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____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 23 CCAAPPÍÍTTUULLOO IIIIII –– CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA 33..11.. IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO O estado sólido ou estado condensado da matéria é constituído por átomos, moléculas e iões ligados fortemente entre si, de forma que os seus movimentos no espaço sejam restritos e como resultado, eles apresentam uma estrutura rígida. A natureza e as propriedades dos sólidos dependem do tipo de forças que unem os átomos, moléculas e iões entre si. Os sólidos são classificados em cristalinos ou amorfos. Neste capítulo, efectuar-se-á uma abordagem de uma das formas de estrutura da matéria, a chamada estrutura cristalina. 33..22.. EESSTTRRUUTTUURRAA CCRRIISSTTAALLIINNAA O termo estrutura cristalina entende-se como um conjunto de átomos periodicamente distribuídos no espaço, formando uma rede. Um cristal pode ser descrito como um conjunto de átomos dispostos numa rede definida por três vectores linearmente independentes → a , → b , → c , chamados vectores fundamentais de translação, tais que o arranjo atómico é, em todos os aspectos, semelhante quando observado de dois pontos com vectores posição → r e →′r , relacionados através de →→→→→ +++=′ clbkahrr (3.1) com h , k e l inteiros arbitrários. Com → r fixo, ao conjunto de pontos que se obtêm variando h , k e l na equação (3.1) dá-se o nome de rede cristalina ou de Bravais. De acordo com as definições apresentadas, não se deve confundir os conceitos de cristal e de rede cristalina. Ao passo que rede cristalina é uma abstracção matemática que consiste num conjunto de pontos idênticos dispostos regular e periodicamente no espaço, o cristal é formado por um conjunto de átomos que podem nem sempre ser todos da mesma ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 24 espécie química. A estrutura do cristal pode ser gerada sobrepondo a cada ponto da rede cristalina uma base (ou motivo) de átomos, idêntica para todos os pontos da rede. Assim, a relação entre cristal, rede cristalina e motivo pode ser simbolizada como cristal base rede =+ (a) (b) (c) Figura 3.1 – Ilustração de uma rede cúbica simples (a) e de uma base composta por um único átomo (b), como descrição de estrutura cristalina (c) Os vectores da rede cristalina são os vectores que unem dois quaisquer pontos da rede. Quando estes podem ser escritos como combinações lineares, com coeficientes inteiros dos vectores fundamentais, dizem-se vectores fundamentais primitivos. Visto que todas os paralelogramos da rede mostrada na figura 3.1 são idênticos, nós podemos escolher um como sendo a menor porção da rede reproduzida no espaço. a b c αβ γa b c αβ γ Figura 3. 2 – Célula unitária O paralelogramo que, por repetição, é capaz de gerar todo o cristal denomina-se célula unitária. A célula unitária é então um paralelogramo constituído por um número finito de átomos que ocupam um determinado volume. Uma célula unitária é primitiva quando contém um só ponto da rede e não primitiva quando contém mais do que um ponto. Desta forma, um ponto da rede no interior de uma célula pertence somente a essa célula e ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 25 um ponto no vértice de uma rede é partilhada por oito células. Saliente-se que por ponto da rede entende-se um átomo ou conjunto de átomos que se repete ao longo da rede [26]. Para uma dada rede cristalina a célula unitária não é, em geral, única. Contudo os volumes de qualquer uma das células unitárias primitivas são iguais [27]. A forma e o tamanho de uma célula unitária podem ser descritos pelos três vectores anteriormente referidos. Estes vectores definem a célula em termos de comprimento, sendo designados por eixos cristalográficos e, juntamente com os ângulos formandos entre eles, constituem os parâmetros da rede de uma determina célula unitária. É de salientar que os vectores → a , → b e → c definem, não somente a célula unitária, mas também todos os pontos da rede. Por outras palavras, o conjunto de todos os pontos da rede pode ser originado por operações de translação dos vectores → a , → b e → c , a partir de um único ponto dessa rede [26]. Atribuindo relações específicas aos comprimentos segundo os eixos cristalográficos ( → a , → b , → c ) e os ângulos entre eles (α , β ,γ ), podem construir-se sete tipos de células unitárias primitivas com diferentes formas e tamanhos, as quais se denominam por sistemas cristalinos. 33..33.. SSIISSTTEEMMAASS CCRRIISSTTAALLIINNOOSS EE RREEDDEESS DDEE BBRRAAVVAAIISS August J. Bravais, em 1848 demonstrou ser possível geometricamente a construção de 14 tipos de células unitárias, ou seja, todas as redes cristalinas possíveis podem ser geradas por 14 tipos de células. Estas células são chamadas células de Bravais e podem ser agrupadas em 7 sistemas cristalinos [28]. A classificação das redes cristalinas faz-se em termos das operações de simetria que cada uma aceita. As operações de simetria dos cristais irão ser abordadas mais à frente. Os cristais transparentes podem ser divididos em três grupos considerando as suas características ópticas. Grupo I: A este grupo pertencem os cristais do sistema cúbico. As três direcções são equivalentes e coincidem com os eixos dieléctricos, onde zyx εεε == , e ED ε= . Estes cristais são opticamente isotrópicos. Grupo II: Os cristais pertencentes aos sistemas: tetragonal, hexagonal e trigonal são opticamente anisotrópicos, visto que as suas propriedades ópticas variam com a direcção ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 26 de propagação dos raios luminosos. Estes cristais podem ainda ser classificados em uniaxiais uma vez que só possui um eixo óptico. Grupo III: Neste grupo estão inseridos os cristais pertencentes aos sistemas ortorrômbico, monoclínico e triclínico. Neste grupo os cristais são opticamente anisotrópicos e biaxiais, uma vez que têm mais que um eixo óptico, ou seja, possuem duas direcções em torno das quais existe uma distribuição atómica simétrica. Na tabela 3.1 estão presentes os 7 sistemas cristalinos, as características dos parâmetros da rede – relações entre os comprimentos dos eixos cristalográficos, os ângulos entre eles e ainda os elementos de simetria existentes em cada grupo[ 29,30]. Sistema Cristalino Geometria da célula unitária Parâmetros da célula Elementos de simetria Grupo I Cúbico º90=== γβα cba == 4 eixos simetria 3 Tetragonal º90=== γβα cba ≠= 1 eixo simetria 4 (ou − 4 ) Hexagonal º90== βα º120=γ cba ≠= 1 eixo simetria 6 (ou − 6 ) Grupo II Trigonal cba == º90≠== γβα 1 eixo simetria 3 (ou − 3 ) Ortorrômbico º90=== γβα cba ≠≠ 3 eixos simetria 2 Monoclínico βγα ≠== º90 cba ≠≠ 1 eixo simetria 2 (ou − 2 ) Grupo III Triclínico º90≠≠≠ γβα cba ≠≠ Sem eixo de simetria Tabela 3.1 – Classificação dos cristais por sistemas cristalinos Como já foi referido, existem 14 tipos de redes espaciais ou de Bravais, derivadas da combinação de comprimentos de eixos e ângulos interaxiais. As 14 redes de Bravais são ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 27 representadas por símbolos. A simbologia mais utilizada é a de Hermman-Mauguin ou notação internacional. A célula primitiva ou simples é representada pelos símbolos P ou R (célula primitiva romboédrica) e as células não primitivas são representadas pelos símbolos I , F ou C , conforme se trate respectivamente de uma célula unitária de corpo centrado, face centrada ou base centrada [31]. Figura 3. 3– Relação entre os sistemas cristalinos e redes de Bravais. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 28 33..44.. PPLLAANNOOSS CCRRIISSTTAALLOOGGRRÁÁFFIICCOOSS EE ÍÍNNDDIICCEESS DDEE MMIILLLLEERR Um cristal é constituído por um plano de átomos que se encontram separados a uma distância d , mas podem encontra-se diversos planos com espaçamentos diferentes entre eles. O conhecimento dos planos dos cristais é importante dado que, muitas das propriedades dos materiais, variam conforme o plano usado para medir a propriedade. Como exemplo de propriedade que varia conforma o plano, temos os chamados planos de clivagem dos cristais, conhecidos empiricamente desde os primórdios da humanidade. Os cristais podem ser clivados com maior facilidade ao longo de certos planos cristalográficos. Esta propriedade está relacionada com o número de ligações químicas e as forças destas ligações perpendiculares ao plano em questão. Quanto menor for este número e/ou menor forem as intensidades das ligações, mais fácil a separação do cristal ao longo desse plano. Um plano cristalino é definido por três pontos não colineares da rede cristalina. Devido à regularidade da rede, um plano cristalino contém, para além dos três pontos de rede que o definem, um número infinito de outros pontos da rede que formam, nesse plano, uma rede cristalina bidimensional. Também por causa desta regularidade, é possível, dado um qualquer plano cristalino definir uma infinidade de outros planos cristalinos, paralelos ao primeiro. Os índices de Miller constituem uma forma prática de especificar a orientação de uma destas famílias de planos cristalinos paralelos. Para cada família, definem-se da seguinte forma: • tomando, na família considerada, o plano que mais se aproxima da origem da célula unitária, determinam-se as distâncias que a separam dos pontos em que o plano escolhido intersecta as direcções dos vectores fundamentais cba ,, , e exprimem-se estas distâncias em unidades de cba ,, , respectivamente; • tomam-se os inversos das unidade cba ,, , e reduzem-se a três inteiros nas mesmas proporções relativas, tendo o cuidado de eliminar eventuais factores comuns. O resultado é apresentado entre parêntesis curvos, sem separadores. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 29 Figura 3. 4 – Planos cristalinos com índices ( hkl ) Para o plano apresentado na figura 3.4, os índices de Miller são ( hkl ), se os inteiros h , k e l não tiverem divisores comuns. Também para os índices de Miller segue-se a convenção de colocar o sinal “-“ sobre os índices negativos; por exemplo ( − lhk ), indica intersecção negativa ao longo do eixo c . Se um dado plano é paralelo a um dos eixos fundamentais, então não o intersecta obviamente e o valor do índice de Miller correspondente é, por definição, zero. Por exemplo, a família de planos paralelos ao plano definido pelos vectores fundamentais → a e → b tem índices de Miller (001) [32]. Os índices de Miller de um plano têm uma interpretação geométrica na rede directa (rede cristalina), o que por vezes constitui uma alternativa à definição da mesma. Analogamente podemos definir direcções cristalográficos. Estas também são expressas por três números inteiros que mantêm a mesma relação que os componentes de um vector na direcção considerada. Os componentes de um vector são dados como múltiplos dos vectores de base da rede geométrica. Os índices que especificam a direcção são representados pela notação [ wvu ], indicando a direcção de uma linha da origem a um ponto de coordenadas u , v , w . Do ponto de vista cristalográfico, existem várias direcções e planos que são equivalentes, cuja ordem dos índices de Miller só depende da escolha arbitrária da origem dos eixos. Um conjunto de direcções equivalentes é representado por <u v w >. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 30 33.. 55.. SSIISSTTEEMMAASS EE GGRRUUPPOOSS PPOONNTTUUAAIISS Uma das características mais importantes de um cristal é a simetria, já que a simetria de um cristal determina a simetria das propriedades físicas. Um estudo da simetria de um cristal é importante para compreender certos processos dinâmicos como as transições de fase, nas quais ocorrem quebras de simetria [31]. A própria ideia de periodicidade tem implícita a ideia de que devem existir certas simetrias nos cristais. Desta forma, a própria translação é um elemento de simetria, só que só é apreciável quando é considerada à escala atómica (relaciona grupo de átomos). Considera-se portanto que, no modelo microscópico ou macroscópico do cristal, a translação pode-se contemplar como um elemento de simetria ou não, respectivamente. A simetria que descreve o modelo macroscópico chama-se simetria pontual ou finita, ao passo que a simetria que descreve o modelo microscópico chama-se simetria espacial ou infinita [33]. De forma a perceber a natureza periódica e o arranjo dos cristais é necessário conhecer as operações de simetria. Se todas as propriedades do espaço permaneceminvariáveis depois da aplicação de uma operação, essa operação designa-se operação de simetria. Por definição, as distâncias e ângulos entre pares de pontos são conservados. Para um cristal, uma operação de simetria é aquela em que há uma permuta de posições dos átomos, resultando num cristal com aparência igual à que tinha antes da operação [31]. Essas operações são feitas com base nos elementos de simetria. Sendo os elementos de simetria pontos, eixos ou planos em relação aos quais são realizadas essas mesmas operações [34]. Combinando estes elementos de simetria com as translações características de um cristal, surgem novos elementos de simetria como componentes de deslizamento. Cada operação de simetria altera a posição do cristal, colocando-o noutra posição de simetria. Um exemplo de uma operação de simetria é a operação de rotação em torno de um eixo, ou seja, se todas as propriedades do espaço permanecer invariáveis após uma rotação de n/2π em torno desse eixo, pode designar-se o eixo de rotação por eixo de simetria de ordem n [34]. Um outro exemplo de uma operação de simetria é a operação matemática que transforma o conjunto de coordenadas ( x , y , z ) em (- x ,- y ,- z ). Os ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 31 cristais nos quais se verifica esta última operação de simetria designam-se por centrossimétricos. Em conclusão, as operações de simetria fundamentais são translações, rotações em torno de eixos que passam por uma origem, reflexões em relação a planos que contém a origem e inversões relacionadas com um cento de simetria no cristal. Para além das operações referidas anteriormente, ainda existem outras denominadas operações compostas, uma vez que resultam do produto de duas operações distintas. As operações compostas são rotação helicoidal, reflexão deslizante, rotorreflexão e rotoinversão. Os elementos e grupos de simetria são designados por notações abreviadas, que informam as propriedades de simetria da estrutura cristalina. Existem dois tipos de nomenclatura: a mais antiga, conhecida como “Notação de Schoenflies” e a mais recente “nomenclatura de Hermman-Mauguin” [31]. Elementos de simetria Símbolos Hermann-Mauguin Eixo de simetria de rotação 1,2,3,4,ou 6 Eixo de simetria de inversão rotatória − 1, − 2 , − 3 , − 4 , − 6 Plano de simetria ou planos de reflexão m Tabela 3. 2 – Nomenclatura de Hermann – Mauguin dos elementos de simetria O conjunto das operações de simetria que transforma a estrutura de um cristal nela própria, considerando um ponto fixo, constitui os 32 grupos cristalográficos pontuais. Estes 32 grupos pontuais podem ser formados a partir dos sete sistemas cristalinos considerando as diferentes maneiras de reduzir a simetria. É importante estabelecer uma relação entre as propriedades físicas e a simetria, e pode demonstrar-se que num cristal centrossimétrico não ocorre Geração de Segunda Harmonia (GSH). Salienta-se ainda que dos 32 grupos pontuais, 21 não possuem um centro de simetria. A ausência deste centro de simetria é essencial mas não suficiente no aparecimento de algumas propriedades físicas dos cristais, tais como a actividade óptica, a piezoelelectricidade e a piroelectricidade. A actividade óptica encontra-se associada a 15 dos 21 grupos pontuais não centrossimétricos e, a piezoelectricidade, a 20 desses grupos. Qualquer propriedade física estudada num cristal apresenta uma simetria que inclui a simetria do grupo pontual desse cristal. Este enunciado – Princípio de Neumann - ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 32 constitui o postulado fundamental da física do estado sólido e é valido para todas as propriedades direccionais, representáveis ou não por tensores [35]. Na tabela 3.3 são apresentados os 32 grupos pontuais que se distribuem pelos sete sistemas cristalinos. SISTEMA GRUPO PONTUAL Triclínico 1; − 1 Monoclínico 2; m; 2/m Ortorrômbico 222; mm2;mmm Tetragonal 4; − 4 ; 4/m; 422; 4mm; − 4 2m; 4/mmm Trigonal/ Romboédrico 3; − 3 ; 32; 3m; − 3 m Hexagonal 6; − 6 ; 6/m; 622; 6mm; − 6 m − 2 ; 6/mmm Cúbico 23; m3; 432; − 4 3m; m3m Tabela 3.3 - Relação entre sistemas cristalinos e grupos espaciais. Adaptado. [32] 33..66.. GGRRUUPPOOSS EESSPPAACCIIAAIISS A simetria que relaciona os átomos e a célula unitária deve considerar os vários elementos de simetria e as operações translacionais. Os elementos de simetria, em conjunto com as operações de translação, produzem elementos de simetria adicionais em vários pontos da célula unitária. Quando as translações possíveis agem nas simetrias dos grupos pontuais, o resultado são os 230 grupos espaciais que descrevem a organização dos átomos ou moléculas na célula unitária. O conjunto das operações de simetria que transformam um ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 33 cristal periódico e tridimensional nele próprio designa-se por Grupo Cristalográfico Espacial. Uma parte dos grupos cristalográficos espaciais obtêm-se por combinação dos 32 grupos pontuais com as 14 redes de Bravais (P, I, F) e, os restantes, resultam de operações adicionais, perfazendo um total de 230 grupos espaciais. Um grupo espacial representa-se por letra maiúscula que indica o tipo de rede (P, C, I, F ou R) seguido pelo símbolo do grupo pontual, onde os eixos de rotação e planos de reflexão são ampliados para incluir os eixos helicoidais e os planos de deslizamento. Os 230 grupos espaciais distribuem-se nos sistemas cristalinos da seguinte forma: sistema cúbico (36), hexagonal (27), trigonal (68), ortorrômbico (59), monoclínico (13) e triclínico (2) [35]. 33..77.. TTEENNSSOORR DDIIEELLÉÉCCTTRRIICCOO EE IINNDDIICCAATTRRIIZZ ÓÓPPTTIICCAA A generalidade dos meios materiais utilizados para controlar e modificar as propriedades de propagação da luz é de natureza anisotrópica (essencialmente anisotropia eléctrica). Num sistema de coordenadas cartesianas ( x , y , z ) orientado arbitrariamente, a relação entre os vectores deslocamento eléctrico e campo eléctrico não são em geral paralelos, podendo-se relacionar as componentes destes dois vectores na forma: zxzyxyxxxx EEED εεε ++= zyzyyyxyxy EEED εεε ++= (3.2) zzzyzyxzxz EEED εεε ++= Estas relações podem ser escritas numa forma mais compacta: j j iji ED ∑ = = 3 1 ε (3.3) onde 1, =ji para x , 2 para y e 3 para z . Alternativamente, as relações dadas na equação (3.2) podem apresentar-se na seguinte forma matricial: ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA__________________________ Capítulo III 34 ⎥⎥ ⎥ ⎦ ⎤ ⎢⎢ ⎢ ⎣ ⎡ ⎥⎥ ⎥ ⎦ ⎤ ⎢⎢ ⎢ ⎣ ⎡ = ⎥⎥ ⎥ ⎦ ⎤ ⎢⎢ ⎢ ⎣ ⎡ z y x zzzyzx yzyyyx xzxyxx z y x E E E D D D � � � ε εεε εεε εεε (3.4) A matriz 33× na equação (3.4) corresponde ao tensor dieléctrico,ε . Em geral, as componentes ijε deste tensor são nove. Contudo, pode mostrar-se que, no caso de um meio não – absorvente, o tensor dieléctrico é real e simétrico, pelo que as suas componentes independentes reduzem-se a seis. Essas componentes reduzem-se apenas a três por uma escolha adequada do sistema de coordenadas. Neste sistema de coordenadas, cujos eixos são paralelos aos chamados eixos principais, a matriz 33× na equação (3.4) torna-se diagonal e os seus elementos não nulos são chamados valores principais de ε : ⎥⎥⎦ ⎤ ⎢⎢⎣ ⎡ = zz yy xx ε ε ε ε 00 00 00 (3. 5) Nesta situação, têm-se as relações: xxx ED ε= , yyy ED ε= , zzz ED ε= (3. 6) A densidade de energia eléctrica é dada por [12]: →→= EDU E .2 1 (3.7) Considerando o sistema de coordenadas definido pelos eixos principais, esta equação pode ser rearranjada e escrita na forma: ⎪⎭ ⎪⎬ ⎫ ⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛+⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛+ ⎪⎩ ⎪⎨ ⎧ ⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛= 222 2 1 z z y y x x E DDDU εεε (3.8) ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 35 É habitual normalizar-se a expressão anterior no espaço de coordenadas fazendo: E x U D x 2 ≡ , E y U D y 2 ≡ , E z U Dz 2 ≡ (3.9) e introduzindo os índices de refracção principais. xxn ε= , yyn ε= , zzn ε= (3.10) Substituindo (3.9) e (3.10) na equação (3.8) da densidade de energia obtém-se: 12 2 2 2 2 2 =++ zyx n z n y n x (3.11) A equação (3.11) representa um elipsóide de índices ou indicatriz óptica cujos componentes são os índices de refracção principal xn , yn e zn [36]. A óptica cristalina estuda-se através de uma superfície de referência, “indicatriz óptica”, que ajuda a visualizar as relações geométricas. Estas superfícies de referência servem para explicar como variam os índices de refracção de um material transparente de acordo com a direcção de vibração da onda luminosa no material. Assim, cada raio vector da indicatriz representa uma direcção de vibração cujo comprimento é proporcional ao índice de refracção do cristal para as ondas que vibram paralelamente àquela direcção. Consoante a classe dos cristais, a forma da indicatriz é diferente: para cristais isotrópicos, a indicatriz tem a forma de uma esfera; para os cristais anisotrópicos, pode tomar a forma de um elipsóide de revolução ou de um elipsóide triaxial consoante se trate, respectivamente, de cristais uniaxiais ou biaxias. As indicatrizes dos cristais são figuras abstractas, ou seja, não podem ser observadas ao microscópio. Por outro lado, essa abstracção permite-nos localizar e determinar os índices de refracção associados às diferentes faces e secções do cristal. De acordo com as propriedades de simetria cristalográfica dos meios materiais, podemos classificá-los em três grandes grupos: Isotrópicos, anisotrópicos uniaxiais e anisotrópicos biaxiais. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 36 33..77..11.. CCRRIISSTTAAIISS IISSOOTTRRÓÓPPIICCOOSS Num cristal isotrópico, ou seja, um cristal opticamente homogéneo, o índice de refracção é constante, independente da direcção considerada, ou seja, a onda luminosa propaga-se com a mesma velocidade em todas as direcções. Assim, as indicatrizes destes cristais serão esféricas cujos raios vectores são proporcionais aos seus índices de refracção, conforme mostra a figura 3.5. Dada a homogeneidade dos cristais, somente aqueles que cristalizam num sistema de maior simetria serão isotrópicos, ou seja, aqueles do sistema cúbico. No outro extremo, substâncias homogéneas que não possuam nenhum arranjo cristalino também são isotrópicos [37]. Figura 3.5 – Representação de uma indicatriz isotrópica, que corresponde a uma esfera cujo raio é proporcional ao índice de refracção do cristal ( n ). A propagação de um raio de luz que atravessa um cristal isotrópico é bastante simples de avaliar, uma vez que este não promove o fenómeno de dupla refracção e, assim, o raio de luz que parte do polarizador atravessa o cristal sem mudar a direcção de vibração. Mesmo que o raio incidente não seja polarizado, ao atravessar o cristal, continuará da mesma forma. Como já foi referido anteriormente, os materiais isotrópicos têm como elipsóide de índices uma esfera, ou seja, os três semi-eixos são iguais, o que significa que os índices de refracção são iguais em qualquer direcção, 0nnnn zyx === . O tensor dieléctrico é da forma diagonal escalar [36]: ⎥⎥ ⎥ ⎦ ⎤ ⎢⎢ ⎢ ⎣ ⎡ = ε ε ε ε 00 00 00 ou ⎥⎥⎦ ⎤ ⎢⎢⎣ ⎡ = 100 010 001 2nε ( 3.12) ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 37 33..77..22.. CCRRIISSTTAAIISS AANNIISSOOTTRRÓÓPPIICCOOSS Os cristais anisotrópicos são aqueles que apresentam mais do que um índice de refracção nas diferentes direcções de propagação da luz no seu interior e as respectivas indicatrizes são representadas por elipsóide de revolução de dois ou três eixos, onde cada um deles (também chamados raios vectores) representa um índice de refracção. Quando o raio de luz incide sobre uma superfície de um cristal anisotrópico transparente sofre o chamado “fenómeno de dupla refracção”, ou seja, ao se refractar são produzidos dois raios de luz distintos que vibram em planos perpendiculares entre si e se propagam no interior do cristal. Figura 3.6 – Raio de luz não polarizado que incide num cristal de calcite e sofre o fenómeno de dupla refracção. O raio ordinário (O) vibra perpendicularmente ao plano de incidência e é aquele que não sofre desvio ao atravessar o cristal, ao contrário do extraordinário (E), cuja direcção de vibração é paralelaàquele plano. Por regra, os raios refractados produzidos por este fenómeno são denominados de ordinário (O) e extraordinário (E), sendo que o ordinário segue a lei de Snell para a refracção, enquanto que o extraordinário não. A direcção de vibração do raio extraordinário está contida no plano de incidência, que também contém o eixo cristalográfico “ c ” do cristal, enquanto que o ordinário é perpendicular a ele (ver figura 3.6). Os cristais anisotrópicos são divididos em dois grandes grupos denominados: uniaxiais e biaxiais. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 38 33..77..22..11.. CCRRIISSTTAAIISS UUNNIIAAXXIIAAIISS A indicatriz de uma substância anisotrópica uniaxial é um elipsóide de revolução com dois eixos principais, denominados de “E” e “O”, cujos comprimentos são proporcionais, respectivamente, aos índices de refracção dos raios extraordinário ( en ) e ordinário ( on ) e são chamados de direcções de vibração ou privilegiadas dos cristais. Supondo que z representa o eixo de maior simetria, a equação (3.11) é escrita para uma indicatriz uniaxial como: 1 n x n y n x 2 e 2 2 0 2 2 0 2 =++ (3.13) Na figura 3.7 está representada uma indicatriz uniaxial, onde o comprimento do raio vector “E” é maior do que o de “O”, ou seja, en > on . ne no n o neno ne n e nene no n o neno ne n e ne Figura 3. 7 – Representações espaciais segundo uma secção principal de uma indicatriz uniaxial onde en > on . Num cristal uniaxial o tensor dieléctrico, quando expresso na forma diagonal, tem dois dos seus elementos não nulos iguais. Neste caso, as propriedades ópticas são invariantes por rotação do cristal em torno do eixo “ c ”, que é o eixo óptico e o tensor dieléctrico assume a forma: o ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 39 ⎥⎥ ⎥ ⎦ ⎤ ⎢⎢ ⎢ ⎣ ⎡ = 2 e 2 o 2 o n00 0n0 00n ε (3.14) Todas as secções que passam pelo centro geométrico da indicatriz e que contêm as direcções “E” e “O”, são chamadas de secções principais e correspondem a elipses. Ao contrário, a secção perpendicular à direcção “E” ou paralela a “O”, corresponde a um círculo cujo raio é igual a on e, portanto, chamada de secção circular. Então, pode-se verificar que todo o raio que incide na indicatriz, passando pelo centro, na direcção de “E”, atravessa o cristal sem sofrer desvio ou mudança nas direcções de propagação e/ou de vibração. Isto ocorre porque o raio está incidindo na indicatriz perpendicularmente à secção circular, onde existem infinitas direcções de vibração, todas elas proporcionais a on . Portanto, segundo esta direcção (E), o raio de luz comporta-se como se estivesse atravessando um meio isotrópico pois, se incidir polarizado ou não, permanecerá desta mesma forma ao atravessar o cristal. A esta direcção, na qual o cristal se comporta como uma substância isotrópica e, portanto não está sujeita ao fenómeno da dupla refracção, dá-se o nome de eixo óptico. Os cristais que cristalizam nos sistemas trigonal, tetragonal e hexagonal, apresentam forte simetria ao redor do eixo “ c ”, (“ c ” é a direcção que apresenta um eixo de maior ordem do sistema cristalinos), sendo necessários dois parâmetros de célula para a sua descrição, uma na direcção, de “ c ” e, outra, perpendicular a ele ( cba ≠= ), daí os dois índices de refracção. Nestes cristais existe apenas um único eixo óptico. Como o eixo óptico é sempre perpendicular a uma secção circular, nos cristais uniaxiais a direcção do eixo óptico será sempre coincidente com o eixo cristalográfico “ c ”. A diferença )nn(n oe −=∆ é uma medida da birrefringência de um cristal [14]. Para os cristais uniaxiais, o sinal óptico é a relação entre os índices de refracção dos raios extraordinário e ordinário. Assim, quando o índice de refracção do raio extraordinário, en , for maior que o do raio ordinário, on , ou seja, 0nnn oe >−= )(∆ , diz-se que o cristal tem um sinal óptico positivo. Nesta situação, a indicatriz será uma elipse de revolução alongada segundo a direcção do eixo óptico. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 40 No caso contrário, quando o índice de refracção do raio ordinário for maior que o do raio extraordinário, 0nnn oe <−= )(∆ , o cristal terá o sinal óptico negativo e a sua indicatriz será achatada segundo a direcção do eixo óptico [37]. Na figura 3.8 estão representadas as indicatrizes ópticas de cristais birrefringentes uniaxiais, sendo a direcção do eixo óptico a direcção do eixo de revolução. on en en onon en en on Figura 3. 8 – Representação de indicatrizes uniaxiais de sinais ópticos positivos (+) e negativos (-) projectados numa das secções principais do elipsóide. 33..77..22..22.. CCRRIISSTTAAIISS BBIIAAXXIIAAIISS Tal como nos cristais anisotrópicos uniaxiais, nos cristais biaxiais nenhuma das direcções de propagação coincide com as direcções dos eixos ópticos, pelo que se observa o fenómeno de birrefringência. Os materiais biaxiais têm um elipsóide de índices com os três semi-eixos principais diferentes entre si (elipsóide escaleno). O tensor dieléctrico em coordenadas principais tem três elementos distintos na diagonal: ⎥⎥ ⎥⎥ ⎦ ⎤ ⎢⎢ ⎢⎢ ⎣ ⎡ = 2 2 2 n00 0n0 00n γ β α ε ( 3.15) e caracteriza-se por terem dois eixos ópticos distintos, daí a designação de biaxiais, ou seja, há duas direcções para os quais não existe dupla refracção [28]. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 41 Pertencem a este grupo os matérias que cristalizam no sistema triclínico, monoclínico e ortorrômbico, uma vez que apresentam um grau de simetria ainda menor que os uniaxiais, sendo necessário três parâmetros de célula para caracteriza-los ( cba ≠≠ ) [36]. Os três eixos principais do elipsóide biaxial são denominados de “ X ”, “Y ” e “ Z ”, cujos comprimentos são proporcionais, respectivamente, aos índices de refracção dos raios αn , βn e γn , também chamados de direcções de vibração ou privilegiadas do cristal. Na figura 3.9 encontra-se representada uma indicatriz biaxial (tridimensional e segundo uma secção principal),onde αn < βn < γn . Esta relação será sempre verificada nos cristais biaxiais, ao contrário dos cristais uniaxiais onde en pode ser maior ou menor do que on . Figura 3.9 – Indicatriz biaxial mostrando as relações entre as direcções “ X ”, “Y ” e “ Z ” da elipse com os índices de refracção αn < βn < γn , que é sempre obedecida na óptica dos cristais biaxias. A indicatriz biaxial mostra três secções principais, XY ; XZ , ZY , todas elas correspondentes a elipses, ver figura 3.10. Figura 3.10 – Indicatriz biaxial, mostrando três secções principais da indicatriz e os índices de refracção associados a cada uma delas. ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 42 Na secção XY , estão presentes os índices αn e βn ; na secção XZ , os índices αn e γn ; e na ZY os índices γn e βn . Geometricamente pode-se observar na secção principal da indicatriz definida por XZ , (secção que contém as direcções de maior ( Z ) e menor comprimento ( X )) que existem duas secções circulares (cujos os raios são βn ) que contém o eixo de comprimento intermédio (Y ). Como perpendicularmente a uma secção circular há sempre um eixo óptico associado, as indicatrizes biaxias possuem dois eixos ópticos e, todos os raios que se propagam segundo essas direcções, estarão submetidos, ao memo índice de refracção βn . Observe-se na figura 3.10, que os eixos ópticos estão contidos na secção principal XZ , designado por plano óptico e, o ângulo agudo que eles formam entre si, medido sobre este plano, recebe a designação de ângulo V2 . Tendo em conta que a relação αn < βn < γn é sempre obedecida, o sinal óptico dos cristais é dado pela reacção entre o valor assumido pelo índice de refracção intermédio ( βn ) em comparação com o maior ( γn ) e com o menor ( αn ). Desta forma, quando ( βγ nn − )> αβ nn − - o cristal é biaxial positivo ( βγ nn − )< αβ nn − - o cristal é biaxial negativo Dito de outra forma, se a bissectriz aguda do ângulo V2 que formam os eixos ópticos coincidir com o eixo Z , a indicatriz é opticamente positiva, se coincidir com o eixo dos X , diz-se que é negativa. Isto acontece porque todo o eixo óptico é perpendicular a uma secção circular. No caso dos cristais biaxiais, a secção circular posiciona-se na indicatriz segundo a direcção de Y e o seu raio é proporcional a βr . Verificou-se anteriormente, que a disposição dos eixos ópticos na indicatriz óptica é função dos valores assumidos pelos diferentes índices de refracção dos cristais. Como os eixos ópticos são perpendiculares às secções circulares que correspondem à direcção Y (ou raio igual a βr ), normalmente diz-se que as posições dos eixos ópticos são controladas pelo índice de refracção βn . ____________________________________________________________________________________________________________________________CCRRIISSTTAALLOOGGRRAAFFIIAA __________________________ Capítulo III 43 Assim, a partir dos valores dos índices de refracção do cristal e através da equação que define as relações geométricas numa elipse de revolução com três eixos, pode-se estabelecer as seguintes relações para o ângulo V2 : )( )(cos 222 222 z 2 nnn nnnV αγβ βγα − −= (3.16) No plano XZ , o ângulo formado entre os dois eixos ópticos é dado por zV2 [37].
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