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A segurança pública sob o olhar da antropologia

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A SEGURANÇA PÚBLICA SOB O OLHAR 
ANTROPOLÓGICO 
 
Vanísia de Sousa Santos Capaverde 
 
RESUMO 
 
A abordagem aqui procedida objetivou enfocar o tema segurança pública sob o olhar 
antropológico focado no prisma da exclusão social e na adoção de políticas sociais cujo 
objeto maior fosse reduzir o alto índice de criminalidade que se observa na atualidade. 
A opção por discutir a presente temática sob o ângulo antropológico, foi entender certos 
fenômenos sociais a partir do contexto de sua ocorrência. Não é possível dissociar 
segurança pública de adoção de políticas sociais, afinal ? ainda que não seja o único 
fator ? é consensual que a criminalidade prolifera (e muito) entre os excluídos. E, a 
exclusão, por seu turno, como manifestação de injustiça (distributiva) se revela quando 
pessoas são sistematicamente alijadas dos serviços, benesses e garantias oferecidos ou 
assegurados pelo Estado, pensados, em geral, como direitos de cidadania. Por esses 
motivos entende-se pertinente tecer alguns comentários sobre os processos que levam à 
exclusão e o conteúdo particular das diversas exclusões, para se ter um entendimento 
mais verdadeiro e menos retórico da mesma, e, em conseqüência, entender a lógica 
estrutural do aumento da criminalidade, tendo por escopo promover a reflexão sobre a 
função da segurança pública e de seus agentes numa sociedade aberta, a partir da 
compreensão dos valores democráticos, fomentando, deste modo uma visão mais 
abrangente sobre a sociedade contemporânea. 
 
PALAVRAS ? CHAVE: Segurança pública. Exclusão. Políticas Sociais. Valores 
democráticos. 
 
INTRODUÇÃO 
 
Numa sociedade como a brasileira, a lei nem sempre tem os seus ditames cumpridos. A 
legitimidade não representa, necessariamente, garantia de obediência e cumprimento. 
 
Um exemplo cabal desta afirmativa é que, consoante o preceito constitucional exarado 
na Constituição da República de 1988 reza categoricamente que as pessoas gozam das 
mesmas liberdades e oportunidades e dos mesmos direitos, consequentemente todos são 
iguais perante a lei. Isso quer dizer que todos os brasileiros são cidadãos. 
 
Numa sociedade de tamanhas desigualdades como a brasileira, marcada pela injustiça, 
pela ausência de compromisso das instituições públicas para com a maioria da 
população, constituída pelo seu segmento mais carente, pela negação de direitos, pela 
discriminação histórica, pode-se facilmente observar que a proclamada igualdade não é 
concreta. 
 
É válido ressaltar que sob o prisma conceitual clássico uma das funções exponenciais do 
Estado é prestar segurança aos seus cidadãos, garantindo-lhe a incolumidade física e 
moral, decorrente de uma convivência pacífica e harmoniosa entre os indivíduos. 
Dentro desses parâmetros analisou-se alguns aspectos pertinentes à segurança pública à 
luz da antropologia cultural. 
 
1 SOBRE A CIÊNCIA DA ANTROPOLOGIA 
 
Segundo o dicionário eletrônico Direitonet (Disponível em: www.direitonet.com.br) a 
antropologia é uma "ciência que estuda o ser humano como ser biológico, cultural e 
social, especialmente sua classificação em função dos seus caracteres físicos. Para a 
ciência jurídica, a antropologia é importante para o estudo de critérios para identificação 
dos indivíduos". 
 
A guisa de esclarecimento, salienta-se que a expressão antropologia cultural é aqui 
entendida como a forma de vida de um grupo de pessoas, uma configuração dos 
comportamentos aprendidos, aquilo que é transmitido de geração em geração por meio 
da língua falada e da simples imitação. Não se trata de um comportamento instintivo, 
mas algo que resulta de mecanismos comportamentais introjetados pelo indivíduo em 
seus pares. 
 
1.1 Analisando o Cenário da Exclusão no Brasil 
 
Uma das formas de exclusão que grassa em muitos países, especialmente no continente 
europeu, e que cresce em ritmo vertiginoso é o xenofobismo. Com relação a isso, o 
Brasil é um dos países mais flexíveis e menos excludentes do mundo. Cardoso (apud 
GILBERTO FREYRE, 2004, p. 24) sintetiza muito bem essa característica da formação 
étnica da brasilidade: 
 
A força, ou antes, a potencialidade da cultura brasileira parece-nos residir toda na 
riqueza de antagonismos equilibrados (...) Não que no brasileiro subsistam, como no 
anglo-americano, duas metades inimigas: a branca e a preta; o ex-senhor e o ex-escravo. 
De modo nenhum. Somos duas metades confraternizantes que se vêem mutuamente 
enriquecendo de valores e experiências diversas; quando nos completamos num todo, 
não será com o sacrifício de um elemento ao outro. 
 
É perceptível e factual que a falta de homogeneidade étnica e racial faz do Brasil um 
país multicultural por vocação, apesar das discriminações "sutis" ocorrerem, e um país 
mais aberto às diversas identidades étnicas existentes no mundo. Ao mesmo tempo, sua 
vocação para a defesa do hibridismo ameniza as diferenças e cria um núcleo racial e 
cultural comum, como resultado da própria mistura. Também por isso o Brasil não é um 
país em que as formas violentamente excludentes do racismo biológico do passado ou 
do racismo cultural do presente sejam tão marcantes. [...] a coexistência, em um mesmo 
território nacional, de diversos grupos étnicos com culturas e religiões diferentes, 
questiona a tradicional visão liberal de igualdade que sempre ignorou as diferenças 
socioeconômicas e culturais existentes na população. (VIEIRA, 2001, s.p.). 
 
É de fato, um país que rejeita teoricamente o racismo, embora na prática apresente 
historicamente, sinais de discriminação dos negros e dos mestiços provenientes da 
mistura entre os vários negros e "brancos" que aqui aportaram e os indígenas que aqui já 
estavam. Entretanto, o mesmo não se pode dizer sobre as exclusões advindas da 
pobreza. Quando as discriminações raciais combinam-se com as discriminações contra 
o pobre, tem-se as mais claras situações de exclusão em diversos setores, por variados 
processos. 
 
O preconceito prevalente e ostensivo existente no Brasil é contra a pobreza e, essa 
característica é historicamente perpetuada. "A formação patriarcal do Brasil explica-se, 
tanto nas suas virtudes como nos seus defeitos, menos em termos de "raça" e de 
"religião" do que em termos econômicos, de experiência de cultura e de organização da 
família, que foi aqui a unidade colonizadora". (FREYRE, 2004, p. 34). 
 
1.2 Segurança Pública e as Práticas Discriminatórias 
 
Nesta abordagem refletiu-se sobre a ocorrência de práticas discriminatórias a partir do 
exercício da segurança pública, enquanto atividade laboral: a saber, a práxis da polícia. 
 
Especificamente no Brasil, a noção de polícia concebida como um órgão de segurança 
pública conduz indubitavelmente à idéia de que sua atividade precípua é limpar da 
sociedade daqueles "indivíduos indesejáveis ao convívio social harmônico" aqueles 
indigitados como inimigos da ordem pública e paz social: os pobres negros ou brancos, 
homossexuais, etc. enfim, aqueles que de certo modo simbolicamente ameaçam a 
sociedade, constituindo-se no grupo dos discriminados sociais, alvos preferenciais da 
ação policial. 
 
Na concepção um tanto "arrebatada" de Fischer (1995) na verdade, a polícia é o espelho 
da mesma sociedade que socorre e que paradoxalmente oprime. A melhoria da imagem 
e do desempenho do policial só irá ocorrer verdadeiramente quando suas condições de 
labor, treinamento e salário forem considerados prioridade para a Administração 
Pública, não se podendo exigir postura adversa do policial, que seja mais receptivo e 
aberto às necessidades e problemas da comunidade, se não lhe for assegurado o respeito 
da sociedade, se não lhe for asseguradas melhores e mais justas condições de trabalho. 
 
Analisando o posicionamento passional de Fischer, nota-se que ela, textualmente, 
responsabiliza o Estado Gestor e, em menor graude intensidade a sociedade civil 
organizada, pelo descaso com que tem sido tratada a segurança pública no Brasil, 
inclusive quanto às condições de trabalho das corporações. 
 
De fato a sociedade precisa se conscientizar que só se pode construir uma cultura de paz 
com a participação social, sendo essencial que as pessoas se sintam responsáveis pelas 
questões que lhe digam respeito e acreditem no poder do trabalho em conjunto, até por 
que querendo ou não, a polícia depende da população para realizar o seu trabalho, quer 
seja na mediação de conflitos sociais, na prevenção do crime ou na manutenção da 
ordem pública. Por força do artigo 144 da Constituição Federal a sociedade é também 
responsável pela segurança pública, e por todas as mazelas que são suportadas pelos 
demais integrantes da coletividade. 
 
Não se considera procedente quando a autora busca "justificar" o comportamento 
muitas vezes inadequado de certos membros da corporação, devido o descaso do Poder 
Público para com a classe. Na verdade, os policiais devem sim, enquanto classe lutar 
pelos seus direitos e congêneres que julgarem pertinentes. Não obstante, suas eventuais 
insatisfações profissionais não devem ser "transferidas" para a sociedade, como se fosse 
uma válvula de escape, numa atitude de puro revanchismo inconseqüente. 
 
1.3 A Segurança Pública Sob a Lógica do Estado 
A segurança pública, quando apreendida no plano das determinações e relações sociais 
e, sendo ela própria constituída e constituinte destas relações apresenta-se, 
historicamente como um campo de disputa hegemônica, onde a retórica do discurso 
político vem, sistematicamente sobrepujando as ações práticas. "[...] a pressão social 
aumentou, mas deixou de produzir efeitos virtuosos: criaram-se muitas zonas de 
contestação e de atrito com os governos, mas não campos de força hegemônica". 
(NOGUEIRA, 2004, p. 31). 
 
Sobre o sentido de hegemonia no contexto em tela, recorre-se ao mui pertinente 
esclarecimento de Nogueira (2004, p. 35): 
 
A idéia de hegemonia habilita-nos a entender que a capacidade de dirigir ? isto é, de 
fixar parâmetros de sentido que desloquem valores e movimentem grandes massas de 
pessoas ? repousa numa "competência" bem específica: o ator hegemônico é aquele que 
consegue sair de si, ir aos demais e construir consensos, qualificando-se para governar 
com metas reformadoras fortes. Ele age para agregar e articular apoios, mas também 
trabalha com idéias e busca apresentar soluções positivas para os diversos problemas 
com que se defronta. Faz a crítica do existente, mas também apresenta um projeto para 
toda a sociedade. 
 
Mouffe compartilha da idéia de hegemonia esboçada por Nogueira, analisando-a pelo 
prisma conjuntural da política, em conformidade com o excerto a seguir: 
 
Há hoje uma necessidade urgente de restabelecer a centralidade da política e isso exige 
desenhar novas fronteiras políticas capazes de dar um real impulso à democracia. Essas 
novas fronteiras políticas precisam incorporar uma multiplicidade de demandas 
democráticas, mas não há como negar que umas das apostas decisivas para a política 
democrática é começar a oferecer alternativas ao neoliberalismo. (MOUFFE, 2003, p. 
21). 
 
Para Nogueira (2004, p. 32): "Nos governos de hoje, acréscimos de virtú dependem de 
uma combinação de fatores, dentre os quais se destaca a existência de um pólo capaz de 
unificar aliados e colaboradores, agregar conhecimentos técnicos e informações, 
formular políticas consistentes e construir decisões". 
 
Sérgio Buarque de Holanda é taxativo em relação à temática: 
 
Sérgio deixou claro que só o próprio povo, tomando a iniciativa, poderia cuidar do seu 
destino. Isto faz dele um coerente radical democrático, autor de contribuição que deve 
ser explorada e desenvolvida no sentido de uma política popular adequada às condições 
do Brasil, segundo princípios ideológicos definidos. (1995, p. 23). 
 
Muito embora se entenda a assertiva de Santos (2003, p. 73) quando afirma: "[...] o 
modelo hegemônico de democracia tem sido hostil à participação ativa dos cidadãos na 
vida política e, quando a tem aceitado, a tem confinado em nível local". 
Particularizando-se para as questões gravíssimas que se verificam hodiernamente na 
segurança pública, entende-se muito procedente a concepção de Nogueira (2004, p. 32): 
"Um governo que não investe contra as circunstâncias que o limitam condena-se a viver 
de adaptações sucessivas, ao embalo de fatos e pressões, e pode, após um tempo, 
simplesmente perder de vista qualquer mudança". Haja vista a situação do Rio de 
Janeiro e São Paulo. 
 
1.4 A Perpetuação da Pobreza no Brasil 
 
Dentro do ideário capitalista, na perspectiva dos grupos sociais que o constituem na 
condição de classe dominante, a exclusão social e, em decorrência a manutenção da 
pobreza sempre foi assunto habilmente tratado, visando a sua perpetuidade. Frigotto 
comenta com muita propriedade, as causas dessa continuidade de exclusão social, 
dentro da perspectiva sócio econômica: 
 
[...] ao contrário do que postula o ideário liberal clássico, o longo processo de passagem 
do feudalismo para o sistema capitalista não representou a superação de uma sociedade 
marcada pela opressão, servilismo e desigualdade de classes por uma sociedade livre e 
igualitária. A superação do servilismo e da escravidão não foram pressupostos para a 
abolição da sociedade classista, mas condição necessária para que a nova sociedade 
capitalista pudesse, sob uma igualdade jurídica, formal e, portanto, legal (certamente 
não legítima), instaurar as bases das relações econômicas, políticas e ideológicas de uma 
nova sociedade de classes. (2003, p. 27). 
 
Sobre essa temática, Freyre corrobora com a concepção de Gaudêncio Frigotto, 
demonstrando, sob prisma antropológico, a perpetuidade da pobreza no Brasil: 
 
Ligam-se à monocultura latifundiária males profundos que têm comprometido, através 
de gerações, a robustez e a eficiência da população brasileira, cuja saúde instável, 
incerta capacidade de trabalho, apatia, perturbações de crescimento, [...] Entre outros 
males, o mau suprimento de víveres, obrigando grande parte da população ao regime de 
deficiência alimentar [...]. (FREYRE, 2004, p. 34). 
 
É consensual que a lógica do sistema capitalista reside no mercado, e este, por seu 
turno, sob as relações de classes fundamentais capital/trabalho, de um lado, constitui-se, 
consoante Frigotto (2004, p. 27) "[...] no lócus fetichizado por excelência, onde todos os 
agentes econômicos e sociais supostamente se igualam e podem tomar suas decisões 
livres, e o contrato, de outro, na mistificação legal da garantia do cumprimento das 
escolhas "igualitárias" e livres". 
 
É mister que se ressalte que muito embora a consolidação das instituições de 
representação política no Brasil tenha permitido a constituição de governos 
democráticos estáveis nos últimos dezoito anos, a construção de um regime político que 
assegure plenamente os direitos dos cidadãos ainda permanece como meta a ser 
conquistada. 
 
2 METODOLOGIA 
 
A construção do conhecimento sobre a segurança pública sob o olhar antropológico 
focado no prisma da exclusão social, tornou-se possível no desenrolar de toda a 
pesquisa realizada durante o processo de esclarecimento e amadurecimento de nossas 
concepções a partir da leitura das obras de autores renomados que versam sobre essa 
temática. 
 
3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 
 
As questões atinentes à segurança pública no Brasil ainda são frágeis do ponto de vista 
da eficácia plena em sua aplicabilidade no cenário da criminalidade nacional. Observou-
se na análise aqui procedida que a pobreza, a desigualdade social, a exclusão, muito 
embora não sejam os únicos responsáveis pelo estado calamitoso de violência que 
assola o país, representa uma significativaparcela de contribuição para esta situação. 
 
Constituí-se num aspecto dramático do problema do crime no Brasil que ele venha a ser 
objeto da atenção da elite dominante somente quando ultrapassar os limites estruturais 
aos quais está tradicionalmente confinado. 
 
Dentro de semelhante logicidade faz-se pertinente o comentário de Muylaert (1993, p. 
38): "As tensões políticas e sociais necessitam de ser resolvidas através dos canais 
diretos para que os movimentos, hoje, tomados como reivindicatórios ou de 
contestação, subsistam como formas de poder político organizado, no dia de amanhã". 
 
Seria uma análise demasiada, simplista e ingênua supor que a violência, enquanto 
fenômeno social é resultante direta da pobreza. Evidentemente que não, afinal, os 
Estados brasileiros mais pobres não são os mais violentos. Os países mais miseráveis 
não são, necessariamente, os mais violentos. Sociedades profundamente desiguais nem 
sempre são violentas. 
 
Contudo, é inegável a contribuição da pobreza em prol da perpetuidade da violência. 
Sob a perspectiva de um cenário capitalista como é o caso do brasileiro o problema da 
desigualdade de classes é exacerbado pela cristalização da contínua relação classista de 
exploração e alienação. Sobre esse aspecto: "As pressões populares (legítimas ou as 
legitimadas) frente ao estamento do poder são por este absorvidas, no capitalismo, 
desde que, nas concessões, os governantes possam exercer o controle sobre suas 
repercussões políticas, sem qualquer rompimento do modelo" (MUYLAERT, 1993, p. 
38). 
 
O advento da globalização eivada de peculiaridades certamente influenciará (e muito) a 
idéia que hoje é prevalente, sobre segurança pública, enquanto fenômeno social. O fator 
territorialidade com certeza requererá tratamento específico e, muito bem parametrizado 
para que não se provoque suscetibilidades no quesito soberania. Mouffe trata da 
temática com a necessária diplomacia: 
 
Acredito que deveríamos almejar o estabelecimento de uma ordem mundial pluralista 
onde um grande número de unidades regionais coexistam, com suas culturas e valores 
diferentes, onde uma pluralidade de compreensões dos "direitos humanos" e formas de 
democracia seriam consideradas legítimas. (2003, p. 25). 
 
No que diz respeito às ações que estão sendo adotadas em prol do resgate da cidadania 
e, na salutar tentativa de "envolver", conscientizar a sociedade da importância de sua 
participação ativa, espontânea, compromissada, cidadã para a resolução dos problemas 
que afligem a nação e, em conseqüência suas vidas, foi dado o primeiro passo, através 
do chamado orçamento participativo, já adotado em muitas prefeituras brasileiras. 
 
[...] participar significa influir diretamente nas decisões e controlar as mesmas [...] Se 
estamos em uma nova fase no país, é possível e é preciso que o movimento comunitário 
avance e influa diretamente, apresentando propostas, discutidas e definidas pelo 
movimento sobre o orçamento (público). (UAMPA, 1986; SILVA, 200, apud SANTOS, 
2003, p. 58). 
 
Faz-se necessário esclarecer que investir, incentivar, buscar, propor a participação 
popular na resolução dos problemas nacionais não é privilégio deste ou daquela 
orientação partidária. A Constituição da República de 1988, já traz em seu ordenamento 
essa previsão legal: 
 
O artigo 14 da Constituição de 1988 garantiu a iniciativa popular como iniciativa de 
processo legislativos. O artigo 29 sobre a organização das cidades requereu a 
participação dos representantes de associações populares no processo de organização 
das cidades. [...] a Constituição foi capaz de incorporar novos elementos culturais, 
surgidos na sociedade, na institucionalidade emergente, abrindo espaço para a prática da 
democracia participativa. (SANTOS, 2003, p. 65). 
 
Quanto mais forem adotadas semelhantes práticas, ter-se-á cidadãos, mais conscientes 
de seus direitos e deveres ganha a sociedade civil organizada. Ganha a democracia. 
Holanda em sua obra exponencial intitulada "Raízes do Brasil" exorta a participação 
popular como ferramenta importante na resolução dos problemas nacionais e, por 
conseguinte na construção democrática: 
 
[...] uma das forças de Raízes do Brasil foi ter mostrado como o estudo do passado, 
longo de ser operação saudosista, modo de legitimar as estruturas vigentes, ou simples 
verificação, pode ser uma arma para abrir caminho aos grandes movimentos 
democráticos integrais, isto é, os que contam com a iniciativa do povo trabalhador e não 
o confinam ao papel de massa de manobra, como é uso. (1995, p. 24). 
 
A adoção dessa prática além de fortalecer a democracia, também atuará como sistema 
de freios e contrapesos devido à responsabilização coletiva, diante da nova arena que 
surge nesse processo: a das instituições desenhadas para garantir a vigência dos direitos 
civis. 
 
CONCLUSÃO 
 
O conhecimento antropológico é indispensável à formação da pessoa profissional de 
segurança pública. Este necessita ter uma visão conscienciosa de que a sociedade se 
encontra representada por classes sociais e etnias diversas, que cada uma delas possui 
seus valores próprios e que se faz necessário que o policial para prestar um bom serviço 
à comunidade precisa conhecer e compreender as motivações e valores desses grupos. 
 
Não obstante, é imprescindível também que a segurança pública seja considerada 
prioridade, que não conste na agenda nacional tão somente em decorrência de 
acontecimentos funestos decorrentes da criminalidade, ou quando atinja algum membro 
da elite dominante. 
 
Compete ao sistema de Segurança Pública, ou seja, a polícia, não apenas forçar o 
cumprimento da lei, mas identificar os conflitos e minimizá-los, quando possível, ou 
reprimir fortemente para extinguí-los, por se constituírem numa ameaça potencial a todo 
o ordenamento social harmônico. 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
DIREITONET. Disponível em: Acesso em: 04. jan. 2007. 
 
FISCHER, Rosa Maria. O Direito da População à Segurança: cidadania e violência 
urbana. Petrópolis, RJ: Vozes; CEDEC. 1995. 
 
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: formação da família brasileira sob o 
regime da economia patriarcal. Apresentação de Fernando Henrique Cardoso. 49. ed. 
rev. São Paulo: Global, 2004. (Introdução à história da sociedade patriarcal no Brasil). 
 
FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a Crise do Capitalismo. 5. ed. São Paulo: Cortez, 
2003. 
 
HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 26. ed. São Paulo: Companhia das 
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KÖCHE, Jose Carlos. Fundamentos de Metodologia Científica: Teoria da ciência e 
iniciação à pesquisa. 20. ed. atual. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. 
 
MUYLAERT, Sergio. Conflitos agrários: as sementes de um poder popular legitimo e 
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Brasília: Universidade de Brasília, 1993. (Série o direito achado na rua, v. 1). 
 
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Sociedade: Revista de Sociologia Política da Universidade Federal de Santa Catarina. 
Programa de pós-graduação em Sociologia Política. v. 1, n. 3. (2003). Florianópolis: 
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VIEIRA, Listz. Cidadania Globalização e Estado Nacional. 23 nov. 2006. 
File://E:\Dados - Global citizenship and the National State. Htm 
 
_________________. Cidadania e Globalização. Rio de Janeiro: Record, 2001. 
 
Leia mais em: http://www.webartigos.com/artigos/a-seguranca-publica-sob-o-olhar-
antropologico/39069/#ixzz3B8Ms6rZd

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