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TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 153 153 TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina KlassmannI Maria de Fátima Garcia Lopes MerinoII Viviani Camboin MeirelesIII Laura Misue MatsudaIV RESUMO A administração tem sido entendida como processo que prevê, organiza, comanda, coordena e controla uma organização/serviço. Para o enfermeiro, a dimensão administrar é inerente ao seu papel de cuidar. Este estudo objetivou apresentar e discutir os principais desdobramentos das Teorias Administrativas no contexto da enfermagem. Através de estudos bibliográficos e discussões em grupo, levantou-se que a enfermagem, em grande parte, ainda atua de acordo com os modelos da administração do início do século XX, caracterizada pela hierarquia verticalizada, autoritária, focada em cumprimento de tarefas e excessivamente normalizada. Isso tudo tem resultado em cuidado que não corresponde com as reais necessidades e expectativas do cliente, visto que se apresenta de forma fragmentada, impessoal e descontínua. Para a efetividade das ações da enfermagem, foram sugeridas mudanças no modelo de gestão de modo que se busque o atendimento das necessidades de saúde não só dos clientes, mas também dos profissionais e da sociedade. Palavras chave: Administração em Saúde; Enfermagem; Enfermeiro. IEnfermeira. Mestre em Enfermagem. Professora do Curso de Enfermagem da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Câmpus - Toledo – PR. E-mail: jaciane.klassmann@pucpr.br IIEnfermeira. Mestre em Enfermagem. E-mail: fatimamerino@gmail.com IIIEnfermeira. Mestre em Enfermagem. E-mail: vcmeireles@ibest.com.br IV Enfermeira. Prof.ª Dr.ª da Universidade Estadual de Maringá. E-mail: lmmatsuda@uem.br TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 154 154 ADMINISTRATIVE THEORIES X NURSING ADMINISTRATION/MANAGE ABSTRACT The administration has been known as process that prevent, organize command, coordinate and control an organization or service. For the nurse; administration is inherent to the role of taking care. This study aimed and discuss the main unfoldings of the Administrative Approaches in the nursing context. We mentioned, throughout bibliography studies and group discussion, that the Nursing mostly acts according to the administration models of the beginning of the 20TH century, that is characterized by the vertical and authoritarian hierarchy focused on the fulfillment of tasks and excessively normalized. All of that has resulted in care, and does not fit the real client’s expectations and needs, since it’s presented in fragmentary, impersonal and discontinuity hierarchy. For the effectiveness of the nursing action, we suggested changes in the management model for it to be able to attend, not only the clients health needs, but also the professional and society. Key words: Health Administration; Nursing; Nurse. INTRODUÇÃO A atenção à saúde, sempre se desenvolveu de maneira distinta, por diferentes atores sociais, mas apesar disso, é possível identificar abordagens hegemônicas em diferentes períodos e situações( Matos e Pires, 2006). Na atualidade, a administração em saúde necessita adotar novas concepções e práticas de modo que operacionalize o serviço de forma ágil e otimize os recursos existentes. Essa afirmação tem como base o contexto das organizações de saúde no Brasil que se fundamenta em modelos gerenciais ultrapassados e se depara com o sucateamento do sistema, a escassez de recursos, o surgimento da competitividade de mercado e a clientela mais exigente por serviços de qualidade. O conceito “administração” provém do latim ad (direção, tendência para) e minister (subordinação ou obediência), designando o desempenho de tarefas e a TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 155 155 direção de profissionais com o objetivo de atingir a produtividade e a lucratividade (Chiavenato, 2004). Tem-se então que a administração visa o aperfeiçoamento do processo de trabalho, pois as teorias e técnicas administrativas permitem estruturar as organizações e planejar as ações para o alcance dos objetivos. Por administração contemporânea, entende-se um novo modelo de gestão capaz de atuar frente às rápidas mudanças do mercado mediante a formação de novas estruturas e processos, de forma horizontal, descentralizada, adequadas às contingências ambientais (Santana, 2007). Com isso, os profissionais que exercem a administração necessitam desenvolver e aprimorar competências para conduzir a organização ao sucesso, através da tomada de decisões eficazes em situações críticas, da manutenção de relacionamento com equipes profissionais, e do melhoramento pessoal constante. Na enfermagem, os novos campos de atuação do enfermeiro, que têm surgido nas últimas décadas, requerem enfermeiros com competências gerais e específicas na área administrativa (Marquis e Huston, 2005). Neste contexto, o gerenciamento na enfermagem envolve atividades complexas que, cada vez mais, exigem dos profissionais competências cognitivas e técnicas na implementação de estratégias adequadas às atuais tendências administrativas contemporâneas que atendam aos anseios da organização e de seus gestores (Jorge et alii, 2007). É importante então que os profissionais adquiram conhecimentos acerca das diferentes abordagens teóricas, desenvolvidas nessa disciplina ao longo do tempo, para que, através disso, façam escolhas e adaptações no modelo de gestão que orienta a sua prática. A importância da administração na atuação do enfermeiro pôde ser constatada no estudo realizado com profissionais recém graduados, que afirmaram ter sentido dificuldades relacionadas à liderança e administração/gestão em enfermagem (Dias et alii, 2004). Apesar de a administração fazer parte do cotidiano da enfermagem, ela (a enfermagem) pouco tem inovado no modo de gerenciar o seu serviço, visto que mesmo na atualidade, internamente se apresenta nos moldes taylorista e fordista os quais imprimem formas de atuações verticalizadas, rígidas e impessoais (Matos e Pires, 2006). Muitos profissionais que seguem os modelos tradicionais de gerenciamento (Taylor, Fayol e outros estudiosos da administração do início do Século XX) embora TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 156 156 sejam competentes tecnicamente, apresentam dificuldades em gerenciar serviços e não conseguem atingir o equilíbrio entre a tomada de decisões e a implementação das ações (Jorge et alii, 2007). Com isso, não atendem as expectativas das organizações que enfrentam o desafio de adotar modelos mais modernos de gerenciamento pautados na participação e em programas de qualidade os quais preconizam a descentralizaçãodas decisões no trabalho, a atuação em equipe e o aperfeiçoamento constante dos trabalhadores (Fernandes et alii, 2003). Considerando a importância da administração na enfermagem, faz-se importante conhecer o conteúdo de algumas Teorias Gerais da Administração (TGA), ou simplesmente Teorias Administrativas, pois elas expressam finalidades e métodos que auxiliam na estruturação e na condução dos processos de atendimento desenvolvidos pela equipe multiprofissional. Entende-se que a administração na enfermagem se refere ao cuidar indireto e que, este modo de cuidar, é fundamental para o processo de atenção à saúde, pois é mediante as práticas administrativas que o enfermeiro viabiliza o cuidado de qualidade (Felli e Peduzzi, 2005). Pelo fato de a atuação do enfermeiro se inserir formalmente em pelo menos duas grandes dimensões, a administrativa (cuidados indiretos) e execução de procedimentos/técnicas (cuidados diretos), e por gerenciar o processo de atendimento ao indivíduo doente, quando institucionalizado, é que se propõe a realização deste estudo que tem como objetivo apresentar e discutir os principais desdobramentos das Teorias Administrativas no contexto da enfermagem. Neste estudo serão abordadas as Teorias da Administração Científica; Clássica; de Relações Humanas; Burocrática; Comportamental; Sistêmica; Contingencial; da Gestão da Qualidade e Re-Administração. Esta última, apesar de ainda não se ter conhecimento da sua aplicação no trabalho da enfermagem, fará parte deste estudo por consistir numa proposta brasileira, interessante e atual. TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 157 157 MATERIAL E MÉTODO Trata-se de um artigo de revisão realizado através de estudo bibliográfico e reflexivo, no ano de 2009. Foram utilizadas publicações na forma de livros, periódicos impressos e em meios eletrônicos, obtidos na Biblioteca Central da Universidade Estadual de Maringá e em bancos de dados da Bireme, Lilacs, Scielo e Google Acadêmico. Após seleção e leitura individualizada das teorias contempladas, realizaram-se reuniões sucessivas para estudo e discussão das mesmas. Posterior a isso, teve início a redação do presente texto cuja discussão terá como base a realidade vivida ou percebida pelas autoras. ABORDAGEM TEÓRICA Teoria da Administração Científica/Teoria Mecanicista. Com o advento da revolução industrial, ocorreram transformações sociais e econômicas que influenciaram no resultado do trabalho e nos modos de produção. Essas transformações resultaram na edificação de grandes indústrias e no fortalecimento do comércio que passou a ter como grande preocupação, o aumento da produção, o desenvolvimento e a manutenção do mercado das indústrias, originando a necessidade de estudos referentes à administração. A primeira Escola de Administração baseou-se nos métodos científicos de observação e mensuração da produção. Essa Escola, denominada Científica, teve início no começo do século XX pelo engenheiro americano Frederick Winslow Taylor (Chiavenato, 2004). A Escola da Administração Cientifica focaliza a medição e a estrutura do trabalho (Bowditch e Buono, 2004). Desta forma, Taylor através de estudos voltados à racionalização dos tempos e dos movimentos, interveio no trabalho, sistematizando a divisão do trabalho, a descentralização de hierarquias e a super especialização do trabalhador (Chiavenato, 2004). Também aperfeiçoou o modo de produção, pela revisão eqüitativa das tarefas, da responsabilidade dos operários e diretores e remuneração daqueles de acordo com a quantidade proporcional de produção. TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 158 158 Taylor iniciou seu estudo pela observação do trabalho dos operários. Sobre este tema, Chiavenato (2004) comenta que o “Estudo de Tempos e Movimentos” teve a preocupação sobre a divisão e subdivisão dos movimentos necessários para o desenvolvimento de cada tarefa em combinação entre evitar o desperdício dos esforços humanos e os métodos de redução de gastos. Nesse modelo, concebia-se a idéia de que o operário mais produtivo, ao perceber que recebia o mesmo valor salarial que o outro com menos produtividade, deixava de se dedicar inteiramente ao trabalho e não produzia de acordo com a sua real capacidade. Certamente, a Escola de Administração Científica ascendeu o pensar e agir em administração, contudo, a crítica afirma que essa teoria induz o trabalhador a atuar como uma máquina, pois a super especialização o robotizava, sendo ele visto como um “apêndice da maquinaria industrial”. De um ponto de vista pessimista acerca do trabalhador, Taylor adotou o conceito de homus economicus ao afirmar que o trabalhador (operário) era movido exclusivamente pelo dinheiro (Chiavenato, 2004). Ao fazer um paralelo da teoria científica com a enfermagem, tem-se que em razão das mudanças sociais e econômicas das organizações de saúde, a enfermeira se deslocou para as tarefas administrativas como forma de atuar em atividades mais intelectuais que as manuais (Stacciarini et alii, 1999). Desse modo, observa-se que o tipo de administração taylorista também tem gerado divisão do trabalho e padronização excessiva de tarefas na enfermagem. Como resultado tem-se a fragmentação e a impessoalidade no processo de cuidado, visto que a determinação de uma tarefa específica para cada profissional o distancia da assistência integral do cliente, resultando em baixa resolutividade das ações implementadas e insatisfação. Em nossa experiência profissional como enfermeiras, nos deparamos diariamente com a realidade voltada à produtividade, pois o que importa é “vencer as tarefas” e “passar um plantão perfeito”. Isso subtende que todos os procedimentos ou tarefas que se referirem a um determinado turno ou plantão devem ser realizados. Nessa perspectiva, o modelo de produção em série, abordada por Taylor, no qual cada trabalhador executa sempre as mesmas tarefas, é adotada para responder às necessidades da instituição. A justificativa para essa forma de atuar na enfermagem, quase sempre se baseia na falta de trabalhadores, na alta TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 159 159 demanda de serviços, associadas à obrigatoriedade de se executar um grande número de procedimentos/cuidados. O trabalho executado de forma tecnicista ocorre quando se privilegia a execução de tarefas em detrimento da atenção integral e humanizada do cliente. Decorrente disso, a atenção às necessidades do cliente fica prejudicada, porque a interação entre o profissional (neste caso os da enfermagem) e o cliente, quando ocorre, é superficial e breve. Pelo fato de vários profissionais atenderem a um cliente, não se consegue estabelecer um vínculo que permita conhecer e se relacionar com o mesmo de maneira globalizada e contínua. Nesse processo, além do cuidado fragmentado, ocorre também a segmentação da equipe que passa a atuar individualmente, comprometendo o resultado final do cuidado e os objetivos do serviço. O método rígido de produção estabelecido naAdministração Científica limita a reflexão acerca dos procedimentos e rotinas de enfermagem, desconsiderando a avaliação dos serviços e a organização na busca de um trabalho mais eficiente (Marquis e Huston, 2005). Portanto, a rigidez das rotinas inviabiliza o seu melhoramento e priva as pessoas envolvidas no processo de trabalho de encontrar formas de se atuar com melhor desempenho, reduzindo custos e aperfeiçoando a qualidade do cuidado. Considera-se importante a existência de modelos e instrumentos que padronizam e direcionam o serviço de enfermagem, contudo, faz-se necessário que tais modelos sejam flexíveis e aplicáveis a cada realidade, devendo ser submetidos a avaliações constantes por todos os membros da equipe, de modo que se identifiquem problemas e apliquem soluções que aprimorem o trabalho. Também na enfermagem, o conceito de homus economicus dado por Taylor pode ser percebido. Não raras vezes, por estar em uma instituição que garante a estabilidade ou pela facilidade de ingresso na profissão, principalmente nas categorias de Nível Médio, o trabalhador aí permanece ao longo de sua vida, quase que unicamente por causa do salário que recebe. TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 160 160 Teoria Clássica As transformações sociais e econômicas se deram pela necessidade de se utilizar novos métodos e técnicas de modo a favorecer o crescimento da industrialização e a fabricação em massa de produtos comercializáveis. Dessa forma, o trabalho, anteriormente realizado de forma artesanal, passou a ser realizado por máquinas trazendo para as cidades, trabalhadores rurais para serem empregados nas fábricas (Bowditch e Buono, 2004). Para os mesmos autores acima citados, a Teoria Clássica recebeu influências sociais, econômicas e tecnológicas que favoreceram a mudança de uma sociedade agrária para uma sociedade industrial. Essa teoria, junto com a Administração Científica, buscou a eficiência das organizações mediante o trabalho conjunto entre as empresas e os trabalhadores. Neste sentido, à Teoria Clássica, desenvolvida por Fayol, em meados de 1910, teve como foco a estrutura e o funcionamento da organização. Para Fayol, as funções básicas das empresas são: técnicas, comerciais, financeiras, de segurança, contábeis e administrativas. Para esse autor, as funções administrativas deveriam ser distribuídas proporcionalmente entre todos os níveis da hierarquia (Chiavenato, 2004). Ainda segundo Chiavenato (2004), a teoria de Fayol teve pouca originalidade, pois coletou os princípios gerais de outros autores da época. Dentre os princípios da administração enunciados por Fayol, se destacam a divisão do trabalho; autoridade e responsabilidade; unidade de direção; remuneração do pessoal e o espírito de equipe. Esses cinco princípios podem ser entendidos mediante a necessidade de se instituir um procedimento de disciplina de trabalho que permita, por parte do empresário, o controle do trabalhador. A Teoria Clássica assume enfoques prescritivo, normativo e formal, porque constitui as organizações a partir de esquemas lógicos e preestabelecidos, desconsiderando a importância do teor psicológico e social dos trabalhadores. Na enfermagem, o Organograma, formado por vários níveis hierárquicos e a execução de tarefas específicas pelos membros de cada nível, indica que a Teoria Clássica se encontra presente neste segmento. Isso retrata a forma normativa e centralizada com que o serviço é estruturado, impedindo ou retardando as decisões TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 161 161 e ordens. Nesse contexto, no ambiente de trabalho, as pessoas e as relações interpessoais não são devidamente consideradas. Considera-se que é necessário estabelecer uma estrutura no serviço de enfermagem de modo que organize e possibilite aos trabalhadores executar as atribuições necessárias ao atendimento do cliente e também da organização, entretanto, eles (os trabalhadores) devem ser considerados como seres humanos que possuem necessidades e expectativas relacionadas tanto a fatores pessoais como profissionais. Nesse âmbito, o superior hierárquico (o enfermeiro), deve agir como articulador e facilitador do processo de trabalho, de modo a atuar junto à sua equipe, no sentido de se obter o equilíbrio entre a otimização dos processos de trabalho e a humanização no serviço. Teoria das Relações Humanas A Escola das Relações Humanas trouxe contribuições na administração sob o aspecto relacionado aos recursos humanos das organizações, considerando que o tratamento das pessoas não pode ser semelhante ao de máquinas. Iniciada na década de 1920, a Escola das Relações Humanas foi desenvolvida nos Estados Unidos por Elton Mayo e colaboradores, ficando conhecida como as “Experiências de Hawthorne”, realizadas na fábrica da Western Ellectric em Hawthorne (Kurcgant et alii, 1991). A Teoria das Relações Humanas tem como princípios a valorização do recurso humano de uma empresa, permitindo-lhe certa autonomia e poder de decisão sobre a divisão do trabalho e seu ritmo de atividade. De acordo com essa teoria, a liberdade e as relações interpessoais no ambiente de trabalho são importantes para o aumento da produtividade. Na Teoria das Relações Humanas o comportamento do indivíduo se apóia no grupo, significando que a administração não pode tratar os empregados, um a um, como se fossem pessoas isoladas (Chiavenato, 2004). Desta forma, o reconhecimento do grupo bem como a aprovação social da pessoa age como fatores de motivação ao funcionário. O grupo é importante para o bom desempenho do trabalhador, despertando a atenção para o fato de que os indivíduos agem e respondem de acordo com os TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 162 162 padrões de comportamentos estipulados pelo grupo que ele faz parte. Assim, a cooperação entre os trabalhadores se reflete nos resultados da produção. Relacionando a Teoria das Relações Humanas com a enfermagem, percebe-se que não existem filosofias e políticas institucionais claras que consideram essa abordagem na administração do pessoal da enfermagem (Kurcgant et alii, 1991).. O que se vê no cotidiano de trabalho em instituições hospitalares, são condutas pontuais das lideranças que podem ser entendidas como humanizadoras, mas que exercem pouco impacto na equipe em razão de que ao existirem, quase sempre dependem da iniciativa e da concepção pessoal de cada líder (enfermeiro). A preocupação das organizações e do sistema de saúde brasileiro, correspondendo com o modelo neoliberal, tem-se voltado à competição e à quantidade de atividades executadas, em detrimento das relações humanas formais e informais dos profissionais. Esse fato pode conduzir ao não envolvimento do trabalhador para com o serviço, por aumentar a competição entre os membros da equipe e também, limitar a participação dele no processo de trabalho. O sucesso da administração se faz mediante a participação e a motivação de todos os membros que conduzem o processo de trabalho. Dessa forma,a enfermagem que clama por reconhecimento profissional e união no trabalho, ao adotar os princípios da Teoria das Relações Humanas, poderá obter o envolvimento da equipe e somar esforços para o alcance de objetivos comuns que é a saúde das pessoas (Matsuda e Évora, 2003). Teoria Burocrática O modelo burocrático de administração, iniciado na década de 1940, a partir das obras do economista e sociólogo Max Weber, propõe uma teoria que aborda de forma sistêmica os problemas organizacionais. Vale lembrar que o termo burocracia segundo a concepção de Weber, não tem o mesmo significado do que lhe é atribuído pelo senso comum. Para esse autor, a burocracia, consiste na racionalização e sistematização do processo de trabalho, através de normalização formal, dos procedimentos e comportamentos (Chiavenato, 2004). TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 163 163 A Teoria Burocrática reza pela sistematização da divisão de trabalho embasada em normas, rotinas e procedimentos (Chiavenato, 2004; Kurcgant et alii, 1991). Também enfatiza a hierarquia de autoridade, utilizando-se de símbolos e sinais que indicam a posição hierárquica dos trabalhadores, permitindo a identificação dos chefes e dos subordinados na instituição. A enfermagem segue a Teoria Burocrática no que se refere à constituição de um grupo dominante que define as posições de seus profissionais (Kurcgant et alii, 1991). Utiliza-se constantemente de normas e rotinas que, em muitas vezes, impedem uma maior agilidade dos serviços, condiciona os profissionais, limita a sua autonomia e crescimento. Noutras situações, as normas e rotinas existem descritas em manuais e documentos da organização que raramente são consultados pelos membros da equipe. A normalização do processo de trabalho deve ser considerada pelo enfermeiro como uma necessidade da dimensão administrativa/burocrática para atingir o cuidado de qualidade ao cliente, entretanto esse recurso deve sempre ser utilizado com parcimônia e bom-senso de modo que não resulte em prejuízos ao cliente e à equipe de saúde. Considera-se que, se bem utilizados, os princípios da Teoria Burocrática podem assumir um importante papel na enfermagem devido à heterogeneidade na formação dos elementos que compõe a equipe, à multiplicidade e a complexidades das ações a realizar. Nesse sentido, é preciso que as lideranças se atenham ao fato de que qualquer excesso é contraproducente, pois se houver muita formalidade, a atuação da equipe pode sofrer engessamento e no caso de muita informalidade, pode ocorrer “[...] caos total por falta de direção e controle sobre os interesses individuais que certamente se sobressairão aos organizacionais” (Spagnol e Fernandes, 2004, p. 160). É sempre bom lembrar que os instrumentos burocráticos de caráter flexível (Regimento, Normas, Rotinas, Procedimentos e outros) que regem uma instituição ou serviço, seja qual for o meio de divulgação, devem sempre ser atualizados com a participação de todos os interessados e mantidos em local de fácil visualização e acesso para consulta. TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 164 164 Teoria Comportamental A oposição à Escola Clássica sustentada pela Escola das Relações Humanas evoluiu para uma segunda fase chamada de behaviorista que deu origem a Teoria Comportamental, na década de 1940, tendo como principal expoente Herbert Simon. A Teoria Comportamental apresentou-se diferente da Teoria das Relações Humanas por não aceitar a concepção ingênua de que somente a satisfação do trabalhador é provedora da eficiência (Chiavenato, 2004). O behaviorismo rejeita o modelo de “homo economicus” no qual se baseava a Teoria Científica. Segundo os behavioristas, os homens se comportam racionalmente em relação a um conjunto de características de determinada situação. Este conjunto compreende o conhecimento das alternativas de ações disponíveis, as suas conseqüências e o estabelecimento de suas preferências. Na abordagem comportamental, percebe-se a preocupação com a estrutura se transfere para o processo e para a dinâmica organizacional. Para explicar o comportamento humano, McGregor criou a Teoria X e Y. A Teoria X tende a levar os gerentes ao controle rígido dos subordinados. Nessa abordagem, a gerência é autoritária, pois concebe os funcionários como seres preguiçosos e desprovidos de ambição o que induz o gerente a assumir a concepção de que o empregado não deseja assumir responsabilidades e intenta atuar contra as necessidades da organização (Bowditch e Buono, 2004; Kurcgant et alii, 1991). Os pressupostos da Teoria X, a nosso ver, se assemelham à administração clássica por não perceber o trabalhador como um Ser que busca a autonomia e o crescimento próprio e da organização. De outra maneira, na Teoria Y o administrador concebe os funcionários como sendo de boa índole, orientados para o desenvolvimento e apoio às mudanças organizacionais (Kurcgant et alii, 1991). Assim, o administrador assume as características da gerência participativa e autônoma, que em decorrência disso motiva os funcionários. É possível perceber então que a Teoria Y se assemelha aos princípios da administração comportamental. Na administração do pessoal de enfermagem freqüentemente são encontradas chefias compatíveis com os pressupostos da Teoria X de McGregor. Nesse sentido, TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 165 165 os enfermeiros adotam uma postura autoritária e centralizadora, de modo que as decisões concentram-se no chefe que canaliza o serviço para o cumprimento de tarefas como um ato mecânico e condicionado (Marquis e Huston, 2005). Na enfermagem, centralizar o processo decisório e focar o trabalho no cumprimento de tarefas tende a desvalorizar as maneiras criativas e humanas de se atuar. Os meios criativos de exercer as tarefas podem ser mais vantajosos, práticos, e eficientes, mas que por insegurança ou falta de preparo, recebem reprovações por parte dos enfermeiros que atuam de maneira inflexível (tão freqüente no nosso meio), porque algumas condutas fogem ao padrão pré-estabelecido nas normas. A Teoria Comportamental, através da incorporação dos conhecimentos de Maslow acerca da motivação humana, valoriza as necessidades globais dos indivíduos. Na enfermagem o que se vê é que muitos profissionais têm dificuldades em satisfazer até mesmo as suas necessidades mais básicas. A extensa jornada de trabalho, a baixa remuneração, a tensão do ambiente onde atua, a desvalorização profissional, o duplo ou mais vínculos empregatícios, dentre outros, são algumas das causas. Fatos desse tipo devem ser considerados pelas lideranças, pois certamente resultam em prejuízo à vida pessoal e profissional do trabalhador. Teoria Sistêmica A obra do alemão Ludwig Von Bertalanffy, concebida na década de 1950, contemplou o modelo de sistema aberto nas organizações, denominado Teoria Sistêmica. Segundo essa Teoria, as organizações são um complexo de elementos que agem em interação contínua com o ambiente (Chiavenato, 2004). Naabordagem sistêmica, a organização é vista em termos de comportamentos inter-relacionados que enfatizam mais os papéis do que as pessoas que o desempenham. Estes papéis, denominados de cargos, são determinados por um conjunto de atividades associadas a um ponto específico da organização (Motta e Vasconcelos, 2004). A Teoria Sistêmica estabelece que cada participante de um conjunto de papéis mantém determinadas expectativas quanto ao papel dos demais e que as expectativas de um grupo em relação a outro, sempre devem ser transmitidas para que o sistema não falhe. Na execução desses papéis existe a interferência da TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 166 166 variável de três classes: organizacionais, de personalidade e interpessoais. Assim, a posição hierárquica que o indivíduo ocupa, a flexibilidade da sua personalidade e sua relação interpessoal são fatores importantes. As características de uma empresa no molde da Teoria Sistêmica podem ser representadas conforme a figura a seguir: Figura 1 – Características de uma empresa segundo o modelo da Teoria Sistêmica (Caravantes, 1998). No que se refere à ênfase nos cargos, não há muita evidência na estrutura hierárquica da enfermagem, fato esse, que gera confusão entre as atribuições e funções dos membros da equipe. Em estudo realizado em uma UTI Geral, constatou-se a não delimitação no que e quem realizar as atividades de enfermagem era uma das causas de insatisfação da equipe deste setor (Matsuda, 2002). A enfermagem, embora de forma não muito específica em razão da necessidade de se adequar os cargos com as necessidades e especificidades de cada instituição e serviço, tem as suas atribuições estabelecidas na Lei do Exercício Profissional (Brasil, 1987), contudo, na prática se percebe uma miscigenação de funções e, por conseguinte, das atividades executadas pelos auxiliares, técnicos de enfermagem e enfermeiros. É importante que o enfermeiro bem como toda a equipe de enfermagem assegure o entendimento acerca da sua função, para que possam atuar conforme as suas atribuições, deveres e direitos. Mediante isso, os resultados do serviço terão “Input” “Output” “Feedback” S I S S I S T E M A E M A Subsistema Subsistema A M B I E N T E A M B I E N T E Entropia Homeostase Subsistema Subsistema TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 167 167 maiores possibilidades de acertos, pois estarão coerentes com as necessidades da clientela e com os propósitos da enfermagem. De maneira geral, a Teoria dos Sistemas pode influenciar positivamente no trabalho da enfermagem e no resultado final que é o cuidado de qualidade. Isso poderá ocorrer na medida em que os profissionais compreenderem que o subsistema Serviço de Enfermagem se interliga e depende de outros subsistemas (farmácia, lavanderia, serviço de nutrição, limpeza e outros), que também são ligados a sistemas maiores como o Sistema Único de Saúde (SUS), organizações de planos de saúde e hospitais. A percepção de que os serviços são interligados e dependentes, nem sempre são observados pelos profissionais da saúde que, ao atuar no modelo biologista e tecno-assistencial vigente, só conseguem visualizar a área restrita da sua atuação. Nesse âmbito, a enfermagem em especial, será prejudicada, visto que é ela o principal elo que liga a gestão e o cuidado. Teoria Contingencial O pressuposto central da Teoria Contingencial, elaborada na década de 1950 pelos estudiosos, Chandler, Stalker, Thompson, Lawrence & Lorsh, é que, não há princípios universais de administração que possam ser aplicados a todas as situações (Chiavenato, 2004). Os princípios da Teoria Contingencial se baseiam no planejamento de sistemas, enfatizando que não há uma solução ideal para todas as organizações. Assim, tem-se que cada empresa possui seus próprios problemas técnicos, humanos e mercadológicos, cuja atuação deve se basear em tecnologias e ambientes econômicos diferentes (Araújo, 2001). A Teoria da Contingência considera tudo relativo, visto que as decisões organizacionais devem ser de acordo com as variáveis ambientais. Nesse aspecto a organização não apenas reage às mudanças do ambiente, mas interage com elas. Para a teoria em questão, a liderança dependerá de fatores como: o relacionamento do líder com os membros do grupo, grau de estrutura da tarefa, o poder que o líder assegura e a capacidade dos subordinados em assumir responsabilidades. TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 168 168 Na enfermagem, a Teoria Contingencial não é comumente utilizada pelos enfermeiros, principalmente no que se refere ao modelo de gerenciamento de recursos humanos do serviço (planejamento, identificação do perfil da clientela, avaliação, adequação individual ao serviço dentre outros). Nesse modelo, cada organização exige um método de administração flexível e o que se vê nos serviços de enfermagem, são métodos rígidos, pré-determinados, igualmente aplicados aos diversos setores de uma instituição. Apesar de os princípios da Teoria Contingencial ser pouco notados no cotidiano da gestão em enfermagem, pensa-se que o enfermeiro deve considerar a variável ambiente no seu trabalho. O ambiente define os fenômenos organizacionais e, por conseguinte, influenciam no processo de produção do trabalho. Neste sentido, o enfermeiro necessita entender que o conhecimento tecnológico é fundamental e está inserido num meio dinâmico e situacional, sobretudo, nas questões de relacionamento com clientes internos e externos. Considera-se que a Teoria Contingencial, se adotada pela enfermagem, permite às lideranças atuarem de maneira dinâmica, flexível e contínua, em relação ao ambiente e à equipe como um todo. Nesse sentido, ao contrário do que se pensa, os ajustes ou adaptações realizados de maneira pontual para resolução de problemas relacionados ao atendimento de determinados casos ou situações, que na enfermagem é conhecido como “apagar incêndios”, não pode ser caracterizado como ações contingenciais. Gestão da Qualidade A abordagem da Gestão da Qualidade (GQ), ou Gestão da Qualidade Total (GQT), teve início na década de 1940, logo após a Segunda Guerra Mundial. No Brasil, esse modelo administrativo tomou vulto nas décadas de 1980 e 1990 e teve como principais expoentes Crosby, Deming, Juran e Ishikawa. A qualidade na área da saúde tem como principal expoente, Donabedian, que se empenhou, principalmente nos aspectos relacionados à avaliação. O referido autor alicerçou a Avaliação da qualidade na tríade estrutura, que se refere aos recursos humanos, físicos, materiais, equipamentos e aspectos financeiros necessários para a assistência à saúde; processo, que se relaciona ao TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileirade Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 169 169 sistema/modo de trabalho dos profissionais; e resultado, que corresponde ao produto/condição final do atendimento prestado (Donabedian, 1986). Tem-se que a Qualidade consiste na adequação do produto ou serviço à necessidade do consumidor (Matsuda, 2002; Juran, 1990). Desse modo, ela (a Qualidade), tem como características principais a satisfação do consumidor/cliente; a inexistência de não-conformidade; a adequação ao uso; a capacidade da organização em satisfazer os requisitos pré-determinados e pressupostos (Barbalho, 1996). Em outras palavras, a Qualidade é composta pelo conjunto de procedimentos pautado no conhecimento das necessidades e expectativas do cliente que influenciarão um serviço que objetiva satisfazê-lo. A produção de suprimentos mais baratos e com maior quantidade também são fatores a serem considerados (Barbalho, 1996). Atualmente existem três abordagens distintas na área de qualidade: a americana, a japonesa e a européia. A abordagem americana defende a idéia de que qualidade não ocorre por acaso, e sim, é constituída pela trilogia de Juran (planejamento, controle da qualidade e aperfeiçoamento da qualidade). A concepção japonesa se fundamenta nos métodos estatísticos, no respeito e na valorização do ser humano em perfeito alinhamento com os 14 princípios de Deming. Já a abordagem européia tem por base a padronização da International Organization for Standartization (ISO), fundada em Genebra, responsável pelo conjunto de normas ISO 9000, que estabelece os requisitos mínimos de qualidade (Barbalho, 1996). No âmbito da saúde, existem quatro componentes que influenciam diretamente na sua qualidade: acesso, continuidade, coordenação e satisfação do cliente. Este último é considerado de fundamental importância como medida avaliativa, em razão de fornecer informações sobre a capacidade do provedor em alcançar os valores e as expectativas daqueles (Donabedian, 1986; Nogueira, 1994). No contexto da saúde muitos serviços encontram dificuldades em desenvolver os princípios da GQ devido às particularidades da área como: os hospitais geralmente não são movidos pelos lucros; a competitividade e a busca pela qualidade ainda são processos em inicialização; a utilização de técnicas de qualidade das indústrias adaptadas ao contexto da saúde; grupo heterogêneo de TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 170 170 trabalhadores; poucas organizações de saúde realizam pesquisas contínuas e sistematizadas de satisfação do cliente para a avaliação dos serviços (Nogueira, 1994). Considerando as especificidades do setor saúde, a Teoria/Sistema da Gestão pela Qualidade traz um ponto fundamental pouco enfocado no sistema de saúde brasileiro: a satisfação do cliente. Com a enfermagem não é diferente, visto que hoje, apesar de se falar em mudança de paradigma, o seu objeto de trabalho ainda é a doença, seguindo o modelo de saúde biologista e clínico. O cliente neste caso é considerado um agente doente e, portanto, suas necessidades consistem basicamente na cura da enfermidade. Para Medeiros et alii (1999), a assistência curativa foi fortalecida na década de 30, após a ampliação do sistema previdenciário e o conseqüente crescimento dos hospitais, em especial, os privados. Atualmente, com o fortalecimento da concepção de cidadania e direitos humanos, as necessidades individuais e sociais de saúde estão se voltando para um novo modelo que favorece a promoção da saúde e a prevenção de doenças, tanto na esfera particular como coletiva. Nesse aspecto, a qualidade advém como fator inerente a esse modelo, pois a preocupação passa a ser a saúde do indivíduo e da sociedade, no sentido mais amplo do termo. No âmbito da GQ na enfermagem, o processo de efetivação da qualidade na saúde, além de envolver todo o recurso humano da organização deve atuar na padronização e na otimização das condutas, dos procedimentos e rotinas (de maneira flexível e autônoma), as quais deverão reverter em mais tempo a ser dedicado ao cliente, à obtenção de conhecimentos e habilidades para melhorar a qualidade do cuidado (Matsuda, 2002). É importante que a enfermagem atue segundo os princípios da GQ, que também integra os pontos fundamentais de outras teorias e se volta para a satisfação das necessidades e expectativas do cliente e da sociedade em geral para tanto, a busca por conhecimento e utilização dos princípios, métodos e ferramentas, instituídos por essa teoria, deve ser estimulada pelas lideranças. TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 171 171 Re-Administração A Re-Administração, proposta por Caravantes & Bjur, assim como outras abordagens administrativas que, apesar de não contemplar todos os quesitos de uma teoria, mas que neste estudo será abordada como tal, abrange um novo modelo gerencial que enfatiza o conhecimento como a “chave de ouro” das organizações. Deste modo, o recurso humano é fundamental no sucesso da organização (Caravantes et alii, 1995). A Re-administração é uma abordagem administrativa recente (década de 1990) e pouco conhecida na área da saúde. O fator humano e o bem estar humano são essenciais na Re-Administração, pois segundo essa abordagem, o conhecimento individual é capaz de se converter em conhecimento grupal e, assim, converter em conhecimento organizacional. O sucesso da organização consiste então na simultaneidade entre a eficiência e a eficácia, ou seja, a organização atua ao mesmo tempo de maneira produtiva e atinge os seus objetivos. A Re-Administração resulta de uma soma de conhecimentos de outras teorias. Ela traz novidades no sentido de incorporar a ecologia como um de seus conceitos fundamentais associados à ética e a responsabilidade social na atuação da organização. Para a Re-Administração, as organizações são concebidas como empresas visionárias, voltadas aos clientes internos – funcionários - e externos - usuários, fornecedores, dentre outros (Caravantes et alii, 1995). Os aspectos referidos devem transcender os fatores monetários, pois o ser humano é concebido como o centro de todo o processo de trabalho devendo participar, inclusive da formação da cultura organizacional. Nesse sentido, a organização por si só não existe. Ela existe porque se compõe de pessoas que se relacionam e possuem objetivos comuns. Com relação à enfermagem, os pressupostos da Re-Administração não se encontram difundidos de forma explícita no seu cotidiano. Observa-se que o recurso humano da enfermagem, comumente, não dispõe de incentivos e nem de condições para a produção e o aperfeiçoamento de seu capital intelectual no sentido de atuar com foco na ética social e na ecologia. O que se vê é a enfermagem voltada às tarefas cotidianas, relacionadas à execução dos procedimentos técnicos e TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 172 172 administrativos que respondam às expectativas da instituição, em detrimento das atividades de pesquisa e/ou de açõesque abordam questões mais amplas. Na prática profissional tem-se observado que muitos enfermeiros não seguem os princípios da Re-Administração, visto que são gerentes que subestimam ou desconhecem a capacidade cognitiva e a experiência dos seus subordinados hierárquicos, atuando de maneira autoritária e centrada na execução de tarefas rotineiras. Considera-se que a proposta de gestão da Re-Administração pode contribuir para a enfermagem, principalmente no que se refere à valorização e obtenção de conhecimentos. Esses quesitos, sem dúvida favorecem o desenvolvimento de competências que influenciam na vida pessoal e profissional dos trabalhadores e com isso, na qualidade dos serviços. Outro fator positivo da Re-Administração consiste nos princípios éticos e de responsabilidade social, os quais certamente auxiliarão para que a enfermagem promova a saúde integral, tanto em nível individual como no coletivo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Dentre as Teorias de Administração apresentadas, observamos que muitos princípios e conceitos que os constituem são utilizados na enfermagem. No que se refere à gestão em enfermagem, no contexto atual, observa-se que há compleição de alguns princípios das abordagens apresentadas, contudo, as que mais se evidenciam são ainda os da Teoria Científica, Clássica e Burocrática, centradas numa administração autoritária, focada na produção/tarefa, de forma a desconsiderar o processo de trabalho como um todo, sob os aspectos de administração participativa, promoção de relações interpessoais, qualificação contínua no ambiente interno da organização e na satisfação do cliente. Outra característica observada na gestão em enfermagem é que o enfermeiro, quase sempre atua de acordo com as expectativas da organização, preocupada com a contenção de gastos e a otimização dos recursos orçamentários e financeiros. Essa característica, que também é importante, não raras vezes, se sobrepõe às expectativas do profissional e da qualidade dos serviços prestados. TEORIAS ADMINISTRATIVAS X ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO EM ENFERMAGEM Jaciane Cristina Klassmann, Maria de Fátima Garcia Lopes Merino, Viviani Camboin Meireles e Laura Misue Matsuda Revista Brasileira de Docência, Ensino e Pesquisa em Enfermagem – ISSN 2175-5736 – Vol. 1, n. 1, p.153-175, Julho/2009 173 173 Considera-se que para a efetividade das ações de enfermagem, é importante que o enfermeiro vislumbre mudanças no modelo de gestão da equipe e do processo de trabalho multiprofissional, utilizando os pontos positivos e factíveis de cada teoria apresentada. Como propósito fundamental, ele deve considerar o atendimento das necessidades e expectativas do trabalhador e do cliente, num processo de busca contínua, rumo à Qualidade do cuidado. REFERÊNCIAS ARAÚJO, L. C. G. Organização, sistemas e métodos: e as modernas ferramentas de gestão organizacional. São Paulo: Atlas, 2001. BARBALHO, C. R. S. Gestão pela qualidade: referencial teórico. Rev. 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