Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Centro Universitário de Patos de Minas Patos de Minas, fevereiro de 2014 2 Professores de Linguagem e Comunicação Centro Universitário de Patos de Minas 3 Caros alunos, A disciplina Linguagem e Comunicação consta da grade curricular do curso escolhido por vocês. Isso mereceria algumas justificativas acadêmicas, mas não queremos nos dirigir a vocês como ―professores de português‖. Dirigimo-nos a vocês como facilitadores no aprimoramento de suas habilidades lingüísticas. Linguagem e Comunicação está presente nos primeiros semestres de quase todos os cursos de graduação deste país – isso já mostra sua importância na formação profissional de qualquer estudante. Infelizmente, os anos anteriores de formação escolar não foram suficientes para o aprimoramento de tais habilidades. O acadêmico tem, na faculdade, uma das últimas oportunidades para desenvolver sua capacidade de expressão por meio da língua, seja na modalidade falada, seja na modalidade escrita. Se perdida essa oportunidade, ou mal aproveitada, poderá sofrer punições principalmente no mercado de trabalho, caso consiga ingressar-se nele. Sabemos que, no nosso dia-a-dia, não comunicamos por meio de palavras – elas existem apenas no dicionário. Comunicamos, sim, por meio de textos. Nossas relações pessoais ou profissionais realizam-se por meio de textos que (co)produzimos com nossos semelhantes. Tecemos idéias, tecemos compromissos. Sem o domínio eficiente da língua, sem o domínio da feitura de textos, não conseguiremos nos mover neste mundo marcadamente tecnológico. Marcadamente sem fronteiras. Marcadamente informativo. Mundo de exigências, então! Nosso papel no curso escolhido por vocês, caros alunos, é contribuir para que a formação de vocês esteja, também, respaldada pelas exigências deste mundo em que informações, que são textos circulantes, são extremamente necessárias para o desempenho profissional. Mesmo que, no futuro profissional, vocês não precisem escrever textos, não precisem ministrar palestras ou seminários, a desenvoltura lingüística poderá lhes garantir possibilidades de crescimento ininterrupto, já que irão (co)produzir textos menos formais em suas relações. Não há profissional isolado; há, sim, aquele que tece conhecimentos, que troca idéias, que comunica achados e os compartilha. E isso é o que nós chamamos de produção de textos. Produzir um texto falado ou escrito é uma atividade que se aprende, por ensaio e erro. Não é privilégio de poucos, mas direito de todos. O seu curso proporciona esse direito. Na nossa disciplina Linguagem e Comunicação, possibilitamos a vocês mecanismos de compreensão de textos, nos aspectos lingüístico, argumentativo e expressivo, para que desenvolvam suas habilidades de interação. Neste mundo sem limites para a troca de informações – vocês sabem o que a tecnologia pode fazer –, a partilha de textos, ou com amigos, ou com colegas de profissão, pode ser, também, o percurso para uma vida feliz e realizada. Sem textos, não há amigos, não há profissionais, não há homens. Esperamos – e acreditamos nisto – que a prática de textos seja um instrumento-chave na participação da vida social, profissional e intelectual. Oferecer, portanto, a vocês instrumentos para capacitá-los nessa empreitada é nosso dever! Os professores 4 Sumário CARTA AOS ALUNOS ............................................................................................................ 03 NOSSO MAIOR DIREITO ............................................................................................................ 05 PLANO DE ENSINO ............................................................................................................... 06 01 LINGUAGEM E SOCIEDADE .................................................................................. 08 1.1 Informação e conhecimento ...................................................................................... 08 1.1.1 Quem sabe ............................................................................................................ 08 1.1.2 Onde mora a inteligência ............................................................................................ 10 1.1.3 Analfabetismo emocional ........................................................................................................ 11 1.2 Indivíduo e profissão .............................................................................................. 12 1.2.1 Língua e poder ........................................................................................................ 13 1.3 Texto e sua circulação ............................................................................................. 14 1.3.1 Intenções do produtor ............................................................................................ 14 1.3.1.1 Textos e atividades ................................................................................................. 14 1.3.2 Polifonia e intertexto .............................................................................................. 15 1.3.2.1 Textos e atividades ................................................................................................. 16 02 TEXTO E SUA TEXTUALIDADE ............................................................................. 19 2.1 Coerência textual .................................................................................................. 19 2.1.1 Textos e atividades ................................................................................................. 20 2.2 Coesão textual ...................................................................................................... 24 2.2.1 Textos e atividades ................................................................................................. 27 2.3 Parágrafo isolado e no texto ...................................................................................... 36 2.3.1 Textos e atividades ................................................................................................. 37 03 COMPREENSÃO TEXTUAL ................................................................................. 44 3.1 Informações implícitas ............................................................................................ 44 3.1.1 Subentendidos e pressupostos ................................................................................... 44 3.1.1.1 Textos e atividades ................................................................................................. 46 3.2 Recursos e falácias da argumentação ............................................................................ 51 3.2.1 Textos e atividades ................................................................................................. 56 04 PRÁTICA DE TEXTOS .......................................................................................... 59 4.1 Artigo de opinião ................................................................................................... 59 4.1.1 Textos e atividades ................................................................................................. 59 4.1.2 Sugestão de atividade .............................................................................................. 62 4.2 Resumo .............................................................................................................. 62 4.2.1 Textos e atividades ................................................................................................. 634.2.2 Sugestão de atividade .............................................................................................. 66 4.3 Resenha .............................................................................................................. 69 4.3.1 Textos e atividades ................................................................................................. 69 4.3.2 Sugestão de atividade .............................................................................................. 71 05 RESOLUÇÃO DE QUESTÕES ................................................................................. 73 5.1 Questões das AVIN‘S ............................................................................................. 73 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 91 5 Nosso maior direito Você já pensou na maravilha que é pensar? Poder pensar? Por que maravilha? Nem sei como explicar, mas ter consciência de que se está pensando é extraordinário; quantas vezes na vida você se deu conta de que estava pensando e na liberdade que se tem quando se pensa? Pensar nos leva de um deserto na Mongólia ao palácio de um rei, do sofrimento mais doloroso à mais escandalosa das felicidades, do ódio à paixão, da descrença à mais profunda fé, até da doença à saúde -e vale o vice-versa. Pensar: o maior privilégio que alguém pode ter. As guerras, as revoluções, as obras de arte, os filmes, os livros, tudo, absolutamente tudo, só existe porque um dia, em algum lugar, um homem pensou, e há quem afirme que a força do pensamento pode até fazer com que as coisas aconteçam. Todas não sei, mas algumas, com certeza. É divertido pensar; quando se pensa não há censura, nada é pecado, proibido ou contra a lei. Talvez seja, verdadeiramente, a única liberdade total que se tem. Muitas pessoas talvez nunca tenham prestado atenção em seus próprios pensamentos: pois deviam. Essa prática pode ser melhor do que muitos filmes e muita conversa fiada, mas difícil, para quem não está acostumado. Você sabia que há muita gente que passa a vida inteira sem se dar conta do privilégio que é poder pensar? Uma maravilha e também um perigo: basta que se fique "pensativa" para que alguém pergunte "o que você tem? Está pensando em quê?" Nada desestabiliza mais um grupo do que perceber que uma das pessoas está longe, pensando. Pensar é perigoso; é pensando que se descobre que a vida não está boa mas que pode mudar, que o país vai bem mas poderia ir muito melhor, é pensando que se pode transformar nossa vida e o mundo. Nelson Mandela disse que tinha saudades do tempo que passou na prisão, porque preso ele tinha tempo para pensar. No nosso dia a dia, quando sobra um momento para se estar só, inventa-se imediatamente alguma coisa para fazer, para evitar o perigo maior que é pensar. Ninguém – ou pouquíssimas pessoas- está completamente feliz com sua vida pessoal, seus amores, seu trabalho. Mas durante a novela ninguém está pondo em questão se poderia fazer alguma coisa para ser mais feliz. Será que os altos homens de negócios já pararam para pensar se vale a pena trabalhar tanto, se não têm nem tempo para gastar o dinheiro que já têm? E para que mais dinheiro? Para ter mais cinco pares de sapato, três bolsas, 12 camisetas? É muito bom ter um carro do ano, mas se ele fosse de 2007 seria tão diferente? E essa mania de acumular, para deixar uma herança para os filhos, isso no fundo é um problema político. Todos sabemos que em alguns países a educação, a saúde e a aposentadoria são garantidas para toda a população, que sem precisar se preocupar tanto com o futuro, vive mais feliz -com menos frescuras, mas com mais alegria. Está vendo no que dá, pensar? Pensar é perigoso e subversivo, e uma coisa é certa: quem não pensa apenas faz o que os outros mandam: usam a bolsa da mesma grife porque inventaram, começaram a fumar e deixaram de fumar porque inventaram, e correm o risco de votar errado porque inventaram que quem tem carisma pode ser um bom presidente. Quem não pensa não escolhe, e são as escolhas que podem mudar. (LEÃO, Danuza. Nosso maior direito. Folha de S. Paulo, São Paulo, 25 julho 2010, p. C2) 6 Centro Universitário de Patos de Minas PLANO DE ENSINO ANO LETIVO PERÍODO CARGA HORÁRIA 2014 1º Semestral: 80h – Semanal: 4h Identificação da disciplina: Linguagem e Comunicação EMENTA A noção de linguagem como interação e o domínio de mecanismos linguísticos (gramaticais) e discursivos que permitam ao usuário da língua não só a leitura eficiente de textos variados, mas também a produção deles, a fim de que possa interagir e atuar sobre o(s) outro(s), social e profissionalmente. OBJETIVO GERAL Ler e produzir textos de maneira eficiente, considerando o interlocutor, o contexto de produção, a circulação e o papel dos textos numa dada comunidade. OBJETIVOS ESPECÍFICOS Refletir sobre a importância da circulação de informações na construção do conhecimento, sobre o papel da linguagem como meio de sobrevivência e como instrumento-chave nas relações sociais e profissionais. Dominar mecanismos linguísticos que permitam a leitura e a produção de textos com coesão e coerência e com progressão e articulação. Compreender textos nos aspectos linguísticos, argumentativos e expressivos, para que se desenvolva habilidade de interação nas modalidades escrita e falada da língua. Produzir textos que possibilitem uma participação social e profissional efetiva. Dominar tópicos referentes à normatização da escrita que permitam a produção de textos que atendam ao padrão culto da língua. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO 01 LINGUAGEM E SOCIEDADE 1.1 Informação e conhecimento 1.2 Indivíduo e profissão 1.3 Texto e sua circulação 1.3.1 Intenções do produtor 1.3.2 Polifonia e intertexto 2 TEXTO E SUA TEXTUALIDADE 2.1 Coerência e coesão textual 2.1.1 O parágrafo isolado 2.1.2 O parágrafo no texto 3 COMPREENSÃO TEXTUAL 3.1 Informações implícitas 3.1.1 Subentendidos e pressupostos 3.2 Recursos e falácias da argumentação 04 PRÁTICA DE TEXTOS 4.1 Artigo de opinião 4.2 Resumo 4.3 Resenha 05 PROBLEMAS GERAIS DA LÍNGUA CULTA 7 ATIVIDADES PRÁTICAS SUPERVISIONADAS Os discentes farão leituras de textos variados e de fontes diversas, selecionados pelo professor, voltados, direta ou indiretamente, à área de atuação escolhida, com a finalidade de reconhecer, de interpretar e de analisar os apontamentos teóricos feitos nas aulas. Será contemplada também a produção de textos a partir das leituras recomendadas. METODOLOGIA Para que se alcancem os objetivos propostos nas aulas de Linguagem e Comunicação, serão adotados os seguintes procedimentos didático-metodológicos: aulas expositivas, estudos de textos, debates, apresentação de seminários, oficinas de leitura e produção de textos. RECURSOS DIDÁTICOS Coletânea de textos e atividades, quadro, giz, textos selecionados de revistas, jornais e livros, retroprojetor, vídeo, salas de computadores e outros recursos necessários ao desenvolvimento das aulas. AVALIAÇÃO Do discente: A avaliação, que consiste em um processo contínuo e permanente, será concebida e utilizada nesta disciplina como elemento constitutivo do processo ensino-aprendizagem que permite identificar, qualitativa e quantitativamente, os avanços e dificuldades na concretização dos objetivos propostos. No decorrer do semestre letivo, serão distribuídos 100 (cem) pontos, da seguinte forma: 1. Quarenta (40) pontosdistribuídos pelo docente da disciplina, por meio da realização de provas e/ou outras atividades de avaliação. 2. Vinte (20) pontos distribuídos pelo professor orientador do Projeto Integrador, naqueles períodos em que este ocorrer, ou pelo docente da disciplina quando isso não acontecer; 3. Vinte (20) pontos atribuídos na Avaliação Colegiada (AC), elaborada pelo professor da disciplina, em parceria com o Núcleo Docente Estruturante (NDE), considerando-se a ementa trabalhada durante o semestre; 4. Vinte (20) pontos atribuídos na Avaliação Integradora (AVIN), elaborada pelo Núcleo de Apoio Psicopedagógico (NAP), considerando-se as ementas de todas as disciplinas trabalhadas durante o semestre. Do docente: Os alunos avaliarão o desempenho e atuação do professor por meio de instrumento elaborado pela CPA. BIBLIOGRAFIA BÁSICA FARACO, Carlos Alberto; TEZZA, Cristovão. Oficina de texto. 8. ed. Petrópolis: Vozes, 2010. FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. 17. ed. São Paulo: Ática, 2007. KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. A coesão textual. 22. ed. São Paulo: Contexto, 2010. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ANTUNES, Irandé. Lutar com palavras: coesão e coerência. 4. ed. São Paulo: Parábola, 2008. DISCINI, Norma. Comunicação nos textos: leitura, produção, exercícios. São Paulo: Contexto, 2010. GARCIA, Othon Moacir. Comunicação em prosa moderna: aprenda a escrever aprendendo a pensar. 27. ed. atual. Rio de Janeiro: FGV, 2011. KOCH, Ingedore Villaça; TRAVAGLIA, Luiz C. A coerência textual. 17 ed. São Paulo: Contexto, 2007. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. 2. ed. São Paulo: Parábola, 2008. 8 Capítulo 1 01 Linguagem e sociedade Neste capítulo, você vai ler e discutir, num primeiro momento, textos que abordam a relação entre informação e conhecimento, a dicotomia entre a leitura racional e a emocional, a construção do conhecimento como processo e a importância da linguagem técnica nas diversas áreas do conhecimento. Num segundo momento, serão apresentados textos para que você aprimore sua visão acerca do que seja (inter)texto, sua circulação e suas intenções. Para cada texto ou conjunto de textos, serão elaboradas atividades para reforço de aprendizagem e para discussão nas aulas. 1.1 Informação e conhecimento Neste ainda recente intercurso de séculos, uma exigência é feita: devemos ter acesso a informações. No entanto, não podemos confundir esse acesso com a construção de saberes ou de conhecimento. Ter informação não significa necessariamente ter capacidade de produzir conhecimento. É consensual, porém, que informações recebidas são necessárias à elaboração de conhecimento. A evolução do homem foi e é garantida, em grande parte, pelo fluxo de informações e pelo conhecimento resultante do intercâmbio delas, ora confirmando-as, ora negando-as, ora aprimorando-as. A cada dia, somos exigidos, principalmente no trabalho: devemos produzir sempre mais. Em qualquer atividade, somos levados a pensar, refletir, discutir, entre outras questões. Quem não tem informação não interage e quem não interage torna-se um indivíduo sem relações. Não há sociedade sem relações entre os indivíduos, não há atividade profissional que não gere resultados. Portanto, para que seja alcançada a interdependência necessária entre os indivíduos e entre os profissionais, a linguagem é necessária. É por meio dela que se constroem conhecimentos. O domínio de linguagens, da língua às manifestações não verbais, não garante ao falante regalias sociais, culturais, profissionais. Não adianta ter acessos a meios que veiculam informações; isso não nos faz melhores nas nossas relações diárias e intelectuais. Não adianta ter a capacidade de assimilar a linguagem técnica de nossas profissões; outras exigências são necessárias. Talvez a nossa disposição para receber informações e colocá- las em confronto com outras seja a nossa principal característica. Somos seres de produção de conhecimento, e a linguagem é a ponte para as travessias. 1.1.1 Quem sabe ? Galileu revolucionou a ciência e a tecnologia ao afirmar que a natureza é escrita na linguagem dos números. A nova revolução tecnológica afirma que a sociedade é escrita na linguagem da informação. Mas de que tipo de sociedade estamos falando? O 0 e o 1 são os blocos básicos com os quais será construído o futuro. Dois algarismos apenas formam o alfabeto do fenômeno mais complexo dos tempos modernos: a tecnologia de informação e comunicação. Novas formas de atividade e expressão, novas práticas de trabalho e de lazer já emergiram, e as velhas já estão passando por transformações radicais. Essas mudanças tremendas estão ocorrendo em escala global porque a partilha 9 de informações em rede está, pouco a pouco, alcançando todo o planeta. Ainda restam grandes disparidades, principalmente entre os hemisférios Sul e Norte, mas esses processos estão longe de completos. Em que direção eles estão nos conduzindo? Como devem ser implementados e regulamentados? Quais devem ser os envolvidos? Essas perguntas todas levaram a ONU a convocar a Cúpula Mundial sobre a Sociedade de Informação, que terá lugar em Genebra em dezembro. Essa cúpula reunirá governos, ONGs, participantes-chaves no setor privado e na sociedade civil, a mídia e organizações que integram o sistema da ONU. Prevendo alguns dos tópicos constantes da agenda da cúpula, a Unesco recentemente lançou um novo ciclo em sua série de fóruns de filosofia. Para situar-se em uma discussão diretamente relacionada à sua área de competência, ela postulou a pergunta ―Quem sabe?‖ a 20 figuras de destaque de uma série de áreas geográficas e intelectuais que participam do Fórum de Filosofia da Unesco. Alguns dirão que essa pergunta já é obsoleta. Para que memorizar se máquinas podem fazer melhor e mais rapidamente que nós? De que adianta conhecermos um teorema ou uma receita se podemos acessá-los facilmente na web? Essas perguntas não deixam de fazer sentido. Mas será que devemos concluir que a sociedade da informação conduz a uma sociedade caracterizada pela amnésia e ignorância? Deve a derrota de um homem pela máquina numa partida de xadrez nos fazer colocar em dúvida aquilo que é intrinsecamente humano? Não. Precisamos repensar o problema em novos termos. O Fórum de Filosofia da Unesco mostrou que a pergunta ―Quem sabe?‖ só terá perdido a relevância se confundirmos informação com conhecimento. No entanto, essas são duas coisas distintas, embora relacionadas, na medida em que a informação é uma ferramenta do conhecimento. A informação é uma técnica que tem por objetivo eliminar o elemento do ruído na comunicação. Mas comunicação não é inovação. Calibrar as palavras e mensagens melhora a transmissão do conhecimento, mas não o cria. O ponto forte da informação também é sua limitação. A inovação ocorre apenas quando existe uma busca pelo que é novo; não existe pesquisa – logo, não há progresso – sem conhecimento e sem a curiosidade e a experiência, as falhas e as tradições que ele pressupõe. É o conhecimento que dá sentido à informação. O conhecimento inclui dimensões sociais, éticas e políticas que não podem ser reduzidas à tecnologia. Uma sociedade que fosse exclusivamente só de informação seria um conjunto de enormes redes interligadas, eficazes e ágeis, mas que não iria produzir inovações. A informação não é base suficiente sobre a qual erguer uma sociedade. Mas a sociedade se baseia no diálogo, não em bits de informação. Assim, ―sociedades do conhecimento‖ parece ser uma expressão mais apropriada do que ―sociedade da informação‖ para designaros fenômenos dos quais estamos tratando. Existe apenas uma sociedade da informação, já que existe apenas um padrão de dados e comunicações. As sociedades do conhecimento existem no plural, já que, na medida em que dizem respeito à criatividade, elas necessariamente implicam diversidade e partilha. Sem o intercâmbio do conhecimento não podem existir avanços econômicos, científicos ou políticos em nível local, regional ou global. A partilha eqüitativa do conhecimento será a origem da riqueza do amanhã. Isso também é verdade no que diz respeito à vida cívica. Sem cultura democrática – ou seja, sem a tradição e o aprendizado dos costumes e valores democráticos –, a informação será utilizada para as finalidades dos regimes oligárquicos ou tirânicos, tanto quanto para as dos regimes fundamentados em processos decisórios públicos e compartilhados. O conhecimento se tornou um potencial-chave de investimento em todas as áreas da atividade humana. 10 É por essa razão que a Unesco decidiu dedicar às sociedades do conhecimento seu primeiro relatório mundial, a ser publicado em 2005, e também organizar uma mesa-redonda sobre o mesmo tema durante sua conferência geral de outubro de 2003. Afinal, a idéia do conhecimento não resume, melhor do que qualquer outra, as exigências implícitas na educação, ciência e cultura? Nossa meta é promover uma reflexão progressiva sobre os desafios postos pelas sociedades emergentes. Diante da revolução do conhecimento, a Unesco se mantém fiel a seu papel essencial: atuar como laboratório das idéias do amanhã. (Jérome Bindé é diretor de Antecipação e Estudos de Perspectivas da Unesco; Joseph Goux é professor de filosofia na Universidade Rice (Texas), EUA) (Folha de S. Paulo, 23 nov. 2003) 1. Informação e conhecimento são conceitos sinônimos e equivalentes? Argumente. 2. O que ocorreria se a informação e a tecnologia de ponta substituíssem a cultura democrática? 3. Discorra, num único parágrafo, sobre a força e a importância do fluxo de informação para a sociedade moderna. 1.1.2 Onde mora a inteligência Retorno ao lugar onde parei, na Escola da Ponte, em Portugal. A menina que me levava me havia dito umas coisas que me espantaram por não combinarem com aquilo que eu pensava saber sobre as escolas. Foi então que me veio à cabeça a sabedoria do Riobaldo: "O real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia". Sem intenção consciente, o dito do Riobaldo passou por uma transformação pedagógica e virou "a inteligência não está na saída nem na chegada, ela se dispõe para a gente é no meio da travessia". A inteligência acontece no "estar indo". Quando ela não está indo, ela está dormindo... Lembrei-me dos meus anos de ginásio, a pedagogia que os professores usavam naqueles tempos, e não sei se as coisas mudaram, porque o hábito tem um poder muito grande... Pois os professores me ensinaram as coisas que estavam na chegada, mas não me contaram como foi que a travessia tinha sido feita. O professor entrou em sala e anunciou: equação do segundo grau. Aí, ele se pôs a falar e a escrever símbolos no quadro negro. Aprendi automaticamente, sem entender, porque tinha memória boa: "x = -b + ou - raiz quadrada de b2 - 4ac sobre 2a". Lembro-me de um colega que não havia entendido a coisa, estava perturbado com o símbolo "x" e veio me perguntar: "Afinal, qual é mesmo o valor de "x"? Eu sabia que a fórmula para se determinar o valor de "x" não havia caído dos céus. Ela aparecera na cabeça de algum matemático que a deduzira séculos atrás depois de uma longa travessia numa jangada feita de pensamentos. O dito matemático a descobriu porque seus pensamentos estavam infelizes. "Ostra feliz não faz pérola". O que é dor para a ostra é uma interrogação para a cabeça. Mas por onde o pensamento matemático navegou para fazer a travessia, isso o professor não ensinou. É possível que ele não soubesse, ou que achasse que isso não importava. Para que entender a gravidez se o nenê já nasceu? O que importa é comer o bolo e não saber a receita... Me ensinaram também as três leis dos movimentos dos planetas que Kepler descobriu, curtinhas, fáceis de guardar na memória. Mas essas três leis na minha memória em nada contribuíram para dar poder à minha inteligência. Enquanto a memória trabalhava para decorar a "chegada", minha inteligência dormia. Nada me contaram sobre os caminhos fascinantes por onde errou o pensamento do astrônomo por dezoito anos. Uma hipótese errada atrás da outra, um caminho que não 11 levava a lugar algum depois do outro. Por que gastar tempo com os erros da "travessia", se se pode ir diretamente à "chegada", conclusão? Não se percebe que, ao assim proceder, o aluno ganha uma memória musculosa e uma inteligência flácida... Pensar é como escalar montanhas. Um alpinista recusaria o caminho rápido e seguro de chegar ao topo da montanha via helicóptero, sem sofrer e sem suar. Onde está a graça? O que ele deseja são os medos, os calafrios, os desafios da montanha, o que ele vê enquanto sobe... A arte de pensar se ensina fazendo a inteligência seguir o caminho da travessia, com todos os seus erros e enganos. (ALVES, Rubens. Onde mora a inteligência. Folha de S. Paulo, 28 junho 2011, p. A2. Caderno Cotidiano) 1. O que o autor discute no texto? Você concorda com o ponto de vista dele? Por quê? 2. Qual a importância da citação no 1º parágrafo para a montagem do esquema argumentativo? 3. Traduza: ―Não se percebe que, ao assim proceder, o aluno ganha uma memória musculosa e uma inteligência flácida...‖ 4. Em relação à construção do conhecimento, a tecnologia é uma ferramenta para a ―travessia‖ ou para a ―chegada‖? 5. Como você pretende percorrer o caminho da leitura e da produção de textos neste momento acadêmico e na vida profissional futura? 1.1.3 Analfabetismo emocional Há os que não conseguem decifrar a língua escrita, são os analfabetos. Outros entendem apenas textos simples, são os analfabetos funcionais. Falarei do que chamo de analfabeto emocional. É aquele que sabe ler, mas é presa das emoções para entender o texto, em vez de usar a razão. Faz uma leitura "criativa", embalada pelo sentimento e pela paixão. Decifra o texto por via de uma reação pura e espontânea, ignorando os estreitamentos de significado, impostos pelo sentido rigoroso das palavras escritas. A fim de ilustrar, utilizarei as cartas dos leitores acerca do meu ensaio "Os legisladores e o Verbo Divino" (12 de dezembro). Isso, por duas razões. Primeiro, por revelar-se uma boa amostra de leitura emocional. Segundo, porque muitas cartas são de professores e há uma corrente pedagógica pregando o subjetivismo e a liberdade do leitor para entender o texto como quiser. Será que alguns estariam ensinando tal estilo de leitura a seus alunos? Como várias interpretações se deslocaram do que está escrito, vale resumir o ensaio: 1) Pesquisas se somam, mostrando que o número de alunos em sala de aula não tem correlação com o nível de aprendizado; 2) Portanto, não há base científica para uma lei nacional inventando um número-limite de alunos por sala; 3) Vários fatores determinam qualidade, mas, segundo as pesquisas, o tamanho das classes não é decisivo; 4) Há situações em que classes pequenas se justificam – inclusive por exigência do método empregado –, mas isso tem de ser demonstrado, casa a caso. O ensaio causou a "indignação" de vários leitores. Entendamos, as emoções fazem parte da vida. Mas podem estar no lugar certo ou errado. Insisto, antes da fúria, é preciso usar razão para entender o que está sendo dito. Faltou a muitos leitores (mas não a todos),a disciplina de seguir o raciocínio, entendendo a lógica do argumento. Por isso, discordam do que não está escrito. Diante de uma pesquisa (no caso, centenas), devemos sempre aplicar a dúvida sistemática de Descartes. Encontramos erro lógico no argumento? Encontramos falhas metodológicas na comprovação empírica? Modelo errado, dados errados? Se não conseguimos identificar falhas, acabou a munição. Gostando ou não, somos obrigados a 12 engolir as conclusões da pesquisa. O debate científico não é minha opinião contra a sua, minha teoria contra a sua, mas sim minha evidência contra a sua. Vale o que revela o mundo real. "Reputo como inválidos seus argumentos". A frase ilustra a confusão entre pesquisa científica e opinião. Vale "o que eu acho", "o que eu vivi", "o que eu sei". A observação pessoal é vista como sendo mais definitiva do que pesquisas submetidas ao duro crivo da ciência. Se fosse assim, por que fazer pesquisas rigorosas? Afinal, a pesquisa é para eliminar subjetivo, as ambiguidades e o particularismo dos casos. Busca-se nela decifrar as grandes forças em jogo, não os detalhes de cada situação. Várias cartas julgaram irrealistas os exemplos oferecidos. É o mesmo engano. Se o convencimento fosse pelos exemplos, para que pesquisa? O papel dos exemplos é facilitar a compreensão, é dar concretude. Não demonstram rigorosamente nada. Houve atribuições de culpa à falta de disciplina, ao calor, à desmotivação de alunos e professores, à promoção automática e a outras moléstias do cotidiano de uma escola. Mas ao se apontarem esses fatores, implicitamente, fica reforçada, e não negada, a tese do ensaio sobre a falta de centralidade do tamanho das classes. Para terminar, fui bombardeado com o clássico argumentum ad hominem, comum nesses debates. Em vez de se apontarem erros, denuncia-se o autor. Vejamos algumas farpas: economistas sucumbem à "retórica mercantilista ou a exercícios de adivinhação levianos"; "Dos seus escritórios com ar condicionado (...) fica mais fácil ter uma visão turva da realidade"; "Com certeza, o senhor nunca viu de perto escola pública" (não é verdade, mas no caso é irrelevante). Ora, uma característica essencial de um estudo científico é que sua validade não depende de quem o realizou, mas de ser metodologicamente inexpugnável. (CASTRO, Cláudio de Moura. Analfabetismo emocional. Veja, 02 fevereiro 2013, p. 22). 1. O que é, na perspectiva de Castro, analfabetismo emocional? 2. O leitor dispõe de uma liberdade que permita a ele ler os textos como quiser? Comente. 3. Para Castro, muitos leitores falham em suas leituras por não seguirem o raciocínio e a lógica argumentativa propostos pelos autores dos textos. Esse posicionamento de Castro aplica-se à leitura de que gêneros textuais? A que gêneros não se aplicaria? 4. Como compreender a dicotomia entre resultado de uma pesquisa e opinião sobre esse resultado? 5. A que recursos você recorreria para validar suas opiniões? Sugestão: leia o texto 232 bombas atômicas, na página 68. 1.2 Indivíduo e profissão Conforme, Nicola, Cavallete Terra (2002), todo falante tem um certo conceito sobre que linguagem usar, dependendo da situação em que se encontra. Por isso, utiliza um registro formal em situação formal e um registro mais livre em situação menos formal. Por isso, também, notamos que a linguagem é desenvolta quando o sujeito tem o domínio da situação e, ao contrário, ele se cala ou se inibe se esse domínio não existe. Nas relações profissionais, o uso da linguagem, sobretudo a técnica, é primordial para que o falante se sobressaia bem. 13 1.2.1 Língua e poder ―A terapia teve um efeito idiossincrático com prognóstico favorável em caso de pronta supressão‖. Essa frase, enigmática para os não- iniciados nas sendas médicas, não significa muito mais do que ―o remédio teve efeito contrário, mas não causará problemas se for suspenso logo‖. Esse é um dos exemplos de jargão que consta da reportagem sobre linguagens técnicas publicada na semana passada no caderno Sinapse. O jargão é de fato inevitável, mas isso não significa que ele deva ser empregado em todas as ocasiões. Com efeito, toda profissão, do telemarketing à física de partículas, acaba por desenvolver um vocabulário específico, muitas vezes impenetrável para o leigo. Não apenas neologismos são criados como palavras comuns podem ter sua significação alterada. Em alguns casos, trata-se de uma necessidade. O jargão, no mínimo, economiza palavras, concentrando carga informativa em termos específicos. Quando um médico fala em ―miocardiopatia idiopática‖, ele está na verdade dizendo um pouco mais do que apenas ―problemas cardíacos de causa ignorada‖. No subtexto, um outro médico compreenderá que o paciente sofre de moléstia cardíaca de origem desconhecida e para a qual já foram descartadas as causas que mais comumente provocam doenças do coração. Em determinadas áreas científicas, os próprios objetos de estudo não passam de jargão. É o caso, por exemplo, da lingüística, com seus morfemas, sintagmas e lexemas, e da física de partículas, com seus quarks, glúons e léptons. No limite, sem o jargão, os fenômenos estudados não podem nem ser enunciados. Reconhecer a importância e a necessidade do jargão em certas situações não significa chancelar seu uso indiscriminado. Um médico ou um advogado que se dirijam a seus clientes em linguagem técnica incompreensível estão, na verdade, atendendo muito mal ao consumidor, que deve ter, em todas as ocasiões, acesso a uma explicação completa de sua situação em linguagem acessível. Infelizmente, as coisas nem sempre se passam assim. Desde que o mundo é mundo, profissionais de uma determinada área tendem a unir-se para manter sua arte impenetrável para o público em geral e, assim, aumentar seu poder. Não foi por outra razão que os escribas do antigo Egito complicaram desnecessariamente a escrita hieroglífica: era uma forma de conservarem e até de ampliarem sua posição hierárquica. Os tempos e as ciências mudaram, mas o princípio de complicar para valorizar-se permanece em vigor. Não devemos, é claro, ser ingênuos e acreditar que poderemos promover a plena igualdade através da língua. Democracia é, antes de mais nada, a arte de negociar, de aplicar o bom senso na solução de problemas. Nesse sentido, o bom profissional é aquele capaz de comunicar-se no melhor jargão com seus colegas, mas que consegue, sem grandes perdas, fazer-se entender pelo leigo. Os que ostensivamente abusam da linguagem técnica tendem a ser os menos capazes, os que mais precisam afirmar-se para não perder poder. (Folha de S. Paulo, 20 junho 2003) 1. Qual a relação entre domínio da língua e manifestação de poder? Dê exemplos. 2. Opine sobre o uso exagerado do jargão e sobre a linguagem ideal para o profissional. 3. Esse texto faz referência a uma reportagem sobre linguagens técnicas publicada anteriormente. De modo geral, como você vê a relação entre textos? 4. O jargão, nas mais diversas profissões, pode ser considerado fator de exclusão? Comente. 5. O sucesso profissional está ligado ao domínio da linguagem técnica? Por quê? 14 1.3 Texto e sua circulação Alguns teóricos da linguagem consideram que, na era da informação, tudo é texto. Um slogan de uma campanha política, uma música, um gráfico, um discurso oral, uma placa de trânsito, enfim, os mais variados arranjos organizados com o propósito de informar, comunicar, veicular sentidos são textos. Assim, um texto é não exclusividade da palavra. O texto é determinado pela finalidade comunicativa. E não faltam meios e recursos, nesta época em que vivemos, paraa produção e circulação de textos dos mais diversos e diferentes possíveis. 1.3.1 Intenções do produtor Conforme, Nicola, Florina e Ernani 20002), o falante, ao realizar um ato de comunicação verbal, escolhe, seleciona palavras para depois organizá-las e combiná-las, conforme a sua vontade. Esse trabalho de seleção e combinação não é aleatório, não é realizado por acaso (afinal, seleção significa ―escolha fundamentada‖), mas está diretamente ligado à intenção do produtor do texto. Desse modo, a linguagem passa a ter funções, como as de informar, seduzir, emocionar, convencer, entre outras. 1.3.1.1 Textos e atividades 1) Leia, com atenção, os três textos a seguir para responder ao que se pede. I – Supremo absolve deputado federal acusado de difamação O Supremo Tribunal Federal (STF) absolveu na manhã desta quarta-feira (12) o deputado federal Wladimir Costa (PMDB-PA) da acusação de difamação por suposta agressão verbal contra um adversário político. A maioria dos magistrados também entendeu que estava prescrito o crime de injúria contra o parlamentar paraense. Segundo queixa-crime feita pelo ex- senador Ademir Galvão Andrade (PSB-PA), Costa o teria ofendido em um programa de TV apresentado pelo deputado. O senador recorreu à Lei de Imprensa para tentar demonstrar que o adversário teria cometido os crimes de difamação e injúria. A Procuradoria Geral da República (PGR) concluiu que não houve crime de difamação, mas sim de injúria. Os procuradores, no entanto, observaram que a eventual punição estaria prescrita. A relatora do processo no STF, ministra Cármen Lúcia, acompanhou o entendimento da PGR e votou pela absolvição de Costa por difamação. Outros cinco magistrados seguiram a relatora. Somente os ministros Carlos Ayres Britto, presidente da corte, e Marco Aurélio Mello se manifestaram pela condenação do deputado, mas foram vencidos. Fabiano Costa e Mariana Oliveira Do G1, em Brasília (Disponível em: <http://g1.globo.com/politica/noticia>. Acesso em: 29 jan. 2013) 15 II – Fragmento do Código Penal Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa. § 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena: I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. § 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. § 3º - Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem: Pena - reclusão de um a três anos e multa. * § 3º acrescentado pela Lei nº 9.459, de 13 de maio de 1997. Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro; II - contra funcionário público, em razão de suas funções; III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria. Parágrafo único - Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro. (Disponível em : <tv.terra.com.br/esportes/esportestv>. Acesso em: 20 abril 2007) III – Calúnia Quiseste ofuscar minha fama E até jogar-me na lama Só porque eu vivo a brilhar Sim, mostraste ser invejoso Viraste até mentiroso Só para caluniar Deixe a calúnia de lá Se de fato és poeta Deixe a calúnia de lá Que ela a mim não afeta Se me ofendes, Tu serás o fendido Pois quem com ferro ferir Com ferro será ferido. Quiseste ofuscar minha fama E até jogar-me na lama Só porque vivo a brilhar (Caetano Veloso. Disponível em: <http://www.kboing.com.br>. Acesso em: 15 julho 2013) 1. Com que intenções os textos foram escritos? 2. No Texto 1, percebe-se o uso do discurso indireto. Que efeito esse uso confere à notícia lida? Já no Texto 2, não se percebe de quem é a voz que fala. Por quê? De quem seria essa voz? E no Texto 3, de quem é a voz e de que modo ela se projeta para nós, leitores ou ouvintes? 1.3.2 Polifonia e intertexto Podemos dizer que textos são reuniões de várias vozes: polifonia. Isso significa dizer que os textos possuem uma multiplicidade de vozes que os atravessam por meio de uma voz privilegiada – a do locutor principal – que vai incorporando as outras. Essas vozes podem aparecer no texto de maneira explícita ou implícita. Um exemplo do primeiro caso é a 16 citação no texto de ideias de outra pessoa. Um exemplo do segundo caso é a introdução no texto de ideias ou conceitos que fazem parte do senso comum, como afirmar que ―televisão faz mal à saúde‖. Nenhum texto se produz no vazio ou se origina do nada. Todo texto se alimenta, de modo claro ou subentendido, de outros textos. Um, ao retomar outro, tanto pode reiterar ou subverter as ideias presentes no texto ―original‖. O autor utiliza-o com o objetivo de apoiar ou de dizer algo totalmente diferente do que foi dito em outro texto, de criticar um ponto de vista, uma visão de mundo. Para Nicola, Florina e Ernani (2002), o conhecimento das relações entre os textos – e os textos utilizados como intertexto – é um poderoso recurso de produção e apreensão de significados. Quando um determinado autor recorre a outros textos para compor os próprios, certamente tem um motivo muito claro – a construção de significados específicos (crítica, reflexão, releitura, entre outras questões). Percorrer o caminho inverso, ou seja, buscar esse motivo e reconstruir o processo de produção leva a desvendar tais significados, pois um texto completa outro, lança luz sobre o outro. É o exercício da leitura que irá garantir tudo isso. 1.3.2.1 Textos e atividades 1) Leia, com atenção, o texto seguinte para responder ao que se pede. Sem adjetivos ―Eu sabia que estava com um cheiro de suor, de sangue, de leite azedo. Ele [delegado Fleury] ria, zombava do cheiro horrível e mexia em seu sexo por cima da calça com olhar de louco.‖ De Rose Nogueira, jornalista em São Paulo. Da ALN, foi presa em 1969, semanas depois de dar à luz. ―No quinto dia, depois de muito choque, pau de arara, ameaça de estupro e insultos, abortei. Quando melhorei, voltaram a me torturar.‖ De Izabel Fávero, professora de administração em Recife. Da VAR-Palmares, foi presa em 1970. ―Eu passei muito mal, comecei a vomitar, gritar. O torturador perguntou: ‗Como está?‘. E o médico: ‗Tá mais ou menos, mas aguenta‘. E eles desceram comigo de novo." De Dulce Chaves Pandolfi, professora da FGV-Rio. Da ALN, foi presa em 1970 e serviu de ―cobaia‖ para aulas de tortura. ―Eu não conseguia ficar em pé nem sentada. As baratas começaram a me roer. Só pude tirar o sutiã e tapar a boca e os ouvidos.‖ De Hecilda Fontelles Veiga, professora da Universidade Federal do Pará. Da AP, foi presa em 1971, no quinto mês de gravidez. ―Eu era jogada, nua e encapuzada, como se fosse uma peteca, de mão em mão. Com os tapas e choques elétricos, perdi dentes e todas as minhas obturações.‖ De Marise Egger-Moellwald, socióloga, mora em São Paulo. Do então PCB, foi presa em 1975. Ainda amamentava seu filho. ―Eu estava arrebentada, o torturador me tirou do pau de arara. Não me aguentava em pé, caí no chão. Nesse momento, fui estuprada.‖ De Gilze Cosenza, assistente social aposentada de Belo Horizonte. Da AP, foi presaem 1969. Sua filha tinha quatro meses. Trechos de 27 depoimentos de sobreviventes, intercalados às histórias de 45 mortas e desaparecidas no livro ―Luta, Substantivo Feminino‖, da série ―Direito à Verdade e à Memória‖. Será lançado na PUC- SP hoje, a seis dias do 31 de março. (Eliane Cantanhêde, Folha de S. Paulo, 25 março 2010, p. A2. Opinião) 17 1. Esse texto apresenta unidade temática. Qual? O que assegura essa unidade? 2. Que efeito produz a identificação das mulheres citadas? 3. No último parágrafo, em virtude da posição dos termos sintáticos que compõem o primeiro período, há um absurdo. Escreva o período para que o texto fique claro. 2) Leia, com atenção, os textos a seguir para responder ao que se pede. I – Os três macacos sábios A escultura Sanzaru, OS TRÊS MACACOS, - do Santuário de Toshogu, localizado na cidade de Nikko, Japão - é uma das mais famosas do templo Nikko Toshogu, o Templo do Xogum divinizado (Ieyasu Tokugawa). O três macacos são conhecidos como ―Os Três Macacos Sábios‖ e significam: ―não veja o mal, não ouça o mal, não fale o mal‖. Seus nomes são: ―Mizaru‖, o que cobre os olhos e não vê o mal; ―Kikazaru‖ o que cobre os ouvidos e não ouve o mal; e ―Iwazaru‖, o que cobre a boca e não fala o mal. Segundo alguns autores, haveria um quarto macaco, chamado Shizaru, com as mãos sobre o abdômen para lembrar ―não faça o mal‖. E embora não haja comprovação, eles teriam sido levados ao Japão por um monge budista chinês no século VIII. Dizem que o Mahatma Gandhi carregava uma gravura dos Três Macacos Sábios em suas viagens para lembrá-lo constantemente dos três segredos da Sabedoria: ―não ouça o mal, não veja o mal, não fale o mal‖." (Disponível em: <http://expiracaoeinspiracao.blogspot.com>. Acesso em 18 julho 2011) II – Charge [Os primatas] www.google.com.br/imagens 18 III – Nem tudo se pode ver, ouvir ou dizer Um músico me escreve contando que pertence a uma grande orquesta, mas não tem prazer no trabalho por causa dos colegas. Não suporta o despotismo, a vaidade, a prepotência, a arrogância e a mania de grandeza de alguns. O convívio com ―egos inflados‖ é demasiadamente penoso, e ele me pergunta o que fazer. Eu, que sempre faço a apologia do ato generoso da escuta, sugiro ao músico que faça ouvidos moucos. Lembro que ele tem o privilégio de escutar os sons mais sutis e sabe ouvir o silêncio. Não precisa dar ouvidos ao que não interessa. Inclusive porque egos inflados estão em toda parte e a luta contra eles não leva a nada. Evitar a luta de prestígio é um bem que nós fazemos a nós e aos outros. Para viver, nem tudo nós podemos ver, escutar ou dizer. Isso é representado, desde a Antiguidade, pelos três macacos da sabedoria. Cada um cobre uma parte diferente do rosto com as mãos. O primeiro cobre os olhos, o segundo, as orelhas e o terceiro, a boca. A representação é originária da China. Foi introduzida no Japão, no século VIII, por um monge budista. A máxima que ela implica é ―não ver, não ouvir e não dizer nada de mau‖. Foi adotada por Gandhi, que levava sempre consigo os três macaquinhos, o cego, o surdo e o mudo – Mizaru, Kikazaru e Iwazaru. Eles ensinam a não enxergar tudo o que vemos, não escutar tudo o que ouvimos e não dizer tudo o que sabemos. Noutras palavras, ensinam a selecionar e a conter-se. Isso é decisivo para uma atitude construtiva, mas não é fácil. Somos impelidos a focalizar o que nos prejudica – impelidos por um gozo masoquista ao qual temos de nos opor continuamente. Só a consciência disso permite não sair do caminho em que a vida desabrocha. Seleção e contenção tornam a existência mais fácil. Desde que não sejam um efeito da repressão, como na educação tradicional, e sim do desejo do sujeito – um desejo vital de se opor às forças do inconsciente que podem nos fazer mal. Isso implica a humildade de aceitar que o inconsciente existe e nós não somos donos de nós mesmos. A ideia não é nova. Data da descoberta da psicanálise por Freud, no fim do século XIX, mas continua a ser ignorada porque é difícil nos livrarmos do ego. Sobretudo numa sociedade como a nossa, que tanto valoriza, e que não condena a vaidade, a prepotência, a arrogância. Pelo contrário, estimula-as para se perpetuar. (MILAN, Bety. Nem tudo se pode ver, ouvir ou dizer. Veja, 12 janeiro 2011. p. 92. A autora é e psicanalista e escritora) 1. Com intenção cada um desses textos foi produzido? 2. Como entender o processo intertextual instaurado na produção desses textos? 3. Comente: não há texto isolado; o que há é uma imensa rede de textos. 19 Capítulo 2 02 Texto e sua textualidade Não adianta saber que escrever é diferente de falar. É necessário preocupar-se com o sucesso dos objetivos da produção textual, como a interação entre o produtor do texto e o seu receptor. Para que se tenha êxito nesse processo, deve-se construir um todo significativo. É preciso, portanto, recorrer a elementos que possam auxiliar na ligação das partes, na construção da coerência, entre outos. Neste capítulo, você terá acesso, num primeiro momento, a uma questão fundamental quando se fala de textos, que é a coerência. Num segundo momento, será abordado outro fator que contribui para o sucesso da produção de textos, que é a coesão. Por último, será vista a construção do parágrafo e sua articulação no texto. 2.1 Coerência textual Como vimos anteriormente, os textos são veiculadores de intenções. Essas intenções ou propósitos do autor de um texto somente terão sentido se houver uma organização harmônica das ideias apresentadas. Podemos dizer, portanto, que um texto não é um aglomerado de frases, mas um todo organizado capaz de manter contato com seus leitores, agindo sobre eles. Dizer que um texto é uma organização de sentido é dizer que ele é coerente. A coerência é resultante da não- contradição entre os segmentos textuais e da adequação entre o que está na materialidade textual e o contexto extraverbal. No primeiro caso, um segmento é pressuposto para o seguinte e assim sucessivamente. No segundo, o que é dito no texto deve estar em harmonia com o nosso conhecimento de mundo, sobre o que é permitido ou não em determinadas situações – que inclui nosso conhecimento sobre tipo e gêneros textuais. Assim, há uma transmissão e uma recepção de uma linha de pensamento. Frequentemente nos deparamos com situações em que se afirma algo, mas se faz o contrário. Como exemplo, na última campanha eleitoral política, muitos eleitores se sentiram traídos pela candidata Dilma Rousseff ou deixaram de dar créditos ao seu discurso, uma vez que constataram uma mudança de pensamento da candidata em relação ao tema do aborto. A capa de Veja (13 out. 2010), abaixo reproduzida, enfatiza essa ―mudança de pensamento‖, para, de certo modo, o que fica mais evidente na reportagem, desqualificar a candidata. A incoerência está clara não só nas citações em discurso direto da candidata, mas também na organização visual da capa. Os dois blocos de informações da capa, um vermelho (discurso desfavorável à opinião pública) e outro branco (discurso favorável à opinião pública), mostram ao leitor de Veja uma dupla face da candidata. Não estaria a revista dizendo: ―Veja o discurso da candidata, (e)leitor!‖ 20 Fiorin e Savioli (2007) apresentam três níveis em que a coerência deve ser observada: narrativo, figurativo e argumentativo. No primeiro, a coerência está na decorrência lógica das ações e de suas relações com os personagens que as praticam. No segundo, a coerênciaestá na articulação harmônica entre o que é descrito (as figuras), com base na relação de significado que mantém entre si. No terceiro, a coerência está na apresentação concatenada de uma ideia que será defendida, de argumentos que sustentam essa ideia e do remate dado pela conclusão. Ao produzir nossos textos, devemos estar atentos à organização coerente de nossas ideias. Recuperar a credibilidade e a confiança do nosso interlocutor não é uma tarefa simples. Embora eleita, a candidata perdeu eleitores em virtude de contradições ditas durante sua campanha. 2.1.1 Textos e atividades 1) Leia, com atenção, o texto a seguir para responder ao que se pede. Em março de 2005, o acordo com o FMI não foi renovado, resultado do sucesso do ajuste na economia promovido pelo governo federal nesses dois anos, que, entre outras coisas, permitiu a queda da relação dívida pública/PIB por dois anos seguidos, ao mesmo tempo em que a distribuição de renda melhorava e se criavam 100.000 empregos formais por mês. Com a economia continuando a se fortalecer nos meses seguintes (mais exportações, menos inflação), a decisão de quitar integralmente a dívida com o Fundo de forma antecipada pôde ser tomada com toda a segurança, trazendo benefícios para a melhora da imagem do país e a diminuição do custo de captação da dívida pública. (Adaptado de Em Questão, n. 387 - Brasília, 26 de dezembro de 2005) Assinale a opção que não completa o período abaixo de acordo com as idéias do texto acima. Foi possível dispensar a renovação do acordo com o FMI em decorrência de a) sucesso do reajuste na economia promovido pelo governo federal. b) queda da dívida pública/PIB por dois anos seguidos. c) melhoria da distribuição de renda e criação de 100.000 empregos por mês. d) melhora da imagem do país no exterior. 2) Assinale a asserção que dá seqüência coerente ao texto. 21 Ao longo da história capitalista, o mundo viveu alguns momentos particularmente felizes em termos de crescimento econômico e produção de riqueza, nos quais tudo parecia conspirar a favor da prosperidade. Foi assim no início do século 20, quando a indústria moderna deu um salto para um patamar até então inédito. O mesmo ocorreu após a Segunda Guerra Mundial, com a Europa e o Japão literalmente se reerguendo das cinzas para se transformar em potências econômicas de primeira grandeza. É também o que se observa, em escala sem precedentes, neste início do século 21. A taxa de expansão mundial no ano passado, de 5,1 %, é a mais alta em décadas. Mas o que realmente chama a atenção é sua dispersão geográfica. A taxa de juro se encontra num dos patamares mais baixos dos últimos tempos – o que funciona como um impulso extra ao crescimento. Como conseqüência, o que se vê mundo afora é produção e consumo em alta, desemprego e miséria em queda. (Exame, 28 set.2005, pág. 21, adaptado). a) A desvantagem fica mais evidente ao se confrontar o desempenho brasileiro não com a média do globo, mas com países em estágio de desenvolvimento semelhante, as chamadas economias emergentes. b) Para os brasileiros, esse momento de rara felicidade global deixa a incômoda sensação de que não estamos participando como deveríamos da festa. c) Não se pode esquecer que o aquecimento da demanda global foi um grande alicerce para que a economia brasileira se mantivesse em pé em tempos de crise política. d) Graças a um volume recorde no comércio global, os bons ventos têm soprado não apenas para as nações ricas, mas especialmente para as remediadas e até para as mais pobres. 3) Assinale a alternativa que apresenta, sem afetar o princípio da coerência, o título mais adequado para o texto abaixo. a) Entrada na casa, salário a discutir b) Maior tempo de casa, menor salário c) Bonificações salariais e tempo de casa d) Redução salarial de executivos antigos 4) Assinale a alternativa que apresenta, sem afetar o princípio da coerência, o título mais adequado para o texto abaixo. 22 a) Eles se preocupam b) Eles estão com receios c) Elas movem o mercado d) Elas dominam o mercado 5) É título adequado para a matéria jornalística em que o gráfico abaixo seja apresentado: a) Sabor de mel: China é o gigante na produção de mel no mundo e o Brasil está em 15º lugar no ranking b) Apicultura: Brasil ocupa a 33ª posição no ranking mundial de produção de mel – abelhas estão desaparecendo no país c) O milagre do mel: a apicultura se expande e coloca o país entre os seis primeiros no ranking mundial de produção d) Pescadores do mel: Brasil explora regiões de mangue para produção do mel e ultrapassa a Argentina no ranking e) Sabor bem brasileiro: Brasil inunda o mercado mundial com a produção de 15 mil toneladas de mel em 2005 23 6) Vamos supor que você recebeu de um amigo de infância e seu colega de escola um pedido, por escrito, vazado nos seguintes termos: ―Venho mui respeitosamente solicitar-lhe o empréstimo do seu livro de Redação para Concurso, para fins de consulta escolar.‖ Essa solicitação em tudo se assemelha à atitude de uma pessoa que a) comparece a um evento solene vestindo smoking completo e cartola. b) vai a um piquenique engravatado, vestindo terno completo, calçando sapatos de verniz. c) vai a uma cerimônia de posse usando um terno completo e calçando botas. d) freqüenta um estádio de futebol usando sandálias de couro e bermudas de algodão. 7) Quando o treinador Leão foi escolhido para dirigir a seleção brasileira de futebol, o jornal Correio Popular publicou um texto com muitas imprecisões, do qual consta a seguinte passagem: Durante sua carreira de goleiro, iniciada no Comercial de Ribeirão Preto, sua terra natal, Leão, de 51 anos, sempre impôs seu estilo ao mesmo tempo arredio e disciplinado. Por outro lado, costumava ficar horas aprimorando seus defeitos após os treinos. Ao chegar à seleção brasileira em 1970, quando fez parte do grupo que conquistou o tricampeonato mundial, Leão não dava um passo em falso. Cada atitude e cada declaração eram pensadas com uma racionalidade típica de sua família, já que seus outros dois irmãos, Edmílson, 53 anos, e Édson, 58, são médicos. (Correio Popular, Campinas, 20 out. 2000 - com adaptações) a) O que aconteceria com Leão se ele, efetivamente, ficasse ―aprimorando seus defeitos‖? Reescreva o trecho de maneira a eliminar o equívoco. b) A expressão ―por outro lado‖, no início do segundo período, contribui para tornar o trecho incoerente. Por quê? 8) O que é necessário saber para tornar o texto da tirinha abaixo coerente? 9) Nesse texto, há um caso de incoerência argumentativa. Procure identificá-la. Embora existam políticos competentes e honestos, preocupados com as legítimas causas populares, os jornais, na semana passada, noticiaram casos de corrupção comprovada, praticados por um político eleito pelo povo. Isso demonstra que o povo não sabe escolher seus governantes. 24 2.2 Coesão textual Nas seções anteriores vimos uma diversidade de gêneros textuais, verbais, não verbais e mistos. Nesta seção, abordaremos apenas textos da modalidade escrita devido a sua importância para o fazer acadêmico e profissional. Veremos, portanto, um dos principais recursos que contribuem para fazer com que frases amontoadas sejam consideradas um texto: a coesão. Há certa confusão entre os termos coerência e coesão. Enquanto a coerência se refere à unidade de sentido e, por isso, é de um nível profundo, a coesão é a ligação, a relação, a conexão entre as palavras, expressões, frases ou parágrafos do texto. Os elementoscoesivos assinalam a conexão entre partes do texto. A palavra texto, na sua etimologia, vem do latim textum, que significa tecido, entrelaçamento. Produzir um texto é o mesmo que praticar a ação de tecer, entrelaçar unidades e partes com a finalidade de formar um todo. Desse modo, podemos falar em textura de um texto, que é a rede de relações coesivas. São muitos os mecanismos de coesão textual. Nesta seção, vamos estudar alguns. Esperamos que, a partir desse estudo, você esteja apto a não só perceber outros em suas leituras, mas também a recorrer a outros em sua produção textual. Escolhemos um editorial da revista Veja (27 abril 2006, p. 9) para demonstração do que consideramos um texto bem tecido. Destacamos apenas alguns recursos coesivos para estudo e para demonstração da continuidade textual. O Brasil tem jeito Desde a volta da democracia, em 1985, o país tem passado por uma série de escândalos na esfera institucional (1). No Poder Executivo (2), houve o impeachment de um presidente e, recentemente, a demissão de ministros envolvidos em esquemas ilícitos. No Legislativo (3), por seu turno (4), ainda se escutam os ecos do mensalão e não empalideceram as imagens dos ―anões‖ da Máfia do Orçamento sendo banidos da vida pública. Agora, com a Operação Hurricane (furacão, em inglês), deflagrada pela Polícia Federal para prender os integrantes de uma quadrilha que explorava o jogo de caça- níqueis, chegou a vez de (5) o Judiciário (6) ter exposta a sua banda podre (7). Três desembargadores foram presos e um ministro do Superior Tribunal de Justiça (8) está afastado das suas funções. Pesa sobre esses togados (9) a acusação de venda de liminares. Com tais instrumentos jurídicos (10), os exploradores do jogo (11) conseguiam manter em funcionamento milhares de casas ilegais de jogatina, dotadas de máquinas manipuladas para lesar o jogador. Há indícios de que pode haver ainda (12) outros altos integrantes do Judiciário (13) comparsas dessa máfia (14). A sucessão de escândalos de corrupção no Brasil costuma provocar nos cidadãos a impressão de que o país não tem jeito (15). É como se a desonestidade fosse parte inextirpável do caráter nacional. Compreende-se que os ânimos se arrefeçam, mas (16) é preciso enxergar o fenômeno (17) de um ângulo mais amplo. Em primeiro lugar (18), os escândalos só vêm à tona graças ao bom funcionamento das instâncias responsáveis pela fiscalização do poder (19) – entre as quais a imprensa livre, a polícia e, ressalte-se (20), a imensa maioria dos integrantes do Poder Judiciário (21). Em segundo lugar (22), a cada quadrilha estourada, a cada esquema desvendado, dá-se um passo a mais para a depuração das instituições. Por isso (23), pode- se analisar a operação da Polícia Federal ora em curso (24) como uma contribuição ao aprimoramento da Justiça (25), cuja (26) distribuição igualitária e eficiente é um dos pilares das sociedades abertas e modernas. A continuar por esse caminho (27), o Brasil tem jeito (28), sim. 25 No quadro abaixo, encontram-se os comentários acerca dos elementos de coesão destacados no texto. (1) Embora essa “série de escândalos‖ esteja indefinida, é a expressão desencadeadora da organização do texto. (2) O autor apresenta, sem comentários, o primeiro dos três poderes institucionais e, a partir daí, dois escândalos aí ocorridos. (3) O autor apresenta, sem comentários, o segundo dos três poderes institucionais. (4) Essa expressão marca a passagem para a apresentação dos escândalos no Legislativo. Não há comentários acerca desses escândalos. (5) Essa expressão marca a passagem para a apresentação do escândalo no Judiciário. No meio da expressão é apresentado o escândalo aí ocorrido. (6) Essa expressão apresenta o terceiro dos três poderes, que é o Judiciário. (7) Refere-se ―quadrilha que explorava o jogo de caça-níqueis‖, que, por sua vez, antecipa a ―banda podre‖ do Judiciário. (8) Refere-se a ―banda podre‖, identificando-a. (9) Refere-se a ―três desembargadores‖ e a ―um ministro‖. (10) Refere-se a ―liminares‖. (11) Refere-se aos envolvidos no escândalo que pagaram pelas liminares. (12) Elemento que mostra a inclusão de membros do Judiciário no escândalo. (13) Refere-se aos desembargadores e ao ministro, além de deixar marcado o envolvimento de outros integrantes do Judiciário. (14) Refere-se a ―banda podre‖, já detalhada anteriormente. (15) Recupera ―uma série de escândalos na esfera institucional‖ do primeiro parágrafo para o articular com o segundo e para acrescentar que o Brasil não tem jeito. (16) Conector que opõe a impressão de que o Brasil não tem jeito a um novo modo de ―ver‖ os escândalos, anunciando-se um otimismo. (17) Refere-se aos escândalos na esfera institucional. (18) Expressão que fragmenta, num primeiro momento, a noção ―amplo‖, anteriormente apresentada. (19) Essas ―instâncias‖ são apresentadas a seguir, após um travessão, destacando-se o Judiciário. (20) Operador que enfatiza a ideia seguinte. (21) Opõe-se a ―banda podre‖ do primeiro parágrafo, assinalando o otimismo do autor. (22) Expressão que fragmenta, num segundo momento, a noção ―amplo‖, anteriormente apresentada. (23) Conector responsável por encaminhar o fechamento da questão de que o Brasil tem jeito. (24) Refere-se a ―Operação Hurricane‖, no primeiro parágrafo. (25) Refere-se ao Poder Judiciário. (26) Refere-se a ―Justiça‖. (27) Expressão que abre a conclusão subjetiva do autor. ―Esse caminho‖ refere-se ao fato de que, se os esquemas são desvendados, há depuração das instituições. (28) Recupera o título do título do texto, deixando explícito o otimismo do autor. Você percebeu que um texto não é simplesmente um conjunto de frases aleatório. A nossa experiência como falante não é a de formar frases; a nossa experiência é a de produzir textos a todo momento. A análise e a leitura do texto O Brasil tem jeito mostraram o papel dos mecanismos de coesão, que é, de acordo com Antunes (2005, p. 47), criar, estabelecer e sinalizar os laços que deixam os vários segmentos do texto ligados, articulados, encadeados. Portanto, a função da coesão é a de promover a continuidade do texto, a 26 sequência interligada de suas partes, para que não se perca o fio de unidade que garante sua interpretabilidade. Quando lemos o primeiro parágrafo do texto O Brasil tem jeito, temos a impressão – ou somos levados a isso – de que o Brasil não tem jeito. São mencionados vários escândalos nos poderes constitutivos de nosso país. Na transição para o segundo parágrafo, o autor retoma a ―série de escândalos‖ do primeiro parágrafo para, além de dar continuidade ao seu texto, fazê-lo progredir noutra direção, que é a de nos levar a acreditar que o Brasil tem jeito. No interior de cada parágrafo, são feitas retomadas e antecipações, além de se deixarem explícitas algumas conexões. Tudo isso para garantir não só a continuidade do texto, mas também o sucesso de sua interpretabilidade. Há dois tipos de coesão: a referencial e a sequencial. O primeiro tipo se caracteriza por substituições de um elemento por outro e por reiterações de elemento do texto. O segundo tipo se refere ao desenvolvimento propriamente dito, ora por procedimentos de manutenção temática, como emprego de termos pertencentes ao mesmo campo semântico, ora por meio de processos de progressão temática, que podem realizar-se por meio da satisfação de compromissos textuais anteriores ou por meio de novos acréscimos ao texto. Quando vamos escrever um texto nos baseamos em quatro elementos centrais: a repetição, a progressão, a não-contradição e a relação. Todas essas partes compõem o texto, relacionando-se com o que já foi dito ou com o que se vai dizer.Vejamos o que quer dizer cada um desses elementos. Repetição – Ao longo de um texto coerente, ocorrem repetições, retomadas de elementos. Essa retomada é normalmente feita por pronomes ou por palavras e expressões equivalentes ou sinônimas. Também podemos repetir a mesma palavra ou expressão, o que deve ser feito com cuidado, a fim de que não seja prejudicado. Progressão – Num texto coerente, devemos sempre acrescentar novas informações ao que já foi dito. A progressão complementa a repetição: esta garante a retomada de elementos passados; aquela garante que o texto não se limite a repetir indefinidamente o que já foi colocado. Dessa forma, equilibramos o que já foi dito com o que se vai dizer, garantindo a continuidade do tema e a progressão do sentido. Não-contradição – Num texto coerente, não devem surgir elementos que contradigam aquilo que já foi considerado falso, ou vice-versa. Esse tipo de contradição só é tolerado se for intencional. Não se deve confundir a não-contradição com o contraste, pois a aproximação de idéias e fatos contrastantes é um recurso muito freqüente no desenvolvimento da argumentação. Relação – Num texto coerente, os fatos e conceitos devem estar relacionados. Essa relação deve ser suficiente para justificar sua inclusão num mesmo texto. Para que se avalie o grau de relação dos elementos que vão construir o texto, é importante organizá-lo esquematicamente antes de escrever. Feito o esquema, é importante observar se a aproximação das idéias é realmente eficaz. Esses quatro itens (repetição, progressão, não-contradição e relação) podem ajudar a avaliar o grau de coesão dos textos. A configuração final do texto depende ainda de outros fatores, como o canal de comunicação, o perfil do receptor e as finalidades pretendidas pelo emissor. Todos esses fatores afetam diretamente as feições do texto que se pretende bem-sucedido. Nas atividades a seguir, você verá, de modo operacional, os tipos de coesão mencionados e esses elementos centrais de avaliação dos textos. 27 A seguir, você terá, num quadro, as principais conjunções e locuções conjuntivas para sua consulta. É importante lembrar que num texto, principalmente de natureza argumentativa, o uso de conectores mostra a capacidade do produtor de apresentar, defender e refutar argumentos. Conjunções e locuções conjuntivas Coordenativas Aditivas e, nem, mas... também, senão também, não ainda, como também, bem como, que (entre verbos), não só... mas também. Adversativas mas, porém, todavia, contudo, no entanto, entretanto, não obstante Alternativa ou...ou, ora...ora, quer...quer, seja...seja, nem...nem, já...já, etc. Conclusivas logo, pois (depois do verbo), portanto, por conseguinte, por isso, assim, então. Explicativas que, porque, pois (antes do verbo), porquanto. Subordinativas Causais porque, pois, porquanto, como [= porque], pois que, por isso que, já que, uma vez que, visto que, visto como, que, na medida em que, etc. Comparativas que, do que (depois de mais, menos, maior, menor, melhor, pior), qual (depois de tal), quanto (depois de tanto), como, assim como, bem como, como se, que nem. Concessivas embora, conquanto, ainda que, mesmo que, posto que, bem que, se bem que, apesar de que, nem que, que, etc. Condicionais se, caso, quando, contanto que, salvo se, sem que, dado que, desde que, a menos que, a não ser que, etc. Conformativas conforme, como [= conforme], segundo, consoante, etc. Consecutivas que (combinada com uma das palavras tal, tanto, tão ou tamanho, presentes ou latentes na oração anterior), de forma que, de maneira que, de modo que, de sorte que. Finais para que, a fim de que, porque [= para que], que Proporcionais à medida que, ao passo que, à proporção que, enquanto, quanto mais... (mais), quanto mais... (tanto mais), quanto mais... (menos), quanto mais... (tanto menos), quanto menos... (menos), quanto menos... (tanto menos), quanto menos... (mais), quanto menos... (tanto mais) Temporais quando, antes que, depois que, até que, logo que, sempre que, assim que, desde que, todas as vezes que, cada vez que, apenas, mal, que [= desde que], etc. Integrantes que, se 2.2.1 Textos e atividades 1) Leia, com atenção, texto a seguir para preencher o quadro. Na coluna de coesão referencial, escreva o referente ao qual o termo ou expressão destacada faz alusão. Na coluna da coesão sequencial, diga o valor semântico do conector destacado. 28 Cerveja preta aumenta o leite? Não. APESAR DA antiga crença de que beber cerveja preta aumenta a quantidade de leite em mulheres grávidas, não existem estudos que comprovem o fato. E, na realidade, qualquer tipo de bebida alcoólica é contra-indicada nessa situação. Num estudo feito em 1993, a cientista americana Julie Mennella acompanhou lactantes que ingeriram bebidas alcoólicas E encontrou indícios de que elas produziam menos leite. Ninguém sabe ao certo a origem da crença. Uma das hipóteses é que ela tenha surgido PORQUE mulheres que ingeriram bebidas de alto teor alcoólico não eram bem vistas na sociedade. ―A cerveja preta tem menos álcool QUE bebidas COMO a cachaça e, POR ISSO, ganhou status de bebida de ‗mulheres decentes‘. OU SEJA, mães. A partir daí, a relação foi se aperfeiçoando‖, diz Maria Amélia Bitar, autora da tese ―Aleitamento materno: um estudo sobre crenças e tabus ligados à prática‖. O que se sabe é que o mito não é exclusividade brasileira. E já foi levado TÃO a sério QUE, nos anos 80, nos Estados Unidos, foi criada a Malt Nutrine, uma bebida escura que era vendida em farmácias e recomendada por médicos PARA incentivar a produção de leite. (Taíssa Stivanin. Super Interessante, fev. de 2005, p. 30) Coesão referencial Coesão sequencial o fato – APESAR DA – nessa situação - E – que – PORQUE – elas – QUE – da crença – COMO – ela – POR ISSO – mães – OU SEJA – o mito – TÃO ... QUE – bebida escura – PARA – 2) Identifique, no texto abaixo, os termos que são retomados pelas palavras ou expressões grifadas. Proprietários e mendigos: duas categorias que se opõem a qualquer mudança, a qualquer desordem renovadora. Colocados nos dois extremos da escala social, temem toda modificação para bem ou para mal: estão igualmente estabelecidos, uns na opulência, os outros na miséria. Entre eles situam-se – suor anônimo, fundamento da sociedade – os que se agitam, penam perseveram e cultivam o absurdo de esperar. O Estado nutre de sua anemia; a ideia de cidadão não teria nem conteúdo nem realidade sem eles, tampouco o luxo e a esmola: os ricos e os mendigos são os parasitas do pobre. Há mil remédios para a miséria, mas nenhum para a pobreza. Como socorrer os que insistem em não morrer de fome? Nem Deus poderia corrigir sua sorte. Entre os favorecidos da fortuna e os esfarrapados, circulam esses esfomeados honoráveis, explorados pelo fausto e pelos andrajos, saqueados por aqueles que, tendo horror ao trabalho instalam-se, segundo sua sorte ou vocação, no salão ou na rua. E assim avança a humanidade: com alguns ricos, com alguns mendigos e com todos os seus pobres... (CIORAN, E. M. Breviário de decomposição. Trad. José Tomaz Brum. Rio de Janeiro: Rocco, 1989, p.113-114) 29 3) Leia atentamente os textos a seguir observando as relações de semânticas entre as ideias. A seguir, complete as lacunas com elementos de coesão sequenciais. I) Sair do convencional e aplicar em ações de empresas menos conhecidas pode ser um bom negócio. Os papéis da Plascar, por exemplo, subiram mais de 700% neste ano e ainda há espaço para altas. Quem compra essas ações, _______________, deve preparar o calmante, ____________ elas
Compartilhar