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Apostila Estudos Territoriais I

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 2 
SUMÁRIO 
 
Introdução ......................................................................................................... 5 
Compreendendo a disciplina ................................................................................................................ 5 
Ementa ..................................................................................................................................................... 5 
Objetivos ................................................................................................................................................. 5 
Programa ................................................................................................................................................ 6 
Bibliografia ............................................................................................................................................ 6 
Importância do território para o administrador público ......................................................... 7 
UNIDADE 1 – Conceitos básicos relacionados ao território .............. 9 
Espaço ............................................................................................................................................................ 9 
Espacialidade ..................................................................................................................................... 11 
Lugar ............................................................................................................................................................ 11 
Território ................................................................................................................................................... 13 
Sistema territorial ............................................................................................................................ 18 
Territorialidade ................................................................................................................................ 19 
Região .......................................................................................................................................................... 19 
Regionalidade e regionalismo ..................................................................................................... 20 
Paisagem .................................................................................................................................................... 21 
Atividade de aprendizagem ............................................................................................................... 22 
UNIDADE 2 – O território e suas dimensões ........................................ 24 
Dimensões territoriais ......................................................................................................................... 24 
Abordagem territorial .................................................................................................................... 24 
Cultura e território .......................................................................................................................... 25 
Identidade e território ................................................................................................................... 26 
Poder no território ................................................................................................................................. 28 
Territorizalização e suas variações ................................................................................................. 32 
Desenvolvimento territorial .............................................................................................................. 33 
UNIDADE 3 – Planejamento territorial .................................................. 38 
Introdução ao planejamento .............................................................................................................. 38 
Planejamento territorial ...................................................................................................................... 39 
Planejamento público ........................................................................................................................... 39 
Ordenamento do território................................................................................................................. 40 
Governança territorial .......................................................................................................................... 41 
Planejamento participativo ................................................................................................................ 42 
 
 
 3 
UNIDADE 4 – Políticas públicas no território ...................................... 44 
Estado e território .................................................................................................................................. 44 
Ordenamento do território urbano .......................................................................................... 45 
Por uma visão estratégica de inovação pública ......................................................................... 47 
Sistemas de acompanhamento e avaliação de políticas públicas ....................................... 48 
Monitoração de dinâmicas urbanísticas e territoriais ............................................................ 50 
Referencial bibliográfico ............................................................................ 51 
 
 
 
 
 4 
 
 
 
 
 
Introdução 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Objetivos de aprendizagem 
 
 Conhecer o conteúdo e funcionamento da 
disciplina. 
 Sensibilizar para a necessidade de o 
administrador público desenvolver uma 
visão territorial. 
 
 
 
Introdução 
Compreendendo a disciplina
A disciplina Estudos Territoriais I
Bacharelado em Administração Pública 
da UFVJM. O PPC foi adaptado por professores da 
partindo de um modelo fornecido pela UAB
Programa Nacional de Formação 
para a UFVJM foram incluídas 
pela UAB para as instituições 
Consideramos que a importância des
compreensão contemporânea e holística
desenvolverem uma visão aplicável a várias 
gestão, seja ela de qualquer tipo de organização. A visão territorial 
que dará ao administrador 
econômica, política, ambiental etc. do mundo atual.
 
O Moodle apresenta o cronograma e a distribuição de frequência da disciplina, 
incluindo as avaliações que serão realizadas.
Ementa 
Conceituação de território. Território, identidade e poder. Fundamentos do processo de 
planejamento territorial. Sistemas de acompanhamento e avaliação de políticas 
Monitoração de dinâmicas urbanísticas e territoriais. Avaliação de programas regionais 
comunitários. Gestão e avaliação de projetos de desenvolvimento sustentável.
 
Observação: Esta ementa é a que consta no Projeto Pedagógico do Curso
Objetivos 
� Sensibilizar o administrador público sobre a importância da visão territorial.
� Demonstrar a importância e contemporaneidade da aplicação dos conceitos 
territoriais. 
� Explicar como os aspectos relacionados ao território que influem na sua gestão.
� Compreender os fenômenos da territorialização, desterritorialização e 
reterritorialização sobre os indivíduos e organizações.
� Discutir sobre a influência d
Para saber mais
http://moodl
5 
Compreendendo a disciplina 
Estudos Territoriais I foi incluída no Projeto Pedagógicodo Curso de 
Administração Pública – modalidade a distância (EaD) da primeira turma
foi adaptado por professores da instituição em dezembro de 2008
fornecido pela UAB – Universidade Aberta do Brasil e 
e Formação de Administradores Públicos. Na adequação do
para a UFVJM foram incluídas esta e outras duas disciplinas, dentro da flexibilidade dada 
instituições participantes. 
Consideramos que a importância desta disciplina está em oferecer uma 
compreensão contemporânea e holística do território, instigando os estudantes a 
aplicável a várias áreas do conhecimento e, principalmente, 
de qualquer tipo de organização. A visão territorial será 
ao administrador público uma compreensão ampla da complexidade social, 
econômica, política, ambiental etc. do mundo atual. 
O Moodle apresenta o cronograma e a distribuição de frequência da disciplina, 
incluindo as avaliações que serão realizadas. 
 
Conceituação de território. Território, identidade e poder. Fundamentos do processo de 
planejamento territorial. Sistemas de acompanhamento e avaliação de políticas 
Monitoração de dinâmicas urbanísticas e territoriais. Avaliação de programas regionais 
comunitários. Gestão e avaliação de projetos de desenvolvimento sustentável.
é a que consta no Projeto Pedagógico do Curso 
administrador público sobre a importância da visão territorial.
Demonstrar a importância e contemporaneidade da aplicação dos conceitos 
Explicar como os aspectos relacionados ao território que influem na sua gestão.
os fenômenos da territorialização, desterritorialização e 
reterritorialização sobre os indivíduos e organizações. 
a influência dos aspectos territoriais na administração pública.
Para saber mais 
moodle.ead.ufvjm.edu.br 
foi incluída no Projeto Pedagógico do Curso de 
da primeira turma 
em dezembro de 2008, 
Universidade Aberta do Brasil e PNAP - 
adequação do projeto 
flexibilidade dada 
a disciplina está em oferecer uma 
os estudantes a 
e, principalmente, na 
será uma habilidade 
uma compreensão ampla da complexidade social, 
O Moodle apresenta o cronograma e a distribuição de frequência da disciplina, 
 
Conceituação de território. Território, identidade e poder. Fundamentos do processo de 
planejamento territorial. Sistemas de acompanhamento e avaliação de políticas públicas. 
Monitoração de dinâmicas urbanísticas e territoriais. Avaliação de programas regionais 
comunitários. Gestão e avaliação de projetos de desenvolvimento sustentável. 
administrador público sobre a importância da visão territorial. 
Demonstrar a importância e contemporaneidade da aplicação dos conceitos 
Explicar como os aspectos relacionados ao território que influem na sua gestão. 
os fenômenos da territorialização, desterritorialização e 
administração pública. 
 
 
 6 
Programa 
Introdução 
1. Conceitos básicos sobre território 
2. O território e suas dimensões 
3. Planejamento territorial 
4. Políticas públicas no território 
• Sistemas de acompanhamento e avaliação 
• Monitoração de dinâmicas urbanísticas e territoriais 
• Avaliação de programas regionais comunitários 
• Gestão e avaliação de projetos de desenvolvimento sustentável 
Bibliografia 
Esta é a bibliografia que consta no Projeto Pedagógico do Curso. 
 
ARAUJO, F. G. B. de; HAESBAERT, R. Identidade e Território: questões e olhares 
contemporâneos. Rio de Janeiro: Acess, 2007. 
CASTRO, Iná E, de. Geografia e Política. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. 
CASTRO, Iná E. de. et al. Explorações geográficas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. 
COSTA, Wanderley M. Geografia Política e Geopolítica. São Paulo: Hucitec/Edusp, 1992. 
ELIAS, Denise. Globalização e Agricultura. São Paulo: Edusp, 2003. 
GOMES, Paulo C. da C. A condição Urbana – ensaios de geopolítica da cidade. Rio de 
Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. 
GRAY, John. Falso amanhecer: os equívocos do capitalismo global. Rio de Janeiro: Record, 
1999. 
RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993. 
SANTOS, Milton. O Espaço Dividido. São Paulo: Edusp, 2004. 
SANTOS, Milton e Silveira Maria L. O Brasil – Território e sociedade no início do século 
XXI. Rio de Janeiro – São Paulo: Editora Record, 2001. 
SANTOS, Milton. Da política dos Estados à política das empresas in Cadernos da Escola 
do Legislativo, v.03, n. 06, Belo Horizonte, p. 09-23, 1997. 
SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: 
Hucitec, 1996. 
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência 
universal. Rio de Janeiro: Record, 2000. 
SILVEIRA, M. L. Globalización y circuitos de la economia urbana em ciudades 
brasileñas. Caracas: Cuadernos del CENDES, v.3, n.57, p. 1-21, 2004. 
SPÓSITO, Eliseu S. e Spósito M. E. B. Cidades Médias – produção do espaço urbano e 
regional. São Paulo: Expressão Popular, 2006. 
 
 
 
 
 7 
Importância do território para o administrador público 
A relação do conceito de território com o de espaço é necessário, pois é no espaço 
que se organiza o “campo operatório” de qualquer sociedade ou grupo de indivíduos, é 
onde ocorrem as interações políticas, econômicas, sociais e culturais. O território se 
expressa na dimensão espacial, mas é muito mais do que isso, pois possui as dimensões 
temporal, psicológica e econômica. 
O território tem sido uma forma moderna de trabalhar a dimensão espacial na 
gestão, seja ela pública ou privada. Na administração pública torna-se fundamental, já que 
o Estado é o seu principal ator, exercendo uma grande influência sobre os territórios. 
Evidentemente, o poder público não o único e nem sempre o maior no território, como 
seria de se imaginar. Em alguns territórios, seu poder pode ser mínimo. 
A importância da visão territorial reside no fato de que o gestor precisa conhecer 
as dinâmicas que ocorrem no e pelo território, que é o local de possibilidades, o espaço 
onde os objetos físicos existem, onde as relações sociais acontecem. Então, ele se torna 
condição de existência dos mesmos. 
As políticas públicas e ações governamentais encontram-se obrigatoriamente 
circunscritas a um território que, administrativamente é bem conhecido e delimitado. 
Porém, esse território se reconfigura dinamicamente, obrigando, continuamente, o agente 
público a conhecê-lo, compreendê-lo, adequá-lo e, em muitos casos, adaptar-se a ele. 
Compreender a dinâmica social, os hábitos e costumes de sua população, as 
interações dos grupos sociais em um determinado espaço geográfico etc. torna-se 
fundamental para que se possa analisar as condições de vida e propor intervenções. É 
necessário identificar os objetos geográficos, sua utilização e sua importância para os 
fluxos de pessoas e materiais (MONKEN e BARCELLOS, 2005). 
Cabe ao administrador público ter clareza na interpretação dos diversos territórios 
que coexistem com o seu território administrativo e das forças que interferem, para que 
possa exercer bem as funções de gestão: planejar, organizar, dirigir e controlar. Tudo isso 
deve ser feito através de projetos, em ações coordenadas com demais atores, que também 
detém poder no território. 
Raffestin (1993) demonstra a multiplicidade dimensional na análise territorial. 
Desenvolver (planejar, executar e controlar) projetos a partir da visão de um sistema 
territorial torna a tarefa menos árdua, já que oferece uma forma mais ampla e diferenciada 
de compreender as relações sociais, os processos produtivos, as configurações do espaço, 
os arranjos políticos, os posicionamentos do Estado e dos diversos agentes econômicos 
etc. existentes dentro do território específico em que se vai trabalhar. 
 
 
 
 
 8 
UNIDADE 
 1 
 
Conceitos básicos 
de território 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Objetivos de aprendizagem 
 
 Conhecer e discerniros conceitos e 
categorias fundamentais relacionados ao 
território. 
 Compreender e diferenciar as visões 
clássica e contemporânea de território. 
 Sensibilizar os estudantes para a 
necessidade de uso da visão territorial na 
administração pública 
 
 
 9 
UNIDADE 1 – Conceitos básicos 
relacionados ao território 
Para compreendermos o território é necessário compreendermos que é um 
conceito, ao mesmo tempo, material de imaterial, formal e não formal, concreto e abstrato, 
tangível e não tangível. Milton Santos, um dos principais cientistas brasileiros, no livro 
Espaço e Sociedade, de 1979, explica a materialização das formas sociais mais abstratas. 
As formas, sem as quais nenhuma função se perfaz, são objetos, formas 
geográficas, mas podem também ser formas de outra natureza, como por 
exemplo, as formas jurídicas. No entanto, mesmo essas formas sociais não 
geográficas terminam por espacializar-se, geografizando-se, como é o caso 
da propriedade ou da família. Assim, as funções se encaixam, direta ou 
indiretamente, em formas geográficas. 
Território foi, inicialmente, definido pela geografia clássica, através dos seus 
aspectos físicos, relacionados ao espaço ocupado pelo homem sobre a superfície do 
planeta. Recentemente, a geografia pós-moderna trouxe vários avanços na concepção do 
território. Essa visão tornou-se multidisciplinar e complexa. Iniciaremos pelos conceitos 
que definem território, para depois compreendermos as dinâmicas a que ele está sujeito. 
As principais categorias relacionadas a território serão vistas a seguir. São elas: 
espaço, espacialidade, região, lugar, paisagem, além do próprio conceito de território. 
Espaço 
O conceito de espaço é um tanto concreto, pois é bem definido e delimitado por 
dimensões físicas. Ele pode ser bidimensional, indicando uma área, ou tridimensional, 
indicando volume. Ele é anterior ao território, pois, quando ainda livre, infinito, ilimitado, 
não é território. 
Quando delimitado é separado em porções, áreas, zonas por meio de linhas, ser 
circunscrito e configurado por meio de limites. Ele pode ser definido por um conjunto de 
coordenadas, tornar-se área, meio, âmbito, ambiente, recipiente, recinto, contorno, 
circunscrição que pode conter estruturas e forma e conter seres e coisas. Ele passa a ser 
um meio de coexistência, um local de relações espaciais entre objetos. 
O espaço possui propriedades: extensão, posição, área e volume. A extensão é 
composta por comprimento, largura, superfície, volume. A posição é relativa: distância, 
longe, perto, acima, abaixo etc. A dimensão é composta de: tamanho, proporções, 
grandeza. 
O espaço pode ser preenchido, ocupado, utilizado, conquistado, comprado, 
apossado, enfim, apropriado. Porém, é a utilização que dá sentido ao espaço, que torna-o 
útil. O valor do espaço está na forma como se organiza ou na possibilidade de ser 
organizado. Dessa forma ele passe a ter valor de uso ou de troca. 
Há também um tipo muito específico de espaço, relacionado ao tempo, o espaço de 
tempo ou espaço-tempo. Nessa dimensão se materializam o trabalho e as relações 
 
 
 10 
dos/entre os homens. São os chamados: espaço social e tempo social. Nele se caracteriza a 
relação social, materializando no espaço e no tempo as relações de produção e de 
dominação, de acumulação desigual de espaço e de tempos (RIBEIRO, 1986 apud 
ESPINDOLA, 2009). 
Milton Santos confirmou a existência das dimensões social (relacional) e temporal 
(histórica) nas suas descrições de espaço: “o espaço é formado por um conjunto 
indissociável, solidário e também contraditório, entre sistemas de objetos e sistemas de 
ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá” 
(SANTOS, 2008, p.63). 
“O espaço não é nem uma coisa, nem um sistema de coisas, senão uma realidade 
relacional: coisas e relações juntas” (SANTOS, 1988, p.7). “Espaço é um campo de forças 
multidirecionais e multicomplexas, e o mundo, considerado como conjunto de 
possibilidades, todas interligadas e interdependentes” (SANTOS, 1988, p. 34-35). 
Essas coisas, que Santos também chama de objetos técnicos, podem ser usinas 
hidroelétricas, estradas, fabricas etc. têm importância na história das sociedades, nas 
ações técnicas (de produção), nos aspectos formais (legal, econômico, científico) e nos 
simbólicos (emotivos, afetivos, rituais). Apesar dessa descrição, Santos (1985) explica que 
a essência do espaço é social, assim, que ele não pode ser reduzido às coisas e objetos 
geográficos, naturais ou artificiais. 
Os elementos ou variáveis do espaço devem ser classificadas: homens, firmas, 
instituições e o suporte ecológico. Cada uma das variáveis estabelece múltipla interação 
com o espaço e podem interagir entre si. A sistematização classificatória faz aparecer as 
relações sociais presentes em cada “espaço” e, consequentemente, as relações espaciais 
(SANTOS, 1985). 
Raffestin explica de forma clara a relação entre espaço e território: 
É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O 
território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação 
conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em 
qualquer nível. Ao apropriar de um espaço concreta ou abstratamente (por 
exemplo, pela representação), o ator "territorializa" o espaço (RAFFESTIN, 
1993, p. 143). 
O espaço é, de certa forma, "dado" como se fosse uma matéria-prima. 
Preexiste a qualquer ação. "Local" de possibilidades, é a realidade material 
preexistente a qualquer conhecimento e a qualquer prática dos quais será 
o objeto a partir do momento em que um ator manifeste a intenção de dele 
se apoderar. Evidentemente, o território se apoia no espaço, mas não é o 
espaço. É uma produção, a partir do espaço (RAFFESTIN, 1993, p. 144). 
A relação entre território e espaço é muito próxima, pois é no espaço que se 
organiza o campo operatório de qualquer sociedade ou grupo de indivíduos, é onde 
ocorrem as interações políticas, econômicas, sociais e culturais. O território se expressa na 
dimensão espacial, mas é muito mais do que isso, pois possui as dimensões temporal, 
psicológica e econômica. 
De fato, a variável espacial passou a obter grande destaque e ser apontada 
por alguns estudiosos como de fundamental relevância para se 
compreender o dinamismo de determinadas regiões e suas relações com o 
desempenho dos atores e das instituições. Esse dinamismo é explicado com 
base na ideia de que a maior proximidade dos atores que atuam em 
determinado espaço geraria ações coletivas e cooperadas (troca de 
experiências, redes de colaboração) que ampliariam a espessura e a 
 
 
 11 
densidade das relações sociais e, como consequência, favoreceriam o 
surgimento de oportunidades inovadoras de desenvolvimento (SCHNEIDER 
e TARTARUGA, 2005, p. 100). 
Espaço é o conceito mais abrangente de todos, por isso, é o mais abstrato e, por 
isso, abrange conceitos mais operacionais como: paisagem, lugar, região e território. 
Espacialidade 
A espacialidade é uma categoria do espaço, que traz consigo a dimensão tempo. Ela 
exprime a organização de um determinado espaço em um determinado tempo. Formas de 
organização de tempos diferentes podem coexistir no mesmo espaço. Assim, a 
espacialidade trata o espaço num processo histórico. Nessa visão, o espaço se torna 
relacional. Ela é social e histórica, vincula agentes concretos em fenômenos sociais, que 
dependem da articulação entre natureza e sociedade, através das leis sociais que se 
sobrepõem às leis naturais. 
Lugar 
Lugar é uma categoria relacionada à Geografia Humanística (tem como expoentes: 
Yi-Fu Tuan, Anne Buttimer e Armand Frémont), que trabalha com a relação dos indivíduos 
com seu ambiente. O lugar está relacionado à experiência humana, ao vivido, à afetividade, 
ao simbólico, ao idealismo.Expressa a particularidade ou singularidade do local onde o 
indivíduo cria significados. 
Assim, o lugar é cheio de simbolismo, dando ao indivíduo sensações emotivas, 
sentimento de segurança, de pertencimento, boas recordações. Essas dimensões 
simbólicas, emocionais, culturais, políticas e biológicas são criação humanas. Por isso, o 
tempo é necessário para criar a experiência (TUAN, 2013). 
A identidade e o significado criados dependem das intenções que as pessoas têm e 
da relação dessas intenções com os atributos do lugar. Essa intencionalidade está, então, 
ligada a afetividade com o lugar. Por isso, nem sempre, o enraizamento ocorre. Algumas 
pessoas vivem por longo tempo em lugar, mas não criam raízes. 
Pela sua subjetividade, o lugar não é muito bem definido geograficamente. A 
tendência de quem detém o poder é organizar e limpar os lugares, muitas vezes 
descaracterizando-os. Os técnicos ignoram a subjetividade do lugar, só consideram os 
objetos geográficos. Um exemplo é a construção de uma barragem, onde há preocupação 
apenas com as famílias, atividades, coisas e bichos. Ao produzir desenvolvimento 
ignorando os aspectos subjetivos do lugar criam um conflito de perda, uma crise de 
identidade e um desenraizamento dos moradores. 
O ser humano precisa de identidade com o espaço para se sentir seguro. O lugar é 
onde isso acontece. Nossa identidade é relacional, nossa construção própria depende do 
outro, da relação. O individual e o coletivo são inseparáveis. 
Lugares têm dimensões históricas, decorrentes da prática cotidiana, que se 
desenvolvem no plano do vivido. Eles têm tradição, uma trama de relações, identidade, 
passado e presente. A história singular de um lugar é uma combinação dos seus aspectos 
particulares – cultura, tradição, língua, hábitos próprios – com tudo aquilo que vem de 
 
 
 12 
fora. O resultando dessa relação é um contexto muito mais amplo, dentro do processo de 
constituição do mundial. 
A particularidade do lugar não anula o fato de estarem interligados o local e o 
global. 
Quanto mais os lugares se mundializam, mais se tornam singulares e 
específicos, isto é, "únicos". Isto se deve à especialização desenfreada dos 
elementos do espaço - homens, firmas, instituições, meio ambiente -, à 
dissociação sempre crescente dos processos e subprocessos necessários a 
uma maior acumulação do capital, à multiplicação das ações que fazem do 
espaço um campo de forças multidirecionais e multicomplexas, onde cada 
lugar é extremamente distinto do outro, mas também claramente ligado a 
todos os demais por um eixo único, dado pelas forças motrizes do modo de 
acumulação hegemonicamente universal (SANTOS, 1988, p.34). 
Cada lugar, ademais, tem, a cada momento, um papel próprio no processo 
produtivo. Este, como se sabe, é formado de produção propriamente dita, 
circulação, distribuição e consumo (SANTOS, 1985, p.13). 
Os lugares são nós na rede de fluxos de informações, pessoas e coisas. Com a 
evolução das Tecnologias de Informação e Comunicação está ocorrendo uma compressão 
no espaço e no tempo. A velocidade de comunicação e transporte reduz as distâncias 
físicas e psicológicas. 
Por oposição ao conceito de lugar, surge o neologismo deslugar, que seria o não-
lugar, um espaço público de rápida circulação, asséptico, com os quais as pessoas não têm 
laços emocionais, ou essas relações são fracas (Ex.: aeroportos, shopping centers, conjuntos 
habitacionais, parques de diversão etc.). O não-lugar, em oposição ao lugar, é não 
identitário, não relacional, não histórico, não antropológico. Os não-lugares não 
substituem os lugares. 
A modernidade e as tecnologias acabaram por criar os não-lugares virtuais. Os 
telejornais e vários sites (a tradução é local, lugar, sítio) de internet poderiam ser 
chamados de não-lugares. Os não-lugares são feitos fundamentalmente de imagens e sua 
atração é inversa à exercida pelo lugar, pelo ausência do peso da tradição. 
As novas tecnologias de comunicação e transporte criam a rede de lugares e, em 
sua conexão, se formam os entre-lugares. Os lugares são os nós da rede e os entre-lugares 
são as vias de passagem dos fluxos, das conexões entre os nós. Esses entre-lugares acabam 
gerando novos lugares ou novos não-lugares, dependendo dos processos identitários de 
cada um. Quando os relacionamentos nos entre-lugares são acontecimentos agenciados 
artificialmente, produzidos para não durar, tornam-se apenas um espaço de trânsito, ou 
um não-lugar. 
Por outro lado, alguns lugares tiveram sua história transformada por um processo 
de revitalização, uma transformação estética e fatual. Isso causou uma artificialização e 
desenraizamento (Ex.: Cidade de Tiradentes, Pelourinho etc.). 
Há também os lugares míticos, em que não se vive, devido á distância, mas sobre os 
quais as pessoas imaginam, sonham, desejam. Mais próximos estão os lugares concebidos, 
que são acessíveis, mas conhecidos apenas por informações de outras pessoas. 
Na economia internacional cada nação e cada lugar possui uma função dentro da 
divisão internacional do trabalho. O lugar é o ponto de tensão ante a globalização, que 
quer homogeneizar, com as características ocidentais, todos os lugares, em sua lógica 
hegemônica. O lugar representa concretude, particularidade, singularidade contra a 
totalidade, a globalidade. 
 
 
 13 
Uma comunidade não é um lugar, mas está contida nele. Algumas comunidades 
podem conviver em um mesmo lugar sem se relacionarem diretamente, mas com uma 
interação diária em um ambiente físico. Esses lugares são alterados, por exemplo, pela 
concentração de populações de etnias diferentes, formando bairros ou enclaves étnicos. 
Nesses territórios, há a sobreposição de lugares e comunidades (CASTELLS, 2005). 
 
Território 
Os conceitos de território surgiram com os estudos dos naturistas sobre a 
territorialidade animal. A territorialidade humana surgiu com Sack (1986) em Human 
territoriality: its theory and history, que examinava a perspectiva das motivações humanas, 
como a base do poder. Em sua visão, o território influencia o comportamento das pessoas 
através do controle de acesso de seus limites, com maior permeabilidade, ou 
acessibilidade, às pessoas, aos objetos ou aos fluxos. O poder estava no esforço constante 
para influenciar e controlar o acesso. 
Sposito (2004) fala de três concepções territoriais: (1) Naturalista - clássica, 
justifica conquista através da história; (2) Individual - abstrata, psicológica, relacionada 
aos sentidos e pertencimento e (3) Espacial - base da ciência da geografia, sistemas de 
objetos e sistemas de ações. Para ele, os objetos técnicos e seus formalismos jurídicos, 
econômicos, científicos ou simbólicos são indissociáveis dos objetos de ações. 
Friedrich Ratzel, geógrafo e etnólogo alemão, definiu território no contexto 
histórico da unificação alemã em 1871, e institucionalização da disciplina geografia nas 
universidades europeias. 
Território, para ele, é uma parcela da superfície terrestre apropriada por 
um grupo humano, coletividade esta que teria uma necessidade imperativa 
de um território com recursos naturais suficientes para sua população, 
recursos que seriam utilizados a partir das capacidades tecnológicas 
existentes. E, mais importante, o conceito de território ratzeliano tem por 
referencial o Estado (SCHNEIDER e TARTARUGA, 2005, p. 101). 
Ratzel criou a divisão da geografia em política, biogeografia e antropo-geografia. 
Por se dedicar ao aspecto humano da geografia, buscou compreender as influências das 
circunstâncias naturais sobre a humanidade, vendo o território como espaço vital, em 
que existe um povo (vivo) em uma terra (estática). 
O território ratzeliano tem o Estado como referência, constituindo sua expressão 
legal e moral. Essa visão geopolítica justificava a defesa e expansão territorial do estadoalemão da época e, posteriormente, do regime nazista. 
Para os geógrafos clássicos, território é uma parcela do espaço definida por limites, 
com sistema de leis e unidade de governo (MONKEN e BARCELOS, 2005). A partir disso, a 
localização e as características internas são descritas e explicadas. Essa é a descrição do 
parcelamento do mundo (partitioning) dentro da história. 
Apesar da influência de Ratzel, o francês Paul Vidal de La Blache, fundou a Escola 
Francesa de Geografia, conhecida como escola possibilista de geografia. O possibilismo 
acreditava na relação mútua homem-natureza e que essa última fornece um conjunto de 
possibilidades a qualquer grupo humano de transformar a paisagem. Assim, seu 
pensamento diferenciava-se do determinismo ambiental da escola alemã. 
O espaço é a "prisão original'', 
o território é a prisão que os 
homens constroem para si 
(RAFFESTIN, 1993, p. 144). 
 
 
 14 
Naquela época o conceito de região tinha uma primazia, contrapondo ou 
desacreditando o conceito de território, como explicação da realidade (SCHNEIDER e 
TARTARUGA, 2005). O conceito de território volta a ser discutido pelo geógrafo francês 
Jean Gottmann em The significance of territory (1973). 
O conceito de território volta a ser utilizado na década de 1970, principalmente, 
por ampliar seu sentido, com a visão do controle espacial ou simbólico, atribuindo maior 
peso às relações sociopolíticas que levam à apropriação, configuração e controle do 
espaço, distinguindo da visão puramente estatal ou nacional. 
A evolução tecnológica do século XX trouxe fluidez na ocupação territorial e 
integração entre os países. A organização das nações e entre nações; quebraram a 
concepção exclusivamente, orientada para o território estatal. 
Alguns autores como: Claude Raffestin, Milton Santos, Regério Haesbaert, Sergio 
Schneider, Bertha Becker dentre outros, esforçam-se para quebrar a visão puramente 
positivista e cartesiana buscando refletir sobre o lado simbólico do território, que está 
relacionado com o tempo, a história, a cultura, o poder etc. Essa visão mais atual se 
expande, rompendo as fronteiras epistemológicas, permeando as mais diversas áreas do 
conhecimento, lançando o território na base de vários estudos multidisciplinares. 
O francês Claude Raffestin, em seu livro Por uma geografia do poder critica a 
"geografia unidimensional", que referencia o território exclusivamente ao poder estatal. 
Para ele, no território há múltiplos poderes e conflitos que não só o do estado, como 
colocava Ratzel. Para Rafestin, a geografia política ou geopolítica de Ratzel é uma geografia 
do Estado todo-poderoso, do Estado totalitário. Ele explica território como uma formação 
que acontece, a partir de um espaço físico, definido pela apropriação física ou abstrata das 
pessoas. Para ele, a visão geográfica homogeneíza a sociedade porque ignora os contextos 
sócio-histórico e espaço-temporal. 
É nesses contextos sócio-histórico e espaço-temporal que os diversos atores se 
interligaram em incontáveis conexões, tecendo malhas ou redes de relacionamentos, que 
ele chama de sistema territorial. Esse sistema vê o território como um campo de poder 
balizado e modificado pelas redes, circuitos e fluxos que nele se instalam (rodovias, 
estradas de ferro, circuitos comerciais e bancários, rotas aéreas etc.). 
Existem múltiplos poderes, inferiores, em uma escala dada pelo próprio Estado, 
hierarquicamente, para organizar, controlar e gerenciar seu território e sua população. 
Esses poderes se manifestam nas estratégias regionais ou locais. A verdadeira geografia, 
então, seria a geografia do poder (ou poderes) já que o Estado não é o único detentor de 
poder no território. 
Podemos considerar que a definição de Schneider e Tartaruga resume o conceito 
de território: 
Portanto, a conceituação, aqui defendida, é aquela em que o território é 
definido como um espaço determinado por relações de poder, definindo, 
assim, limites ora de fácil delimitação (evidentes), ora não explícitos (não 
manifestos), e que possui como referencial o lugar; ou seja, o espaço da 
vivência, da convivência, da co-presença de cada pessoa. E, considerando 
ainda, o estabelecimento de relações, internas ou externas, aos respectivos 
espaços com outros atores sociais, instituições e territórios (SCHNEIDER e 
TARTARUGA, 2005, p.106-207). 
Santos (2008) explica que o desenvolvimento e conformação dos territórios ocorre 
de forma heterogênea, devido às suas feições naturais, seus processos sociais (formas 
 
 
 15 
herdadas), que hoje definem a divisão territorial do trabalho, mas também pelas formas 
artificiais (meio ambiente construído), principalmente após a inclusão de objetos técnicos. 
Gottmann (1973 apud Schneider e Tartaruga, 2005) coloca que o conceito de 
território evoluiu desde o final do século XX. Com as novas tecnologias, que trouxeram 
maior rapidez às comunicações e aos transportes, a percepção de território ganhou 
fluidez. Castells (2005) afirma que a Sociedade em Rede1 acelerou a globalização, encolheu 
o mundo, acabou com as fronteiras e encurtou as distâncias. Com isso as dimensões 
circulação e relação ganham nova importância. Nas dimensões espacial e temporal 
acontece a circulação de pessoas e mercadorias em escala planetária, criando novas 
relações entre os países, repercutindo em novas configurações territoriais. 
A análise territorial oferece uma forma diferenciada de visualizar as relações 
existentes dentro de uma combinação espaço-tempo específica. É uma nova forma de 
estruturar a realidade sob o ponto de vista das forças que atuam em um espaço físico. Este 
“novo território” é muito mais abrangente conceitualmente e, ao mesmo tempo, mais 
detalhista, por apresentar uma maior variedade de propriedades. 
[...] pode-se falar em abordagem, enfoque ou perspectiva territorial 
quando se pretende referir a um modo de tratar fenômenos, processos, 
situações e contextos que ocorrem em um determinado espaço (que pode 
ser demarcado ou delimitado por atributos físicos, naturais, políticos ou 
outros) sobre o qual se produzem e se transformam (SCHNEIDER e 
TARTARUGA, 2005, p. 107). 
Eles demonstram a multiplicidade dimensional na análise territorial, em categorias 
diversas que se relacionam com o território: espaço, espacialidade, região, fronteiras, 
sociedade, local, lugar, paisagem, ambiente, Estado, política, governo, nação, população, 
migração, língua, religião, etnias, nodosidade, centralidade, marginalidade, regionalidade, 
regionalismo, redes, recursos, atores, trunfos, resistência, influência, autoridade, 
territorialidade, territorialização, desterritorialização, reterritorialização, espaço-tempo 
relacional, dentre outras. 
Para Santos (1988) o uso conceitual do território pelos diversos cientistas que 
lidam com o espaço: economistas, sociólogos, etnólogos, politicólogos, historiadores, 
demógrafos etc. retirou a exclusividade dos geógrafos e lhes criou uma ameaça. 
A visão territorial passou a ser, nos últimos anos, a referência para o planejamento 
e a atuação dos poderes público e privado, devido à sua característica interdisciplinar, 
conferindo-lhes maior abrangência e efetividade. Ela tem a capacidade de descrever 
melhor a realidade, extrapolando o mero particionamento espacial do mundo. 
O território deve ser gerido sob uma visão sistêmica. Monken e Barcellos (2005) se 
referem a Santos (1988) para demonstrar isso. 
Com a técnica – conceito-chave da obra de Santos –, o indivíduo em 
sociedade forma um conjunto de meios instrumentais e sociais com os 
quais realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço. Essa 
concepção de espaço leva em conta todos os objetos existentes numa 
extensão contínua, supondo a co-existência desses objetos como sistemas e 
não apenas como coleções: a utilidade atual dos objetos, passada ou 
futura,vem exatamente do seu uso combinado pelos grupos humanos que 
 
1 O termo “sociedade em rede” foi descrito por Castells (2005) definindo um novo paradigma de 
organização social em que as relações econômicas, sociais, de trabalho etc. são realizadas em uma rede 
global, alterando a nossa percepção de tempo e espaço. 
 
 
 16 
os criaram ou que os herdaram das gerações anteriores (MONKEN e 
BARCELLOS, 2005, p. 4). 
Assim como a visão sistêmica criou novos paradigmas descritivos nas ciências, em 
geral, a visão territorial criou um arcabouço conceitual para auxiliar nos planejamentos, 
nas pesquisas, e em tudo mais que trabalhe com a dimensão espacial, sem deixar de lado a 
dimensão temporal. É a evolução de um modelo mecanicista cartesiano que analisava 
regiões sob óticas restritas para uma visão holística, sistêmica, ambiental. 
Santos (2008) explica que a ação humana no território não é puramente racional e 
enfatiza a noção do território composto por aspectos abstratos e concretos, mas alertando 
que estes últimos não podem ser relegados. 
Apenas, o espaço é um misto, um híbrido, formado como já o dissemos, da 
união indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações. Os sistemas 
de objetos, o espaço-materialidade, formam as configurações territoriais, 
onde a ação dos sujeitos, ação racional ou não, vem instalar-se para criar 
um espaço. Este espaço – o espaço geográfico – é mais que o espaço social 
dos sociólogos porque também inclui a materialidade (SANTOS, 2008, p. 
199). 
Castells (2005, p. 512) explica que a sociedade contemporânea está organizada em 
espaços de fluxos e espaços de lugares. Para ele “um lugar é um local cuja forma, função e 
significado são independentes dentro das fronteiras da contiguidade física”. Porém, a 
função e o poder estão organizados em espaços de fluxo, e alteram a dinâmica e o 
significado dos lugares, isto é, onde as pessoas moram. 
Para Santos (1988) a evolução científica e tecnológica causou a especialização 
funcional das áreas e lugares, causando o aumento das cidades grandes e médias e a 
estagnação e desaparecimento das pequenas. A diversificação e o barateamento dos 
transportes criou um aumento do fluxo de pessoas e mercadorias entre cidades e regiões, 
aumentando a importância das trocas. 
Na pós-modernidade, o território torna-se mais mutante, flexível, as sensações de 
espaço e tempo não são mais as mesmas. Os territórios podem ser de tamanhos variados, 
sobrepostos, contíguos, simultâneos, concretos, psicológicos, virtuais etc. As fronteiras são 
menos definidas e o poder mais disperso. 
Território é espaço coletivo e, por isso mesmo, é tecido por relações, que visam 
resolver “o problema fundamental da repartição das coisas entre os seres humanos” 
(RAFFESTIN, 1993, p. 34). Essas relações podem ser unilaterais, bilaterais ou multilaterais, 
simétricas ou dissimétricas. Mas, essas classificações são teóricas, pois na maioria dos 
casos elas são multilaterais e dissimétricas. 
As relações são criadas pelos atores e por suas políticas, que são as estratégias que 
eles utilizam para atingir seus fins. Em todo processo relacional, devido à assimetria 
inerente a eles, existe um componente fundamental que é o poder (RAFFESTIN, 1993). 
O poder econômico, gradualmente, está se sobrepondo ao político, ao qual 
interessa “dividir para reinar”, criando disjunções e evitando a difusão, para conseguir 
manter o controle centralizado. Mas, o poder econômico quer um território isotrópico, 
sem obstáculos, que facilite a difusão e permita mudanças rápidas. Raffestin (1993) 
complementa que existem inúmeros poderes em escala inferiores e superiores ao Estado. 
Este autor confronta o conceito de zona com o de fronteira. Segundo ele fronteira está 
relacionada aos aspectos administrativos e políticos que, pela sua natureza, são mais 
estáticos e determinados; enquanto zona se relaciona com o econômico que é mais 
dinâmico, flexível e indefinido. 
 
 
 17 
Territórios encerram noções de poder, ordem, contexto geográfico, significância 
subjetiva do mundo. Possuem regras de conduta e convivência cultural e política em 
diferentes escalas, desde a dimensão mundial, até territórios indígenas, territórios 
sagrados, ou territórios domésticos proibidos. 
Para Becker (1983) o território é usado para fins políticos, expondo questões do 
terceiro mundo. Ela fala da multidimensionalidade geopolítica do poder, em poderes que 
estão em escala inferiores e superiores ao Estado, das organizações supranacionais 
(empresas multinacionais) confrontando o poder do Estado. 
Suertegaray (2001) explica que o território leva a relações de poder e que a 
multiplicidade de relações de poder no território – incluindo suas origens e 
intencionalidades – afetam qualquer ação de planejamento. “Observa-se que, 
historicamente, a concepção de território associa-se a ideia de natureza e sociedade 
configuradas por um limite de extensão do poder”. Mas, para ela, ocorre uma flexibilização 
do conceito de poder, não o restringindo à dominação-apropriação. 
Castro (1995) fala de duas escalas para a definição territorial: (1) Escala local – 
onde a informação é factual, há a valorização do vivido, uma tendência à heterogeneidade, 
com dados individuais desagregados, ligados a fenômenos manifestos. (2) Escala regional 
ou global – cuja informação é estruturante, há a valorização do organizado, uma tendência 
à homogeneização e os dados são agregados e ligados aos fenômenos latentes. 
Apesar da expansão da mundialização e das relações capitalistas de produção, a 
dimensão local é a base para o poder territorial – ideal para movimentos reivindicatórios 
e para política espacial do Estado. Assim, o local torna-se um espaço de tensão, de 
contestação e resistência do local contra o global, que quer impor a homogeneização dos 
costumes, usos, consumos etc. O local não é totalmente autônomo nem totalmente 
heterônomo, ou seja, tem sua autonomia sofrendo influência do globalismo, gerando 
situações híbridas e assimétricas. 
Nessa discussão, Sposito (2004) apresenta dois caminhos ou tendências para os 
territórios. A primeira seria a redução das distâncias, através das redes tecnológicas de 
informações, dificultando a manutenção de identidades territoriais, podendo chegar até o 
fim dos territórios ou à desterritorialização. O segundo caminho seria a volta ao indivíduo 
e sua escala cotidiana, ao conceito de lugar (visto anteriormente). 
Haesbaert (2005a, 2005b, 2006 e 2007) criou uma tipologia dos territórios, 
considerando diversos autores nacionais e internacionais, formando um quadro 
razoavelmente extenso para a compreensão dos territórios, sob os seguintes aspectos: 
Jurídico-política espaço controlado por um determinado poder, às vezes, o 
Estado. 
Simbólico-cultural produto da apropriação simbólica de uma coletividade. 
Econômica o território serve como fonte de recursos. 
Dinâmica relações sociais dinâmicas são projetadas no espaço 
estático criando territórios dinâmicos. 
Flexibilidade territorialidade flexível, cíclica, sazonal ou móvel. 
Territórios de baixa definição superposição de territórios levando à novas relações de 
poder ou a novos territórios. 
 
 
 18 
Continuidade territórios podem ser contínuos, descritos por suas 
superfícies ou descontínuos, chamados territórios-redes, 
descritos por pontos. 
Sistema territorial 
Raffestin (1993) descreve território 
através de um sistema territorial, uma 
forma mais ampla e mais abstrata que a 
definição tradicional cartográfica 
cartesiana oriunda da geografia. A visão 
geográfica homogeneíza a sociedade 
porque ignora os contextos sócio-histórico 
e espaço-temporal. A partir daí ele coloca o 
conceito de “territorialização do espaço” 
com o uso de um sistema que se baseia emnós (que representam os atores biossociais, ou seja, indivíduos ou grupos) e redes 
(ligações entre atores criando interações) gerando a tessitura de malhas. 
Os agentes são os nós (pontos) e suas relações (retas) são tecidas em redes (plano) 
que “organizadas hierarquicamente permitem assegurar o controle sobre aquilo que pode 
ser distribuído, alocado e/ou possuído”. 
As ações organizadas espacialmente são a “produção territorial” e interferem na 
tessitura, nó e rede. As relações de produção revelam as relações de poder, que aparece 
também na noção de limite territorial (e delimitação por consequência), que é a 
manifestação do poder em uma área precisa, exprime o domínio de uma porção de espaço 
por um grupo. Delimitar é isolar, tecer malhas, é “a forma mais elementar da produção de 
território”. 
Outro aspecto importante é a diferenciação de imagem e estrutura. As imagens 
(redes urbanas de uma cidade, por exemplo) exprimem uma estruturação do modelo 
urbano (distribuição populacional, por exemplo) orientado por objetivos e ações 
econômicas, políticas, sociais e culturais. Dessa forma, elas explicitam as relações de poder 
na hierarquia: Estado, organizações e indivíduos. Todos esses atores sintagmáticos 
produzem “territórios”. Podemos dizer que os atores sintagmáticos são aqueles que detêm 
poder sobre o território, de organizá-lo, por exemplo. 
A tessitura pode otimizar o uso do território pelo grupo (tessitura “desejada”) ou 
otimizar o controle do grupo no território (tessitura “suportada”). Resumindo a tessitura 
ou limites definem a área de exercício ou de capacidade dos poderes. “As tessituras se 
superpõem, se cortam e se recortam” dependendo da atividade (econômica, cultural etc.). 
Redes são imagens e instrumentos de poder porque podem assegurar a 
comunicação de alguns e impedir a comunicação de outros. Esse é o paradoxo do sistema 
territorial: “tessituras, nodosidades e redes criam vizinhanças, acessos, convergências, 
mas também disjunções, rupturas e distanciamentos”. 
Santos (2008) acredita que a mobilidade se tornou uma regra. Para ele a circulação 
é mais criadora que a produção. Os homens mudam de lugar, mas também produtos, 
mercadorias, imagens e ideias. Essa dinâmica leva ao estranhamento e desculturização e 
culmina na luta identitária e em processos de territorializações e reterritorializações. 
Claude Raffestin 
Geógrafo francês, Raffestin escreveu o livro 
Por uma Geografia do Poder em que discute 
a visão pós-moderna, diferente da geografia 
clássica que enxergava o território apenas 
pelo aspecto geopolítico. Analisa as diversas 
fontes de poder no território, que podem ser, 
por exemplo: a população, o próprio 
território, os recursos existentes no território, 
os símbolos, a comunicação e as relações. 
 
 
 
 
Territorialidade 
A territorialidade está ligada à dinâmica de apropriação do território e seus 
recursos, o que está diretamente ligado ao poder. Para Sack (1986)
uma estratégia geográfica poderosa
geográfico, utilizado pelos humanos para controlá
influenciar ou controlar recursos, pessoas, fenômenos e relações. 
uma autoridade define limites (fronteiras) par
e acessos. Na visão de Sack, 
social sobre o território, inter
as relações históricas entre a 
Para Soja (apud Raffestin
três elementos: senso de identidade espacial, senso de exclusividade, compartimentação 
da interação humana no espaço”
“Territorialidade pode ser definida como um conjunto de relações que se originam num 
sistema tridimensional sociedade
possível, compatível com os recursos do sistema”.
O termo “territorialização” é muito recente, segundo 
“derivado do verbo territorializar, que significa tornar territorial, situar em bases 
territoriais, ou ainda associar a um território ou distrito particular”. 
Para Raffestin (1993)
onde ocorre, por exemplo, o consumo de bens culturais, caso em que encontram
atores paradigmáticos; ou a 
realizados pelos atores sintagmáticos
(ação). Resumindo, o ator sintagmáti
seu poder, submetendo os atores paradigmáticos a se territorializem, dentro das regras e 
condições impostas pelo primeiro
Há vários conceitos relacionados ao território (capital, fronteira, malhas interiores 
hierarquizadas, redes de circulação, centro 
superior versus inferior), mas vamos nos ater no momento
outros fenômenos que ocorrem no território serão mais bem tratados na segunda unidade.
Região 
O conceito de região é mais difícil de determinar, tendo em vista que, para sua 
caracterização, existe a necessidade de certa homogeneidade
econômica, política, formação histórico
Para saber mais 
Do livro Por uma Geografia do Poder
Terceira Parte - Capítulo I 
http://www.univale.br/cursos/tipos/pos
graduacao_strictu_sensu/mestrado_em_gestao_integrada_do_territorio/_downloads/por_uma_geo
grafia_do_poder-claude_raffestin.pdf.
19 
territorialidade está ligada à dinâmica de apropriação do território e seus 
recursos, o que está diretamente ligado ao poder. Para Sack (1986), a territorialidade 
uma estratégia geográfica poderosa, de um indivíduo ou de um grupo, sobre 
geográfico, utilizado pelos humanos para controlá-lo, com a finalidade de afetar, 
influenciar ou controlar recursos, pessoas, fenômenos e relações. Um exemplo
uma autoridade define limites (fronteiras) para moldar, influenciar e controlar atividades 
de Sack, territorialidade está intimamente ligada ao conceito de poder 
social sobre o território, inter-relacionando o espaço e o tempo, ajudando a compreender 
as relações históricas entre a sociedade, o espaço e o tempo. 
Raffestin, 1993, p. 162) “a territorialidade [...] seria composta de 
três elementos: senso de identidade espacial, senso de exclusividade, compartimentação 
da interação humana no espaço”. Raffestin (1993, p. 160) complementa que 
“Territorialidade pode ser definida como um conjunto de relações que se originam num 
sistema tridimensional sociedade-espaço-tempo, em vias de atingir a maior autonomia 
possível, compatível com os recursos do sistema”. 
ialização” é muito recente, segundo Haesbaert (2006, p.21). É 
“derivado do verbo territorializar, que significa tornar territorial, situar em bases 
territoriais, ou ainda associar a um território ou distrito particular”. 
Para Raffestin (1993) pode ocorrer de duas formas: a territorialização passiva
onde ocorre, por exemplo, o consumo de bens culturais, caso em que encontram
; ou a territorialização ativa, deslocamento físico, conexão às redes, 
sintagmáticos que são aqueles que realizam algum programa 
ator sintagmático cria um território, a partir do espaço
submetendo os atores paradigmáticos a se territorializem, dentro das regras e 
pelo primeiro. 
Há vários conceitos relacionados ao território (capital, fronteira, malhas interiores 
hierarquizadas, redes de circulação, centro versus periferia, interior 
inferior), mas vamos nos ater no momento, ao que foi descrito.
outros fenômenos que ocorrem no território serão mais bem tratados na segunda unidade.
O conceito de região é mais difícil de determinar, tendo em vista que, para sua 
caracterização, existe a necessidade de certa homogeneidade sobre vários aspectos: social, 
econômica, política, formação histórico-econômica, comportamentos sociais, relevo etc. 
Por uma Geografia do Poder de Claude Raffestin 
Capítulo I – O que é território? 
http://www.univale.br/cursos/tipos/pos-
graduacao_strictu_sensu/mestrado_em_gestao_integrada_do_territorio/_downloads/por_uma_geo
claude_raffestin.pdf. 
 
territorialidade está ligada à dinâmica de apropriação do território e seus 
a territorialidade é 
sobre um espaço 
lo, com a finalidade de afetar, 
exemplo é quando 
a moldar, influenciar e controlar atividades 
ente ligada ao conceito de poder 
relacionando o espaço e o tempo, ajudando a compreender 
) “a territorialidade [...] seria compostade 
três elementos: senso de identidade espacial, senso de exclusividade, compartimentação 
complementa que 
“Territorialidade pode ser definida como um conjunto de relações que se originam num 
tempo, em vias de atingir a maior autonomia 
Haesbaert (2006, p.21). É 
“derivado do verbo territorializar, que significa tornar territorial, situar em bases 
territorialização passiva, 
onde ocorre, por exemplo, o consumo de bens culturais, caso em que encontram-se os 
, deslocamento físico, conexão às redes, 
que realizam algum programa 
cria um território, a partir do espaço e através de 
submetendo os atores paradigmáticos a se territorializem, dentro das regras e 
Há vários conceitos relacionados ao território (capital, fronteira, malhas interiores 
periferia, interior versus exterior, 
oi descrito. O poder e 
outros fenômenos que ocorrem no território serão mais bem tratados na segunda unidade. 
O conceito de região é mais difícil de determinar, tendo em vista que, para sua 
sobre vários aspectos: social, 
econômica, comportamentos sociais, relevo etc. 
graduacao_strictu_sensu/mestrado_em_gestao_integrada_do_territorio/_downloads/por_uma_geo
 
 
 20 
dentro de sua dimensão espacial ou territorial. Porém, não existe homogeneidade 
absoluta, mas um conjunto de fatores que devem ser semelhantes para que se possa 
definir como região. 
O conceito de região, na escola francesa de La Blache, é o de “uma área com 
propriedades homogêneas que a diferencia de áreas adjacentes”. O Estado, desde essa 
época, usou esse conceito de geografia regional, com sustentação acadêmica e política, 
para sua intervenção no espaço. O conceito de região ganhou força sobre o de território, 
mas perdeu prestígio a partir do seu uso pelos nazistas . 
A análise regional deve ressaltar as particularidades que diferenciam regiões, mas 
a ideia de homogeneidade não deve existir. A busca pela igualdade não deve ser para a 
homogeneização social, cultural etc., mas para a justiça social. 
As regiões político-administrativas (e seus limites) são mais bem definidas e 
duradouras, e quase nunca coincidem com as regiões econômicas, que são mais dinâmicas 
e se adaptam mais rapidamente às conjunturas (lembrando o conceito mais amplo de 
região). Ao poder do Estado convém dividir o território em regiões para controlá-lo 
melhor. Administrativamente, no Brasil, os governos usam os conceitos de microrregião, 
mesorregião e macrorregião. Mesmo dentre essas organizações, trabalhar sob a ótica do 
território tem se tornando mais interessante do que a lógica da região. 
Contrário ao poder político, há o poder econômico que busca a unificação e 
homogeneização do território, para ampliar suas possibilidades de ganho. “O objetivo da 
produção da subjetividade capitalista é reduzir tudo a uma tabula rasa. Mas isso nem 
sempre é possível, mesmo nos países capitalistas desenvolvidos” (GUATTARI e ROLNIK, 
1986, p.56 apud HAESBAERT, 2006, p.82). 
Apesar da evolução para o enfoque territorial, região ainda é uma divisão 
geográfica muito utilizada instrumentalmente por organizações, políticos e militares. 
Regiões são recortes feitos de acordo com o interesse de quem vai atuar nela. Uma 
empresa define a região por rota de atendimento, o governo para organizar a 
descentralização administrativa. 
Regionalidade e regionalismo 
Culturalmente a região é uma entidade simbólica que cria uma identidade regional 
e, com ela, a noção de pertencimento. O regionalismo também é um conceito ambíguo. 
Interessa-nos o aspecto ligado às instituições e práticas culturais que distinguem grupos 
regionais. Neste caso, aspectos culturais do regionalismo (língua, grupos de parentescos, 
afinidades religiosas, ritos de nascimento, morte e mudança de vida, hábitos de relações 
sociais ou relacionamentos com o ambiente) são importantes para as noções de: 
identidade, cultura e pertencimento. O regionalismo fomenta o enraizamento, uma ligação 
forte do indivíduo com o seu lugar, além de criar resistências a mudanças diante do novo. 
Exemplo desse sentimento de pertencimento regional é aquele comum aos nativos 
dos vales do Jequitinhonha e Mucuri, por exemplo. Isso pode ser visto em frases do tipo 
“sou do vale” (e nem é necessário identificar qual vale, como se fosse único existente no 
mundo) ou “eu saí do vale, mas o vale não saiu de mim” (normalmente utilizado pelo que 
emigraram). O emigrante tem sempre o sonho de voltar ao seu local, mantendo-o 
inalterado na sua memória. Por isso, ocorre o impacto, o estranhamento quando ele 
retorna e percebe que o seu local faz parte de um território e que ele mudou. 
 
 
 21 
Paisagem 
O conceito de paisagem pode ser artístico ou científico. No Romantismo do século XVIII 
surge a tendência de representar a natureza pura. Coincidência ou não, foi nos séculos 
XVIII e XIX que, segundo Pozzo e Vidal (2010), ocorre a origem do conceito científico de 
paisagem, a partir das grandes expedições científicas realizadas à América Latina. 
O conceito de paisagem, em seu sentido pictórico, antecede e acompanha o 
surgimento e a vida da ciência geográfica, e em um sentido mais amplo, ele 
se liga à própria cultura burguesa em formação. Por outro lado, ele não só 
é fruto de uma nova concepção filosófica do mundo ou de uma nova 
concepção de arte (o romantismo), mas deita raízes no próprio 
desenvolvimento de ciências cujos avanços proporcionaram novas 
possibilidades à imaginação, mudando também o olhar do homem sobre o 
seu mundo (POZZO e VIDAL, 2010, p. 114). 
Para os geógrafos clássicos a paisagem é a “expressão materializada das relações 
do homem com a natureza num espaço circunscrito”, limitada à possibilidade visual 
(SUERTEGARAY, 2001, p. 4). As paisagens são manifestações espaciais, constituídas por 
um conjunto de elementos criados pela natureza e pelo homem (RAFFESTIN, 1993, p.16). 
Como bem colocou Tricart, a palavra “paisagem” apareceu na Europa com 
várias traduções, como Landschaft em alemão, landscape em inglês, 
Paysage em francês etc. Todas tinham em comum o fato de não possuírem 
nenhuma utilização científica em particular, até o aparecimento da escola 
de Geografia alemã, em que o termo se tornou erudito (SANTOS, 2006, p. 
101-102). 
A paisagem está relacionada à necessidade humana de uso do sentido da visão, 
capacidade limitada de enxergar uma pequena extensão de território próxima. Mas, a 
paisagem não pode ser útil apenas pelos seus elementos visíveis, mas também por aquilo 
que nela se encerra, ou seja, na compreensão dos aspectos territoriais menos visíveis. 
O conceito faz parte do ramo da Geografia cultural, criada na escola norte-
americana, por transmitir a ideia de relação entre as formas físicas e culturais. Para eles, a 
paisagem é importante quando há o interesse humano de habitá-la, se apropriar dela e de 
transformar a natureza. (POZZO e VIDAL, 2010). 
Portanto, a importância da abordagem paisagística está no fato de nos 
remeter a uma percepção direta da realidade geográfica; para tal, 
devemos considerar desde suas formas, ou seja, sua aparência visível, até 
os aspectos invisíveis, tendo-se em mente a relação dialética entre todos os 
seus elementos. Relação esta que, por sua vez, pode ser apreendida na via 
da compreensão da formação de um determinado território que gera uma 
determinada paisagem (SOUZA e PASSOS, 2009, p.9). 
A paisagem é “transtemporal”, pois contém objetos passados e presentes, diferente 
do espaço que é sempre presente. A paisagem é relativamente imutável, enquanto o 
espaço se transforma. A paisagem se forma pela modificação das formas pela dinâmica 
social. Os geógrafos consideram a paisagem para além da forma, sob duas análises: a da 
forma (configuração) e a da funcionalidade (interação de geofatores incluindo a economia 
e a cultura humana). Os elementos naturais modificados criam uma naturezaartificializada, como manifestação das ações sociais, nas suas faces econômica e cultural. 
Essa análise considera que há paisagens exclusivamente naturais e também paisagens 
culturais (humanizadas) SUERTEGARAY (2001). 
 
 
 22 
Relacionado ao conceito de paisagem, surge o conceito de zona, que possui 
características geográficas similares (zonas climáticas, zona urbana, zona rural). Também, 
pode ser uma porção delimitada de terra onde há restrições políticas e administrativas 
(zona restringida a caça ou zona militar). Econômica e fiscalmente, também tem 
significado restritivo (zona franca, zona de processamento de exportações, zona industrial, 
zona turística). É importante salientar que seu conceito não pode se confundir com o do 
território. 
Atividade de aprendizagem 
Responda as questões abaixo considerando o seu lugar, onde você vive, inserido em uma 
região e em um ou mais territórios. 
 
1. Descreva os territórios que você consegue identificar na sua região. 
2. Dê exemplos de atores sintagmáticos e paradigmáticos. 
3. Explique o regionalismo de onde você vive através dos conceitos descritos pelo autor e 
dê exemplos culturais. 
4. Pode um espaço se transformar em lugar? E o contrário? Explique. 
 
 
 
 23 
UNIDADE 
 2 
 
O território e suas 
dimensões 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Objetivos de aprendizagem 
 
 Compreender as dimensões abstratas 
relacionadas ao território: identidade e 
cultura. 
 Conhecer as fontes de poder no território. 
 Elucidar os conceitos relacionados ao 
desenvolvimento territorial. 
 
 
 
 24 
UNIDADE 2 – O território e suas 
dimensões 
Dimensões territoriais 
Nesta unidade buscaremos refletir sobre o lado simbólico do território, que está 
relacionado ao tempo, à história, à cultura, ao poder etc. Essa visão é mais atual e expande 
a compreensão do território, rompendo as fronteiras epistemológicas, permeando as mais 
diversas áreas do conhecimento, lançando o território na base de vários estudos 
multidisciplinares. 
Abordagem territorial 
Abordagem, enfoque ou perspectiva territorial é uma forma de tratar fenômenos, 
processos, situações e contextos que ocorrem em territórios e que os transformam. 
Importante salientar que os levantamentos conceituais estudados na primeira unidade 
servem para esclarecer que território não deve ser confundido com espaço, lugar ou 
região. 
Essa abordagem tornou-se uma referência para a compreensão de processos, mas 
também uma forma de intervenção, seus objetivos são instrumentais e práticos. Estamos 
falando, então, das relações sociais nele existentes, de suas ações e das mudanças 
ocorridas nessas relações (SCHNEIDER e TARTARUGA, 2004). 
Os estudos de desenvolvimento territorial partem do cenário que pressupõe dois 
fatores. O primeiro é a crise do modelo fordista de produção, sendo reestruturado pelo 
modelo de acumulação flexível (denominação de Piore e Sabel, 1984), onde os processos 
produtivos são mais difusos, baseados na descentralização de plantas, maior flexibilização 
e sistemas produtivos locais (SPL’s ou clusters). 
O segundo fator está relacionado aos aspectos políticos e institucionais que 
derivam, basicamente, da crise do Estado e da perda crescente de seu poder de regulação. 
O território se tornou “uma variável crucial para explicar as dinâmicas econômicas 
relativas a diferentes espaços”, “o lugar de reencontro entre as formas de mercado e as 
formas de regulação social” (COULERT & PECQUEUR, 1994 apud SCHNEIDER e 
TARTARUGA, 2004, p. 108). 
O território, além de ser o suporte espacial, torna-se um elemento de organização 
produtiva, influindo nas estratégias dos atores. Torna-se, por si só, um sistema produtivo 
local, onde ocorrem reciprocidade, cooperação, concorrência, disputa etc. Nele se 
apresentam as dimensões econômica, material, cultural e cognitiva. 
 
 
 
 25 
Cultura e território 
O conceito de cultura surgiu na Europa do século XVIII, relacionado ao termo 
civilização. Os alemães diferenciaram o significado, colocando o termo como referência ao 
espírito, às tradições locais, ao território. 
O antropólogo Y. Taylor, no livro Cultura Primitiva, definiu cultura como “todo o 
complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra 
capacidade ou hábito adquiridos pelo homem na condição de membro de uma sociedade” 
(PERICO, 2009, p.58). Essa definição retirava da biologia (herança genética) a 
responsabilidade da aquisição cultural, transferindo-a para o aprendizado social. 
Posteriormente, outro antropólogo, Franz Buenas, evoluiu o conceito, incluindo 
nele a particularidade o particularismo histórico, que considerava as particularidades das 
cidades e regiões na formação da cultura. Essa ideia foi a base para o relativismo cultural. 
A antropologia americana, entre os anos de 1920 e 1950 criou 157 definições de 
cultura. Por isso, R. Keesing se preocupou em classificar essa definições e encontrou dois 
grupos distintos. O primeiro grupo, baseado na linha neo-evolucionista, considera culturas 
como sistemas adaptativos, com padrões de comportamento transmitidos socialmente 
(organização econômica e política, crenças, práticas religiosas etc.), mas ainda ligado a 
embasamentos biológicos, por estarem em uma linha. 
As teorias idealistas de cultura se dividem em três linhas, dos cientistas: Ward 
Goodenough, Claude Levi-Strauss e Clifford Geertz. Goodenough dizia que a cultura era 
algo mental, relacionada aos conhecimentos e crenças que uma pessoa precisa ter para ter 
um comportamento adequado em uma sociedade. Levi-Strauss era um antropólogo 
naturalista que estudou os povos indígenas brasileiros. Para ele as sociedades substituem 
a natureza pela cultura, construindo regras para seu bom funcionamento. A cultura, para 
ele, é um sistema simbólico estruturada na mente humana com mitos, arte, parentesco e 
linguagem. Geertz definiu que mecanismos de controle (planos, prescrições, regras, 
instruções) formam um “programa cultural” que controla nosso comportamento e o 
homem é o animal mais dependente desses mecanismos. Todas as pessoas nascem aptas a 
receber esse programa, que vai continuar existindo na sociedade após a sua morte. 
Porém, a Antropologia não foi a única ciência a trabalhar o conceito. Da Sociologia 
vem o conceito de que cultura é tudo aquilo que resulta da criação humana: ideias, 
artefatos, costumes, leis, crenças morais, conhecimentos adquiridos através do convívio 
social. Não há graus ou qualificações de cultura (melhor, superior etc.), apenas diferentes. 
A cultura tem as funções de satisfazer as necessidades humanas, criando limitações 
normativas para essas necessidades e violando, de certa forma, a condição natural do 
homem. A busca da beleza física ideal, de símbolos de poder e prestígio são exemplos, mas 
esses símbolos podem diferir muito de uma sociedade para outra. 
Derivados, surgem os conceitos de cultura de massa e indústria cultural. O 
primeiro é definido como padrões compartilhados pela maioria dos indivíduos, 
independente de renda, instrução, ocupação etc. e é estimulada por essa indústria, típica 
de sociedades capitalistas, que “fabricam” modas, gostos e outros aspectos superficiais de 
lazer, arte e vestuário. Nesse caso, existe um caráter de submissão a padrões culturais 
hegemônicos, impostos pelo poder econômico industrial e financeiro, até mesmo das 
outras culturas (popular, erudita, nacional e clássica). Não devemos confundir cultura 
popular com cultura de massa, pois essa última nivela todos os indivíduos como 
consumistas. 
 
 
 26 
Mais recentemente, tem-se discutido, na antropologia, que os animais possam 
apresentar traços culturais, linguagem e capacidade de aprender e usar signos em 
processos de comunicação. Darwin já havia notado uma ética nos instintossociais, afetos 
entre pais e filhos e até um senso de moral. 
Podemos concluir que a cultura modela o comportamento dos indivíduos dentro 
de uma sociedade, no nosso caso as sociedades que compõem os diversos territórios que 
coexistem dentro dos diversos espaços. Então, as culturas territoriais coexistem, pois 
existem vários territórios ou ambientes, localizados em espaços próximos, contíguos ou 
sobrepostos (família, escola, trabalho etc.). 
Interessa-nos a cultura localizada em um determinado território, definida pela 
história e tradição dos componentes desse espaço geográfico, que construíram valores, 
costumes, visões compartilhadas, crenças, símbolos regras para os que vivem nesse 
território. Essa cultura localizada gera grupos culturais, tornando-se mais um dos 
elementos que definem, diferenciam e particularizam os territórios. 
É possível compreender a angústia gerada por essa fragmentação, que se deve aos 
processos sociais que acontecem dentro dos territórios. Angústia maior e mais recente 
vem da tentativa de homogeneização cultural do mundo, causada pela globalização, que 
tenta impor a cultura ocidental capitalista em todos os territórios do planeta. 
Ianni (1998) explica que antes mercados eram invadidos por mercadorias, mas 
agora culturas inteiras são invadidas por informações, entretenimentos e ideias. A 
instantaneidade dissolve fronteiras, desenraiza coisas, gentes e ideias, formando 
linguagens globais, pasteurizando a produção, as mercadorias, mas também os públicos, 
pela homogeneização de padrões, estilos, linguagens, modas ou ondas. 
Identidade e território 
Identidade possui uma grande diversidade conceitual, pois é descrita de forma 
distinta em algumas ciências: Psicologia, Antropologia, Filosofia e Sociologia. Vamos nos 
limitando apenas àquelas características que influem no território. 
Na concepção sociológica de Maraschi (2006) identidade é produto da socialização 
e garantida pela individualização, sendo construída na articulação entre o individual e o 
social. Identidade está relacionada aos aspectos subjetivos dos indivíduos, o 
reconhecimento de um “eu”, de uma autoconsciência ou autoimagem, de um sentimento 
de unicidade e durabilidade. A identidade é composta por aspectos pessoais e sociais, 
construída na articulação entre o indivíduo e o grupo sendo, então, moldada pela cultura. 
Ela possui uma dupla visão, intrínseca, de semelhança e diferença com relação ao 
outro, ao grupo social. Esse duplo olhar é necessário, pois não há como identificar o 
semelhante sem reconhecer o diferente. Então, a identidade é coletiva, com um sentido de 
pertencimento a um grupo com o qual se tem atributos semelhantes e ao mesmo tempo de 
alteridade, de estranhamento, de contraste com o diferente. Ela é a ligação entre o “eu” e o 
“outro”, por identificação criando o “nós”, e pela diferença definindo o “eles”. 
A identidade traz consigo a noção de pertencimento ou pertença, fundamental à 
saúde mental dos indivíduos. 
Costa (2002) define identidade cultural como uma experiência social que impregna 
os indivíduos na busca de construir traços culturais comuns entre si. Neste caso o 
processo é mais importante que o resultado. A identidade cultural possui uma forte base 
territorial. 
 
 
 27 
Visão semelhante é a de Santos para quem as identidades culturais combinam o 
próprio e o alheio, o individual e o coletivo, a tradição e a modernidade. Mas, elas não são 
rígidas – nem as identidades mais sólidas como as de gênero, nacionalidade ou 
continentalidade –, são mutáveis, transitórias, num processo de negociação de sentidos, 
são identificações em curso (SANTOS, 1994). 
Campos (2003) explica que a identidade cultural de uma cidade é seu maior 
patrimônio, e faz questionamentos sobre sua dinâmica. Ela seria naturalmente constituída 
pelas etnias que compuseram a formação do território, historicamente? Ela poderia ser 
artificialmente criada pelos diversos organizadores políticos do município? Ou ainda, ela 
sofreria grande influência dos emigrantes que estão no exterior? Para ele, “isto é 
importante ser considerado, especialmente no momento contemporâneo em que cada vez 
mais o que se faz presente são signos de identificação e não sistemas de identidades 
herméticos” (CAMPOS, 2003, p. 64). 
Relacionando com o território, temos que as identidades individuais e coletivas 
podem ser desterritorializadas e reterritorializadas. Por isso, os territórios resistem, 
tentam manter suas tradições, que se originaram de um processo histórico, que pode ser 
recente ou mais antigo, desde a sua formação. 
A identidade territorial é fator fundamental, para não dizer existencial para muitos 
indivíduos. 
Para os “hegemonizados” o território adquire muitas vezes tamanha força 
que combina com intensidades iguais funcionalidade (“recurso”) e 
identidade (“símbolo”). Assim, para eles, literalmente, retomando 
Bonnemaison e Cambrèzy (1996), “perder seu território é desaparecer”. O 
território, neste caso, “não diz respeito apenas à função ou ao ter, mas ao 
ser”. É interessante como estas dimensões aparecem geminadas, sem 
nenhuma lógica a priori para indicar a preponderância de uma sobre a 
outra: muitas vezes, por exemplo, é entre aqueles que estão mais 
destituídos de seus recursos materiais que aparecem formas as mais 
radicais de apego às identidades territoriais (HAESBAERT, 2005, p.6777). 
Diante do exposto, percebe-se que o território é um dos pontos de referência 
cultural e identitário das pessoas, local ao qual pertencem, onde as ações acontecem e, 
devido a elas, são modificados para novas configurações. Esta dinâmica cria a uma 
inserção temporal e social na concepção puramente espacial. As redes sociais são tecidas 
dentro e para fora dos territórios, permitindo os fluxos internos e entre eles, criando a 
mobilidade humana, dentre outras. Como espaços de lugares os territórios enraízam as 
pessoas, como espaços de fluxo eles fomentam a mobilidade. Os dois efeitos são 
importantes para a compreensão de vários fenômenos sociais no território. 
O migrante é um sujeito com características especiais diante do território. Os 
conceitos de espaços de lugares e de espaços de fluxos explicam a migração e também a 
necessidade do retorno que vários migrantes carregam em si. Eles saem de um território 
em que tem uma identidade e vão para outro, onde criam (ou pelo menos tentam criar) 
outra identidade, adequando-se à cultura desse novo território. Muitos não criam 
identidade e vivem o sonho de voltar ao território original. 
Mas, as relações de poder nos territórios são dissimétricas, o que cria uma série de 
dificuldades a serem enfrentadas pelos migrantes, por exemplo. 
Por outro lado, Oakes (1997) defende que a na região e no território o senso de 
identidade é abstrato para os indivíduos, mas que no lugar, onde sua ação é imediata, onde 
 
 
 
há vivência, convivência, cotidiano, 
identidades significativas. 
 
 
Poder no territóri
Raffestin trata o poder como uma categoria fundamental no território. “O poder 
não é uma categoria espacial nem uma 
‘produção’ que se apoia no espaço e no tempo” (RAFFESTIN, 1993, p.6).
geografia política clássica de Ratzel é uma geografia do Estado, onde esse figura como 
fonte única de poder ou com poder 
O termo poder é ambíguo. Com “P” maiúsculo significa o poder e soberania do 
Estado e sujeição de seus cidadãos, na forma de dominação legal. Como nome comum está 
infiltrado em todas as relações sociais. O “Poder” é mais fáci
grande aparato necessário ao controle do território e de sua população e recursos. O 
“poder” pode estar oculto, mas está em todo lugar, gerando hierarquia, relações de força, 
desigualdade, dentro de um campo de poder.
Baseado em Michel Foucault, Raffestin
poder, que são bem elucidativas:
1. 
2. 
3. 
4. 
5. 
O Estado hierarquiza o poder

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