava que a assimilação e a acomodação trabalham juntas para promover o crescimento cognitivo. E elas não ocorrem igualmente como no exemplo anterior, mas Cap. 7 Desenvolvimento Cognitivo: A Teoria de Piaget e a Visão Sociocultural de Vygotsky • David R. Shaffer 221 assimilações não compatíveis com os esquemas existentes eventualmente introduzem con- flitos cognitivos e levam a acomodações dessas experiências. E o resultado final é a adap- tação, um estado de equilíbrio entre as estruturas cognitivas do indivíduo e o ambiente. A Tabela 7.1 nos dá um exemplo de como o crescimento cognitivo pode acontecer desde o ponto de vista de Piaget - uma perspectiva que enfatiza que o desenvolvimento cognitivo é um processo ativo, no qual as crianças buscam regularmente além de assi- milar novas experiências, acomodar suas estruturas cognitivas a essas experiências e organizar o que sabem em esquemas novos e mais complexos. Assim, duas atividades inatas - a adaptação e a organização - tornam possível para as crianças a construção progressiva de maior entendimento do mundo em que vivem. : Os ESTÁGIOS DO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DE PIAGET Piaget identificou quatro grandes períodos, ou estágios, de desenvolvimento cognitivo: o estágio sensório-motor (do nascimento aos 2 anos), o estágio pré-operacional (dos 2 aos7 anos), o estágio das operações concretas (dos 7 aos 11 anos) e o estágio das operações formais (dos 11 anos em diante). Esses estágios de crescimento intelectual representam níveis qualitativamente diferentes de funcionamento cognitivo e formam o que Piaget de- nominou seqüência desenvolvimental invariante; ou seja, todas as crianças progridem por esses estágios e exatamente nessa mesma ordem. Posteriormente Piaget argumentou que esses estágios jamais podem ser saltados, porque cada estágio é construído sobre aquilo que foi realizado nos estágios anteriores. Apesar de acreditar que a seqüência de estágios intelectuais fosse invariante, Piaget reconhecia a existência de grandes diferenças individuais nas idades em que as crianças entravam ou saíam de cada estágio em particular. De fato, sua visão era a de que fatores culturais e outras influências ambientais poderiam tanto acelerar quanto retardar o ritmo do crescimento intelectual de uma criança, e ele levava em consideração as normas de idade que acompanhavam seus estágios (e subestágios) apenas, na melhor das hipóteses, como aproximações. Estágio Sensório-motor (do nascimento aos 2 anos) Durante o estágio sensório-motor, as crianças coordenam as informações sensoriais que recebem com suas habilidades motoras, formando esquemas comportamentais que lhes permitem "agir sobre" e "conhecer" seu ambiente. Quanto elas realmente podem enten- der pelo apoio em experiências externas para produzir conhecimento? Mais do que você imagina. Durante os 2 primeiros anos de vida, as crianças desenvolvem-se de criaturas Seqüência desenvolvimental invariante: série de aquisições que ocorrem em uma ordem determinada porque cada etapa de desenvol- vimento na seqüência é um pré-requisito para aquelas que a seguem. Estágio sensório-motor: primeiro estágio inte- lectual de Piaget, do nascimento aos 2 anos, quando as crianças passam a se apoiar em esquemas comporta- mentais como um meio de explorar e entender o meio ambiente. Psicologia do Desenvolvimento • Editora Thomson Atividade reflexa: primeiro subestágio do período sensório-motor de Piaget; as ações das crianças se limitam ao exercício de reflexos inatos, assimilando novos objetos dentro desses esquemas refle- xivos e acomodando tais reflexos a esses novos objetos. Reações circulares primárias: segundo subestágio do período sensório- motor de Piaget; uma resposta agradável, cen- trada no próprio corpo do bebê, descoberta por acaso e realizada repeti- das vezes. Reações circulares secundárias: terceiro subestágio do período sensório-motor de Piaget; uma resposta agradável, centrada em um objeto externo, descoberta por acaso e realizada repetidas vezes. Coordenação de reações circulares secundárias: quarto subestágio do pe- ríodo sensório-motor de Piaget; a criança passa a coordenar duas ou mais ações para alcançar objetivos simples. reflexivas com pouco conhecimento a habilidosas solucionadoras de problemas que já aprenderam muito sobre si mesmas, seus companheiros mais próximos e os objetos e eventos de sua rotina diária. É tão radical o crescimento cognitivo do bebê, que Piaget dividiu o período sensório-motor em seis subestágios que des- crevem a transição gradual da criança de um ser reflexivo para um ser refletivo (veja a Tabela 7.2, na página 225). Nossa revisão vai focar em três importantes aspectos do desenvolvimento sensório-motor: habilidades para a solução de pro- blemas (ou atividades com objetivos/fins), imitação e o crescimento do conceito de objeto. O Desenvolvimento de Habilidades para a Solução de Problemas Atividades Reflexa. Piaget caracterizava o primeiro mês de vida como um estágio de ati- vidade reflexa - um período em que as ações do bebê praticamente estão limitadas ao exercício de reflexos inatos, assimilar novos objetos nesses esquemas reflexos (por exemplo, sugar cobertores ou brinquedos, bem como o seio materno) e acomodar esses reflexos aos novos objetos. De fato, não são intelectualizadas, mas essas adaptações pri- mitivas representam o início do crescimento cognitivo. Reações Circulares Primárias (1 aos 4 meses). Os primeiros esquemas que não são reflexos emergem entre 1 e 4 meses de vida, à medida que a criança descobre por acaso que as diversas respostas que ela pode emitir e controlar (por exemplo, chupar os dedos, fazendo sons) são satisfatórias e, assim, dignas de ser repetidas. Esses simples atos repe- titivos, chamados reações circulares primárias, são sempre centrados no próprio corpo do bebê. São denominados "primários" por serem os primeiros hábitos motores a apare- cer, e '"circulares" por serem repetidos. Reações Circulares Secundárias (dos 4 aos 8 meses). Entre o quarto e oitavo mês de vida as crianças estão descobrindo (novamente por acaso) que podem realizar coisas interessan- tes a objetos além de seus próprios corpos, como provocar o som em um pato de borracha apertando sua barriga. Esses novos esquemas, chamados reações circulares secundárias, são igualmente repetidos pelo prazer que provocam. Segundo Piaget, o interesse repentino das crianças entre os 4 e 8 meses em objetos externos indica que começaram a se diferen- ciar dos objetos que podem controlar no ambiente que as rodeia. Um bebê que se delicie nessas ações repetitivas, como brincar com um mobile colo- rido ou apertar a barriga do pato de brinquedo, estaria engajado em um comportamento planejado ou intencional? Segundo Piaget, não: a reação circular secundária ainda não é uma resposta completamente intencional, visto que o interessante resultado por ela produzido foi descoberto por acaso e não era um objetivo definido na primeira vez que a ação foi realizada. Coordenação de Esquemas Secundários (dos 8 aos 12 meses). Respostas realmente planejadas aparecem pela primeira vez entre o oitavo e décimo segundo mês de vida, durante o subestágio da coordenação de reações circulares secundárias, à medida que a criança começa a coordenar duas ou mais ações para realizar objetivos simples. Por exemplo, se você colocasse um brinquedo interessante embaixo de uma almofada, um bebê de 9 meses poderia levantar a almofada com uma das mãos enquanto usaria a outra para pegar o brinquedo. Nesse caso, o ato de erguer a almofada não é em si agradável, tampouco é realizado por acaso. Pelo contrário, é parte de um esquema intencional maior no qual duas respos- tas inicialmente não-relacionadas - erguer e pegar - são coordenadas com um objetivo em mente. Piaget acreditava que essas simples coordenações de esquemas secundários representavam o início do comportamento dirigido por um objetivo e, portanto, a real solução de problemas. Reações Circulares Terciárias (dos 12 aos 18 meses). Entre os 12 e 18 meses, a criança começa a experimentar ativamente com objetos e tenta inventar novos métodos de solu- Cap- 7 Desenvolvimento Cognitivo: A Teoria de Piaget e a Visão Sociocultural de Vygotsky • David R. Shaffer 223 ção de problemas ou a reprodução de resultados interessantes. Por exemplo, uma criança que tenha originalmente apertado a barriga de um pato de borracha para fazê-lo grasnir poderia agora jogá-lo no chão, pisar e amassá-lo com um travesseiro para ver se essas ações produzirão os mesmos resultados ou efeitos diferentes no brinquedo. Ou ela pode aprender por meio de suas experiências que jogar a comida na parede é mais eficiente para fazê-la grudar ali do que simplesmente cuspi-la. Apesar de os pais nem sempre se sentirem tão animados com esses novos e emocionantes avanços cognitivos, esses esque- mas exploratórios de tentativa e erro, chamados reações circulares terciárias, refletem a curiosidade da criança - seu grande motivador para aprender sobre o modo de funcio- namento das coisas. Solução de Problemas por Combinações Mentais (dos 18 aos 24 meses). O grande feito do estágio sensório-motor ocorre quando a criança começa a internalizar seus esquemas comportamentais para construirsímbolos mentais, ou imagens, que podem usar para guiar sua conduta futura. Agora a criança pode experimentar mentalmente e pode mos- trar um tipo de "percepção" de como resolver um problema. Laurent, o filho de Piaget, ilustra muito bem esse tipo de solução de problemas, ou experimentação interna: Laurent encontra-se sentado em frente à mesa e coloco um pedaço de pão à sua frente, longe do seu alcance. Também, à direita (...) coloco um bastão, de cerca de 25 cm. A princípio, Laurent tenta pegar o pão (...) e então desiste (...) Laurent novamente olha para o pão e, sem se mover, olha rapidamente para o bastão, e então subitamente o agarra e o direciona para o pão (...) (ele então) traz o pão para si (Piaget, 1952, p. 335). Não há dúvidas de que aqui não há a experimentação do tipo tentativa e erro. Em vez disso, a solução para o problema de Laurent aconteceu em um nível simbólico e in- terno, ao visualizar o bastão sendo usado como uma extensão do seu braço para alcançar um objeto distante. O Desenvolvimento da Imitação Piaget reconheceu o significado adaptativo da imitação e esteve bastante interessado em seu desenvolvimento. Suas observações pessoais o levaram a crer que os bebês eram in- capazes de imitar novas respostas emitidas por um modelo até o período de 8 a 12 meses (a mesma idade em que demonstravam alguma evidência de intencionalidade em seu comportamento). Entretanto, os esquemas de imitação de crianças tão jovens são bas- tante imprecisos. Se você dobrasse e esticasse um dedo, um bebê provavelmente tentaria imitá-lo abrindo e fechando toda a mão (Piaget, 1951). De fato, imitações precisas mesmo de respostas simples podem levar dias (ou mesmo semanas) de prática (Kaye e Marcus, 1981), e literalmente centenas de demonstrações podem ser necessárias antes que um bebê de 8 a 12 meses compreenda ou comece a apreciar jogos sensório-motores como de "esconde-esconde". A imitação voluntária torna-se muito mais precisa entre os 12 e 18 meses, como vemos no seguinte exemplo: Aos (1 ano e 16 dias, Jacqueline) descobriu sua testa. Quando eu toquei o meio da minha, ela primeiro esfregou os olhos, então sentiu acima deles e tocou seu cabelo, logo após levou sua mão para baixo e, finalmente, colocou o dedo em sua testa (Piaget, 1951, p. 56). Segundo Piaget, a imitação diferida - a habilidade de reproduzir o comporta- mento de um modelo ausente - aparece pela primeira vez entre os 18 e 24 meses. Ao discutir esquemas simbólicos, notamos um exemplo de imitação diferida - a reprodução de Jacqueline de seu ataque de temperamento 24 horas depois do de seu companheiro. Piaget acreditava que crianças mais velhas são capazes de realizar imitações diferidas, Reações circulares terciárias: quinto subestágio do período sensório-motor de Piaget; um esquema exploratório no qual a criança cria um novo método de ação sobre objetos com o objetivo de produzir resultados interessantes. Experimentação interna: no sexto subestágio do estágio sensório-motor de Piaget, a habilidade de resolver problemas simples no nível mental, ou simbólico, sem ter de se apoiar na experiência do tipo tentativa e erro para tanto. Imitação diferida: habilidade de reproduzir a atividade-modelo que tenha sido testemunhada em algum momento passado. 224 im Psicologia do Desenvolvimento • Editorê Thotnsijq . - < • pois podem construir símbolos mentais, ou imagens, do comportamento-modelo que está guardado em sua memória e é trazido à tona mais tarde para guiar a recriação da resposta do modelo. Alguns investigadores discordam de Piaget, argumentando que a imitação diferida e assim a representação simbólica, tem seu início muito mais cedo. Por exemplo, pesqui- sas demonstraram que crianças de apenas 9 meses são capazes de imitar atos bastante simples (por exemplo, apertar um botão para ativar um brinquedo barulhento), dias após observá-los (Carver e Bauer, 1999; Meltzoff, 1988), e crianças um pouco maiores demonstraram imitar eventos particularmente memoráveis até 12 meses após o haverem testemunhado pela primeira vez (Bauer e Wewerka, 1995; Mandler e McDonough, 1995- Meltzoff, 1995). Assim, a capacidade para a imitação diferida - a imitação que requer que a criança construa, guarde e então se recorde de símbolos mentais - está presente muito antes do que Piaget pensava. Permanência do objeto: a realização de que os objetos continuam a existir quando não mais visíveis ou percebidos por meio dos outros sentidos. Erro A e não B: tendência, apresentada pelas crianças dos 8 aos 12 meses, de buscar um objeto escondido onde o tenham encontrado pre- viamente mesmo após terem visto ser movido a outro lugar. Desenvolvimento da Permanência do Objeto Um dos feitos mais notáveis do período sensório-motor é o desenvolvimento da perma- nência do objeto - a idéia de que os objetos continuam a existir quando não são mais visíveis ou percebidos pelos outros sentidos. Se tirasse seu relógio e o cobrisse com uma caneca, você ainda estaria consciente de que seu relógio continuaria a existir. Mas já que bebês muito jovens se baseiam muito em seus sentidos e habilidades motoras para "en- tender" um objeto, eles parecem operar como se os objetos existissem apenas se puderem ser sentidos ou tocados. De fato, Piaget (1954) e outros descobriram que bebês de 1 a 4 meses não procurarão por objetos interessantes que não estejam visíveis. Se um relógio que lhes interessa for coberto por uma caneca, logo perderão o interesse, quase como se acreditassem que o relógio não existisse mais ou tenha se transformado na caneca. Entre o quarto e o oitavo mês, a criança se recordará de brinquedos que estejam parcialmente ocultos ou colocados abaixo de uma cobertura semitransparente; mas continuam a falhar na busca de objetos que estejam completamente escondidos, o que sugeriu a Piaget que, da perspectiva do bebê, objetos que desaparecem deixam de existir. Sinais claros de uma noção emergente de objeto aparecem entre os 8 e 12 meses. Entretanto, a permanência do objeto está longe de estar completa, como vemos na de- monstração de Piaget com sua filha de 10 meses: Jacqueline está sentada em um colchão sem nada que (...) a distraia (...) eu pego seu papagaio (de brinquedo) de suas mãos e o escondo por duas vezes (...) embaixo do colchão, à sua esquerda (ponto A). Ambas as vezes, Jacqueline olha para o objeto imediatamente e o agarra. Então eu o retiro de suas mãos e o movo muito lentamente à frente de seus olhos ao lugar correspondente à sua direita, embaixo do colchão (ponto B). Jacqueline observa esse movimento (...) mas no momento em que o papagaio desaparece (no ponto B), ela se vira para a sua esquerda e olha para onde ele estava anteriormente (ponto A) (1954, p. 51, grifos acrescentados pelo autor). A resposta de Jacqueline é típica de crianças de 8 a 12 meses, que buscarão por um objeto escondido onde o tenham encontrado anteriormente, e não onde o tenham visto pela última vez (Marcovitch e Zelazo, 1999). A consideração de Piaget sobre esse tipo de erro A e não B era bastante direta: Jacqueline agia como se seu comportamento determi- nasse onde o objeto poderia ser encontrado; conseqüentemente, ela não tratava o objeto como algo que existisse independente de sua própria atividade. Entre os 12 e 18 meses, o conceito de objeto melhora. Crianças nessa idade acompa- nham os movimentos visíveis dos objetos e os procuram no último lugar que os tenham visto. Entretanto, a permanência do objeto ainda não está completa, visto que a criança ainda não é capaz de realizar as inferências mentais necessárias para entender a moção invisível. Dessa forma, se você esconde um brinquedo em sua mão, a coloca atrás de uma barreira e deixa o objeto ali, depois, tira sua mão e pede à criança que encontre o brinquedo, bebês de 12 a 18 meses procurarão o brinquedo onde o viram pela última vez - na sua mão - em vez de procurá-lo atrás de você. Entre 18e 24 meses, as crianças tornam-se capazes de representar mentalmente moções invi- síveis e usar tais inferências mentais para guiar a busca de objetos que tenham desaparecido. Nesse ponto, elas entendem completamente que os obje- tos possuem uma "permanência" e se orgulham bastante de localizar seus objetivos em brincadei- ras de esconde-esconde. Desafios para a Consideração de Piaget sobre o Desenvolvimento Sensório-motor: O Neonativismo e a Teoria das Teorias Piaget foi um impressionante observador de crianças, e quanto ao nível de descrição dos tipos de resolução de problemas por elas utilizados que a maioria das pessoas (incluindo os pais) realmente vê, a consideração de Piaget sobre o desenvolvimento infantil geral- mente é bastante precisa, embora um tanto incompleta (Bjorklund, 2000; veja a Tabela 7.2 para um resumo de algumas atualizações). Ainda assim, Piaget geralmente subestimava as capacidades cognitivas das crianças, e muitos pesquisadores hoje acreditam que são necessárias novas teorias para captar completamente a riqueza da inteligência infantil. Neonativismo. A crítica mais bem-articulada sobre a teoria infantil de Piaget vem do neo- nativismo. Neonativistas são teóricos que acreditam que as crianças nascem com conhe- cimento substancial sobre a natureza do mundo físico (Gelman e Williams, 1998; Mandler, 1998; SpeLke e Newport, 1998). Essa perspectiva é bem ilustrada no trabalho de Renee Baillargeon (1987), descrito no Quadro 7.1, que sugere que as crianças sabem algo sobre a permanência de objetos muito cedo; e tal conhecimento não precisa ser "construído" Brincar de esconde-esconde é uma atividade bastante excitante para as crianças que estão adquirindo a permanência do objeto. Neonativismo: idéia de que muito do conhecimento cogni- tivo, como o conceito de objeto, é inato, requerendo pouco em termos de experiências para se expressar, e de que existem limitações biológicas, à medida que a mente/cérebro está programada para processar certos tipo de informação de determi- nadas maneiras. como Piaget propôs, mas é parte da herança genética da criança. Isso não significa que não haja um desenvolvimento ou que nenhuma experiência seja necessária para a ex- pressão madura dessa habilidade, mas sim que os bebês entram no mundo com conhe- cimento substancial e estão preparados pela evolução para dar sentido a certos aspectos do seu mundo físico (como a permanência de objetos ou, como vimos no Quadro 6.2 a constância de tamanho). De modo similar, outros argumentam que desde os primeiros meses de vida os bebês são seres simbólicos, uma perspectiva bastante diferente do ponto de vista de Piaget (Meltzoff, 1990). Pesquisas sobre a imitação diferida (e imitação neonatal discu- tida no Capítulo 6) são consistentes com essa posição e levaram Andrew Meltzoff (1990, p. 20) a argumentar que "em um sentido bastante real, pode não existir algo como o 'pe- ríodo sensório-motor' no bebê humano normal". A realização precoce de habilidades simbólicas é ilustrada na pesquisa inovadora de Karen Wynn (1992), que usou técnicas semelhantes às de Baillargeon (1987), apresentada no Quadro 7.1, para avaliar julgamentos aritméticos simples em crianças. Na pesquisa de Wynn, eram apresentadas para bebês de 5 meses seqüências de eventos que envolviam a adição e subtração de elementos. Duas dessas seqüências podemos ver na Figura 7.2. Uma seqüência (o "resultado possível") leva à conclusão de que 1 + 1 = 2; a outra seqüên- cia (o "resultado impossível") leva à conclusão de que 1 + 1 = 1. Se os bebês possuem algum conceito primitivo de adição, eles deveriam ficar surpresos e assim passar mais tempo olhando para o "resultado impossível". E isso foi exatamente o que aconteceu, tanto para o problema de adição apresentado na Figura 7.2 como para o problema de subtração simples (2 - 1 = 1), e esses resultados têm sido agora repetidos por outros pes- quisadores (Simon et ai, 1995; UUer et ai, 1999). Note que os bebês não estão simplesmente fazendo uma discriminação perceptual entre dois arranjos (ou seja, percebendo a diferença entre um arranjo com um item e outro com dois). Pelo contrário, quando eles observam como um item é adicionado a ou- tro atrás de uma tela, eles esperam poder ver dois itens quando a tela é removida. Isso requer um certo nível de permanência do objeto e memória, mas também idéias rudi- mentares de adição. Eles devem inferir que um segundo objeto foi somado ao primeiro, sem realmente ver que isso foi feito (lembre-se de que a tela lhes bloqueava a visão). Essa linha de trabalho é interessante e sugere que mesmo bebês de 5 meses possuem mais co- nhecimento quantitativo (simbólico) do que o proposto por Piaget, embora não estabeleça 1. Objeto colocado 2. Tela levantada 3. Segundo objeto adicionado 4. Mão se retira vazia Resultado possível: Resultado impossível 5. A tela se abaixa , ... e revela 2 objetos 5. A tela se abaixa ... e revela apenas 1 objeto Figura 7.2 Seqüência de eventos para o resultado I + I = 2 (possível) e para o resultado I + I = I (impossível) da pesquisa de Wynn (1992). (De Bjorklund, 2000.) Será que bebês muito pequenos realmente acreditam que um objeto desaparecido deixa de existir? Renee Baillargeon (1987) duvida disso, e sua pesquisa ilustra um tema que tem sido repetido por muitos pesquisadores contemporâneos: bebês pe- quenos sabem muito mais sobre objetos do que Piaget imaginou que soubessem; de fato, é possível que nunca sejam totalmente ignorantes sobre a permanência de objetos. 0 truque para demonstrar o que bebês pequenos sabem é conduzir testes apropriados a seu nível de desenvolvimento. Infelizmente, bebês de 3 a 4 meses de vida possuem habilida- des motoras limitadas, assim, suas inabilidades para procurar objetos (testes de Piaget) dizem realmente muito pouco acerca de seu conhecimento sobre objetos. Baillargeon (1987; Baillargeon e De Voss, 1991) usou o pa- radigma da habituação/desabituação para avaliar o que bebês de 3 meses e meio a 4 meses e meio sabem sobre os objetos e suas propriedades. Baillargeon (1987) primeiro habituou cada criança a uma tela que se movia 180°, com seu lado plano voltado para a criança continuamente subindo em arco e se afastando do bebê (veja a parte (a) da figura). Uma vez habitua- dos a esse evento, os bebês viam um bloco de madeira colorido com o desenho da face de um palhaço no lugar da tela frouxa (na verdade, o bloco era uma ilusão criada por um espelho). Então, como vemos na figura, a tela era virada para produzir um evento possível (a tela deixaria de mover-se como se tivesse sido parada pelo bloco; veja parte (b) da figura) ou um evento impossível (a tela viraria 180° passando pelo bloco; veja parte (c) da figura). Baillargeon argumentou que, se os bebês pen- sassem que o bloco ainda existisse, mesmo quando encoberto pela tela, eles iriam olhar por mais tempo para a tela e se mos- trariam mais surpresos quando esta aparentasse passar atra- vés do bloco sólido (evento impossível) do que quando parasse no bloco (evento possível). E foi exatamente o que a maioria dos (a) Evento de habituação (b) Evento possível (c) Evento impossível Representações do estímulo de habituação e eventos possível e impossível mostradas para crianças na pesquisa de Baillargeon (1987). As crianças demonstraram grande interesse no evento "impossível", o que sugere que elas sabiam que o bloco continuava a existir e que a tela não deveria passar através deste. Com base em Baillargeon, 1987. bebês de 4 meses e meio e muitos de 3 meses e meio fizeram, demonstrando maior interesse pelo evento impossível. A performance dos bebês na condição de "evento impossí- vel" reflete não apenas um conhecimento sobre a permanência de objetos, como também o conhecimento de que objetos sólidos não podem passar através de outro. Elizabeth Spelke (1991; Spelke et ai., 1992) demonstrou de modo similar em uma série de experimentos que bebês de apenas 2meses e meio pos_suem o conhecimento de solidez e continuidade de objetos (o fato de que um objeto em movimento continua em seu cami- nho), e a mais recente pesquisa realizada por Baillargeon e cols. ilustrou a compreensão de bebês pequenos sobre apoio (um objeto deve estar apoiado ou cairá), colisões (um objeto atingido por outro se moverá) (Baillargeon et ai., 1995) e contenção (um objeto grande não cabe dentro de um menor) (Aguiar e Baillar- geon, 1998). Antes se pensava que déficits de memória também explica- vam erros AenãoB realizados por bebês de 8 a 12 meses. Mas hoje sabemos que bebês dessas idades possuem uma memória razoavelmente boa e ficam realmente muito surpresos se obje- tos escondidos aparecem não onde o tinham visto pela última vez (no ponto B) (Baillargeon e Graber, 1988). Assim, bebês entre 8 e 12 meses que cometem erros A e não B geralmente se lembrarão que o objeto foi escondido na nova localização B; o que lhes pode faltar é a habilidade de inibir a tendência a buscá-lo onde o encontraram anteriormente. De fato, Adele , Diamond (1985) afirma que algumas crianças que buscam ina- propriadamente por objetos escondidos no ponto A dificilmente olham totalmente para lá, como se percebessem que ali não é o lugar certo para procurar pelo objeto, mas simplesmente não: podem evitar de fazê-lo. Diamond (1985) testou 25 crianças na tarefa A e não B, iniciando por volta dos 7 meses e meio até os 12 meses. Ela descreveu que o atraso entre o esconder e buscar necessário para produzir o erro A não B aumentava com a idade em média dois segundos por mês. Ou seja, crianças de 7 meses e meio buscavam pelo objeto escondido no lugar errado (posição A) após dois segundos de espera. Aos 12 meses, as crianças erravam apenas se houvesse passado dez segundos entre o ato de esconder o objeto e o início da busca. Com base nesses é em outros dados, Diamond (1991,1995) acredita que as mudanças maturacionais no lobo frontal do córtex cerebral durante o segundo semestre de vida permitem as crianças a aquisição de maior controle sobre suas respostas motoras, lhes permitindo assim inibir um impulso para buscar objetos escondidos em lugares que sabem estar errados. E ela pode estar certa. Ao usar o método de potencial evocado, Martha Bell e Nathan Fox (1992) descobriram que crianças de 7 a 12 meses que evitavam cometer erros A e não B demonstra- vam maior atividade elétrica no lobo frontal enquanto realizavam a tarefa se comparadas a seus colegas de mesma idade que buscavam de forma menos apropriada. Apesar de termos considerado apenas parte das evidências, é claro que a confiança de Piaget nos procedimentos de busca ativa o levou a (1) subestimar o que bebês muito pequenos sabem sobre objetos e (2) interpretar erroneamente o porquê de os bebês realizarem o erro A e não B. • ; ••-. 228 que bebês nasçam sabendo noções básicas de aritmética ou que crianças deveriam ser capazes de aprender matemática complexa. "Teoria" das teorias: teorias de desenvol- vimento cognitivo que combinam o neonativis- mo ao construtivismo, propondo que o desen- volvimento progride por meio da geração, testagem e alteração das teorias que a criança constrói os mundos físico e social. Estágio pré-operacional: segundo estágio do de- senvolvimento cognitivo de Piaget, que dura dos 2 aos 7 anos, quando o pensamento da criança está em um nível simbóli- co, mas ainda sem o uso de operações cognitivas. Insight representacional: o conhecimento de que uma entidade pode se colocar (representar) algo além de si mesma. "Teoria" das Teorias. Existem outros teóricos que concordam que as crianças nascem com um conhecimento maior do que o proposto por Piaget, mas que também acreditam que, além dos estágios iniciais do desenvolvimento sensório-motor, a teoria construti- vista de Piaget é, em geral, próxima à verdade. Estes são os teóricos da "teoria", qUe combinam aspectos do neonativismo com o construtivismo de Piaget (Gopnik e Meltzoff 1997; Karmiloff-Smith, 1992). A idéia básica por trás da "teoria" das teorias é a de que os bebês nascem preparados para dar sentido a algumas classes de informação (sobre objetos e sons da fala, por exemplo), como os neonativistas propõem, mas que tal conhe- cimento inato é incompleto e requer experiências sólidas para que as crianças sejam ca- pazes de construir a realidade, tal como Piaget propôs. Os bebês fazem isso por meio da construção de idéias, ou "teorias", sobre como o mundo funciona, e então testam e modi- ficam suas teorias, como o fazem os cientistas, até que o modelo mental que possuem se assemelhe ao mundo tal qual é estruturado. Mudanças no desenvolvimento são similares àquelas descritas por Piaget. Segundo Alison Gopnik e Andrew Meltzoff (1997, p. 63), "podemos ver tipicamente um padrão no qual a criança se apoia em um conjunto par- ticular de predições e interpretações por algum tempo; a criança possui uma teoria particular. Então devemos esperar um período de desorganização, no qual a teoria entra em crise. E, finalmente, veremos uma nova, igualmente coerente e estável, teoria emer- gir". Isso é remanescente do conceito piagetiano de equilíbrio. Por que, então, os "teóricos" infantis de diferentes culturas constróem teorias muito semelhantes sobre a realidade física (e início da social) durante os 2 primeiros anos de vida? Os teóricos da "teoria" das teorias respondem salientando que todas as crianças começam a vida com o mesmo conhecimento inato. Então, elas constróem cedo teorias similares, pois possuem muitas experiências similares para se adaptarem, nas mesmas idades, durante os primeiros anos de vida. Resumindo A teoria de Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo infantil tem sido uma das mais in- fluentes propostas já feitas. Ela trouxe à tona fenômenos antes encobertos (por exemplo, a permanência de objetos) e gerou por volta de um século de pesquisas. Entretanto, tem- se tornado óbvio nas últimas décadas que novas teorias são necessárias para dar conta da tão rica habilidade cognitiva que as crianças têm demonstrado possuir. Ainda assim, à medida que novas pesquisas sé acumulam, também se tem tornado claro que não que- remos jogar fora Piaget juntamente com a água do banho do bebê. Muitas das idéias de Piaget, particularmente o construtivismo, têm demonstrado poder para ficar e têm sido incorporadas em novas teorias sobre o desenvolvimento infantil. 0 Estágio Pré-operacional (dos 2 aos 7 anos) Quando a criança entra no estágio pré-operacional de Piaget, vemos um drástico au- mento no uso de símbolos mentais (palavras e imagens) para representar os objetos e eventos que encontram. Basicamente, um símbolo é algo que representa alguma coisa, assim como a palavra "cachorro" representa um mamífero doméstico de quatro patas, de tamanho médio. Judy DeLoache (1987, 2000) referiu-se ao conhecimento que uma entidade pode representar de alguma outra coisa além de si mesma como um insight representacional. A evidência mais óbvia do uso simbólico, segundo Piaget, é a linguagem. Outros exemplos de uso simbólico em crianças pequenas são imitação diferidas, esboços, ima- gens mentais e jogos simbólicos (por exemplo, fazendo de conta que um sapato é um telefone ou alimentando uma boneca com cereal imaginário). Cada uma dessas formas de simbolismo encontra-se disponível para a maioria das crianças de 2 anos, embora a maneira como fazem uso desses símbolos melhore substancialmente nos próximos dez a 12 anos. Mas, apesar dessa nova força tão importante, as descrições de Piaget sobre a in- teligência pré-operacional enfocavam principalmente as limitações, ou deficiências, no pensamento da criança. De fato, ele denominou esse período "pré-operacional" porque acreditava que crianças em idade pré-escolar ainda não adquiriram os esquemas opera- cionais que lhes permitissem pensar logicamente. Piaget dividiu o período pré-operacional em dois subestágios: o período pré-concei- tual (dos2 aos 4 anos) e o período intuitivo (dos 4 aos 7 anos). O Período Pré-conceitual Emergência do Pensamento Simbólico. O período pré-conceitual é marcado pelo apa- recimento da função simbólica - a habilidade de fazer algo, como uma palavra ou objeto, significar ou representar alguma outra coisa. Essa transição da curiosidade de colocar a mão em tudo do bebê para uma criança em idade pré-escolar contemplativa e simbólica é realmente extraordinária. Considere, por exemplo, que pelo fato de as crianças de 2 e 3 anos poderem usar palavras e imagens para representar suas experiências, elas são agora mais capazes de reconstruir o passado e pensar sobre, ou mesmo comparar, objetos que não estejam mais presentes. E quanto, exatamente, a habilidade para construir símbolos mentais transforma o pensamento da criança? David Bjorklund (2000) responde pela ob- servação que, em média, uma criança de 3 anos na fase simbólica e um adulto de 21 anos possuem provavelmente maiores semelhanças intelectuais que uma criança de 3 anos e um bebê de 12 meses. Apesar de o pensamento de uma criança de 3 anos vir a mudar em muitas maneiras nos anos seguintes, é similar ao do adulto pelo fato de ambos, a criança em fase pré-escolar e o adulto, pensarem por meio da manipulação de símbolos mentais. A linguagem talvez seja a forma mais óbvia do simbolismo demonstrada por crian- ças pequenas. Embora a maioria das crianças pronuncia sua primeira palavra signifi- cativa ao final do primeiro ano, e não antes dos 18 meses - ponto em que demonstram outros sinais de simbolismo, tais como a experimentação interna - que se tornam capazes de combinar duas (ou mais) palavras para formar sentenças simples. Será que o uso da linguagem promove o desenvolvimento cognitivo? Piaget diz que não, argumentando em vez disso que a linguagem meramente reflete o que a criançada sabe e pouco contribui para o conhecimento. Em outras palavras, ele acreditava que o desenvolvimento cogniti- vo promovia o desenvolvimento da linguagem, e não o contrário (como veremos ao final do capítulo, Lev Vygotsky discorda firmemente de Piaget nesse ponto). A segunda principal marca característica do início do período pré-conceitual é o florescer do jogo simbólico (ou do faz-de-conta). Crianças freqüentemente imaginam ser outras pessoas (mães, super-heróis), e podem interpretar tais papéis tendo como suporte, por exemplo, uma caixa de sapatos ou uma vara que simbolize outros objetos relevantes, como um berço ou uma arma. Apesar de alguns pais ficarem preocupados quando seus filhos mergulham no mundo do faz-de-conta e começam a inventar amigos imaginá- rios, Piaget acreditava que tais atividades são basicamente saudáveis, um ..ponto .de vista mantido por muitos pesquisadores contemporâneos (Gleason et ai., 2000). No Quadro 7.2, focaremos rapidamente os jogos infantis e veremos como essas atividades do "faz- de-conta" podem contribuir positivamente para o desenvolvimento social, emocional e intelectual da criança. Novas Visões sobre o Simbolismo. A ênfase de Piaget na natureza simbólica do pensa- mento pré-operacional chamou a atenção dos desenvolvimentalistas. Judy DeLoache e cols., por exemplo, exploraram as habilidades de as crianças em idade pré-escolar usarem escalas de modelos e figuras como símbolos (DeLoache, 1987, 2000; Uttal et ai., 1995). Nos estudos de DeLoache, as crianças eram convidadas a encontrar um brinquedo es- condido em um quarto. Antes de buscarem o brinquedo, as crianças viam um modelo em Período pré-conceitual: subestágio inicial das pré-operações, dos 2 aos 4 anos, caracteri- zado pelo surgimento de idéias, conceitos, métodos e raciocínio primitivos. Função simbólica: habilidade de usar símbolos (por exemplo, imagens e palavras) para representar objetos e experiências. Jogo simbólico (ou do faz-de-conta): jogo no qual um objeto, ação ou ator simboliza ou representa outro. 230 Psicologia do Desenvolvimento • Editora Thomso Representação dual (decodificação dual; orientação dual): habilidade de representar simultaneamente um objeto em si e como a representação de algo mais. escala do quarto, com o pesquisador escondendo um brinquedo em miniatura (Snoopy) atrás da cadeira do modelo. O brinquedo em miniatura e a pequena cadeira simbolizavam um grande Snoopy e uma cadeira de verdade no quarto "real" ao lado. Pedia-se então que as crianças encontrassem o brinquedo no quarto real (Recuperação 1). Após procurar pelo brinquedo no quarto real elas retornavam ao modelo e eram convidadas a encontrar onde estava escondido o brinquedo em miniatura (Recuperação 2). Se a criança fosse incapaz de encontrar o brinquedo no quarto real (Recuperação 1), mas encontrasse a miniatura na escala modelo (Recuperação 2), a falha em encontrar o brinquedo grande não poderia ser atribuída ao esquecimento de onde a miniatura estava escondida. Uma interpretação melhor seria que a criança não possui a percepção representacional e não pode usar o modelo de modo simbólico para direcionar sua busca. Os resultados de tal pesquisa com crianças de 2 anos e meio a 3 anos encontram- se na Figura 7.3. Como vemos, as crianças de 3 anos realizaram com sucesso ambas as tarefas de recuperação, indicando que se lembravam de onde a miniatura do brinquedo estava escondida e usavam a informação do modelo em escala para encontrar o brinque- do grande no quarto real. As crianças de 2 anos e meio demonstraram boa memória em relação ao lugar em que o brinquedo em miniatura havia sido escondido (Recuperação 2 na figura), mas suas performances foram muito pobres quando tentaram encontrar o brinquedo grande no quarto real (Recuperação 1 na figura). Aparentemente, as crianças de 2 anos e meio falharam em reconhecer que o modelo em escala era uma representação simbólica do quarto maior. Não é que a criança de 2 anos e meio não possua a percepção representacional. Se é mostrada uma foto com o esconderijo do Snoopy no quarto real, a criança de 2 anos e meio (mas não a de 2 anos) poderá encontrar o brinquedo se for lhe dada a oportunidade. Por que elas se saem melhor com uma foto de duas dimensões do que com um modelo em escala tri- dimensional propriamente dito? DeLoache acredita que os modelos em escala são mais di- fíceis de ser usados como símbolos, pois às crianças de 2 anos e meio falta a representação dual - a habilidade de pensar acerca de um objeto de duas maneiras diferentes no mesmo momento. A representação dual não é necessária com fotos, pois o propósito primário de uma foto é representar outra coisa. Mas um modelo em escala é um objeto interessante em si mesmo, e uma criança de 2 anos e meio pode não reconhecer que isso é também uma representação do quarto maior. Se DeLoache estiver certa, então qualquer coisa que induza a criança pequena a prestar menos atenção ao modelo em escala como um objeto deveria persuadi-la a usar isso como um símbolo e assim melhorar sua busca pelo objeto escon- dido. De fato, DeLoache (1991, 2000) relata que crianças de 2 anos e meio que não foram autorizadas a brincar com o modelo em escala, mas apenas olharam para ele através de uma janela enfocaram menos as qualidades interessantes do modelo em escala, tratando-o mais como um símbolo que lhes ajuda a encontrar o brin- quedo escondido no quarto real. Apesar de a percepção representacional e de a habilida- de para a representação dual melhorarem consideravelmente entre os 2 anos e meio e os 3 anos, elas permanecem bastan- te cautelosas e são facilmente interrompidas. Considere, por exemplo, que quando as crianças de 3 anos deviam esperar cinco minutos após ver o objeto escondido no modelo em escala para iniciar sua busca, elas normalmente não conse- guiam obter sucesso em encontrar o brinquedo em uma sala grande. Não é que tenham esquecido onde estava escondido o brinquedo no modelo em escala. Em vez disso, elas não parecem se lembrar, após um intervalo de cinco minutos, que o modelo em escala é uma representaçãosimbólica do quarto real (Uttal et ai, 1995). Dessa forma, a representa- ção dual é bastante frágil em crianças de 3 anos, mas que melhora substancialmente durante os anos pré-escolares (DeLoache et ai, 1999; Marzolf e DeLoache, 1994). Figura 7.3 O número de recuperações com menor índice de erro (localizar corretamente o brinquedo escondido) para crian ças de 2 anos e meio (mais jovens) e de 3 anos (mais velhas) na tarefa modelo. A Recuperação I envolvia localizar o brinquedo real no quarto real; a Recuperação 2 envolvia a localização do brinquedo miniatura no modelo. (De DeLoache, 1987.) O brincar é uma atividade intrinsecamente satisfatória - algo que as crianças pequenas fazem por puro prazer (Rubin et ai., 1983). Em contraste com visões antigas de que as atividades de recreação da infância fossem uma frívola perda de tempo, Piaget (1951) era fascinado pelas brincadeiras das crianças pequenas. Ele acreditava que o brincar demonstrava um pouco da emergência dos esquemas cognitivos da criança em ação enquanto permitia aos jovens jogadores a prática e o fortaleci- mento de qualquer competência que eles possuíssem. O jogo sensório-motor tem início muito cedo e desenvol- ve-se de maneira parecida em todas as culturas (Pellegrini e Smith, 1998; Sigman e Sena, 1993). Os bebês evoluem do brincar com o próprio corpo (por exemplo, chupar o dedo) para a manipulação de objetos externos como chocalhos e animais de pelúcia, para jogos completamente funcionais - usando ob- jetos para servir a funções que têm um fim em si mesma -, que aparecem ao fim do primeiro ano de vida. Assim, uma criança de 12 meses agora está mais inclinada a apertar botões em um telefone de brinquedo do que meramente chupar ou bater no brinquedo. Talvez o avanço mais excitante nas atividades do brincar seja a emergência do jogo simbólico (ou do faz-de-conta), entre os 11 e 13 meses. Os primeiros episódios do "faz-de-conta" são bastante simples, nos quais a criança simula ocupar-se com as atividades familiares do dia-a-dia, como comer, beber ou dormir. Mas entre os 18 e 24 meses, os bebês evoluem ao ponto em que farão de conta diversos atos em uma seqüência significativa; também se tornam capazes de coordenar suas ações com as de um companheiro de jogos, realizando jogos sociais de imitação uns dos outros e algumas vezes até mesmo cooperando para alcançar um objetivo em comum (Brownell e Carriger, 1990; Howes e Matheson, 1992). Os pais podem estimular esse desenvolvimento provendo uma base segura de afeto e partici- pando junto com criança de seus pequenos dramas (0'Reilly e Bornstein, 1993; Slade, 1987). Ójjogojimbólicú floresce realmente durante o estágio pré- operacional de Piaget. Ao redor dos 2 anos, as crianças podem utilizar um objeto (um bloco) para simbolizar outro (um carro) e agora usam a linguagem de maneira inventiva para criar mundos ricos em fantasia para si mesmas. Elas claramente entendem o "faz-de-conta": se você lhe entrega uma toalha e sugere que limpe o chá imaginário que acabou de derrubar, ela o fará (Harris et ai., 1994). Pense nisso: já que não existe qualquer chá à vista, o desejo da criança em limpá-lo sugere queela pode construir uma representação mental do ato pretenso de outra pessoa e então agir segundo essa representação. O jogo de faz-de-conta torna-se cada vez mais social e complexo entre os 2 e 5 anos. Mais importante, a criança combina sua gradual capacidade para o jogo social e sua capacidade para entender o faz-de-conta para coordená-los no planejamento de suas brincadeiras de faz-de-conta: elas nomeiam e designam papéis que cada participante deve desempenhar, propõem roteiros e podem até mesmo parar de brincar para modificar o roteiro se necessário (Howes e Matheson, 1992). De fato, episódios de brincadeira estão entre as interações sociais mais complexas das crianças em idade pré-escolaf (Pellegrini, no prelo). O que há de bom na brincadeira? Intelectualmente, a brin- cadeira prove um contexto para o uso da linguagem para a comunicação e o uso da mente para a fantasia, planejamento de estratégias e resolução de problemas. As crianças freqüen- temente demonstram mais habilidades intelectuais avançadas durante os jogos de faz-de-conta que quando realizam outras ati- vidades, o que sugere que o brincar estimula o desenvolvimento cognitivo (Lillard, 1993). De fato, crianças em idade pré-escolar que se engajam bastante em jogos de faz-de-conta (ou que são treinadas para tanto) têm melhor desempenho nos testes de desenvolvimento cognitivo de Piaget, habilidades de linguagem e criatividade que outras crianças que brincam de "faz-de-conta" com menor freqüência (Fisher, 1992; Johnsen, 1991). Atividades pré-escolares de faz-de-conta também podem promover o desenvolvimento social. Para ter sucesso nas brincadeiras de faz-de-conta em grupo, a criança pode adotar diferentes papéis, coordenar atividades e resolver quaisquer disputas que possam aparecer. As crianças também podem aprender sobre e se preparar para funções adultas ao 'brin- car de casinha", ou "brincar de escola" e assim se colocando no lugar de suas mães, pais ou professoras (Gleason et ai., 2000; Pellegrini, no prelo). Talvez devido às habilidades sociais que adquirem (por exemplo, a habilidade para cooperar) e às experiências de troca de papéis que possuem, as crianças em idade pré-escolar que participam bastante em atividades so- ciais de faz-de-conta tendem a ser socialmente mais maduras e mais populares com seus pares que aqueles que normalmente brincam sozinhos (Connolly e Doyle, 1984; Howes e Matheson, 1992). E, finalmente, o brincar estimula o desenvolvimento emo- cional ao permitir às crianças a expressão de sentimentos que as incomodam ou a resolver conflitos emocionais (Fein, 1986). Se Jennie, por exemplo, levar bronca no almoço por não ter comido suas ervilhas, ela pode ganhar o controle da situação na brincadeira ao ralhar com sua boneca por ficar escolhendo a comida ou convencendo sua boneca a comer "de forma mais saudável" e consumir as ervilhas. De fato, resoluções lúdicas de tais conflitos emocionais podem ser um importante contribuinte para a compreensão das crianças sobre a autoridade e para ra- cionalizações que embasem todas as regras que devem seguir (Piaget elnhelder, 1969). Assim, que nunca seja dito que o brincar é uma atividade inútil. Apesar de a criança brincar para se divertir e não porque melhora suas habilidades, os companheiros que estão brincan- do indiretamente contribuem para o seu próprio desenvolvimen- to social, intelectual e emocional, enquanto se divertem. Dessa forma, o brincar é verdadeiramente o trabalho da criança - e é um negócio realmente sério! Animismo: atribuição de vida e qualidades de vida para objetos inanimados. Egocentrismo: tendência para ver o mundo de sua própria perspectiva ao mesmo tempo em que não reconhece que os outros podem ter pontos de vista diferentes. Diferença entre aparência e realidade: habilidade de manter em mente as propriedades ou características ver- dadeiras de um objeto mesmo que sua apa- rência tenha assumido- uma forma enganosa; freqüentemente ausente em crianças pequenas durante o período pré- conceitual. Déficits no Raciocínio Pré-conceitual. Piaget denominou as crianças entre 2 e 4 anos de "pré-conceituais" porque acreditava que as idéias, conceitos e processos cognitivos delas seriam bastante primitivos para os padrões de um adulto. Ele afirmava, por exemplo, que as crianças pequenas freqüentemente manifestam animismos - o desejo de atribuir vida e qualidades de vida (por exemplo, motivos e intenções) a objetos inanimados. A criança de 4 anos que acreditava que o pôr-do-sol acontecia porque o Sol estava vivo, bravo, e por isso se escondia atrás da montanha fornece-nos um claro exemplo da lógica animística que as crianças desempenham durante o período pré-conceitual. Segundo Piaget, a deficiência mais severa no pensamentodas crianças no período pré-conceitual - uma deficiência que em muito contribui para as demais limitações inte- lectuais que elas manifestam - é seu egocentrismo, a tendência de ver o mundo apenas da própria perspectiva e a dificuldade em reconhecer pontos de vista de outras pessoas. Piaget demonstrou isso ao, primeiro, familializar crianças com a cena de uma montanha assimétrica (Figura 7.4) e então perguntando a elas o que um observador veria se olhasse fixamente a cena a partir de uma posição estratégica diferente da sua. Na grande maio- ria das vezes, crianças de 3 a 4 anos afirmaram que a outra pessoa veria exatamente o mesmo que elas, falhando assim em considerar a diferente perspectiva do outro. Outros exemplos do pensamento autocentrado aparecem nas afirmações de crianças pequenas. A seguir há um exemplo de conversa em que o egocentrismo de uma menina de 4 anos de nome Sandy torna-se bastante evidente quando ela descreve um evento que desejava: Sandy: Tio David, ele subiu no seu carro e o arranhou. Adulto: Fez o quê? Sandy: Venha, vou lhe mostrar (ela leva o tio para fora e mostra um risco no capo do seu carro novo). Adulto: Sandy, quem fez este arranhão? Sandy: Eu não! Adulto: (rindo) Eu sei, Sandy, mas como o risco foi parar ali? Sandy: Ele subiu no carro e o arranhou com suas garras. Adulto: Fez o quê? Sandy: (olhando em volta) Ali! (ela aponta para um gato que caminha na rua). Adulto: Ah! 0 gato! Por que você não me disse isso logo? Sandy: Eu disse! Figura 7.4 O problema de três montanhas de Piaget. Crianças pequenas no estágio pré-operacional são egocêntricas. Elas têm dificuldades em supor a perspectiva de outra pessoa e na maior parte das vezes afirmam que a outra criança que está vendo a montanha de uma posição estratégica diferente vê exatamente o que elas vêem a partir de suas próprias localizações. Nesse caso, Sandy supôs que seu tio com- partilhava sua perspectiva e já deveria saber o que causou o risco no carro. Conseqüentemente, seu discurso não é adaptado para as necessidades do seu ouvinte, refletindo, em vez disso, o seu ponto de vista egocêntrico. Por fim, Piaget afirmou que o foco egocên- trico com que as crianças vêem as coisas torna quase impossível para elas diferenciarem aparên- cias enganosas da realidade. Considere o estudo clássico de Rheta DeVries (1969) sobre a dife- rença entre aparência e realidade. Crianças de 3 a 6 anos eram primeiramente apresentadas a um gato chamado Maynard. Após brincarem um pouco com o gato, DeVries escondia a cabeça e ombros de Maynard atrás de uma tela, enquanto colocava uma máscara da cara de um cachorro na cabeça de Maynard (Figura 7.5). A seguir as crianças eram questionadas sobre a identidade de Maynard com perguntas como "Que tipo de animal é ele agora?" e "Ele late ou mia?". Mesmo Cap. 7 Desenvolvimento Cognitivo: A Teoria de Piaget e a Visão Sociocultural de Vygotsky • David R. Shaffer 233 que a metade traseira e o rabo de Maynard estivessem completamente à vista durante toda a transformação, quase todas as crianças de 3 anos concentravam-se na nova aparência de Maynard e concluíram que ele realmente era um cachorro. Em contraste, as crianças de 6 anos foram capazes de diferenciar a aparência da realidade, notando corretamente que Maynard, agora, apenas se parecia a um cachorro. Por que as crianças de 3 anos falharam ao distinguir entre o visual enganoso de um objeto com sua identidade real? O problema delas, segundo John Flavell e cols. (1986), é que ainda não dominam a decodificctção ditai - a representação de um objeto em mais de uma maneira ao mesmo tempo. Assim como crianças pequenas têm dificuldade de representar um modelo em escala como um objeto e um símbolo (DeLoache, 2000), elas lutam para construir representações mentais simultâneas de um objeto que se assemelha a algo diferente do que realmente é. Para ilustrar, Flavell e cols. (1983, 1987, 1989) descobriram que crianças de 3 anos que viam uma esponja semelhante a uma pedra afirmavam que ela não apenas se pare- cia com uma pedra, mas que "real e verdadeiramente era uma pedra". A representação que possuíam da identidade do objeto estava baseada em sua singular e mais marcante característica - sua aparência enganosa. Ainda assim, quando crianças de 3 anos são persuadidas a brincar de enganar alguém (por exemplo, "Vamos enganar Sally e fazê-la pensar que essa esponja é realmente uma pedra, e não apenas uma esponja que se parece com uma pedra"), ou quando solicitadas a selecionar um objeto que poderia enxugar um líquido derramado, muitas delas são capazes de construir representações duais desse objeto como uma esponja (realidade) que apenas se parece a uma pedra (aparência) (Rice et ai., 1997; Sapp et ai., 2000). Não restam dúvidas de que atividades de jogos simbólicos, nas quais as crianças fazem de conta que objetos (como uma grande caixa de cartas) são outra coisa do que realmente são (por exemplo, um forte), consiste em um importante contribuinte para a representação dual e para o surgimento gradual de habilidades que distinguem aparências enganosas da realidade (Golomb e Galasso, 1995). Mas, como veremos na próxima parte, tais habilidades desenvolvem-se gradualmente durante o pe- ríodo pré-escolar. O Período Intuitivo Piaget denominou a fase entre 4 e 7 anos período intuitivo. O pensamento intuitivo é pouco mais que uma extensão do pensamento pré-conceitual, embora as crianças sejam menos egocêntricas e muito mais proficientes na classificação de objetos com base nos atributos perceptuais compartilhados como tamanho, forma e cor. O pensamento da criança é denominado "intuitivo" porque o seu entendimento sobre objetos e eventos Período intuitivo: último subestágio das pré-operações, dos 4 aos 7 anos, quando o pensa- mento da criança sobre eventos e objetos é domi- nado por características perceptuais salientes. Figura 7.5 Maynard, o gato, com e sem a máscara de cachorro. Crianças de 3 anos que conheceram Maynard antes de sua transformação na aparência, todavia, acreditaram assim mesmo que ele tivesse se transformado em cachorro. 234 Psicologia do Desenvolvimento • Editora Thoirtsn Centração: na teoria de Piaget, a tendência de crianças pré-operacionais de dar maior atenção a um aspecto de uma situação à exclusão de outros; contraste com a descentração. Conservação: o reconhecimento de que as propriedades de um objeto ou substância não se modificam quando sua aparência é alterada superficialmente. ainda está muito baseado, ou centrado, em sua característica perceptual mais saliente - o modo como as coisas parecem ser - em lugar de um processo de pensamento lógico e racional. O exemplo mais citado do raciocínio intuitivo infantil vem dos famosos estudos sobre a conservação de Piaget (Flavell, 1963). Um desses estudos inicia-se com a criança ajustando o volume de líquidos em dois potes iguais até que se diga que "ambos possuem a mesma quantidade de líquido". A seguir a criança vê o pesquisador colocar o líquido do pote longo e fino em outro largo e baixo. Ele então perguntou se ambos os potes possuem a mesma quantidade de líquido (veja a Figura 7.6 para uma ilustração do procedimento), i) As crianças menores de 6 ou 7 anos normalmente dizem que o pote longo e fino contém mais líquido que o largo e baixo. O pensamento da criança a respeito de líquidos é aparen- temente centrado em sua característica perceptual - a altura relativa das colunas (coluna longa = mais líquido). Na terminologia de Piaget, crianças no período pré-operacional são incapazes de atentar para a conservação: elas não percebem que algumas propriedades dos objetos (como volume, massa ou número) mantêm-se imutáveis mesmo quando as aparências desses objetos são alteradas de modo superficial. Por que crianças em idade pré-escolar falham em perceber a conservação? A respos- ta, segundo Piaget, é que essas crianças/»re-operacionais não possuem as duas operações Líquidos:Dois vidros idênticos encontram-se cheios no mesmo nivel, e a criança concorda que possuem a mesma quantidade de líquido. 0 conteúdo de um dos vidros é transferido para outro de diferente formato, de modo que as duas colunas de água estejam em alturas .diferentes. A criança capaz de reconhecer a conservação percebe que cada um dos frascos possui a mesma quantidade de liquido (normalmente, a conservação de líquido é adquirida entre os 6 e 7 anos). Massa (substância contínua): Números: Duas bolas idênticas de massinha são apresentadas. A criança concorda que possuem a mesma quantidade de massa. * ,. Uma das bolas é transformada em formato de salsicha. , A criança vê duas linhas de bolinhas e concorda que possuem o mesmo número. - Uma das linhas de bolinhas é "esticada" em comprimento. A criança capaz de reconhecer a conservação percebe que cada um dos objetos possui a mesma quantidade de massa (em média entre 6 e 7 anos). A criança reconhece que ambas as linhas possuem o mesmo número de bolinhas (em média, entre 6 e 7 anos). Volume (deslocamento de água): Duas bolas idênticas de argila são colocadas em vidros iguais que já foram calculados para ter a mesma quantidade de líquido. A criança vê o volume de água aumentar ao mesmo nivel em ambos os vidros. Uma das bolas de argila é retirada do vidro, moldada em um formato diferente e colocada sobre o vidro. Pergunta-se então à crianças se o nível de água diminuirá, aumentará ou se manterá o mesmo do outro vidro quando a argila for novamente colocada na água. A criança capaz de reconhecer a conservação perceberá que o nivel de água será o mesmo, porque nada a não ser o formato da argila foi alterado, ou seja, os pedaços de argila contêm a mesma quantidade de água (em média entre 9 e 12 anos). F i g u r a 7 .6 Alguns testes comuns sobre a habilidade infantil de conservação. cognitivas que lhes ajudarão a ir além do seu raciocínio intuitivo baseado na percepção. A primeira dessas operações é a descentração - a habilidade de se concentrar em mais de um aspecto de um problema ao mesmo tempo. As crianças no estágio intuitivo são in- capazes de prestar atenção simultaneamente tanto na largura quanto na altura ao tentar resolver o problema de conservação de líquidos. Elas centram sua atenção em qualquer uma das diferenças, na largura ou altura e tomam suas decisões pelas diferenças nessa dimensão particular. Conseqüentemente, falham em reconhecer que aumentos na lar- gura da coluna de líquidos compensam a perda em sua altura para preservar sua quan- tidade absoluta. Às crianças em idade pré-escolar também falta a reversibilidade - a habilidade de desfazer ou negar mentalmente uma ação. Assim, uma criança intuitiva de 5 anos diante do problema de conservação de líquido é incapaz de reverter mentalmente o que acabou de ver para concluir que o líquido no pote largo e baixo ainda é o mesmo e atingiria a altura anterior se colocado de volta no pote original. Piaget Subestimou a Criança no Estágio Pré-operacional? As crianças em idade pré-escolar são realmente intuitivas, ilógicas e egocêntricas tal como Piaget supôs? Pode uma criança que não entende de operações cognitivas aprender sobre a conservação? Vamos ver o que novas pesquisas nos têm a dizer. Novas Evidências sobre o Egocentrismo. Numerosas pesquisas indicam que Piaget subes- timou a habilidade de as crianças pré-escolares reconhecerem e apreciarem o ponto de vista de outras pessoas. Por exemplo, a tarefa das montanhas de Piaget e Inhelder tem sido cri- ticada como excepcionalmente difícil, e pesquisas mais recentes têm demonstrado que as crianças aparentam ser muito menos egocêntricas se apresentadas a imagens visuais menos complicadas (Gzesh e Surber, 1985; Newcombe e Huttenlocher, 1992). Por exemplo, John Flavell e cols. (1981) mostraram um cartão com um gato de um lado e um cachorro de outro a crianças de 3 anos. O cartão era então colocado verticalmente entre a criança (que podia ver o cachorro) e o pesquisador (que podia ver o gato) e a criança era questionada sobre qual animal o pesquisador poderia ver. As crianças de apenas 3 anos se saíram perfeitamente bem, indicando que podiam supor a perspectiva do pesquisador e inferir que ele deveria ver o gato em vez do animal que elas estavam vendo. Os estudos de Flavell investigaram a perspectiva perceptual tomada por crianças pe- quenas - ou seja, a habilidade de inferir corretamente sobre o que outra pessoa pode ver ou ouvir. Será que crianças pré-operacionais são capazes de tomar uma perspectiva conceituai por inferir corretamente sobre o pensamento ou sentimento de outra pessoa quando esses estados mentais se diferenciam dos seus? A resposta é um sonoro sim. Em um estudo (Haia e Chandler, 1996), solicitava-se a crianças de 3 anos para que pregassem uma peça em uma pessoa (Lisa), ao mover algumas bolachas do pote de bolachas para um lugar escondido, de modo que Lisa fosse enganada. Mais tarde ao serem perguntadas sobre onde Lisa procura- ria pelas bolachas e onde ela pensaria que as bolachas estavam, as crianças que ajudaram a planejar a peça se saíram bastante bem, afirmando que Lisa procuraria pelas bolachas no pote de bolachas. Em contraste, as crianças que meramente observaram o pesquisador planejar a peça não se saíram tão bem. Pelo contrário, elas estiveram mais propensas a responder erroneamente a essa tarefa de falsa crença, afirmando que Lisa procuraria pelas bolachas no lugar do novo esconderijo. Em outras palavras, quando planejavam enganar alguém, as crianças de 3 anos estavam aptas a tomar a perspectiva da outra pessoa. Quando não estavam ativamente envolvidas no engano, entretanto, elas atuavam egocentricamente, afirmando que a pessoa que não duvida de nada procuraria pelas bolachas onde ela sabia que estariam (veja também Carlson et ai., 1998). / É claro que a criança do estágio pré-operacional não é tão egocêntrica como Piaget imaginava. No entanto, Piaget estava correto ao afirmar que crianças pequenas normalmen- te se apoiam em suas próprias perspectivas e assim falham na realização de julgamentos corretos sobre os motivos, desejos e intenções de outras pessoas; e elas freqüentemente su- põem que, se sabem alguma coisa, os outros também o saberão/kuffman e Olson, 1989; Descentração: na teoria de Piaget, a habilidade da criança da fase pré-operacional concreta considerar múltiplos aspectos de uma situação ou estímu- lo; contraste com a centração. Reversibilidade: habilidade para inverter ou negar uma ação ao realizá-la mental- mente de modo oposto (negação). Treinamento de identidade: tentativa de promover o conceito de conservação em crianças pequenas ensinando-as a reco- nhecer que um objeto ou substância transformado é o mesmo objeto ou substância, apesar de sua aparência nova. Ruffman et ai., 1993). Hoje, os pesquisadores acreditam que as crianças se tornam gradual- mente menos egocêntricas e mais aptas a apreciar outros pontos de vista à medida que apren- dem mais, particularmente sobre outras pessoas e as causas de seus comportamentos. Em outras palavras, as habilidades de mudança de perspectiva não se encontram totalmente ausentes em um estágio para, de repente, surgir em outro; elas se desen- volvem vagarosamente e tornam-se mais refinadas desde a infância até a idade adulta (Bjorklund, 2000). Outro Olhar sobre o Raciocínio Causai Infantil. Piaget estava bastante correto ao afir- mar que a criança em idade pré-escolar é propensa a usar respostas animísticas a muitas questões e realizar erros lógicos quando pensa em relações de causa e efeito. Entretanto, Susan Gelman e Gail Gottfried (1996) descobriram que crianças de 3 anos não atribuem rotineiramente vida ou qualidades de vida a objetos inanimados, mesmo aqueles ina- nimados como um robô que podem se mover. E mais, a maior parte das crianças de 4 anos reconhece que plantas e animais crescem e se curam após um machucado,
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