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UNIVERSIDADE DE FORTALEZA Direito Penal I (PARTE GERAL) Período: 2013.1 Nota de Aula Prof. Antonio Sergio ERRO DE TIPO 1. CONCEITO DE ERRO DE TIPO: “é o que incide sobre as elementares ou circunstâncias da figura típica, sobre os pressupostos de fato de uma causa de justificação ou dados secundários da norma penal incriminadora” (Damásio). Para o professor Nucci, erro de tipo “é o erro que incide sobre os elementos objetivos do tipo penal, abrangendo qualificadoras, causas de aumento e agravantes”. OBS: 1. Erro (falsa noção da realidade ou falso conhecimento de determinado objeto) e ignorância (falta de representação da realidade ou o desconhecimento total do objeto) são tratados de forma idêntica pelo Código Penal, posto que ambos podem ensejar a aplicação do erro de tipo. 2. Há dois tipos de erro: o erro de tipo e o erro de proibição. No erro de tipo, a falsa percepção do agente recai sobre a realidade que o circunda; enquanto no erro de proibição, a pessoa tem plena noção da realidade que se passa ao seu redor, todavia seu equívoco recai sobre a compreensão acerca de uma regra de conduta, sobre a ilicitude do ato praticado. Este será mais bem estudado quando examinar o tema da culpabilidade. (Exemplo de erro de tipo: “A” subtrai coisa alheia, supondo-a própria). (Exemplo de erro de proibição: “A”, holandês, chegou ao Aeroporto de Guarulhos-SP, ocasião em que, publicamente, resolveu fumar maconha, posto que no seu país de origem (Holanda) não há proibição. Como no Brasil, tal conduta é crime, “A” agiu por erro de proibição, acreditando que sua conduta não seria criminosa). 2. ESPÉCIES DE ERRO DE TIPO: O erro de tipo pode ser: 3.1 Erro de tipo essencial: sempre exclui o dolo, pois retira do agente a capacidade de perceber que comete o crime. Subdivide-se em: a) erro de tipo incriminador (art. 20, caput, CP); e b) erro de tipo permissivo (art. 20, § 1º, CP). 3.2 Erro de tipo acidental: não beneficia o agente, justamente por não impedir o sujeito de se dar conta de que pratica o delito. É subdividido em: a) erro sobre o objeto material (art. 20, § 3º, CP); b) erro na execução (arts. 73 e 74, CP); e c) erro sobre o nexo causal 2 3. ERRO DE TIPO ESSENCIAL: “Dá-se quando a falsa noção da realidade retira do agente a capacidade de perceber que pratica determinado crime” (André Estefam). Este erro pode excluir o crime (Ex: o agente que, distraído, pega uma bicicleta alheia idêntica a sua) ou desclassificá-lo para outro (Ex: “A” ofende a honra de “B”, sem saber que “B” é funcionário público, não responde pelo crime de desacato, mas, sim, pelo crime de injúria). O erro de tipo essencial, como dito alhures, pode ser erro de tipo incriminador e erro de tipo permissivo. 3.1 Erro de tipo incriminador: “a falsa percepção da realidade incide sobre situação fática prevista como elementar ou circunstância de tipo penal incriminador” (André Estefam). 3.1.1 O objeto de incidência do erro de tipo incriminador: a) As elementares de um crime: elementares são os dados essenciais da figura típica, sem os quais não há crime, ou, ainda, cuja ausência provoca surgimento de outro delito (encontram-se no tipo fundamental). Quando o erro de tipo incide sobre uma elementar, o crime é excluído (Ex: “A” pega uma caneta alheia, pensando ser de sua propriedade) ou é desclassificado para outro tipo delitual (“A”, sem saber que seu comparsa “B” era funcionário público, não concorre para o crime de peculato, mas, sim, para o crime de apropriação indébita). b) As circunstâncias do crime: circunstâncias são dados acessórios da figura típica que, agregados ao tipo fundamental, agravam ou atenuam a pena. O erro incidente sobre a circunstância não exclui ou desclassifica o crime, apenas, tem o condão de afastar dita circunstância (Ex: ladrão furta objeto de pequeno valor, imaginando-o de grande valor. Responde pelo furto simples, sem direito à circunstância do privilégio que desconhecia; Agente mata um menor de 14 anos, pensando ser maior, dada a sua avantajada condição física. Não incide a circunstância majorante do § 4º do artigo 121 do CP, a qual era desconhecida). OBS: Segundo Luiz Flávio Gomes, “o efeito prático do erro de tipo, como se nota, depende do seu objeto concreto (ora exclui o tipo, ora o desclassifica, ora só afasta uma qualificadora ou uma causa de aumento ou uma agravante” ou ainda uma minorante). 3.1.2 O efeito do erro de tipo incriminador: quanto à intensidade, o erro essencial incriminador pode ser: a) Inevitável, ou invencível, ou escusável: ocorre quando, pelas circunstâncias concretas, qualquer pessoa de media prudência, na situação em que o agente se encontrava, incorreria no mesmo equívoco. (Ex: Um caçador atira contra um arbusto, matando uma pessoa que se fazia passar, de modo verossímil, por animal bravio). 3 b) Evitável, ou vencível ou inescusável: ocorre quando se verificar que uma pessoa de media prudência, na situação em que o agente se encontrava, não teria cometido o mesmo equívoco. (Ex: Um caçador, estando sem os seus óculos de grau, atira contra uma pessoa que está a quatro metros de distância, acreditando se tratar de um animal). O efeito do erro de tipo essencial incriminador é o seguinte: (1) Se for inevitável, invencível ou escusável: exclui o dolo e a culpa; (2) Se for evitável, vencível ou inescusável: exclui o dolo, mas permite a punição do agente por delito culposo, se previsto na lei. 3.2 Erro de tipo permissivo: “ocorre quando a falsa percepção da realidade recai sobre situação de fato descrita como requisito objetivo de uma excludente de ilicitude (tipo penal permissivo), ou, em outras palavras, quando o equívoco incide sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação” (André Estefam). O erro de tipo permissivo recai sobre situação de fato que, se existisse, tornaria sua ação legítima. Vejamos o seguinte exemplo (“A” observa que “B” faz a menção de colocar a mão no bolso, ocasião em que “A” labora em erro e pensa que “B” pegaria uma arma para agredi-lo, momento em que se antecipa e consegue atingir “B” com um disparo de arma de fogo). Observe que o agente errou no tocante a um dos requisitos da legítima defesa, a saber, a agressão atual ou iminente, posto que esta inexistia. 3.2.1 O efeito do erro de tipo permissivo: quanto à intensidade, o erro essencial permissivo tem o mesmo regramento do erro de tipo essencial incriminador, a saber: pode ser inevitável ou evitável. A consequência, também, é a mesma, ou seja: (1) Se o erro permissivo for inevitável: exclui o dolo e a culpa; e (2) Se o erro permissivo for evitável: exclui o dolo, mas pune-se o agente por crime culposo, caso haja previsão na lei. OBS: 1. Quando o agente opera em erro de tipo permissivo vencível ou evitável incorre na chamada CULPA IMPRÓPRIA, posto que, na verdade, há uma conduta dolosa praticada pelo agente, porém, a mesma é considerada, pela Lei, como crime culposo, caso haja previsão legal. 2. Embora a consequência do erro de tipo permissivo seja idêntica ao do erro de tipo incriminador, parte da doutrina discorda, por entender que o erro de tipo permissivo é um erro sui generis ou se trata de um verdadeiro erro de proibição indireto. Estudaremos melhor este assunto no tema “descriminantes putativas”. 4. DESCRIMINANTES PUTATIVAS: 4.1 Conceito: “descriminantes putativas são as excludentes de ilicitude que aparentam estar presente em uma determinada situação, quando, na realidade, não estão” (Nucci). Em outras palavras, as descriminantes putativas são as excludentes imaginárias da ilicitude. 4OBS: 1. Descriminantes: são as causas de exclusão da ilicitude. 2. Putativa: significa imaginário, suposto, aquilo que aparenta ser verdadeiro. 4.2 Espécies de Descriminantes Putativas: são três: a) Erro quanto aos pressupostos fáticos de uma causa de exclusão da ilicitude: é o caso do erro de tipo permissivo, onde, por exemplo, o agente pensar estar em situação de se defender, por imaginar uma iminente agressão (SUPÕE SITUAÇÃO DE FATO). b) Erro quanto à existência de uma causa excludente de ilicitude: configura um erro de proibição indireto, onde o agente se equivoca quanto à existência de uma excludente de ilicitude (Ex: o agente imagina erroneamente que é possível matar aquele que ofende sua honra; mulher pensa que pode fazer aborto por motivo social ou econômico). (SUPÕE ESTAR AUTORIZADO) c) Erro quanto aos limites de uma excludente de ilicitude: também configura um erro de proibição indireto, onde o agente, embora conhecedor da causa de exclusão da ilicitude, ultrapassa os limites permissivos. (Ex: o agente imagina erroneamente que é possível matar aquele que ofendeu sua honra – a legitima defesa da honra - é notório o excesso quanto ao limite imposto pela excludente). (SUPÕE ESTAR AUTORIZADO) 4.3 Natureza jurídica das Descriminantes Putativas: a) Em relação ao erro quanto à existência ou os limites de uma causa excludente de ilicitude: não há qualquer divergência doutrinária, posto que tais espécies configuram erro de proibição indireto tratado no artigo 21 do Código Penal. b) Em relação ao erro quanto aos pressupostos fáticos de uma causa de exclusão da ilicitude: a doutrina diverge sobre o assunto, existindo, portanto, três correntes doutrinárias, a saber: (1) Configura erro de tipo permissivo: posição majoritária na doutrina, a qual entende que o tratamento dado ao erro contido no artigo 20, § 1º, CP, é o mesmo dispensado ao erro de tipo essencial: se inevitável, exclui o dolo; se evitável, pune-se o agente pelo crime culposo, se previsto na lei. (2) Configura erro de proibição indireto: alega-se que o artigo 20, § 1º, CP, usa a expressão “é isento de pena”, a qual é associada a fatores que excluem a culpabilidade do agente, conforme art. 22, 26 e 28 CP. (3) Configura um erro sui generis: com base na mesma premissa supra, entendem que o erro disciplinado no artigo 20, § 1º, CP, não é de tipo (usa-se a expressão “isento de pena”) e nem de proibição (pois quando vencível permite a punição por crime culposo, se previsto 5 em lei). Daí, tratar-se de um erro sui generis, onde a consequência no caso da inevitabilidade do erro é a exclusão da culpabilidade; e quando o erro for evitável, a consequência é igual ao do erro de tipo essencial, a saber, pune-se o agente por crime culposo, se previsto na lei. 5. ERRO DE TIPO ACIDENTAL: incide sobre dados irrelevantes da figura típica. O erro acidental tem várias divisões, as quais são apresentadas em forma de síntese pelo Professor Luiz Flávio Gomes, nos seguintes termos: ”diz-se acidental o erro do agente que recai ou sobre o objeto material da infração (error in persona e error in objeto) ou sobre o seu modo de execução (aberratio ictus e aberractio criminis), ou sobre o nexo causal (aberratio causae ou dolo geral)”. Vejamos cada uma das modalidades: 5.1 Erro sobre o objeto material da infração: (1) Error in persona (erro sobre a pessoa) – art. 20, § 3º, CP: “o agente confunde a pessoa que queria atingir (vítima virtual ou visada) com pessoa diversa (vítima efetiva)” - (Cleber Masson). Esse erro é irrelevante (aplica-se a teoria da equivalência). O agente responderá pelo crime como se tivesse atingido a vítima visada ou virtual. (Ex: um filho pretende matar o próprio pai, mas confunde seu genitor com terceiro. A ele será imputado o crime de homicídio, agravado com a circunstância contida no art. 61, II, e, CP – crime contra ascendente). (2) Error in objeto (erro sobre o objeto): o agente se engana quanto ao objeto material do crime, quando este é uma coisa e não uma pessoa. Este erro é irrelevante. O agente responderá pelo crime. (Ex: o agente pretendia subtrair produtos importados, mas, por erro, acaba levando produtos nacionais). 5.2 Erro sobre a execução do crime: (1) Aberratio ictus (erro na execução, desvio na execução ou erro no golpe) – art. 73, CP: “o agente não confunde a pessoa que desejava atingir com outra, mas por aberração no ataque acaba por acerta pessoa diversa” (Cleber Masson). Esse erro é irrelevante (aplica-se a teoria da equivalência, onde a pessoa atingida se equivale à pessoa pretendida). O agente responderá pelo crime como se tivesse atingido a vítima visada ou virtual. (Ex: “A” pretende matar “B”, porém, ao efetuar o disparo de arma de fogo contra “B”, erra na execução, e, acidentalmente, acerta “C”). Há duas espécies: a) Com resultado único (art. 73, 1ª parte, CP): o agente atinge unicamente a pessoa diversa da desejada, embora estivesse no local a pessoa que pretendia atingir. Aplica-se a regra do art. 20, § 3º, CP, onde o agente responde como se tivesse atingindo a vítima desejada. Não se trata, portanto, de duplo crime: homicídio consumado 6 contra a vítima atingida, e tentativa de homicídio contra a vítima desejada. b) Com resultado duplo (art. 73, in fine, CP): o agente, além de atingir a vítima visada, atinge, também, pessoa ou pessoas diversas. Sua conduta gera dois resultados: o originariamente pretendido e o involuntário. (Ex: “A” atira em “B”, matando-o, mas, também, acaba, por imprudência (culpa), atingindo “C”, que se encontrava no lugar). Nessa hipótese, aplica-se a regra do concurso formal próprio ou perfeito (art. 70, caput, 1ª parte, CPB), onde o agente responde pelo crime mais grave praticado, aumentando-se a pena de 1/6 a 1/2. Observe que a produção do resultado não pretendido (contra terceiros) deve derivar da culpa, e não do dolo eventual, logo, se estiver presente o dolo eventual, aplica-se a regra do concurso formal impróprio ou imperfeito, somando-se as penas. OBS: A aberractio ictus difere do erro sobre a pessoa em dois aspectos: 1. No erro sobre a pessoa não há concordância entre a realidade do fato e a representação do agente (erro de representação); já na aberratio ictus não existe erro na representação, apenas, no momento da execução (erro de execução); 2. Na aberratio ictus, a pessoa visada pelo sujeito sofre perigo de dano, enquanto isso não ocorre no erro sobre pessoa. (2) Aberratio criminis (resultado diverso do pretendido) – art. 74, CP: “ocorre quando o acidente ou erro no emprego dos meios executórios faz com que se atinja um bem jurídico diferente do pretendido” (André Estefam). Observe que na aberratio ictus, a relação é de erro envolvendo pessoa- pessoa; na aberratio criminis, atinge-se bem jurídico diverso, numa relação coisa-pessoa. (Ex: “A” querendo danificar o veículo de “B”, arremessa uma pedra contra o mesmo, porém, acaba atingindo uma pessoa que passava no local, causando-lhe lesões corporais). Há duas espécies: a) Resultado único: é atingido somente o bem diverso. O agente responde por um único crime a título de culpa, se houver previsão legal. No exemplo acima, “A” responde pelo crime de lesão corporal culposa. b) Resultado duplo: são atingidos o bem visado e o bem diverso. Aplica-se a regra do concurso formal heterogêneo, com a pena do crime mais grave acrescida de 1/6 a 1/2. 5.3 Erro sobre o nexo causal: trata-se do chamado dolo geral já estudado anteriormente. 6. ERRO DETERMINADO POR TERCEIRO (Art. 20, § 2º, CP): temos visto o erro espontâneo. Agora, veremos o erro provocado. Este ocorrequando o agente é induzido a erro por conduta de terceiro. A provocação pode ser: dolosa e culposa. 7 a) Provocação Dolosa: “quando o erro é preordenado pelo terceiro, i.e., o terceiro conscientemente induz o sujeito a incidir em erro” (Damásio). Ex: “A” querendo matar “C”, entrega uma arma municiada a “B”, fazendo-o crer que se encontra descarregada e o induz a acionar o gatilho na direção de “C”, matando-o. Nesta situação: (1) O terceiro provocador (agente provocador) responde por homicídio doloso. (2) O agente provocado não responde pelo crime, se o erro for inevitável; contudo, se evitável, responde por homicídio culposo. b) Provocação Culposa: “quando o terceiro age com imprudência, negligência ou imperícia”. Ex: “A”, sem verificar se a arma estava municiada, entrega-a a “B”, afirmando que a arma está desmuniciada, induzindo-o a acionar o gatilho. “B”, sem verificar se a arma se encontra sem munição, aciona o gatilho e mata “C”. Nesta situação, tanto o agente provocador como o provocado respondem por homicídio culposo. OBS: Em resumo, temos as seguintes responsabilidades quanto ao agente provocador e o provocado: a) Posição do agente provocador: responde pelo crime a título de dolo ou culpa, de acordo com o elemento subjetivo do induzimento; b) Posição do agente provocado: tratando-se de erro inevitável, não responde pelo crime; se o erro for evitável, não responde pelo crime a título de dolo, porém, responderá pelo crime a título culposo, se previsto em lei. BONS ESTUDOS NOS LIVROS!
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