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Capitulo I

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Capitulo I
DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO E CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS
Considerações gerais
A tutela do sentimento religioso e do respeito aos mortos, abrange-se, de modo geral, a proteção aos valores ético-social de uma sociedade, ao qual a liberdade é sua força-motriz, pois que esta abrange a liberdade de crença, de culto e de organização religiosa, em que nossa Constituição Federal, coube tratar, ao passo que o Código Penal, ainda que anterior a Carta Maior, os tutelou em caso de violabilidade, tipificando-os como crime. Assim, numa visão Constitucional, trata-se da dignidade da pessoa humana e seus valores perante a sociedade em ter sua liberdade protegida, deixando a livre escolha de o cidadão optar em seu prospecto filosófico-religioso.
A liberdade de crença trata-se da simples liberdade de consciência, ou seja, do cidadão optar e manifestar-se de sua religião, como prevê o estatuto Constitucional “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias” assim como “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”; (art.5°, VI e VIII)
A liberdade de culto exterioriza-se com a prática do corpo doutrinário e de seus ritos, com suas cerimônias, manifestações, hábitos, tradições, na forma que indicada para a religião escolhida. (art. 5°, VI, CF).
A liberdade de organização religiosa tem dois primados, um refere-se a organização da igreja em seu espaço físico como também a profanação de sua crença, separando aos ditames ideológicos com o Estado, devido seu laicismo declarado (art.19, CF)
Por fim, pujante as breves considerações gerais acima colocadas quanto aos delineios endo-constitucionais a temática, cumpre-se promover o Capitulo I do Código Penal.
DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO
ULTRAJE A CULTO E IMPEDIMENTO OU PERTUBAÇÃO DE ATO A ELE RELATIVO
Art. 208. Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso;
Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa.
Parágrafo único. Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente violência.
Bem jurídico: Tutela-se a liberdade individual de ter a crença e culto, seu sentimento religioso, independentemente da religião professada.
Sujeitos do delito: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois trata-se de crime comum. O sujeito passivo é a pessoa que sofre com o escarnecimento, assim como a perturbação, impedimento de cerimônia ou prática de culto religioso, como também o vilipendio. Portanto, são pessoas determinadas que são vítimas, pois tanto pode ser um sacerdote, crente, rabino, padre, freira, pastor, ministro, assim como a toda a coletividade praticante da atividade religiosa.
Tipo objetivo: há três condutas diversas previstas no artigo 208 que configuram o delito, vejamos:
a) Escarnecer alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa: O legislador na sua feitura de promover seu domínio com a língua pátria utilizou a palavra escarnecer ou mesmo dizer: zombar, achincalhar, troçar, mofar, ridicularizar, fazer pouco, ofender alguém publicamente em virtude de crença ou função religiosa, ao qual a crença é a fé religiosa e a função é sinônimo de cargo, exercida por pessoas determinadas como já dito anteriormente. A publicidade da ofensa entende-se, na presença de varias pessoas ou de maneira que a chegue ao conhecimento delas.
b) Impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso: Impedir é paralisar, impossibilitar, evitar que se comece cerimônia ou pratica de culto religioso; Perturbar é atrapalhar, estorvar, tumultuar, desorganizar, atrapalhar, embaraçar culto ou cerimônia religiosa. Vem a convir que cerimônia é o ato solene e exterior do culto (ex. missa, procissão, batismo, casamento) e quanto a pratica de culto religioso é o ato religioso não solene (ex. reza, ensino de catecismo, novena, oração coletiva, sessão espírita). Portanto, a exemplos fáticos são: efetuar disparo com arma de fogo, provocando barulho para que os demais fiéis não possam ouvir o sermão do padre (RT, 419/293); palavrões proferidos por pessoa embriagada e de shorts que irrompe na igreja durante a missa (RT, 491/318); altos brandos durante casamento que provocam a abreviação da cerimônia (RT, 533/394). Cabe aqui ressaltar, que se configura o delito se houver uma alteração material capaz de impedir ou perturbar cerimônia ou culto religioso, porquanto, em sua substancia não configura como tal um simples desvio de atenção.
c) Vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso: A palavra vilipêndio consiste em desprezar, menoscabar, aviltar, desdenhar, injuriar, ultrajar, portanto, pode ser praticada em ato de culto religioso por palavras, escritos ou gestos e que seja cometido na presença de várias pessoas ou de maneira que chegue ao conhecimento delas, ou mesmo pode ser praticado contra objeto de culto religioso a que prestam como o altar, púlpito (tribuna), cálice, crucifixo, livros litúrgicos, turíbulos (Vaso suspenso por pequenas correntes, usado nas igrejas para nele queimar-se o incenso; incensório), aspersório (Instrumento de metal ou madeira que se mergulha em água-benta para aspergi-la sobre os fiéis na igreja).
Elemento subjetivo: Em todas as condutas acima é representado pelo dolo (vontade livre e consciente) de modo especifico, já que inexiste modalidade culposa.
Consumação: Trata-se de delito material, com o escarnecimento, independentemente do resultado; com o efetivo impedimento ou perturbação; com o vilipêndio, sendo este material ou de simples conduta.
Tentativa: É admissível, em todas as condutas moldadas nos eixos do art.208, CP.
Causa de aumento de pena: Será aumentada de um terço se houver violência, seja contra a pessoa como o objeto, mas além dessa causa de aumento de pena, o agente responderá, em concurso material de crimes, delito correspondente à sua conduta violenta como lesão corporal, dano, etc; sendo assim será forma majorada dos crimes contra o sentimento religioso devido ao emprego de violência.
Pena: Trata-se de crime de menor potencial ofensivo, conforme dispõe a Leis 9.099/95 e a 10.259/01, aos quais a pena máxima não importe a ser superior a dois anos, ainda que esteja a majorante de um terço presente.
Suspensão condicional do processo: é cabível no caput e no parágrafo único (art.89 da Lei 9.099/95)
Ação penal: publica incondicionada, promovida e movimentada pelo Ministério Publico; órgão incumbido pela persecutio criminis in judicio
Capitulo II
DOS CRIMES CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS
Impedimento ou perturbação de cerimônia funerária
Art.209. Impedir ou perturbar enterro ou cerimônia funerária:
Pena- detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa.
Parágrafo único. Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.
Bem jurídico: Tutela-se o sentimento de respeito pelos mortos, que configura um interesse individual coletivo, bem como um valor ético-social.
Sujeitos do delito: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive familiares do morto. Quanto ao sujeito passivo, frisa-se, não é o morto, pois este não é mais titular de direitos, portanto, atinge a coletividade, a família e amigos do morto. Trata-se de crime comum, ou seja, autoria por qualquer pessoa e crime vago, já que a ofensa atinge toda coletividade inerente ao morto, desprovidas de personalidade jurídica.
Tipo objetivo: Ação ou omissão de impedir (paralisar, impossibilitar) ou perturbar (embaraçar, atrapalhar, estorvar) o enterro (transporte do corpo do falecido em cortejo fúnebre ou mesmo desacompanhado, até o local do sepultamento oucremação, entendendo também num sentido amplo, o velório que pode ou não ser realizado no mesmo lugar do sepultamento ou cremação) ou cerimônia fúnebre (ato religioso ou civil realizado em homenagem ao morto). Ex. furar o pneu do veiculo destinado para o transporte do corpo ou deixar de fornecer automóvel para tal fim, não entregar as chaves para o tumulo.
Elemento subjetivo: Dolo (vontade livre e consciente de impedir ou perturbar enterro ou cerimônia funerária, causando tumulto ou desorganização que altere seu desenvolvimento. Não há previsão de culpa.
Consumação: Trata-se de crime material, portanto, basta que o agente tenha efetivamente produzido o resultado de impedir ou perturbar enterro ou cerimônia fúnebre.
Tentativa: É admissível, na hipótese em que o agente empregue todas as formas para produzir o resultado, mas não produzir, cessando-o.
Causa de aumento de pena: será a pena aumentada de um terço se houver violência, tanto quanto contra a pessoa como contra o objeto, alem disso, o agente responderá em concurso material de cimes, com a sanção correspondente à violência a sua conduta como lesão corporal, dano, homicídio, etc.
Suspensão condicional do processo: é cabível no caput e no parágrafo único (art.89 da Lei 9.099/95)
Ação penal: publica incondicionada, promovida e movimentada pelo Ministério Publico; órgão incumbido pela persecutio criminis in judicio.
Violação de sepultura
Art.210. Violar ou profanar sepultura ou urna funerária:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Bem jurídico: Assim como o artigo anterior, tutela-se o sentimento de respeito pelos mortos.
Sujeitos do delito: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive familiares do morto, proprietários do tumulo. O sujeito passivo é a coletividade indefinida, entidade sem personalidade jurídica, como a família e os amigos do morto.
Tipo objetivo: Violar (abrir, devassar, romper, escavar, alterar) ou profanar (ultrajar, desprezar, vilipendiar, aviltar, macular, conspurcar, degradar) sepultura (local destinado ao enterro do cadáver, como os sepulcros, mausoléus, tumbas, covas, túmulos) ou urna funerária (local onde guarda cinzas ou ossos, como caixas, cofres ou vasos que contêm as cinzas ou ossos do morto.
Tipo subjetivo: É representado pelo dolo (vontade livre e consciente) de violar ou profanar sepultura funerária.
Consumação: Com a violação ou profanação de sepultura ou urna funerária, portanto, trata-se de crime material.
Tentativa: é admissível em caso de violação, mas em se tratando de profanação não cabe tentativa, pois aqui, frisa-se ser crime consumado em sua forma.
Excludente de ilicitude: estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular do direito (CP, art.23,III), mas somente na circunstância de violação porque a profanação é típico contra legem.
Pena: reclusão, de um a três anos, e multa
Suspensão condicional do processo: é cabível no caput e no parágrafo único (art.89 da Lei 9.099/95)
Ação penal: publica incondicionada, promovida e movimentada pelo Ministério Publico; órgão incumbido pela persecutio criminis in judicio, tanto em procedimento comum como ordinário (art.394 a 405 e 408 a 502 do CPP)
Destruição, subtração ou ocultação de cadáver
Art.211. Destruir, subtrair ou ocultar cadáver ou parte dele:
Pena – reclusão, de 1(um) a 3 (três) anos, e multa.
Bem jurídico: tutela-se o sentimento de respeito pelos mortos
Sujeitos do delito: O sujeito ativo é qualquer pessoa, inclusive familiares do morto. Quanto ao sujeito passivo, é a coletividade, entidade sem personalidade jurídica, a família e os amigos do morto.
Tipo objetivo: Destruir (fazer com que não subsista, tornar insubsistente, destroçar, queimar, reduzir a detritos ou resíduos, desaparecer), subtrair (tirar do local, furtar) e ocultar (esconder, desde que não destrua do cadáver ou parte dele).
Tipo subjetivo: É representado pelo dolo (vontade livre e consciente) de violar, subtrair ou ocultar cadáver.
Consumação: com a destruição total ou parcial do cadáver; desaparecer o cadáver ou parte dele, mesmo que temporariamente; retirada do cadáver ou parte dele, ainda que temporária.
Tentativa: É admissível.
Concurso de crimes: haverá concurso de crimes se o agente mata a vitima e posteriormente destrói ou oculta o cadáver (art.121e 211, CP), porém se o agente apenas subtrair ou destruir, viola sepultura, tipifica-se como crime único.
Pena: detenção de um a três anos e multa.
Suspensão condicional do processo: É cabível (art.89. Lei n. 9.099/95).
Ação penal: pública incondicionada.
Competência: aplica-se em primeira instância, desde que afastada a incidência do crime de aborto, em que este último é de competência do Tribunal do Júri.
Vilipêndio a cadáver
Art.212. Vilipendiar cadáver ou suas cinzas:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Bem jurídico: tutela-se o sentimento de respeito pelos mortos.
Sujeitos do delito: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo é toda coletividade.
Tipo objetivo: Vilipendiar (tratar com desprezo, aviltar, ultrajar e pode ser praticado por diversas maneiras como, atirar excrementos, no cadáver, proferir palavrões; despir cadáver; pratica de atos de necrofilia (Psicose que se caracteriza por atração sexual pelos cadáveres); despejar líquidos sobre as cinzas.
Tipo subjetivo: Dolo (vontade livre e consciente) de vilipendiar, aviltar o cadáver ou suas cinzas. Delito subjetivo especial de tendência devido a intenção de ultrajar o bem jurídico tutelado.
Consumação: ato ultrajante, delito material ou formal, quando verbalmente, perante o cadáver ou suas cinzas.
Tentativa: É admissível, salvo de for praticado de forma verbal. Crime unissubsistente.
Concurso de crimes: haverá concurso de crimes, desde que material, quando, além de vilipendiar o cadáver, violar sepultura (art.210 e 212 do CP). Mas, se crime formal, ou seja, palavras proferidas contra o morto estejam configuradas em calúnia (arts. 212 e 138, inciso 2°, do CP).
Penal: detenção, de um a três anos, e multa.
Suspensão condicional do processo: é admissível (art.89. Lei n. 9.099/95).
Ação penal: publica incondicionada.
Estupro 
Art. 213.  Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
2.1 COMENTÁRIO INTRODUTÓRIO
Antes da Lei 12.015/2009 o delito de estupro compreendia apenas a conjunção carnal (assim entendida como a introdução do pênis na vagina) forçada praticada em detrimento da mulher. Os demais atos libidinosos impostos mediante violência ou grave ameaça eram tidos como atentado violento ao pudor, tipificado no art. 214 do CP, agora revogado. A revogação desse artigo, contudo, não significou um abolitio criminis, pois a conduta antes prevista no art. 214 do CP passou a ser descrita no artigo 213 do mesmo Código.
Anteriormente o art. 213 (estupro) descrevia a seguinte conduta criminosa: "Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça". E o art. 214 (atentado violento ao pudor) tipificava o seguinte comportamento: "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal".
Atualmente não há mais o crime de atentado violento ao pudor, porém a conduta correspondente agora é considerada estupro; ou seja, a redação em vigor do art. 213 (estupro) alcança tanto a conduta antes considerada estupro como aquela anteriormente considerada como atentado violento ao pudor. O vocábulo estupro passou a ter, portanto, uma maior amplitude.
O crime em referência, em todas as modalidades, é considerado hediondo (art. 1º, V, da Lei nº 8.072/1990).
2.2 OBJETOS JURÍDICO E MATERIAL
Tem-se como objeto jurídico (bem juridicamente protegido) tanto a liberdade quanto a dignidade sexual (GRECO, 2010, v.III, p. 452). Ninguém pode ser forçado a práticas sexuais, sendo direito seu a escolha do parceiro com quem irá se relacionar. Tem-seem mira a liberdade de dispor do próprio corpo para práticas sexuais. Nesse passo também ensinam Pierangeli e Souza (2010, p. 10): "O bem juridicamente tutelado é a liberdade sexual do homem e da mulher, que têm o direito de dispor de seus corpos de acordo com sua eleição".
O objeto material é a pessoa (homem ou mulher) vítima do constrangimento.
2.3 SUJEITOS ATIVO E PASSIVO
Atualmente o crime de estupro compreende tanto a conjunção carnal forçada quanto a prática de outro ato libidinoso nas mesmas condições.
Ato libidinoso é qualquer ato destinado a satisfazer a lascívia, o apetite sexual (CAPEZ, 2011, v. 3, p. 26). Desse modo, a conjunção carnal é uma espécie de ato libidinoso. Tem, contudo, uma acepção mais restrita, pois "[…] caracteriza-se pela penetração total ou parcial do pênis na genitália feminina (introductio penis intra vas), com ou sem o objetivo de procriação e com ou sem ejaculação ou gozo genésico" (PIERANGELI e SOUZA, 2010, p. 11).
Para haver conjunção carnal, portanto, necessário se faz a penetração do pênis na vagina. Assim sendo, não é possível haver conjunção carnal entre pessoas do mesmo sexo.
É por essa razão que Rogério Greco (2010, v. III, p. 453), acertadamente afirma:
Assim, sujeito ativo no estupro, quando a finalidade for a conjunção carnal, poderá ser tanto o homem quanto a mulher. No entanto, nesse caso, o sujeito passivo, obrigatoriamente, deverá ser do sexo oposto, pressupondo uma relação heterossexual.
No que diz respeito à prática de outro ato libidinoso, qualquer pessoa pode ser sujeito ativo, bem como sujeito passivo, tratando-se, nesse caso, de um delito comum.
Desse modo, em regra podem ser sujeito ativo ou passivo do crime de estupro tanto homem quanto mulher. Daí Rogério Sanches Cunha (2010, v. 3, p. 250) alertar que se trata de crime bicomum, podendo qualquer pessoa praticar ou ser vítima de referida infração penal.
Alerte-se, todavia, conforme bem pontuado por Greco, que quando a conduta for mediante conjunção carnal, exige-se que o sujeito ativo imediato e vítima sejam de sexos opostos, pois não é possível ocorrer conjunção carnal entre pessoas do mesmo sexo.
Outrossim, não pode figurar como sujeito passivo do crime em deslinde menor de catorze anos, considerando que a relação sexual com pessoa nesta condição acarreta a incidência do art. 217-A do CP (estupro de vulnerável), seja o ato sexual forçado ou consentido.
Antigamente havia discussão sobre a possibilidade da mulher ser sujeito passivo do crime de estupro praticado pelo seu próprio marido. Alegava-se que como há o dever de relações sexuais entre os cônjuges, o marido que obrigava sua esposa à prestação sexual estaria escudado pelo exercício regular de direito. Esta visão hoje está totalmente superada, entendendo-se que embora a relação sexual constitua dever recíproco entre os cônjuges, sua obtenção não pode se dar por meios juridicamente inadmissíveis e moralmente reprováveis (CAPEZ, 2011, v. 3, p. 33).
Outra discussão outrora existente era sobre a possibilidade da prostituta ser vítima de estupro. Atualmente não há mais dúvidas que a mesma pode ser sujeito passivo do delito em análise, visto que o fato de manter relações sexuais mediante pagamento não elimina o seu direito de escolha de parceiros, corolário de sua liberdade e dignidade sexual.
2.4 TIPO OBJETIVO
Consoante já evidenciado, descreve o art. 213 do CP a seguinte conduta proscrita: "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso".
Constranger significa forçar, coagir, obrigar. No estupro constrange-se alguém (ser humano – homem ou mulher).
O meio de execução é a violência ou grave ameaça.
A violência consiste no emprego de força física (conhecida como vis corporalis ou vis absoluta) para obtenção da satisfação sexual. Ocorre quando a vítima é efetivamente agredida, amarrada, ou de qualquer modo tolhida em sua capacidade de resistir através da aplicação de força física.
A grave ameaça consiste na violência moral (vis compulsiva). No caso do estupro, a mesma interfere no plano psíquico da vítima, fazendo-a ceder, por intimidação, aos desejos do criminoso. O mal prometido pode ser contra a própria vítima (ameaçá-la de morte, por exemplo) ou contra terceiros a ela ligados (dizer, p. ex., que vai matar o seu genitor se ela não ceder). Não é necessário que esse mal seja injusto, podendo até ser justo (por exemplo: sujeito que força a vítima a manter relações sexuais com ele, ameaçando-a de denunciá-la por um crime que ela efetivamente praticou).
A gravidade da ameaça deve ser analisada sob o ponto de vista da vítima, demandando-se uma análise do caso concreto para fins de averiguar se o mal prometido foi suficientemente grave para fazê-la ceder [01]. Por exemplo: uma mesma ameaça pode ser insuficiente para intimidar uma pessoa culta e experiente, porém suficiente para levar uma pessoa simplória a concordar em se submeter aos desejos de outrem.
No delito em estudo, mediante violência ou grave ameaça, o agente constrange a vítima a: a) ter conjunção carnal; b) praticar outro ato libidinoso; c) permitir que com ela se pratique outro ato libidinoso.
A conjunção carnal consiste, consoante já explicado, na introdução do pênis na vagina. Limita-se a este ato.
Já o ato libidinoso consiste em gênero que abarca todos os atos voltados à satisfação da lascívia (por exemplo: sexo oral, masturbação, sexo anal etc.), sendo, inclusive, a conjunção carnal uma espécie de ato libidinoso.
2.5 TIPO SUBJETIVO
Pune-se a conduta do art. 213 do CP somente na forma dolosa. Nesse sentido ensinam Pierangeli e Souza (2010, p. 21): "Trata-se de crime exclusivamente doloso, e o dolo se expressa como consciência e vontade de realizar a conduta proibida, consistente em constranger, forçar, obrigar alguém à conjunção carnal ou ao ato libidinoso".
Entende a doutrina majoritária que não se exige finalidade especial do agente (elemento subjetivo do tipo específico) para configuração do crime. Quanto a este ponto Fernado Capez (2011, v. 3, p. 36) faz os seguintes comentários:
Na realidade, o que poderia causar certa dúvida é o fato de que tal crime exige a finalidade de satisfação da lascívia para a sua caracterização. Ocorre que se trata de um delito de tendência, em que tal intenção se encontra ínsita no dolo, ou seja, na vontade de praticar a conjunção carnal ou outro ato libidinoso. Desse modo, o agente que constrange mulher mediante o emprego de violência ou grave ameaça à prática de cópula vagínica não agiria com nenhuma finalidade específica, apenas atuaria com a consciência e vontade de realizar a ação típica e com isso satisfazer sua libido (o até então chamado dolo genérico).
Em algumas situações práticas, a exigência ou não da finalidade especial do agente de satisfação da lascívia, referida pelo autor transcrito acima, é importante para definir se o fato será enquadrado como estupro. Leia-se o seguinte exemplo dado por Rogério Greco (2010, v. III, pp. 484-485):
Assim, mesmo que com a finalidade de humilhar a vítima, se o agente, fisicamente mais forte, em vez de um simples tapa nas nádegas, introduzir o dedo em seu ânus, o delito não poderá ser entendido como mera injúria real, visto que, tanto objetiva quanto subjetivamente, o agente tinha conhecimento de que levava a efeito um ato grave e ofensivo à dignidade sexual da vítima, razão pela qual deverá ser responsabilizado pelo delito tipificado no art. 213 do Código Penal.
Note-se que no exemplo dado por Greco, se houvesse a exigência da finalidade especial do agente de satisfazer sua lascívia, o crime não poderia ser enquadrado como estupro; porém, como não há essa exigência, mesmo sendo intenção do agente unicamente humilhar a vítima, deverá responder pelo crime tipificado no art. 213 do CP, considerando que o fato enquadra-se perfeitamente na descrição típica.
2.6 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
Já dissemos antes que no delito em estudo, mediante violência ou grave ameaça, o agente constrangea vítima a: a) ter conjunção carnal; b) praticar outro ato libidinoso; ou c) permitir que com ela se pratique outro ato libidinoso.
Quando a prática for de conjunção carnal forçada, a consumação se dá com a penetração, parcial ou total, do pênis na vagina, exclusivamente. Logo, deve ser uma relação sexual entre homem e mulher.
Outra forma de se consumar o delito é através da prática de outro ato libidinoso por parte da vítima constrangida. Esse ato libidinoso pode ser praticado nela mesma (sem contato físico com outra pessoa), no sujeito ativo ou em terceiros. Pode, portanto, a vítima ser forçada, por exemplo, a se masturbar [02], a fazer sexo oral no agressor ou em terceira pessoa; em ambos os casos haverá o crime de estupro, que se consuma com a efetiva prática do ato libidinoso.
Por último, pode a vítima ser forçada a consentir que com ela se pratique outro ato libidinoso. Seria o caso, por exemplo, da vítima ser constrangida a permitir que o agente nela pratique sexo oral. Neste caso, também se consuma o delito com a efetiva prática do ato libidinoso.
A tentativa é possível nas três formas didaticamente esmiuçadas, desde que, por razões alheias à sua vontade, o agente não consiga consumar o delito. É possível o reconhecimento da desistência voluntária (art. 15 do CP), caso o agente, antes de consumar o crime, desista voluntariamente de sua prática, sendo que responderá apenas pelos atos até então praticados.
Sabe-se que o iter criminis comporta a seguintes fases: a) cogitação; b) preparação (atos preparatórios); c) execução; e d) consumação. Para ser reconhecida a tentativa, como é cediço, tem que se iniciar a fase de execução.
No caso do estupro a execução identifica-se com o constrangimento mediante violência ou grave ameaça visando o ato libidinoso (aí incluída a conjunção carnal, que é uma espécie de ato libidinoso) [03]. A consumação, conforme dito, ocorre com a efetiva prática desse ato.
Não há estupro quando a pessoa é constrangida a apenas presenciar a prática de ato libidinoso, consoante bem explicita Cleber Masson (2011, v. 3, p. 11): "De qualquer modo, não há estupro no ato de constranger alguém a presenciar ou assistir a realização de conjunção carnal ou outro ato libidinoso. A análise do art. 213, caput, do Código Penal autoriza a conclusão no sentido que o ato sexual deve ser praticado pela, com ou sobre a vítima coagida".
Por derradeiro, destacamos algumas situações que podem despertar dúvidas quanto à consumação do delito em estudo:
a) tratando-se de indivíduo que possui a patologia conhecida como ejaculação precoce, acaso pretenda consumar conjunção carnal ou sexo anal contra vítima coagida, se ejacula antes de concretizar seu intento, resta reconhecer a ocorrência apenas de tentativa se não tiver realizado no contexto outros atos libidinosos considerados autônomos;
b) no caso de homens acometidos de impotência coeundi (incapacidade de ereção peniana), acaso tentem estuprar alguém mediante penetração, estará caracterizado crime impossível (art. 17 do CP). Não cabe esta ressalva para homens acometidos de impotência generandi (incapacidade de procriação), pois esta não se confunde com a incapacidade de ereção.
2.7 FORMAS QUALIFICADAS
As qualificadoras do crime de estupro estão previstas nos §§ 1º e 2º do art. 213 do CP, conforme transcrevemos a seguir:
§ 1º  Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.
§ 2º  Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
A parte inicial do § 1º estabelece como circunstância qualificadora a lesão corporal grave sofrida pela vítima em decorrência do estupro. São consideradas graves para tais efeitos as lesões previstas nos §§ 1º (lesões corporais graves) e 2º (lesões corporais gravíssimas) do art. 129 do CP. Tal resultado agravador deve sobrevir a título de culpa (trata-se de delito preterdoloso), pois havendo dolo do agente, deve responder por estupro em concurso com o crime de lesão corporal. Exige-se, portanto, para caracterização da qualificadora em comento o dolo em relação ao estupro (antecedente) e culpa em relação à lesão corporal (consequente).
A parte final do § 1º traz como qualificadora a circunstância da vítima ser menor de dezoito e maior de catorze anos. A razão do limite mínimo de catorze anos é que se a vítima for mais nova ocorrerá estupro de vulnerável (art. 217-A do CP).
Interpretando a expressão "maior de 14 (catorze) anos" contida no dispositivo em análise, Fernando Capez (2011, v. 3, p. 49) afirma que "[…] a qualificadora não incidirá se o crime for praticado na data em que a vítima completa seu 14º aniversário". Essa também é a posição de Rogério Sanches Cunha (2009, p. 37). De outro modo, Rogério Greco (2010, v. III, p. 49) defende posição contrária, ensinando que no dia em que completa a idade prevista pelo tipo a pessoa já é considerada, no caso, maior de catorze anos; devendo, portanto, incidir a qualificadora. Filiamo-nos a esta última posição, apesar de ser a minoritária na doutrina.
O § 2º do dispositivo em comento elege como circunstância qualificadora a morte da vítima como resultado do estupro. Este resultado agravador, assim como no caso da lesão grave, também deve sobrevir a título de culpa, pois se for causado dolosamente deve o agente responder por estupro em concurso com homicídio, submetendo-se a julgamento pelo Tribunal do Júri.
Nos casos de estupro tentado, em que sobrevém a morte culposa ou lesão corporal também culposa, entende a doutrina majoritária [04] que deve o agente responder pelo estupro consumado qualificado, considerando a impossibilidade da ocorrência de crime preterdoloso tentado.
No caso de estupro contra menor de dezoito e maior de catorze anos, com resultado morte culposo em decorrência do crime sexual, incidirá apenas a qualificadora prevista no art. 213, § 2º, do CP. A idade da vítima não será valorada como qualificadora.
CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
Para Nucci (2009, p. 17), com as inovações introduzidas pela Lei nº 12.015/2009:
O crime passa a ser comum (pode ser cometido por qualquer pessoa) e de forma livre (pode ser cometido tanto por conjunção carnal como por qualquer outro ato libidinoso). Continua a ser material (demanda resultado naturalístico, consistente no efetivo tolhimento à liberdade sexual); comissivo (os verbos do tipo indicam ação); instantâneo (o resultado se dá de maneira definida no tempo); de dano (a consumação demanda lesão ao bem tutelado); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (é praticado em vários atos).
Ressalte-se que apesar do crime em estudo ser comissivo, é possível que seja reconhecida a forma omissiva imprópria (comissiva por omissão). Acontece isso, por exemplo, no caso da mãe que, podendo evitar, nada faz para impedir o estupro de sua filha menor pelo padrasto. Deve ela, no caso, responder pelo art. 213 do CP, considerando-se os termos do art. 13, § 2º, "a", do mesmo Código.
Violência Sexual Mediante Fraude
Art. 215.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
Parágrafo único.  Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
Mirabete explica que "o crime de violência sexual mediante fraude decorre da fusão, com modificações, dos delitos de posse sexual mediante fraude e atentado violento ao pudor mediante fraude, previstos na anterior redação dos arts. 215 e 216" (2015, p. 1550). 
Chamado pela doutrina de estelionato sexual, distingue-se o crime de violação sexual mediante fraude do estupro, porque naquele não há constrangimento empregado pelo agente mediante violência ou grave ameaça, enquanto neste, o agente utiliza-se de métodos ardilosos que viciam a vontade da vítima, induzindo-a em erro, burlando o seu consentimento,fazendo com que tenha o seu exercício de livre liberdade sexual viciado. 
Para alcançar o seu intento e conseguir ter a conjunção carnal ou outro ato libidinoso, o agente se vale de fraude ou outro meio semelhante à fraude, mas que sejam capazes de impedir ou dificultar a livre manifestação de vontade da pessoa. Fraude, no conceito de Prado (2010, p. 607), é "todo engodo, artifício ou ardil apto a enganar o sujeito passivo". Ou seja, a pessoa engana-se na legitimidade da conjunção carnal ou outro ato libidinoso a que se permite envolver-se. Para o delito ser reconhecido é necessário que o erro que a pessoa é induzida decorra de artifício, de uma artimanha adotada pelo agente, e tal estratagema impeça ou dificulte a livre manifestação de sua vontade.
Como exemplos de fraude para a configuração do delito, a Exposição de Motivos da Parte Especial do Código Penal traz simular casamento e substituir-se ao marido na escuridão da alcova (n.70). 
Sujeitos do delito
Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, homem ou mulher. Sujeito passivo também, pois o artigo menciona ‘alguém’, ou seja, tanto faz mulher, quanto homem a vítima do crime. É irrelevante a condição pessoal da vítima, pode ser, inclusive, prostituta, sendo que o Código protege a liberdade sexual da pessoa no referido artigo, e não a sua decência ou pudor. 
Estão excluídos de ser sujeitos passivos os menores de 14 anos ou aquelas pessoas em estado de completa vulnerabilidade, pois a prática da conjunção carnal ou outro ato libidinoso com eles caracteriza o crime de estupro de vulnerável, tipificado no art. 217-A.  
Distinção entre o crime de violência sexual mediante fraude (art. 215) e o estupro de vulnerável (art. 217-A, § 1º).
Aquele que, por ‘enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência (art. 217-A, § 1º), é considerado pelo Código Penal como sendo vulnerável. Sendo assim, a pessoa que se insere na dicção do mencionado parágrafo não pode ser vítima do delito de violência sexual mediante fraude (art. 215), e sim de estupro de vulnerável. 
É de se observar que não é apenas a presença da enfermidade ou deficiência mental que tornará a pessoa vulnerável, mas em que extensão isso torna o sujeito incapaz de discernir sobre o ato em que está inserido. No caso de haver condições mínimas de discernimento, que o torne capaz de alguma forma manifestar o exercício de sua vontade, não será considerado o seu estado de vulnerabilidade, e poderá figurar como vítima do delito de violência sexual mediante fraude, como bem esclarece Nucci (2016, p. 216): "no art. 215, está-se diante de aspectos relativos da livre manifestação, ou seja, a vítima, mesmo enferma ou deficiente, tem condições mínimas para perceber o que se passa e manifestar a sua vontade". 
A impossibilidade da vítima oferecer resistência por qualquer outra causa (art. 217-A, § 1º, 2ª parte), é também hipótese de vulnerabilidade. No crime de violência sexual mediante fraude, o agente obtém o consentimento da vítima, porém induzindo-a em erro ao ludibriá-la. Mirabete explica que "na circunstância a que se refere o art. 217-A, § 1º, 2ª parte, o agente não obtém o consentimento da vítima, mas esta, por qualquer causa, está impedida de oferecer resistência" (2015, p. 1553). Ou seja, para configurar o estupro de vulnerável deve haver uma completa impossibilidade de resistência, pois se presente condições que tornem a vítima capaz de resistir de uma ou outra forma, o agente enquadra-se no art. 215, se se amoldar ao tipo. 
Consumação e tentativa
O delito está consumado com a conjunção carnal, ainda que incompleta, ou com a prática de outro ato libidinoso. A tentativa é admissível no momento que o agente emprega fraude com o intuito de ter a conjunção carnal ou outro ato libidinoso, mas não consegue por circunstâncias alheias à sua vontade. 
Tipo subjetivo 
É o dolo específico de através da fraude conseguir ter a conjunção carnal ou a prática de ato libidinoso. Dolo específico também manifestado quando através da fraude o agente tem a finalidade de obter vantagem econômica. Nesse caso, aplica-se, além da pena de dois a seis anos de reclusão, a pena de multa.  
Aumento de pena
A pena é aumentada de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas (art. 226, I), e aumentada de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela (art. 226, II). 
Ação penal 
Crime que procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação (art. 225). Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos (225, par. ún.). Sendo que se a vítima é menor de 14 anos, o crime caracterizado é o do art. 217-A (estupro de vulnerável), e não do artigo 216. 
Corrupção de menores
Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
Classificação doutrinária: crime comum, material, de forma livre, instantâneo, comissivo (em regra), unissubjetivo e plurissubsistente.
Introdução: o crime permanece com o título de corrupção de menores, embora alguns autores sustentem que houve a revogação do nomen juris dado ao art. 218. Seja qual for o posicionamento adotado, é inegável que a expressão não mais serve para representar o delito em estudo, que consiste em aliciar o menor de 14 (quatorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem. Para Cleber Masson (CP Comentado), o CP deveria ter adotado a nomenclatura “mediação de menor vulnerável para satisfazer a lascívia de outrem”. Em geral, a doutrina utiliza o termo lenocínio para se referir aos crimes em que terceiro explora a dignidade sexual de alguém.
Como distingui-lo: o maior problema do art. 218 é diferenciá-lo de outros crimes contra menores de 14 (quatorze) anos. Aquele que induz uma pessoa de 12 (doze) anos à prática de ato libidinoso deve responder por corrupção de menores, como autor, ou por estupro de vulnerável, na condição de partícipe? E quem pratica o ato sexual, por qual crime deve responder? E como fazer na hipótese de submissão de vulnerável à prostituição, haja vista que a conduta encontra previsão expressa no art. 218-B? Para responder a todos esses questionamentos, vejamos, a seguir, cada uma das situações trazidas pelo CP:
a) a corrupção de menores - CP, art. 218: o agente induz (convence, cria a ideia) a vítima a praticar algum ato que vise satisfazer a lascívia de outra pessoa. O ato deve ser meramente contemplativo (ex.: uso de uma fantasia), sem que exista contato físico entre o terceiro beneficiado e a vítima. Se vier a ocorrer conjunção carnal ou outro ato libidinoso diverso, ambos, quem induziu e beneficiado, serão responsabilizados por estupro de vulnerável - CP, art. 217-A -, desde que, é claro, tenha existido dolo do aliciador nesse sentido. Ademais, a conduta deve ter como destinatária pessoa determinada (beneficiário certo). Caso contrário, caso o agente convença a vítima a satisfazer a lascívia de um número indeterminado de pessoas, o crime poderá ser o do art. 218-B: favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável;
b) o estupro de vulnerável - CP, art. 217-A: consiste em ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com quem é menor de 14 (quatorze) anos. Se alguém alicia o vulnerável a praticar ato sexual com terceiro, ambos, aliciador e beneficiado, devem responder por estupro de vulnerável;
c) o favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável - CP, art. 218-B: o conceito de vulnerável, nesta hipótese, é mais amplo: menor de 18 (dezoito) anos ou quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato sexual. Sendo a vítima menor de 14 (quatorze) anos, só ocorrerá o crimedo art. 218-B se o aliciamento se der a um número indeterminado de pessoas. Se determinado, o crime será o do art. 218. Ademais, se vier a ocorrer o contato sexual entre vítima e beneficiado, o crime será o de estupro de vulnerável, tanto para o aliciador quanto para quem pratica o ato sexual.
Sujeito ativo: é o proxeneta, que pode ser qualquer pessoa. A conduta do beneficiado (quem satisfaz a lascívia pelo ato meramente contemplativo)é atípica. Contudo, caso venha a ocorrer a conjunção carnal ou outro ato libidinoso, ele, beneficiado, será responsabilizado por estupro de vulnerável - CP, art. 217-A. É essencial que o agente tenha consciência de que a vítima é menor de 14 (quatorze) anos.
Sujeito passivo: é a pessoa, do sexo masculino ou feminino, menor de 14 (quatorze) anos. Se a vítima for maior de 18 (dezoito) anos, o crime será o do art. 227 do CP. Se for maior de 14 (quatorze) e menor de 18 (dezoito) anos, aplicar-se-á a forma qualificada do art. 227, prevista no parágrafo primeiro.
Consumação: não é necessário, para a consumação do crime, que o beneficiado tenha a sua lascívia satisfeita. Isso não significa, no entanto, que se trate de crime formal, mas material, pois, para a consumação, é necessário que a vítima pratique o ato a que fora induzida. Caso não o faça por razão alheia à vontade do aliciador, o crime ficará na esfera da tentativa - CP, art. 14, II.
Elemento subjetivo: é o dolo, consistente em buscar a satisfação da lascívia de outrem, não sendo punível a forma culposa por ausência de previsão legal.
Corrupção de menores do ECA: Art. 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la. Não há como confundir os delitos. No art. 244-Bdo ECA, o agente pratica crime ou contravenção penal na companhia de menor de 18 (dezoito) anos, ou o induz a praticá-lo, fazendo com que aquela pessoa, que ainda não atingiu a maioridade, passe a fazer parte do mundo do crime. Trata-se de crime formal, que não exige resultado naturalístico para a sua consumação. No art. 218 do CP, por outro lado, a vítima, menor de 14 (quatorze) anos, é induzida a satisfazer a lascívia de outrem mediante a prática de alguma conduta sem contato físico, meramente contemplativa. A seguir, posicionamento do STJ acerca da corrupção do ECA:
“Tratando-se de crime formal, basta à sua consumação que o maior imputável pratique com o menor a infração penal ou o induza a praticá-la, sendo irrelevantes as consequências externas e futuras do evento, isto é, o grau prévio de corrupção ou a efetiva demonstração do desvirtuamento das vítimas da corrupção de menores.” (STJ, AgRg no REsp 1378870 / MG, Relatora Ministra Regina Helena Costa, j. 13/02/2014).
Abolitio criminis (1): “Com a publicação da Lei nº 12.015/09, esta Corte Superior de Justiça firmou orientação no sentido de que a corrupção sexual de maiores de 14 (quatorze) anos e menores de 18 (dezoito) anos deixou de ser tipificada no Estatuto Repressivo, operando-se em relação à conduta verdadeira abolitio criminis, como é o caso dos autos.” (STJ, HC 273582 / GO, Rel. Min. Moura Ribeiro, j. 17/09/2013).
Abolitio criminis (2): “3. Como se pode ver, com a reforma empreendida pela Lei 12.015/2009, a corrupção sexual de maiores de 14 (catorze) anos e menores de 18 (dezoito) deixou de ser tipificada no Código Penal, operando-se verdadeira abolitio criminis. 4. Não se pode afirmar que a conduta incriminada no antigo artigo 218 do Código Penal continuou sendo tipificada na legislação penal, agora no artigo 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois o ilícito previsto na Lei 8.069/1990 corresponde ao que estava disposto na Lei 2.252/1954, agora revogada, não trazendo em seu conteúdo qualquer conotação sexual. Precedentes.” (STJ, HC 221480 / ES, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 02/05/2013).
Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente
Art. 218-A. Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.
Classificação doutrinária: crime comum, formal, de forma livre, instantâneo, comissivo (em regra), unissubjetivo e plurissubsistente.
Núcleos do tipo: a) praticar, na presença de alguém menor de 14 (quatorze) anos, conjunção carnal ou outro ato libidinoso diverso: o agente faz sexo (em sentido lato) na presença do vulnerável, sem, no entanto, induzi-lo a presenciar (ex.: em um cinema, com um menor de quatorze na poltrona ao lado, um casal pratica sexo oral). A finalidade especial deve estar presente: a satisfação da própria lascívia ou a de outrem; b) induzir alguém menor de 14 (quatorze) anos a presenciar conjunção carnal ou outro ato libidinoso diverso: nesta hipótese, o agente convence a vítima a presenciar o ato. A finalidade especial (satisfação da lascívia) deve estar presente. Trata-se de tipo penal misto alternativa. Portanto, se, em um mesmo contexto fático, o agente pratica o delito em suas duas formas, ocorrerá um único crime.
Contato físico com a vítima: é essencial, para a configuração do crime do art. 218-A, que a vítima não se envolva fisicamente no ato – ela apenas assistirá ao ato sexual. Caso contrário, o crime será o de estupro de vulnerável - CP, art. 217-A.
Vítima que presencia o ato por webcam: não vejo como afastar a prática do delito do art. 218-A nesta hipótese. Se alguém convence uma pessoa, menor de 14 (quatorze) anos, a assistir conjunção carnal ou ato libidinoso diverso por transmissão em vídeo, pela Internet, é evidente que o objeto jurídico tutelado (a dignidade sexual) será atingido. Para Cleber Masson, a transmissão não precisa ser “ao vivo”, em tempo real: “também é possível que o menor presencie relações sexuais ocorridas em local e tempo diversos, com a finalidade de satisfazer a lascívia de determinada pessoa” (CP Comentado). Por outro lado, caso a vítima, criança (menor de doze anos), seja convencida a se expor, de forma pornográfica (ex.: strip-tease), diante da webcam, desde que presente a finalidade especial (intenção de praticar ato libidinoso), o crime será o do art. 241-D, II, do ECA.
Vítima corrompida: pouco importa o histórico sexual da vítima. Ainda que se prostitua, sendo menor de 14 (quatorze) anos, ocorrerá o crime, caso ela venha a presenciar o ato sexual por dolo do agente.
Sujeito ativo: qualquer pessoa, homem ou mulher, inclusive na modalidade conjunção carnal, afinal, o que se pune é a prática do ato sexual na presença do vulnerável. É possível o concurso de pessoas, quando todos os envolvidos na prática sexual tem consciência de que o menor está presente, ou quando todos participam do induzimento. É essencial que o agente tenha consciência de que a vítima é menor de 14 (quatorze) anos.
Sujeito passivo: é a pessoa menor de 14 (quatorze) anos, do sexo masculino ou feminino. Os demais vulneráveis, do art. 217-A, § 1o, não foram abrangidos pelo dispositivo.
Elemento subjetivo: é o dolo, com a especial finalidade de satisfação da lascívia (própria ou de outrem). Por ser crime formal, pouco importa se a lascívia foi satisfeita ou não. No momento em que o menor presenciar o ato sexual, o delito estará consumado. Ademais, não se pune a forma culposa. Por isso, se os pais, por descuido, deixam a porta do seu quarto aberta, e o menor presencia o casal fazendo sexo, não haverá a prática do delito.
Ação penal: como todos os demais delitos sexuais contra menor de 18 (dezoito) anos, crime de ação penal pública incondicionada - CP, art. 225, parágrafo único.
Artigo 241-D do ECA: Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso; II– pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita. No crime do ECA, no inciso I, o agente induz a vítima a ter acesso a material contendo cena de sexo explícito ou pornografia com o objetivo de, com ela, praticar atos libidinosos (que, se vierem a ocorrer, configurarão o delito de estupro de vulnerável). No crime do art. 218-A, por outro lado, o agente quer que a vítima presencie o ato sexual por ser algo que lhe dá prazer. Não existe o objetivo de prática de ato libidinoso, como no ECA, mas mera satisfação de lascívia. Ademais, perceba que o ECA fala em criança. Portanto, a vítima só será aquela menor de 12 (doze) anos.

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