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A PROPRIEDADE A POSSE E OS EFEITOS DA FUNCAO SOCIAL

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ 
 
ANA CRISTINA KUSS CASTANHEIRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A PROPRIEDADE, A POSSE, E OS EFEITOS DA FUNÇÃO SOCIAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CURITIBA 
2014 
 
 
 ANA CRISTINA KUSS CASTANHEIRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A PROPRIEDADE, A POSSE, E OS EFEITOS DA FUNÇÃO SOCIAL 
 
 
 
Trabalho de Monografia apresentado ao Curso de 
Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da 
Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito 
parcial para a obtenção do grau de Bacharel em 
Direito. 
 
Orientador: Prof. Dr. Clayton Reis 
 
 
 
 
 
 
CURITIBA 
2014 
 
 
TERMO DE APROVAÇÃO 
 
ANA CRISTINA KUSS CASTANHEIRA 
 
A PROPRIEDADE, A POSSE, E OS EFEITOS DA FUNÇÃO SOCIAL 
 
Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenção do título de Bacharel no 
Curso de Bacharelado em Direito da Universidade Tuiuti do Paraná. 
 
 
Curitiba, _____ de _____________________ de 2014. 
 
 
Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
_____________________________________ 
Orientador: Prof. Dr. Clayton Reis 
 
 
 
_____________________________________ 
Prof. 
 
 
 
_____________________________________ 
Prof. 
 
 
___________________________________ 
Professor Doutor Eduardo de Oliveira Leite 
Coordenador do Núcleo de Monografias 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
 
Direito real é o complexo das normas reguladoras das relações jurídicas referente às 
coisas suscetíveis de apropriação pelo homem. O conceito de posse considera 
possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos 
poderes inerentes à propriedade. O conceito de propriedade abrange uma visão do 
homem sobre mundo, e também uma ideologia. Função Social, no direito, serve 
para exprimir a finalidade de um modelo jurídico, algo que precisa ser cumprido por 
determinada ordem jurídica. O presente estudo teve como objetivo definir a 
importância de um conceito correto de posse seja para a contraposição ante o direito 
de propriedade, quando evidenciado o mau uso, seja para garantir direitos inerentes 
à condição humana. Como o direito pode estabelecer uma nova forma se sociedade 
com os conceitos de posse e propriedade e suas implicações com a função social. 
Para tanto, realizou-se uma pesquisa bibliográfica contextualizando toda a história 
dos direitos reais, conceitos e teorias de posse, natureza jurídica da posse, noções 
históricas acerca da propriedade, função social da propriedade, restrições ao direito 
de propriedade e função social da posse. Conclui-se assim a imensa importância de 
não confundir a função social que o direito à propriedade deve englobar com a 
política social que o governo deve desenvolver para amenizar as desigualdades 
sociais existentes no País. Assim, estarão preservados os institutos do direito à 
propriedade e da soberania como assegurados pela Constituição Federal brasileira 
de 1988. 
 
 
Palavras-chave: Propriedade. Posse. Efeitos da função social. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 07 
CAPÍTULO 1 - AS TEORIAS DA PROPRIEDADE E DA POSSE ............................. 09 
1.1 Conceito, Caracteres Fundamentais, e Classificação dos Direitos Reais ........... 09 
1.2 Noções Históricas do Direito Real ....................................................................... 12 
1.3 Conceito e Teorias da Posse .............................................................................. 13 
1.4 A Natureza Jurídica da Posse ............................................................................. 18 
1.5 Noções Históricas acerca da Propriedade .......................................................... 21 
CAPÍTULO 2 - A PROPRIEDADE COMO PORTADORA DE FUNÇÃO SOCIAL ..... 24 
2.1 A Função Social da Propriedade ......................................................................... 24 
2.2 Restrições ao Direito de Propriedade .................................................................. 32 
2.2.1 Cláusula de Inalienabilidade ............................................................................. 33 
2.2.2 Cláusula de Incomunicabilidade ....................................................................... 35 
2.2.3 Cláusula de Impenhorabilidade ........................................................................ 35 
2.2.4 Súmulas e Leis de Convergência de Restrições Voluntárias ........................... 36 
2.2.5 Bens de Domínio Público ................................................................................. 36 
CAPÍTULO 3 - A FUNÇÃO SOCIAL DA POSSE E SUA MAIOR IMPORTÂNCIA 
ANTE A PROPRIEDADE .......................................................................................... 39 
3.1 A Importância da Propriedade no Contexto Social .............................................. 39 
3.2 O Estatuto da Cidade, em Face da Função Social da Propriedade .................... 39 
3.3 O Uso da Posse na Função Social da Propriedade ............................................ 41 
3.4 A Importância da Função Social da Propriedade em Face dos Tribunais ........... 43 
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 55 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 57 
 
 
7 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
Atualmente, é de imensa relevância o conhecimento dos conceitos, 
características e implicações legais da propriedade, da posse, bem como de sua 
função social. 
Sendo a propriedade a matriz dos direitos reais, a diversidade de 
concepções em torno do aludido instituto pode ser compreendida por meio de um 
escorço histórico, analisando-se a sua evolução através dos tempos e das fases 
mais importantes que contribuíram para a sua feição atual. Na história do direito não 
existe um conceito único de propriedade. Pode-se afirmar que a configuração do 
instituto da propriedade recebe direta e profundamente influência dos regimes 
políticos em cujos sistemas jurídicos é concebida. 
Este trabalho foi orientado com base no tema da propriedade e a posse 
como institutos jurídicos e as implicações da Função Social como limite 
constitucional. Delimitando a propriedade e a posse como institutos jurídicos 
podendo ser consideradas como um fato ou como um direito, levantamento das 
teorias existentes e as implicações da Função Social como limite constitucional 
estabelecido no nosso ordenamento jurídico. 
O presente tema foi escolhido, pois a propriedade apresenta função social 
delimitada constitucionalmente e pode-se considerar que também a posse deve 
obediência ao limitador constitucional? Como se delimita o interesse individual e o 
interesse coletivo? 
Justificando-se pelo fato de que no nosso país de extensão continental 
precisamos de políticas sociais, de distribuição de terras para o aperfeiçoamento da 
utilização da propriedade e do instituto da posse, para garantir o plantio, o trabalho e 
a moradia e o desenvolvimento no campo, como busca de uma diminuição das 
desigualdades sociais, contudo observa-se que o modelo econômico de nossa 
sociedade, que tem como pedra basilar a propriedade privada, e onde princípios 
como livre mercado e concorrência, livre contrato e do estado liberal imperam. 
Evidencia-se cada vez mais a importância de se ter um conceito correto 
de posse introduzido em qualquer sociedade. Seja para a contraposição ante o 
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direito de propriedade,quando evidenciado o mau uso, seja para garantir direitos 
inerentes à condição humana. 
Enquanto na propriedade a função social é um mero limitador ao modo de 
uso; na posse, a função social deve também funcionar como tal. 
Desta forma, o objetivo geral deste estudo foi definir a importância de um 
conceito correto de posse seja para a contraposição ante o direito de propriedade, 
quando evidenciado o mau uso, seja para garantir direitos inerentes à condição 
humana. Como o direito pode estabelecer uma nova forma de sociedade com os 
conceitos de posse e propriedade e suas implicações com a função social. 
Como objetivos específicos, têm-se: 
 Avaliar os conceitos de posse e propriedade, conforme doutrina 
dominadora; 
 Examinar bibliografia sobre Direito Civil e Agrário; e 
 Conflitos existentes sobre o tema. 
 
Visando atingir os objetivos propostos, este estudo está pautado em 
pesquisa bibliográfica, sendo classificada como qualitativa – exploratória. 
O presente estudo classificou-se como uma pesquisa qualitativa, que 
segundo Diehl, e Tatim (2004, p.52), 
Caracteriza-se por poder descrever a complexidade de determinado 
problema e a interação de certas variáveis, compreender e classificar os 
processos dinâmicos vividos por grupos sociais, contribuir no processo de 
mudança de dado grupo e possibilitar, em maior nível de profundidade, o 
entendimento de particularidades do comportamento do indivíduo. 
 
O presente estudo, segundo os autores acima citados, é uma pesquisa do 
tipo exploratória, pois tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o 
problema, e, freqüentemente envolve levantamento bibliográfico e estudos de caso. 
Assim, a pesquisa se classifica como pesquisa bibliográfica - sendo que o 
presente estudo iniciou-se desta forma - e foi construído com base em materiais já 
elaborados, em sua maioria livros e legislação específica. 
De acordo com Gil (2002, p. 45), ―a principal vantagem da pesquisa 
bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de 
fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente.‖ 
 
 
9 
 
CAPÍTULO 1 - AS TEORIAS DA PROPRIEDADE E DA POSSE 
 
 
1.1 Conceito, Caracteres Fundamentais, e Classificação dos Direitos Reais 
 
No Livro III do Código Civil de 2002, os direitos reais são entitulados de 
―Direito das Coisas‖, bem como no Código Civil de 1916, porém utiliza-se mais 
frequentemente, de acordo com o batismo de Savigny. 
 
Segundo Gonçalves (2012, p. 12), 
na concepção clássica o direito real consiste no poder jurídico, direto e 
imediato, do titular sobre a coisa, com exclusividade e contra todos. No pólo 
passivo incluem-se os membros da coletividade, pois todos devem abster-
se de qualquer atitude que possa turbar o direito do titular. No instante em 
que alguém viola esse dever, o sujeito passivo, que era indeterminado, 
torna-se determinado. 
 
Porém, de acordo com Farias e Rosenvald (2012), no ordenamento 
jurídico brasileiro, o direito real nunca se definiu por nenhuma titularidade com 
sentido dicionarizado. Alguns autores definem: 
Para Coelho e Sampaio era o seguinte: ―por Direitos Reaes entendemos 
todos os direitos, faculdades, possessões, que pertencem ao summo imperante, e 
como tal, e como representante da sociedade.‖ (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 
31) 
Já Clóvis Beviláqua apud Farias e Rosenvald (2012) conceitua os direitos 
reais como ―o complexo das normas reguladoras das relações jurídicas referente às 
coisas suscetíveis de apropriação pelo homem.‖ (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 
31) 
De acordo com Farias e Rosenvald (2012), é necessário que os direitos 
reais ultrapassem a noção de coisas corpóreas. Pois, o direito das coisas regula o 
poder do homem sobre bens suscetíveis de valor e a regulação da economia. 
Visando realizar clara distinção entre os direitos reais e os direitos 
pessoais, alguns autores listam alguns traços característicos dos direitos reais. 
 
 
10 
 
Segundo Lisboa (2012), as características fundamentais dos direitos reais 
são 5: 
 a incidência direta e imediata do titular sobre a coisa, sob todos os 
seus aspectos (domínio) ou em apenas alguns (direito real 
desmembrado de domínio); 
 a defesa dos direitos reais, por ações e pelo exercício do direito, 
com exclusividade e em oponibilidade erga omnes; 
 a inexistência de superposição de direitos colidentes; 
 o objeto dos direitos reais é ordinariamente uma coisa corpórea, 
seja ela móvel ou imóvel; 
 o poder que o titular exerce sobre a coisa independe de prestação 
do sujeito passivo da relação, que é a coletividade em geral, 
considerando-se que não há violação contra os direitos do titular da 
coisa enquanto subsistir realizada a prestação de não fazer, ou 
seja, somente se poderá falar em ofensa ao direito real quando 
houver uma conduta comissiva nesse sentido. 
 
Para Gonçalves (2012, p. 14-15) os principais caracteres do direito real 
são: segundo as normas de natureza cogente, de ordem pública. 
Quanto ao modo do seu exercício caracteriza-se pela efetivação direta, 
sem a intervenção de qualquer parte. Nessas condições, o direito real de 
propriedade é exercido direta e imediatamente pelo titular, sem necessidade de 
qualquer intermédio. (GONÇALVES, 2012) 
 Gomes apud Gonçalves (2012, p. 15) cita outros cinco caracteres 
distintivos do direito real: 
a) o objeto do direito real há de ser, necessariamente, uma coisa 
determinada, enquanto a prestação do devedor, objeto da obrigação que 
contraiu, pode ter por objeto coisa genérica, bastando que seja 
determinável; b) a violação de um direito real consiste sempre num fato 
positivo, o que não se verifica sempre com o direito pessoal; c) o direito real 
concede ao titular um gozo permanente porque tende à perpetuidade, ao 
passo que o direito pessoal é eminentemente transitório, pois se extingue 
no momento em que a obrigação correlata é cumprida; d) somente os 
direitos reais podem ser adquiridos por usucapião; e) o direito real só 
encontra um sujeito passivo concreto no momento em que é violado, pois, 
enquanto não há violação, dirige-se contra todos, em geral, e contra 
ninguém, em particular, enquanto o direito pessoal dirige-se, desde o seu 
nascimento, contra uma pessoa determinada, e somente contra ela. (Grifo 
do autor) 
 
11 
 
Já segundo Farias e Rosenvald (2012), os principais caracteres dos 
direitos reais são o absolutismo, seqüela, preferência, e a taxatividade, 
o absolutismo é o traço básico no qual a dogmática sempre se apegou para 
apartar os direitos reais dos direitos obrigacionais, tradicionalmente 
marcados pela relatividade. Os direitos reais são excludentes, pois todos se 
encontram vinculados a não perturbar o exercício do direito real – jura 
excludendi omnis alios. De fato, nas obrigações não há poder jurídico sobre 
um objeto oponível a toda a coletividade. Pelo contrário, somente surge 
uma faculdade jurídica de um credor exigir uma atuação positiva ou 
negativa do devedor, pautada em um comportamento. Tal atuação só 
poderá ser reclamada relativamente ao sujeito passivo da relação, não 
atingindo imediatamente terceiros estranhos ao vínculo. Se eventualmente, 
um terceiro intervir ilicitamente em um negócio jurídico, induzindo a relação 
obrigacional ao inadimplemento, a sua responsabilidade perante o credor 
será extracontratual. (FARIAS, ROSENVALD, 2012, p. 34) 
 
De acordo com Farias e Rosenvald (2012), o atributo da seqüela é a mais 
eloqüente manifestação da evidente situação de submissão do bem ao titular do 
direito real. Isto decorre do fato de não existir relação jurídica entre a pessoa e a 
coisa. O atributo da seqüela decorre do absolutismodos direitos reais, pois exigi-se 
de todos o dever de abstenção da coisa, deve-se retirar o bem daquele que viola tal 
comando. 
A característica da preferência, presente predominantemente nos direitos 
reais de garantia, ―consiste no privilégio do titular do direito real em obter o 
pagamento de um débito com o valor do bem aplicado exclusivamente à sua 
satisfação.‖ (FARIAS, ROSENVALD, 2012, p. 39) 
Desta forma, havendo mais de um credor a coisa dada em garantia é 
subtraída da execução coletiva, tendo o credor real preferência sobre os demais. 
A taxatividade segundo Farias e Rosenvald (2012, p. 41-42), 
destinando-se a operar contra toda a coletividade, não pode qualquer direito 
rela ser reconhecido juridicamente se não houver prévia norma que sobre 
ele o faça previsão. Portanto, inseridos em regime de ordem pública, os 
direitos reais são numerus clausus, de enumeração taxativa, localizados no 
rol pormenorizado do art. 1.225 do Cógigo Civil e em leis especiais diversas. 
 
Ainda segundo os mesmos autores, vale ressaltar que os direitos reais 
são considerados abertos, pois há um espaço no qual a autonomia privada pode se 
manifestar, desde que não exista a criação de figuras atípicas não previstas na 
legislação pertinente. 
Farias e Rosenvald (2012) discorrem também sobre a classificação dos 
direitos reais, onde compartimentam-se os mesmos em três grupos: direitos reais de 
gozo e fruição, direitos reais de garantia, e direitos reais de aquisição. 
12 
 
Onde, por direito real de gozo e fruição estão o usufruto, servidão, uso e 
habitação; nos direitos reais de garantia, penhor, hipoteca e anticrese; e nos direitos 
reais de aquisição a promessa de compra e venda. 
 
 
1.2 Noções Históricas do Direito Real 
 
O direito real constitui o ramo do direito mais influenciado pelo direito 
romano. Sendo que coube a este estabelecer a estrutura de propriedade. 
Segundo Gonçalves (2012, p. 9), 
o direito civil moderno edificou-se, com efeito, em matéria de propriedade, 
sobre as bases do aludido direito, que sofreu, todavia, importantes 
modificações no sistema feudal. A concepção da propriedade foi marcada, 
inicialmente, pelo aspecto nitidamente individualista. O sistema feudal, 
produto do enfraquecimento das raças conquistadas, introduziu no regime 
da propriedade do direito romano, no entanto, profundas alterações, 
―consequências naturais da necessidade de apoiar no solo a dominação dos 
senhores sobre as míseras populações escravizadas‖. 
 
O que iniciou o estabelecimento de concepções de propriedade neste 
período foi a constante dualidade de sujeitos, porém a disponibilidade real do bem 
sempre recaía aquele que detinha o poder político. Permanecendo assim durante 
todo o período do feudalismo. 
Com o advento da Revolução Francesa instalou-se nos sistemas 
jurídicos, uma noção de propriedade não somente semelhante, mas com 
características fiéis à tradição romana e aos princípios individualistas. A liberdade 
preconizada servia a burguesia, proporcionando desta forma segurança aos novos 
proprietários desta classe. Para tanto, era considerado legítimo até mesmo o abuso 
do direito de propriedade pelo proprietário. (GONÇALVES, 2012) 
Com o passar do tempo, porém esta concepção egoísta e individualista 
foi-se modificando, dando enfoque, mais frequentemente, à função social da 
propriedade, onde o Estado deve reconhecer a propriedade e defendê-la em função 
do bem comum, como se observa no art. 182, parágrafo 2º da Constituição Federal 
de 1988. A partir do século XX a socialização imperou e o predomínio do interesse 
público sobre o privado foi proclamado. (GONÇALVES, 2012) 
De acordo com o código civil de 2002, art. 1.228, parágrafo 1, 
o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas 
finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de 
13 
 
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as 
belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, 
bem como evitada a poluição do ar e das águas 
 
O código de Minas (Dec. N. 24.642, de 10-7-1934) e o Código de Águas 
(Dec. N. 24.643, de 10-7-1934), bem como as legislações posteriores e as 
Constituições Federais de 1969 e 1988 dispõe sobre o referido assunto. 
Ainda de acordo com Gonçalves (2012, p. 10-11), 
o exercício do direito de propriedade tem tido seu perfil modificado 
principalmente nas zonas mais densas, que são as urbanas. As 
modificações nesse campo visam a tornar possível a coexistência de um 
sem-número de proprietários em áreas relativamente pouco extensas, e, 
mais, acomodar o exercício de seus respectivos direitos à idéia da função 
que devem exercer. Nessa senda, o Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257, de 
10-7-2001) prevê e disciplina a usucapião coletiva, de inegável alcance 
social, de áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros 
quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia por 
cinco anos, onde não for possível identificar os terrenos ocupados 
individualmente. Não bastasse, o Código Civil de 2002 criou uma nova 
espécie de desapropriação, determinada pelo Poder Judiciário na hipótese 
de ―o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e 
de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e 
estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e 
serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante‖ 
(art. 1.228, § 4º). Nesse caso, ―o juiz fixará a justa indenização devida ao 
proprietário‖ (§ 5º). Trata-se de inovação de elevado alcance, inspirada no 
sentido social do direito de propriedade e também no novo conceito de 
posse, qualificada como posse-trabalho. Em poucas linhas se procurou, 
assim, dar uma rápida visão da feição atual do direito de propriedade e um 
panorama geral do direito das coisas na legislação brasileira. (Grifo do 
autor) 
 
 
 
1.3 Conceito e Teorias da Posse 
 
O conceito de posse remonta aos textos romanos que formularam o 
nosso direito pré-codificado, o Código Civil de 1916 e o Código civil de 2002, bem 
como as teorias estudadas. 
O conceito de posse, no direito positivo brasileiro, indiretamente nos é 
dado pelo art. 1.196 do Código Civil, ao considerar possuidor ―todo aquele que tem 
de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade‖. 
O art. 1.198 do mesmo diploma proclama: ―Considera-se detentor aquele 
que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em 
nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas‖. 
14 
 
Complementa o quadro o art. 1.208, prescrevendo: ―Não induzem posse 
os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição 
os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a 
clandestinidade‖. 
Para Gonçalves (2012, p. 35), 
o conceito de posse resulta da conjugação dos três dispositivos legais 
mencionados. O art. 485 do Código Civil de 1916, ao definir o possuidor, 
aludia aos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade. O vocábulo 
domínio tem caráter restritivo, pois é usado somente em relação às coisas 
corpóreas. Já a palavra propriedade abrange também as incorpóreas, 
podendo ser considerada como campo dos direitos sobre o patrimônio. 
Como a posse não se limita às corporales res, podendo o seu objeto 
consistir em qualquer bem, o Código Civil de 2002 suprimiu a expressão ―ao 
domínio‖, que a doutrina considerava ociosa, sem afastar do âmbito da 
posse qualquer espécie de bem. 
 
A Teoria Subjetiva ou clássica de Savigny foi criada em 1803 quando 
Friedrich Karl Von Savigny tinha apenas 24 anos. Em sua concepção, ―a posse seria 
o poder que a pessoa tem de dispormaterialmente de uma coisa, com intenção de 
tê-la para si e defendê-la contra a intervenção de outrem. (FARIAS E ROSENVALD, 
2012, p. 60) 
Segundo Lisboa (2012, p. 50), ―para Savigny, direito subjetivo é o poder 
de atuação da vontade de uma pessoa decorrente da autorização que lhe é 
conferida pela vontade geral, traduzida por meio do ordenamento jurídico.‖ 
Assim, a posse é considerada um fator regulador no direito subjetivo, 
manifestado pelo poder atuação da vontade, conforme norma jurídica emanada da 
vontade popular. (LISBOA, 2012) 
Dessa teoria retiramos um conceito de corpus e animus: Corpus: é o 
elemento material que se traduz no poder físico sobre a coisa ou na mera 
possibilidade de exercer esse contato. É à disposição do destino do objeto. Já 
o Animus consiste na intenção de exercer sobre a coisa o direito de propriedade. As 
duas trabalham em conjunto. Nessa teoria, para haver uma posse relevante para o 
direito, deve haver a parte material e a parte subjetiva. Segurar um objeto, sem 
ânimo de posse é meramente detenção. Ter a intenção, mas não ter o objeto é 
apenas vontade. (FARIAS E ROSENVALD, 2012) 
Assim, a posse só se configura pela união de corpus e animus; a posse é 
o poder imediato de dispor fisicamente do bem, defendendo-a contra agressões de 
15 
 
terceiros, a mera detenção não possibilita invocar interditos possessórios, devido 
ausência de animus. 
Critica-se na teoria subjetiva, a exacerbação do papel da autonomia da 
vontade pela incondicionada ligação de posse ao animus domini. Segundo 
Savigny, refletindo o ideário liberal e individualista vigente na época, a 
pessoa era o indivíduo abstrato que ocupava um dos pólos da relação 
jurídica, possuindo autodeterminação nas relações econômicas. Esta visão 
restrita e unitarista camufla o ser humano concreto, capaz de manifestar em 
uma pluralidade de relações possessórias, nas quais não releva o exame do 
animus domini, mas sim a proteção à moradia, ao trabalho e a defesa 
incondicional dos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa 
humana. (FARIAS E ROSENVALD, 2012, p. 61) 
 
O grande mérito de Savigny, ao criar esta teoria, foi o de dar autonomia a 
posse, por explicar que o use de bens adquire relevância jurídica fora do contexto de 
propriedade privada. 
Essa teoria foi de grande importância e influenciou profundamente nosso 
ordenamento, mas não é a teoria que acabou prevalecendo. Ela tem um problema 
fundamental: a necessidade de caracterização do animus (que é difícil e altamente 
subjetivo). Além disso, retira do conceito de possuidor pessoas como o locatário, 
comodatário, depositário (já que eles não têm animus de dono). 
Pois, segundo Gonçalves (2012, p 28-29), 
os dois citados elementos são indispensáveis, pois, se faltar o corpus, 
inexiste posse, e, se faltar o animus, não existe posse, mas mera detenção. 
A teoria se diz subjetiva em razão deste último elemento. Para Savigny 
adquire-se a posse quando, ao elemento material (poder físico sobre a 
coisa), vem juntar-se o elemento espiritual, anímico (intenção de tê-la como 
sua). Não constituem relações possessórias, portanto, na aludida teoria, 
―aquelas em que a pessoa tem a coisa em seu poder, ainda que 
juridicamente fundada (como na locação, no comodato, no penhor etc.), por 
lhe faltar a intenção de tê-la como dono (animus domini), o que dificulta 
sobremodo a defesa da situação jurídica‖. Nesse ponto a aludida teoria não 
encontrou sustentáculo. [...] Savigny procurou uma solução tangencial, 
criando uma terceira categoria além da posse e da mera detenção, a que 
denominou posse derivada, reconhecida na transferência dos direitos 
possessórios, e não do direito de propriedade, e aplicável ao credor 
pignoratício, ao precarista e ao depositário de coisa litigiosa, para que 
pudessem conservar a coisa que lhes fora confiada. Assim, ―contrariando a 
própria tese, isto é, admitindo a posse sem a intenção de dono, Savigny 
mostrou a fragilidade de seu pensamento, embora tenha procurado fazer a 
distinção entre o ânimo exigido para a posse e o ânimo do proprietário 
propriamente dito. No primeiro caso, o ânimo é mais que representação 
(animus repraesentandi). No outro, o arrendatário, o locatário e o 
usufrutuário estariam representando o arrendante, o locador ou o nu-
proprietário, situação, no entanto, diferente daquela que a realidade 
apresenta‖. Tanto o conceito do corpus como o do animus sofreram 
mutações na própria teoria subjetiva. O primeiro, inicialmente considerado 
simples contato físico com a coisa (é, por exemplo, a situação daquele que 
mora na casa ou conduz o seu automóvel), posteriormente passou a 
consistir na mera possibilidade de exercer esse contato, tendo sempre a 
coisa à sua disposição. Assim, não o perde o dono do veículo que entrou no 
16 
 
cinema e o deixou no estacionamento. Também a noção de animus evoluiu 
para abranger não apenas o domínio, senão também os direitos reais, 
sustentando-se ainda a possibilidade de posse sobre coisas incorpóreas. 
 
De acordo com Lisboa (2012, p. 50), ―a teoria voluntarista do direito 
subjetivo fixa-se, portanto, na idéia de poder. Somente se torna possível fazer algo 
que se quer realizar se a norma jurídica o autorizar.‖ 
Ainda de acordo com Lisboa (2012), para Sauvigny a posse não deve ser 
considerada apenas como a utilização física de uma coisa, mas um uso decorrente 
de um poder jurídico conferido pela lei à pessoa. 
Portanto, uma nova teoria precisava surgir: a Teoria Objetiva de Ihering. 
Segundo Lisboa (2012, p. 50), ―Ihering afirmou que o direito subjetivo não 
é à vontade ou o seu poder de atuação, mas sim o interesse que o ordenamento 
jurídico protege. O direito subjetivo seria, resumidamente, na sua visão, o interesse 
juridicamente protegido.‖ 
A teoria de Rudolf Von Ihering é por ele próprio denominada objetiva porque 
não empresta à intenção, ao animus, a importância que lhe confere a teoria 
subjetiva. Considera-o como já incluído no corpus e dá ênfase, na posse, ao 
seu caráter de exteriorização da propriedade. Para que a posse exista, 
basta o elemento objetivo, pois ela se revela na maneira como o proprietário 
age em face da coisa. (GONÇALVES, 2012, p. 29) 
 
Ele sustenta que esse elemento está ínsito no poder de fato exercido 
sobre a coisa ou bem. Essa teoria dispensa investigações subjetivas da intenção de 
dono. Isso foi importante, pois através dela começamos a poder considerar 
possuidores locatários, comodatários, depositários. 
―A teoria objetiva afirma que a detenção seria a posse sem interditos, 
enquanto a posse poderia ser defendida por meio dos interditos.‖ (LISBOA, 2012, p. 
52) 
Devido a isso, o fenômeno da detenção é desconsiderado juridicamente, 
e deve ser entendido que apenas em casos excepcionais previstos em lei é que se 
torna possível a defesa da posse por aquele que não a tem. (LISBOA, 2012) 
Para Ihering, portanto, a posse não é o poder físico, e sim a exteriorização 
da propriedade. Indague-se, diz o aludido jurista, como o proprietário 
costuma proceder com as suas coisas, e saber-se-á quando se deve admitir 
ou contestar a posse. Protege-se a posse, aduz, não certamente para dar 
ao possuidor a elevada satisfação de ter o poder físico sobre a coisa, mas 
para tornar possível o uso econômico da mesma em relação às suas 
necessidades. Partindo-se disto, tudo se torna claro. Não se guardam em 
móveis, em casa, os materiais de construção, não se depositam em pleno 
campo dinheiro, objetos preciosos etc. Cada qual sabe o que fazer com 
17 
 
estas coisas, segundo a sua diversidade, e este aspecto normal da relação 
do proprietário com a coisa constitui a posse. (GONÇALVES, 2012, p. 30) 
 
Essa teoria também trouxe a análise da finalidade econômica do bem e 
isso foiimportante. Com ela podemos identificar com mais clareza que é proprietário 
e quem é possuidor, já que o proprietário é aquele que pode usar ele mesmo do 
destino econômico do bem (utilização imediata ou real), ou então, cedê-lo, onerosa 
(locação, venda ou permuta) ou gratuitamente (comodato, doação). (FARIAS e 
ROSENVALD, 2012) 
Para Ihering ―o interesse jurídico movimenta a vontade. È o interesse da 
realização da destinação econômica da propriedade que justifica a proteção à 
posse. A posse só se converte em direito, por base no direito superior de 
propriedade.‖ (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 64) 
Assim, para essa escola: a posse é condição de fato da utilização 
econômica da propriedade, o direito de possuir faz parte do conteúdo do direito de 
propriedade, a posse é meio de proteção do domínio, e a posse é uma rota que 
conduz à propriedade, reconhecendo, assim, a posse como um direito. 
Segundo Lisboa (2012, p. 52), ‖a vantagem da teoria objetiva é a de se 
permitir a tutela da posse através dos interditos, deixando-se de lado: 
primeiramente, a discussão acerca da detenção; e, ainda, a questão da existência 
ou não do ânimo de ter a coisa como proprietário.‖ 
A lei brasileira adotou essa escola. De acordo com o Código Civil, art. 
1.196, ―Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou 
não, de algum dos poderes inerentes à propriedade‖. Podemos entender assim que 
se considera possuidor todo aquele que tem poder fático de ingerência 
socioeconômica, absoluto ou relativo, direto ou indireto, sobre determinado bem da 
vida, que se manifesta através do exercício ou possibilidade de exercício inerente à 
propriedade ou outro direito real suscetível de posse. 
O conceito de posse também deve ser encontrado em conjunto com 
esses dois seguintes artigos: 
Código Civil, art. 1.198, ―Considera-se detentor aquele que, achando-se 
em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em 
cumprimento de ordens ou instruções suas.‖ 
18 
 
Código Civil, art. 1.208, ―Não induzem posse os atos de mera permissão 
ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou 
clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.‖ 
Assim, pode-se afirmar que para haver posse (excluindo-se a detenção, 
permissão e tolerância): sujeito capaz (natural ou jurídica), objeto (corpórea ou 
incorpórea), uma relação de dominação entre o sujeito e o objeto, um ter da coisa 
por parte do sujeito. 
 
 
1.4 A Natureza Jurídica da Posse 
 
Apesar de não se debater muito sobre a natureza jurídica da propriedade, 
visto que esta é um direito real, o mesmo não pode ser dito sobre a posse. 
Segundo Gonçalves (2012, p. 43), 
é profunda e antiga a divergência sobre a natureza jurídica da posse. 
Cumpre defini-la e extremá-la, no entanto, não apenas em razão do 
interesse teórico-dogmático que desperta no âmbito do direito civil, senão 
também em consequência dos efeitos que gera no campo do direito 
processual. 
 
Para Farias e Rosenvald (2012, p. 67), 
a natureza da posse é uma das mais discutidas controvérsias que cercam a 
matéria, pela própria dificuldade em se abordar a posse de forma analítica. 
Compreender a sua natureza significa entender se a posse é protegida pelo 
ordenamento por seu próprio significado, ou como uma extensão da tutela 
da propriedade, ou mesmo, da necessidade do sistema evitar qualquer 
forma de violência e proteger a personalidade do ser humano. 
 
O primeiro caminho a trilhar no conhecimento da natureza jurídica da 
posse, é a indagação sobre a posse ser um fato ou um direito. Em algumas 
passagens do Corpus Iuris Civilis têm-se a idéia de direito subjetivo da posse, em 
outras se encontra a afirmação que a posse não é somente um fato, mas também 
um direito, e ainda há a caracterização exclusiva como fato, sendo negada 
expressamente a natureza do direito. (GONÇALVES, 2012, p. 43) 
Após a passagem de muitos séculos e a continuidade desta discussão, a 
doutrina é dividida em três correntes. 
De acordo com Fiuza (1999, p. 368) na primeira corrente, 
[...] posse é estado de fato, é situação fática, caracterizada pelo fato de um 
bem se achar submetido á vontade de uma pessoa (animus), agindo esta 
com aparência de dono em relação àquele (corpus). Dessa situação, 
19 
 
surgiriam direitos e deveres para o possuidor. Estes direitos e deveres são 
efeitos da posse, estado de fato. 
 
Gonçalves (2012) ressalta que para Ihering a posse é um direito, que 
consiste em um interesse juridicamente protegido, constituindo condição de 
econômica utilização da propriedade e por este fato deve ser protegida pelo direito. 
Possui também relação jurídica, tendo por causa determinante um fato. 
Ainda de acordo com o autor, segundo a teoria objetiva, a posse é um 
direito subjetivo. Pois o autor desta teoria ―via na posse um interesse juridicamente 
protegido. Em sua opinião, posse é direito do titular sobre a coisa. Logicamente, 
esse direito nasce de um fato. Mas a posse difere dos outros direitos reais.‖ (FIUZA, 
1999, p. 368) 
Já Gonçalves (2012) cita a segunda corrente afirmando que ela define 
posse como um fato, uma vez que não possui autonomia e não tem valor jurídico 
próprio. 
Fiuza (1999, p. 368) ainda ressalta uma terceira corrente encabeçada por 
Savigny: advoga ser a posse simultaneamente fato e direito. Num primeiro 
momento, a posse é estado de fato, como descrito acima. Ocorre que, dessa 
situação fática. 
Segundo Gonçalves (2012, p. 43), ―A corrente mais comum é a eclética, 
que admite que a posse seja fato e direito. Sustenta Savigny que a posse é, ao 
mesmo tempo, um fato e um direito. Considerada em si mesma, é um fato. 
Considerada nos efeitos que produz — a usucapião e os interditos —, é um direito.‖ 
Fiuza (1999) ainda enfatiza que para se compreender a natureza jurídica 
da posse é de extrema importância analisar a questão por etapas. Segundo o autor, 
a terceira corrente de pensamento é a mais racional, visto que, a posse seria um 
estado de fato, uma situação fática em um primeiro momento, e um direito subjetivo 
num segundo momento. 
Para Savigny a posse é um direito pessoal e obrigacional, para Ihering 
direito real. Porém, para outros doutrinadores a posse não se encaixa em nenhuma 
destas categorias, mas sim como direito especial, sui generis, por não ser possível 
encaixar perfeitamente em nenhuma destas categorias. (GONÇALVES, 2012) 
Assim, 
posse é estado de coisas, em que uma pessoa tem um bem em seu poder, 
ou seja, um bem se acha subordinado à esfera de atuação de uma pessoa. 
A essa situação, a esse estado de fato, denomina-se posse. Nele podemos 
20 
 
identificar dois elementos: um objetivo, material; o outro subjetivo, anímico. 
O elemento objetivo é a atitude externa, visível do possuidor para com a 
coisa. Traduz-se no exercício de direito pelo possuidor sobre a coisa, que 
pode ser usar, fruir, dispor ou reivindicar, dentre outros. É neste ponto que 
se diz, com razão, ser a posse a visibilidade do domínio. Além do corpus, 
caracteriza a situação fática chamada posse, um elemento subjetivo, 
interno, volitivo: é o animus, ou vontade de ter a coisa em seu poder, 
vontade de agir como age o dono, mesmo sem pretender sê-lo. Resumindo, 
pode-se dizer ser a posse estado de fato caracterizado por dois elementos: 
corpus e animus. Desse estado de fato, dessa situação fática nascem 
relações jurídicas, ditas relações possessórias. (FIUZA, 1999, p. 368-369) 
 
Vale ressaltar que dessa relação jurídica básica ―inerente à própria 
situação de posse, decorre apenas um direito real, o direito à proteção possessória. 
A este direito, corresponde uma obrigação real da partedos não-possuidores, qual 
seja não ameaçar, perturbar ou esbulhar o possuidor.‖ (FIUZA, 1999, p. 369) 
À situação básica podem agregar-se outros elementos, gerando outras 
relações jurídicas e outros direitos. 
Para compreender onde a posse se encaixa, direitos reais ou direitos 
pessoais, Gonçalves (2012) lista as diferenças substanciais entre os sujeitos e o 
objeto dos direitos reais e o dos direitos pessoais: 
 O objeto do direito real há de ser, necessariamente, uma coisa 
determinada, enquanto a prestação do devedor, objeto da obrigação que contraiu, 
pode ter por objeto coisa genérica, bastando que seja determinável. O objeto dos 
direitos reais é sempre a coisa corpórea, tangível e suscetível de apropriação, ao 
passo que o objeto dos direitos pessoais é sempre uma prestação. 
 o direito real só encontra um sujeito passivo concreto no momento em 
que é violado, pois, enquanto não há violação, dirige-se contra todos, em geral, e 
contra ninguém, em particular, enquanto o direito pessoal dirige-se, desde o seu 
nascimento, contra uma pessoa determinada, e somente contra ela. 
 
O código civil brasileiro, 1916 e 2002, tendo adotado o princípio numerus 
clausus, também não incluiu a posse no rol taxativo dos direitos reais, porém, este 
fato não é o bastante para justificar sua inserção como direito pessoal, uma vez que 
a doutrina brasileira reconhece a existência de outros direitos reais no mesmo 
diploma. 
21 
 
Porém, de acordo com Rios Gonçalves apud Gonçalves (2012) um forte 
argumento que retira da posse qualquer natureza real é a ausência de caráter 
absoluto dos direitos reais. 
No entanto, o fato de a posse não pertencer à categoria dos direitos reais 
não significa que, necessariamente, seja um direito pessoal. Consiste este, como 
visto em um vínculo jurídico que confere ao sujeito ativo o direito de exigir do sujeito 
passivo o cumprimento da prestação. (GONÇALVES, 2012, p. 45) 
Fiuza (1999) finaliza concluindo que em princípio, posse é um estado de 
fato, onde se caracteriza por dois elementos: corpus e animus. Caracterizando uma 
relação possessória básica, entre possuidor e não-possuidores, emergindo assim o 
direito real á proteção possessória. Ademais, agregando-se outros elementos ao 
estado básico da posse, podem surgir outras relações jurídicas de direito, podendo 
ser de caráter real ou creditício. Desta forma, quando se trata de direito de posse, 
refere-se ao conjunto de direitos subjetivos gerados pela situação fatídica de posse. 
 
 
1.5 Noções Históricas acerca da Propriedade 
 
De acordo com Farias e Rosenvald (2012, p. 256), a história do 
pertencimento e das relações jurídicas sobre coisas é necessariamente marcada por 
uma profunda descontinuidade; a propriedade moderna é um produto histórico, já 
que a propriedade é, sobretudo, mentalidade. 
Não se pode resumir propriedade a forma ou conceito, mas sim a uma 
ordem substancial, pois se liga a uma visão do homem sobre mundo, e também a 
uma ideologia. 
Desde os primórdios da humanidade o indivíduo sempre procurou 
satisfazer suas necessidades por intermédio da apropriação de bens. (FARIAS e 
ROSENVALD, 2012) 
A idéia de propriedade privada, em Roma ou nas cidades gregas da 
antigüidade, sempre foi intimamente ligada à religião, à adoração do deus-lar, que 
tomava posse de um solo e não podia ser, desde então, desalojado. A casa, o 
campo que a circundava e a sepultura nela localizada eram bens próprios de uma 
gens ou de uma família, no sentido mais íntimo, ou seja, como algo ligado aos laços 
de sangue que unem um grupo humano. Na civilização greco-romana, a propriedade 
22 
 
privada – assim como a família e a religião doméstica – faziam parte da constituição 
social, da organização institucional da sociedade, que não podia, em hipótese 
alguma, ser alterada, quer por deliberação popular, quer por decisão dos 
governantes. 
De acordo com Farias e Rosenvald (2012, p. 257), 
a relação entre propriedade e liberdade coincide com o surgimento do 
Estado, que protege a propriedade como um direito, da mesma forma que 
tutela o indivíduo contra o arbítrio do estado. Sempre que o Estado 
reivindica para si recursos produtivos, os indivíduos ou famílias não afirmam 
sua liberdade, pois se tornam completamente dependente do poder 
soberano. 
 
Então, a civilização burguesa estabeleceu a nítida separação entre o 
Estado e a sociedade civil, entre o homem privado, como indivíduo e o cidadão, 
como sujeito da sociedade política. Nesse esquema, a propriedade foi colocada 
inteiramente no campo do direito privado, e essa foi o alvo preferido da crítica 
socialista. 
No curso do século XVIII, essa justificativa da subsistência individual e 
familiar transformou-se na garantia fundamental da liberdade do cidadão contra as 
imposições do Poder Público. Cuidou-se de resguardar a esfera pessoal de cada 
indivíduo contra as intrusões de outrem, não mais pela religião, mas pelo direito 
natural, ou pela idéia de contrato social. Sob esse aspecto de garantia da liberdade 
individual, a propriedade passou a ser protegida, constitucionalmente, em sua dupla 
natureza de direito subjetivo e de instituto jurídico. Não se trata, apenas, de 
reconhecer o direito individual dos proprietários, garantindo-os contra as investidas 
dos demais sujeitos privados ou do próprio Estado. Cuida-se, também, de evitar que 
o legislador venha a suprimir o instituto, ou a desfigurá-lo completamente, em seu 
conteúdo essencial. É o que a elaboração teórica da doutrina alemã denominou uma 
garantia institucional da pessoa humana. (FARIAS e ROSENVALD, 2012) 
A evolução sócio-econômica ocorrida a partir de fins do século passado 
veio, porém, alterar o objeto dessa garantia constitucional. Doravante, a proteção da 
liberdade econômica individual e do direito à subsistência já não dependem, 
unicamente, da propriedade de bens materiais, segundo o esquema do ius in re, 
mas abarcam outros bens de valor patrimonial, tangíveis ou intangíveis, ainda que 
não objeto de um direito real. O reconhecimento constitucional da propriedade como 
direito humano liga-se, pois, essencialmente à sua função de proteção pessoal. 
23 
 
Segundo os mesmos autores, 
o Código Civil de 1916, filho tardio do liberalismo o fruto de uma concepção 
oitocentista – conferiu prevalência às situações patrimoniais, que espelham 
resquícios de um sistema liberal, cujos protagonistas eram o proprietário, o 
contratante e o marido. Por intermédio do absolutismo da propriedade e da 
liberdade de contratar, seria permitido o acúmulo de riquezas e a 
estabilidade do cenário econômico, preservando-se ainda a tranqüila 
passagem do patrimônio de pai aos filhos legítimos, no contexto de uma 
família essencialmente padronizada. (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 
260) 
 
Daí decorre, em estrita lógica, a conclusão – quase nunca sublinhada em 
doutrina – de que nem toda propriedade privada há de ser considerada direito 
fundamental e como tal protegida. Algumas vezes, o Direito positivo designa 
claramente determinada espécie de propriedade como direito fundamental, ligado 
diretamente aos nascidos de mulher (segundo os italianos), atribuindo-lhe especial 
proteção. (FARIAS e ROSENVALD, 2012) 
Escusa insistir no fato de que os direitos fundamentais protegem a 
dignidade da pessoa humana e representam a contraposição da justiça ao poder, 
em qualquer de suas espécies. Quando a propriedade não se apresenta, 
concretamente, como uma garantia da liberdade humana, mas, bem ao contrário, 
serve de instrumento ao exercício de poder sobre outrem, seria rematado absurdo 
que se lhe reconhecesse o estatuto de direito humano, com todas as garantias 
inerentes a essa condição,notadamente a de uma indenização reforçada na 
hipótese de desapropriação. 
Ainda de acordo com Farias e Rosenvald (2012), no novo Código Civil, 
art. 1.228, é reproduzida a idéia mestra de propriedade. 
É preciso, enfim, reconhecer que a propriedade-poder, sobre não ter a 
natureza de direito humano, pode ser uma fonte de deveres fundamentais, ou seja, o 
lado passivo de direitos humanos alheios. 
 
 
 
 
 
 
 
 
24 
 
 
 
CAPÍTULO 2 - A PROPRIEDADE COMO PORTADORA DE FUNÇÃO SOCIAL 
 
 
2.1 A Função Social da Propriedade 
 
Função Social vem do latim functio, onde o significado é de cumprir algo 
ou realizar uma atividade ou dever de fundo social / coletivo. 
De acordo com Farias e Rosenvald (2012) esse termo, no direito, serve 
para exprimir a finalidade de um modelo jurídico. Pode-se dizer que a função social 
no direito nos remete a algo que precisa ser cumprido por determinada ordem 
jurídica. Deve-se considerar função social da propriedade as medidas que 
contribuem para o bom uso das terras. Sem estes controles, por exemplo, uma 
possível Reforma Agrária seria inviável, já que parte-se do pressuposto de divisão 
de terras igualmente, já prevista no inciso XXII do art. 5º da Lei Maior. Esta prevê a 
propriedade como garantia inviolável do individuo, isto é, garantia fundamental, 
declarada neste como ―é garantido do direito da propriedade‖, e, por conseguinte, ―a 
propriedade atenderá sua função social‖. Vale lembrar que a exigência da função 
social não está ligada como artifício ao comunismo ou socialismo, já que ela é uma 
ferramenta capitalista que preserva o direito da propriedade. Não é a função social 
que vai garantir uma Reforma Agrária, mas sim auxiliar na mesma trazendo 
civilidade e bem básico aos seres. 
A regulação remete ao início da evolução do capitalismo onde o ser 
apenas se apropriava da terra sem pensar no coletivo. Este pensamento chegou ao 
século XX retirando toda e qualquer esperança de boa parte da população, pois com 
o seu direito a propriedade ferido, retira-se a dignidade de muitos em prol do poderio 
de poucos. 
Para Farias e Rosenvald (2012, p. 306) ―a liberdade de uns poucos 
importa opressão de uma massa de pessoas, privadas de acesso a bens mínimos e 
excluídas até de sua especial dignidade.‖ 
Segundo Farias e Rosenvald (2012) ―este cenário mostra uma profunda 
decepção, mostrando assim a fragilidade do ser humano. O racionalismo previa a 
inteligência humana que produzia a liberdade, mas sem enxergar o outro.‖ 
25 
 
Estes fatos contribuíram para o desenvolvimento de constituições mais 
condizentes com a vida em sociedade. 
Farias e Rosenvald (2012, p. 306) citam que: 
As feridas produzidas na humanidade ao longo do século passado 
repercutiram nas Constituições forjadas nos últimos 50 anos. O 
compromisso com a tutela da dignidade da pessoa humana e o princípio da 
solidariedade, acarretou a valorização dos direitos da personalidade e na 
consequente submissão a esta de todas as relações patrimoniais. 
 
A Constituição Federal de 1988 mostra a grande mudança do isolamento 
do indivíduo para um ser solidário e vivendo em sociedade e enxergando limites na 
sua liberdade em decorrência do limite do outro. 
Mesmo com a importância de regulação das propriedades feita pelas leis 
pode-se entender que ainda há um caminho muito grande a se percorrer com 
relação à função social nas propriedades. Isso se deve ao fato de que o capitalismo 
gera competição e naturalmente existem vitoriosos e derrotados. A vitória faz com 
que se exerça o direito sobre o prêmio e quanto mais se ganha logo se quer mais. 
Este comportamento é inerente ao ser humano e por isso quando se determina algo 
como privado de alguém se deturpa totalmente o sentido de igualdade social, isto é 
função social. 
Segundo Farias e Rosenvald (2012, p. 308), 
A função social é um princípio que opera um corte vertical em todo o 
sistema de direito privado. Ela se insere na própria estrutura de qualquer 
direito subjetivo para justificar a razão pela qual ele serve e qual papel 
desempenha. 
 
Percebe-se, portanto uma separação entre tudo o que é privado 
(capitalismo) do que é igualitário (social). 
A premissa de igualdade social deve estar intrínseca ao direito, pois todos 
somos iguais perante a lei, porém o individualismo e as decisões com pensamentos 
para benefícios de causas próprias acabam por deturpar e distorcer essa essência. 
Ainda com relação a este aspecto individualista do direito, 
é até mesmo redundante indagar acerca de uma função social do direito, 
pois pela própria natureza das coisas qualquer direito subjetivo deveria ser 
direcionado ao princípio da justiça e bem-estar social. Porém, o 
individualismo exacerbado dos dois últimos séculos deturpou de forma tão 
intensa o sentido do que é direito subjetivo, que foi necessária a inserção do 
princípio da função social nos ordenamentos contemporâneos para o 
resgate de um valor deliberadamente camuflado pela ideologia dominante. 
(FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 308) 
 
26 
 
A inserção da função social nas decisões faz com que se regulem itens 
que são inerentes dos direitos dos seres humanos como a propriedade. Esta 
vertente garante aos cidadãos direitos para o bom andamento da sociedade e evite 
o controle desta por poucos. 
Logo, segundo Farias e Rosenvald (2012, p. 308) ―em uma sociedade 
solidária, todo e qualquer direito subjetivo é funcionalizado para o atendimento de 
objetivos maiores do ordenamento.‖ 
Esta afirmação leva ao entendimento de que toda e qualquer decisão 
deve ser remetida, primeiramente, ao bem social e depois sim ao que seja benéfico 
aos agentes diretos do processo, vai também a via contrária ao início da era liberal 
em que se priorizava o poder absoluto sobre a terra. 
Farias e Rosenvald (2012, p. 310) ressaltam que ―nos primórdios da era 
liberal, a postura absolutista da propriedade se justificava como uma conquista 
igualitária, pelo próprio histórico de restrição da monarquia ao acesso da maior parte 
da população à propriedade.‖ 
Essa igualdade pregada, no período citado acima, mostra que as 
propriedades eram de direito apenas de parte da sociedade. Este regime 
(absolutista) era utilizado apenas como forma de excluir parte da sociedade 
No entanto, com o tempo, tamanho absolutismo se converteu em mero 
instrumento de exclusão social. É notório que quem possui direito subjetivo 
absoluto sobre uma propriedade também pode optar por não usá-la não 
fruí-la e não dispô-la, submetendo-a ao ócio e à paralisia. (FARIAS e 
ROSENVALD, 2012, p. 310) 
 
O termo propriedade nos remete a algo que pertence a alguma pessoa ou 
entidade que possa usufruir desta. Porém propriedade possui seus limites mesmo 
para seus donos. 
Existem hoje leis rigorosas quanto ao uso da terra por parte de quem as 
detém. Segundo Neves (2013) no texto: ―O fim do direito absoluto à propriedade‖ as 
alterações nessas regras do uso da propriedade quanto ao exercício são 
aproximadamente de 30 anos atrás, com o advento da constituição de 1988 e o 
parágrafo 2º do artigo 1228 do código civil. 
 
Estas alterações se deram num passado relativamente recente, 
aproximadamente nos últimos 30 anos, e vem sendo solidificadas. Isto se 
afirma com base nas novas idéias disseminadas com maior rigor após o 
advento da Constituição de 1988, com a valorização dos direitos sociais e 
do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por exemplo, na 
área do Direito Imobiliário o uso responsável da propriedade com o 
27 
 
cumprimento, por parte do proprietário, da função social atribuída a terra. 
(NEVES, 2013, p. 1) 
 
Este controle é antigo, vindo desde o séculoXIX na França quando se 
verificou um abuso no uso do direito subjetivo a propriedade, muito antes do 
conceito de função social. Verificou-se que não se deve utilizar a propriedade de 
forma nociva ao próximo, dando-se o nome de atos emulativos, que remetem a 
intenção de prejudicar outros. 
A partir do final do século XIX, surgiram em França as primeiras restrições 
ao absolutismo do direito da propriedade, por intermédio da teoria do abuso 
do direito. Lembramos dois casos paradigmáticos: a) proprietário que edifica 
uma enorme chaminé apenas com a finalidade de emanar gases no terreno 
vizinho; b) proprietário que levanta alto muro com hastes de ferro, tão-
somente para causar danos aos dirigíveis que partiam do prédio contiguo. 
Nas duas hipóteses, as cortes francesas entenderam que o direito de 
propriedade não poderia ser utilizado com o propósito de causar danos a 
terceiros, sem o intuito de produzir qualquer proveito ao seu titular. (FARIAS 
e ROSENVALD, 2012, p. 311) 
 
O uso da propriedade é controlado porque os proprietários precisam 
utilizar suas terras de maneira adequada com o meio ambiente e socialmente 
condizentes. Estas normas visam uma melhor distribuição da terra, contribuindo 
assim para o Direito da Propriedade, de todo cidadão. Além de melhorar a utilização 
de terras para que poucos não tenham muito e muitos não tenham tão pouco. 
Leno Streck apud Farias e Rosenvald (2012, p. 332) diz que ―milhões de 
sem-terra, como andarilhos medievais, vaga pelos campos à procura de um lugar 
para plantar, em um país em que 2% da população possuem mais de 50% das 
propriedades rurais.‖ 
Para Farias e Rosenvald (2012, p. 312), ―em termos concretos, haverá 
função social da propriedade quando o Estado delimitar marcos regulatórios 
institucionais que tutelem a livre iniciativa, legitimando-há ao mesmo tempo.‖ 
Ainda de acordo com Farias e Rosenvald (2012, p. 320), ―quando uma 
atividade econômica concede, simultaneamente, retorno individual em termos de 
rendimentos e retorno social, pelos ganhos coletivos da atividade particular, a função 
social será alcançada‖, mais uma vez depara-se com o equilíbrio entre o interesse 
individual e o coletivo. 
Na Alemanha, após 100 anos de exclusão devido ao exercício do 
liberalismo passando pela inclusão da concepção de função social na Constituição 
alemã feita por Weimar, em 1919, onde a legislação obriga o proprietário a possuir 
28 
 
intrinsicamente o princípio de solidariedade, chega-se a uma conjuntura em que o 
proprietário possui não somente direitos sobre a propriedade mas, também, deveres 
e obrigações perante a sociedade. Farias e Rosenvald elencam princípios para essa 
forma de se encarar a propriedade: 
a refundação do direito de propriedade prende-se a três princípios: o bem 
comum, a participação e a solidariedade. Quanto ao primeiro, a sociedade 
surge porque as pessoas descobrem uma vontade geral e um bem que é 
comum e dispõe-se a construí-lo. A ele se subordinam os bens particulares; 
a participação resulta na contribuição de todos, a partir daquilo que são e 
daquilo que têm. A participação transforma o indivíduo em ser humano; por 
último, a solidariedade, que nasce da percepção de que todos vivemos uns 
pelos outros, valor sem o qual a sociedade não é humana. (FARIAS e 
ROSENVALD, 2012, p. 313-314) 
 
Essa necessidade de igualdade vista nos itens acima remete a citação 
abaixo que fala sobre essa igualdade com teores práticos no que tange as 
propriedades rurais: 
este conceito de função social da propriedade partiu da observação dos 
movimentos sociais rurais, cujas entidades organizadas passaram a bradar 
e exigir um melhor aproveitamento da terra disponível para agricultura e/ou 
pecuária, atacando os denominados ―latifúndios improdutivos. (FARIAS e 
ROSENVALD, 2012, p. 316) 
 
De acordo com o parágrafo 2º do art. 1.228 do Código Civil, toda ação 
que não proporciona ao proprietário utilidade ou comodidade e sejam motivados 
apenas para prejudicar outros estão proibidos. 
Segundo Farias e Rosenvald: 
em concreto, esse dispositivo já nasce ultrapassado por duas razões: 
primeiro, por situar o abuso do direito em um contexto subjetivo, no qual o 
ato emulativo requer a prova da culpa do proprietário, o que é incompatível 
com a teoria finalista adotada pelo art. 187, do Código Civil, que configura 
ato ilícito em sentido puramente objetivo. (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 
311) 
 
A questão foi objeto de discussão no Conselho de Justiça Federal 
conforme citado por Farias e Rosenvald (2012): ―A regra do art. 1228, § 2º, no novo 
Código Civil, interpreta-se restritivamente, em harmonia com o princípio da função 
social da propriedade e com o disposto no art. 187 da mesma lei”. Esta afirmação 
configura como não necessária à análise da intenção do indivíduo para a 
demarcação do abuso do direito a propriedade, pois, desta maneira, fica-se definido 
por meios mais objetivos e regras bem definidas se houve ou não culpa, descarta-se 
assim a subjetividade na decisão. 
29 
 
Nos primórdios pode se entender que tudo o que não fosse permitido 
seria proibido, porém, de acordo com Farias e Rosenvald (2012), nesta linha tênue 
existe um outro fator que é o abusivo, este tão ilícito quanto o ato proibido de acordo 
com o art. 186 do Código Civil. 
O abuso do direito de propriedade é um ato ilícito objetivo, no qual o 
proprietário pratica uma atividade lícita na origem – posto inserido em uma 
das faculdades de domínio -, porém ilícita no resultado, eis que ofensiva a 
interesses coletivos e difusos que interagem com o exercício do direito 
subjetivo. (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 312) 
 
A citação remete, em partes, a máxima de que os fins não justificam os 
meios, isto é, mesmo que a ação tenha uma origem permitida pode ser que o seu 
propósito não se enquadre na lei e seja um abuso no que tange aos interesses 
coletivos. Um exemplo é o de que determinado proprietário pode adquirir terras de 
maneira lícita, com toda a documentação correta e pagamentos feitos, mas deixá-la 
improdutiva, sem utilização, ou prejudicar o meio ambiente para seu benefício, 
fazendo com que o ato seja benéfico individualmente, porém um malefício para o 
coletivo. 
Nos centros urbanos a ordenação, organização dos locais de habitação 
para melhor condição para os seres humanos fica por conta do direito urbanístico. O 
conflito entre o que os proprietários desejam em suas propriedades e o que se pode 
fazer, não agredindo o interesse coletivo e social, para Farias e Rosenvald (2012) é 
tarefa árdua e emergencial. Os problemas da urbanização são decorrentes do 
século XIX, os autores elencam alguns problemas dessa crescente de pessoas nas 
áreas das cidades: 
desde o século XIX os problemas urbanos crescentes se identificam com a 
falta de racionalidade dos administradores e munícipes na gestão de seus 
locais de trabalho e lazer. Isto propicia relações sociais conflitantes e 
excludentes, determinando um caldo de intolerância e violência. (FARIAS e 
ROSENVALD, 2012, p. 323) 
 
As cidades possuem normas que auxiliam na utilização da função social, 
como cita o art. 182 da Constituição Federal regulamentado pela Lei nº10. 257/01 
parágrafo único do art. 1º, de nome Estatuto da Cidade. Ele traz em seu teor normas 
que contribuem para o bem estar, vida em sociedade e regulamentação do uso da 
propriedade visando bem coletivo, segurança e equilíbrio ambiental. 
Por meio de instrumentos urbanísticos, o município poderá disciplinar a 
função social da propriedade, seja pelo plano diretor (obrigatório para 
cidades com mais de 20 mil habitantes e municípios integrantes de área de 
30 
 
especial interesse turístico) ou pelas leis orgânicas locais das cidadesde 
porte reduzido. (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 323) 
 
O conceito de função social é muito importante, principalmente para as 
cidades (Estatuto da Cidade – Lei nº 10.257 / 2001), pois equaciona os métodos de 
preservação do bem comum, como cita Farias e Rosenvald no que tange a 
importância da função social no meio urbano. 
A função social da cidade pode redirecionar os recursos e a riqueza de 
forma mais justa, combatendo situações de desigualdade econômica e 
social vivenciadas em nossas cidades, garantindo um desenvolvimento 
urbano sustentável no qual a proteção aos direitos humanos seja o foco, 
evitando-se a segregação de comunidades carentes. (FARIAS e 
ROSENVALD, 2012, p. 325) 
 
Ainda para Farias e Rosenvald (2012, p. 325), ―a prática da cidadania 
consiste assim em incorporar setores da sociedade aos mecanismos básicos de 
direitos habitacionais‖, isto é, a propriedade como forma de prover a cidadania, 
realizando assim sua função social. 
Fator determinante para uma boa utilização da função social é a aplicação 
de um bom plano diretor. Farias e Rosenvald (2012, p. 326) afirmam que, ―o plano 
diretor é o instrumento fundamental de intervenção do Município na política urbana 
de garantir o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade‖. O art. 182, § 2º 
mostra que o plano diretor é de suma importância para a sociedade já que diz em 
seu teor que ―a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às 
exigências fundamentais da ordenação da cidade, expressas no plano diretor”, 
concomitantemente com este artigo pode-se colocar o art. 186 § 4º que vai de 
encontro com as sanções previstas para o cumprimento da função social: 
a função social é cumprida quando a propriedade rural atende, 
simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em 
lei, aos seguintes requisitos: I – aproveitamento racional e adequado; II – 
utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do 
meio ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações 
de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem estar dos proprietários e 
dos trabalhadores. 
 
A propriedade rural difere da urbana, já que uma tem como centro a 
produção e a outra moradia. A função social na propriedade rural precisa ser mais 
rigorosa que em outros tipos de propriedade. O art. 186, da CF, cuida das regras 
para o cumprimento da função social da propriedade rural. Este é baseado em três 
31 
 
elementos para a realização da função social no espaço agrário: econômico, social e 
ecológico. 
Além de produzir, a propriedade rural, segundo Farias e Rosenvald (2012, 
p. 332) é destinada a ―criação de empregos, como bem de produção em que 
sobreleva o ônus social do proprietário‖. 
Existem diferenças nesses bens: 
a distribuição entre bens de consumo e de produção não está localizada na 
natureza dos bens, mas em sua destinação econômica. Segundo a noção 
corrente, bens de produção seriam aqueles idôneos à produção de outros 
bens; já os bens de consumo seriam aqueles destruídos no momento da 
satisfação da necessidade. (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 332) 
 
A produção e as adequações ao bem coletivo percorrem uma linha tênue, 
pois não se deve pensar somente no que está produzindo sem pensar no meio 
ambiente, por exemplo, que é fator de bem comum. Qualquer uso de terras de 
maneira não condizente com as leis, interesses coletivos ou difusos, pode acarretar 
em desapropriação de terras por interesse social, para a reforma agrária (art. 184 da 
CF). 
Farias e Rosenvald (2012, p. 333) explicam este contexto: ―em resumo, a 
função social da propriedade rural demanda requisitos de eficiência, utilização 
adequada de recursos ambientais e de utilidade comum, favorecendo o bem-estar 
dos trabalhadores.‖ 
Roberto Marques apud Farias e Rosenvald (2012), afirma que no que 
tange a adequação de exploração correta de recursos naturais tanto os recursos 
naturais quanto o meio-ambiente são fatores que se entrelaçam, porque ambos 
consideram o imóvel como um elemento natural posto à disposição do ser humano. 
Aqui, leva-se em conta o valor natureza, presumindo-se o homem como agente 
capaz de violá-lo ou preservá-lo. 
O art. 225 da CF tem como base o privilégio de tutela ecológica ao direito 
fundamental da terceira dimensão, prezando para que o meio ambiente seja 
equilibrado à saúde e vida de gerações presentes e futuras. 
Farias e Rosenvald (2012, p. 352) ainda questionam se propriedade é ou 
se tem uma função social. 
em princípio, a propriedade privada não é função social; cuida-se de um 
direito subjetivo – constituído pela autonomia privada – com função social. 
Em contrapartida, a propriedade pública é, em regra, função social, pelo fato 
de os bens pertencerem ao patrimônio estatal. 
 
32 
 
 
 
2.2 Restrições ao Direito de Propriedade 
 
Como citado no item anterior, pertence à Função Social da Propriedade a 
regulação do uso das propriedades com o foco no bem coletivo, para melhor 
distribuição de terras, direito a propriedade e manutenção do meio ambiente, por 
exemplo, e também em consonância com as finalidades econômicas e sociais (art 
1228, parágrafo 1, CC). 
Para entender este contexto deve-se retornar a Roma antiga, já que 
segundo Fiuza: 
todos os direitos de vizinhança que hoje figuram nas legislações mais 
modernas se prendem ao sistema romano do Digesto. Outras restrições, 
como o usucapião e as servidões prediais, também tiveram origem no 
antigo Direito de Roma. (FIUZA, 1999, p. 314) 
 
Desde a Roma antiga pode-se dizer que as restrições já estavam 
presentes para delimitar limites para benefício do bem comum. 
 
O direito real de propriedade sempre sofreu restrições. Dizer que em Roma 
era absoluto e ilimitado indica, quando nada, pouco conhecimento da 
sociedade romana. Na Roma Antiga dos primeiros tempos, e me refiro à 
época denominada Período da Realeza, de 753 a.C. a 510 a.C., a 
propriedade do solo, por exemplo, sofria duas das mais sérias restrições: 
esta inalienável e indivisível. As razões, como já dissemos, eram religiosas. 
O prédio familiar se ligava ao culto dos antepassados, que nele se 
enterravam e permaneciam. 
§ 905. [Limitação da propriedade] O direito do proprietário de um prédio 
estende-se ao espaço sobre a superfície e aos recursos sob a superfície. O 
proprietário não pode, todavia, opor-se a trabalhos que sejam empreendidos 
a tal altura ou profundidade, que não tenha ele interesse algum em impedi-
los. (FIUZA, 1999, p. 314) 
 
Gonçalves elenca que hoje no Brasil existem vários órgãos que cuidam 
desses normativos: 
 
inúmeras leis impõem restrições ao direito de propriedade, como o Código 
de Mineração, o Código Florestal, a Lei de Proteção do Meio Ambiente etc. 
Algumas contêm restrições administrativas, de natureza militar, eleitoral etc. 
A própria Constituição Federal impõe a subordinação da propriedade à sua 
função social. (GONÇALVES, 2012, p. 164) 
 
Baseando-se no estilo exercido no império romano e no apontamento de 
Gonçalves (2012), relatando o modelo dos dias de hoje, com leis e normas, neste 
33 
 
item serão mostradas essas regulações, denominadas Restrições ao direito de 
propriedade. 
Essas restrições podem ser legais, quando diretamente ligada às leis, ou 
voluntárias, no cenário em que o proprietário delimita o direito de acordo com seu 
desejo. 
Dentro do grupo das restrições voluntárias se apresenta as cláusulas de 
inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade. 
Nas palavras de Fiuza as restrições legais são: 
[...] as impostas por lei, dentre elas os direitos de vizinhança; o usucapião; 
as restrições de Direito Agrário; as servidões legais; a proteção especial 
pelo PoderPúblico a documentos, obras e locais de valor histórico artístico 
e cultural, monumentos e paisagens naturais notáveis, por meio de 
tombamento e desapropriação; as limitações ao espaço aéreo e ao subsolo; 
as restrições ao uso do solo urbano; e outras mais. (FIUZA, 1999, p. 314) 
 
As restrições legais são formadas por bens pertencentes ao domínio 
público, compreendendo os bens públicos (bens de patrimônio do estado), bens 
particulares de interesse público e os bens de fruição geral (que não podem ser 
objeto de apropriação individual, mas seu uso se refere a uma coletividade). Estes 
recebem um tratamento diferenciado pela lei, pois, este campo de atuação do poder 
do Estado visa o bem comum, e para isso pode existir a possibilidade de restringir e 
limitar o direito de propriedade. 
Gonçalves (2012, p. 164) cita que: 
todo esse conjunto, no entanto, acaba traçando o perfil atual do direito de 
propriedade no direito brasileiro, que deixou de apresentar as 
características de direito absoluto e ilimitado, para se transformar em um 
direito de finalidade social. 
 
Fiuza (1999, p. 314) ainda cita a definição de restrição legal e a 
congruência com a função social. 
As restrições legais procuram proteger os direitos "do outro", dentro do 
espírito de que o exercício do direito de propriedade não deverá prejudicar 
terceiros. Mas não é só esse o intuito do legislador, que busca promover a 
função social da propriedade, em prol do interesse público. 
 
 
 
2.2.1 Cláusula de Inalienabilidade 
 
Entende-se cláusula de inalienabilidade como uma proibição de alienação 
de um bem por parte do proprietário em função da vontade do alienante, isto é, 
mesmo sendo detentor de um bem esta cláusula não permite que o mesmo seja 
34 
 
envolvido em outras negociações, como por exemplo, um veículo que já esteja em 
um trâmite de alienação. Para Fachin (2006), existem três teorias que explicam a 
natureza jurídica desta cláusula: 
a primeira é a que leva em conta a incapacidade do proprietário. Essa teoria 
considera o sujeito incapaz de alienar o bem, de dispor da coisa [...]. 
Considera a restrição em relação ao proprietário, e não em relação ao bem. 
Este é suscetível de alienação, mas seu proprietário é que não o pode 
alienar [...]. (FACHIN, 2006, p. 116-117) 
 
Percebe-se que a citação acima coloca o foco da restrição de propriedade 
no proprietário do bem e não em si no objeto a ser alienado. Ainda explica que neste 
caso o objeto pode ser alienado desde que por outra pessoa. 
A segunda doutrina que pretende elucidar a natureza jurídica da cláusula 
em questão é a da obrigação de não fazer, que ―parte da distinção entre 
indisponibilidade real e a simples proibição de alienar‖. A proibição gerada 
pela cláusula torna-se um compromisso de conduta negativa (non facere) 
imposto ao herdeiro ou legatário, constituindo-se em mera obrigação de não 
alienar. A inexecução do dever de abstenção acarretaria apenas a 
indenização por perdas e danos, o que frustraria a intenção do testador 
quando da inserção da cláusula ora analisada em seu testamento, pelo que 
essa teoria pode não merecer o prosperar. (FACHIN, 2006, p. 116-117) 
 
A citação acima remete a impossibilidade de alienação do bem por parte 
de pessoas que assumam este através de herança ou legado. 
Na teoria da indisponibilidade da coisa, terceiro modo de ver esse tema, a 
cláusula grava o bem de ônus real, sendo a inalienabilidade inerente à 
coisa. O proprietário do bem fica privado do jus abutendi, e qualquer afronta 
legítima à cláusula, considera-se nula, com inteira razão. (FACHIN, 2006, p. 
116-117) 
 
Esta última citação, ao contrário da primeira teoria, mostra o bem como 
impossibilitado de alienação proibindo, assim, qualquer tipo de alienação utilizando o 
bem, isto é, o proprietário pode alienar quaisquer bens menos os que estejam sob 
esta cláusula. 
A cláusula de inalienabilidade não pode ser invalidada por atos judiciais, 
mesmo assim ainda permite algumas exceções, hipóteses em que a mesma deixa 
de ser aplicada: no caso de expropriação por necessidade ou utilidade pública, 
estando aí englobada a desapropriação por interesse social e no caso de execução 
de dívida ativa de impostos devidos em função do próprio imóvel‖ (FACHIN, 2006, p. 
120). 
Na mesma linha, Fachin apud Fiuza (1999, p. 315) mostra que ―por força 
da inalienabilidade ou inalterabilidade, fica o bem protegido do próprio titular que o 
não poderá alienar, seja por tempo determinado ou vitaliciamente.‖ 
35 
 
Existem ainda os frutos que, segundo o autor, não são alienáveis. ―Resta 
acrescentar que a inalienabilidade não se estende aos frutos. O apartamento é 
inalienável, mas os aluguéis que dele o dono receba não o são.‖ (FIUZA, 1999, p. 
316) 
 
 
2.2.2 Cláusula de Incomunicabilidade 
 
Esta cláusula corresponde à proteção dos bens quanto existe meação 
(regime de comunhão universal de bens). Estes bens incomunicáveis não farão 
parte da meação do cônjuge em qualquer regime que tenha sido escolhido pelo 
casal. 
Para melhor entendimento da questão pode se citar a definição de Fiuza 
(1999, p. 315) para a questão. 
Pela incomunicabilidade, o bem fica protegido do cônjuge do titular. No 
casamento em comunhão universal de bens, todos os bens adquiridos pelos 
cônjuges, salvo algumas exceções, se comunicam, ou seja, passam a 
integrar o patrimônio comum do casal. Isso não ocorre com os bens 
incomunicáveis, que só pertencerão a um dos cônjuges. Se uma pessoa 
deixa sua herança gravada com cláusula de incomunicabilidade, somente 
seu filho herdará, em nada participando o consorte deste. Logicamente, a 
incomunicabilidade estende-se aos frutos. 
 
A cláusula de incomunicabilidade serve, basicamente, para que o cônjuge 
se proteja no caso de realizar o casamento com a comunhão universal de bens. Esta 
proporciona a proteção contra uniões por interesse, por exemplo, o famoso caso do 
―golpe do baú‖. 
 
 
2.2.3 Cláusula de Impenhorabilidade 
 
A restrição voluntária, cláusula de impenhorabilidade serve para proteger 
o patrimônio (bem) de dívidas adquiridas/contraídas pelo seu proprietário. Todos os 
bens sob essa cláusula não poderão ser objeto de disputas judiciais que fazem com 
que se quite dívidas por penhora, por arresto, e outras. ―A impenhorabilidade tem 
por escopo proteger o bem dos credores do titular, que não o poderão executar por 
dívidas. Diferentemente da inalienabilidade, a impenhorabilidade estende-se aos 
frutos.‖ (FIUZA, 1999, p. 315) 
36 
 
Esta Cláusula tem como fator importante a proteção ao bem quando este 
é um bem de família. Pode-se dizer que existem função social intrínseca neste item, 
pois, por exemplo, no caso de uma família necessitar de sua casa para moradia esta 
não permite que este bem seja penhorado, mesmo esta família tendo diversas 
dívidas. 
A garantia do direito a moradia traz a função social para esta cláusula. 
 
 
 
2.2.4 Súmulas e Leis de Convergência das Cláusulas de Restrições Voluntárias 
 
Neste item citam-se algumas convergências dessas três cláusulas dentro 
de leis e súmulas. 
A cláusula de inalienabilidade está presente na cláusula de 
impenhorabilidade de acordo com o Art. 649, I, do Código de Processo Civil (2002): 
art. 649. São absolutamente impenhoráveis: 
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à 
execução; 
 
Este item mostra proibição quanto à execução de bens que não sejam 
alienáveis (inalienáveis) e mostra a convergência entre duas cláusulas de restrição 
de propriedade voluntárias. 
A súmula Nº 49 do STF também faz essa convergência de cláusulas. Ela 
cita a importação da cláusula de incomunicabilidade por parte da cláusula de

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