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Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares Hélio Pereira Lopes José Freitas Siqueira Jr. Carlos Nelson Elias Capítulo 13 531 O preparo químico-mecânico tem como objetivo promover a limpeza, a ampliação e a modelagem do ca- nal radicular. A ampliação e a modelagem do canal radi- cular são obtidas exclusivamente pelo desgaste de suas paredes dentinárias por meio da ação mecânica dos ins- trumentos endodônticos. A ampliação e a modelagem obedecem a uma forma cônica cujo maior diâmetro está voltado para cervical e o menor para apical. A limpeza é lograda pela somatória de diferentes eventos: pela ação mecânica dos instrumentos endodônticos junto às pare- des internas do canal radicular; pela ação das substân- cias químicas auxiliares sobre os componentes (tecidos orgânicos, inorgânicos e micro-organismos) presentes no interior do sistema de canais radiculares e completa- da pela irrigação-aspiração que, às expensas da energia cinética do jato, da turbulência criada e do refluxo da corrente líquida (solução irrigadora), arrasta para fora do canal radicular os resíduos oriundos desses eventos. Do exposto, as substâncias químicas podem ser empregadas no preparo dos canais radiculares como au- xiliares da instrumentação e como soluções irrigadoras. A escolha da substância química para uma dessas fun- ções depende de suas propriedades físicas e químicas. SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS AUXILIARES DA INSTRUMENTAÇÃO As substâncias químicas auxiliares são emprega- das no interior do canal radicular com os objetivos de promover a dissolução de tecidos orgânicos vivos ou necrosados, a eliminação ou máxima redução possível de micro-organismos, a lubrificação, a quelação de íons cálcio e a suspensão de detritos oriundos da instrumen- tação. Devem apresentar propriedades físicas e quími- cas que as qualifiquem para esses objetivos. São usadas durante a instrumentação dos canais radiculares, de- sempenhando ações químicas e físicas, concomitante- mente, com a ação mecânica dos instrumentos endo- dônticos. Também são usadas após a instrumentação para remover das paredes do canal radicular a smear layer. Podem ser empregadas em forma de solução lí- quida, de creme ou de gel. Geralmente, são utilizadas em forma de soluções líquidas. Uma solução é formada pela adição de um ou mais solutos ao solvente. Em uma solução o soluto é o disperso, e o solvente, o dispersante. O estado físico do solvente é que determina o estado físico da solução. Em Endodontia se empregam soluções líquidas, onde o solvente é sempre um líquido, e o soluto, um sólido, um líquido ou um gás. Requisitos Tensão superficial Em um líquido, as forças de atração entre as molé- culas da superfície são maiores que as do interior. Isso ocorre porque, no interior do líquido, as moléculas es- tão cercadas por outras e, na superfície, há uma região 532 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares de contato com o meio exterior. A superfície do líquido se comporta como uma película elástica, que tende a minimizar sua área superficial. A essa película se atri- buem as forças de tensão superficial. A tensão superficial é uma propriedade carac- terística de cada líquido, variando com a temperatu- ra e com o tipo de superfície contatada. Por exemplo, a água a 20ºC possui tensão superficial igual a 72,75 dinas/cm, em contato com o ar, e 21 dinas/cm, em contato com óleo de oliva12. Para Santos130, a solução de hipoclorito de sódio a 2,5%, a 24ºC, possui tensão superficial de 76 dinas/cm e a 37ºC de 70,3 dinas/cm. No Quadro 13-1 apresentamos os valores da tensão su- perficial de algumas substâncias químicas empregadas na Endodontia58,94,97,116,164. Existem substâncias que, em solução, são capazes de reduzir a tensão superficial de outras. São os agen- tes tensoativos, entre os quais se incluem os detergen- tes e o hipoclorito de sódio. Os sólidos exercem força de atração sobre as mo- léculas dos líquidos. Quando essa força é maior do que a tensão superficial do líquido, ocorre o molhamento ou umectação daqueles pelo líquido, o que não ocorre quando a força de atração é menor. Essa interação tam- Quadro 13-1 Tensão superficial de substâncias químicas endodônticas (dinas/cm) SOLUÇÕES Naumovich (1963) Milano et al. (1983) Guimarães et al. (1988) Pécora et al. (1991) Tasman et al. (2000) Método de Ring Método de Ring Método Capilaridade Método Capilaridade Método de Ring Água destilada 72,8 71,9 72,72 72,73 70 Água de cal 14g/L ------- 58,9 ------- 66,82 ------- Água oxigenada 10% 65,1 63,7 ------- 70,42 63 Irrigocal ------- ------- ------- 37,52 ------- EDTA 17% 54,0 ------- 69,25 ------- 46 EDTA + Tergentol ------- ------- 31,09 ------- ------- EDTA + Cetavlon 39,7 ------- 33,92 ------- ------- Ácido cítrico 10% ------- ------- ------- 68,34 ------- Tergentol ------- 33,7 33,41 ------- ------- Cetavlon ------- ------- 33,62 ------- ------- Soro fisiológico 68,9 54,0 ------- ------- 66 Álcool etílico 70% 27,5 ------- ------- ------- ------- Álcool etílico 96% 24,1 23,0 23,06 23,51 ------- Solução de Dakin ------- 62,9 31,34 71,34 ------- Solução de Milton ------- 63,5 ------- ------- ------- Solução de NaOCl 2,5% ------- ------- ------- ------- 41 Solução de NaOCl 5% ------- 49,7 ------- ------- 43 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 533 bém explica a capilaridade, que é o poder de o líquido se elevar em tubos capilares ou entre duas superfícies próximas entre si. A capilaridade, que é inversamente proporcional à tensão superficial, traduz o comporta- mento do líquido em anfractuosidades, reentrâncias ou ramificações comuns na cavidade pulpar12,68,94. Estudos in vitro e in vivo mostram que a tensão superficial das soluções químicas auxiliares determina a profundidade de penetração do líquido no canal ra- dicular. Portanto, quanto menor a tensão superficial de uma substância, maior será sua capacidade de umecta- ção e penetração, aumentando a efetividade da limpe- za das paredes do canal radicular58,94. Viscosidade Viscosidade é a resistência ao movimento relativo das moléculas de um fluido em escoamento, devido às forças de coesão intermolecular. Ao se tentar deslocar uma camada de líquido sobre outra, é necessário ven- cer a força de atração entre as moléculas. Essa força é dada pela expressão: F = η Δv S Δl onde Δv/Δl é a relação entre as velocidades das duas ca- madas, S é a distância entre elas, que é a área de contato entre as camadas, e η é a viscosidade. O inverso desta propriedade é chamado fluidez e, quanto maior a visco- sidade, mais difícil o escoamento. Assim como a tensão superficial, a viscosidade diminui com o aumento da temperatura, como mostrado no Quadro 13-212,107. Devemos considerar que uma solução química muito viscosa escoa com dificuldade nas cânulas finas e mais longas, permitindo a formação de um jato líquido com menor alcance e refluxo. O aumento da viscosidade reduz a capacidade de penetração da solução química em anfractuosidades e reentrâncias do canal radicular. A tensão superficial e a viscosidade das soluções químicas influenciam na efetividade de suas ações físi- cas e químicas, não apenas quando empregadas como auxiliares da instrumentação, mas também quando usadas na irrigação-aspiração dos canais radiculares. Atividade de solvente de tecido A capacidade de dissolução de matéria orgânica é uma propriedade necessária na escolha da substância química auxiliar da instrumentação, sendo de particu- lar importância no preparo químico-mecânico do canal radicular, visando à remoção de tecido pulpar vivo ou necrosado. Devido à complexidade da morfologiain- terna dos canais radiculares, que formam verdadeiro sistema de canais mecanicamente inacessíveis, há ne- cessidade de se explorar a capacidade de dissolução te- cidual da solução química auxiliar da instrumentação. Todo tecido pulpar, mesmo vivo e não infectado, deve ser eliminado no momento do tratamento endodônti- co, para não servir de substrato potencial a uma proli- feração microbiana30,54 (Fig. 13-1A e B). A capacidade de dissolução de uma solução quí- mica auxiliar depende de vários fatores, tais como: re- lação entre o volume de solução e a massa de tecido or- gânico, área de contato com os tecidos, tempo de ação, temperatura da solução, agitação mecânica, concentra- ção da solução e frequência da renovação da solução no interior do canal radicular. Atividade antimicrobiana Micro-organismos e seus produtos são os prin- cipais responsáveis pela iniciação e perpetuação das Quadro 13-2 Variação da viscosidade (η) da água com a temperatura (em centipoise) T (ºC) 0ºC 20ºC 40ºC 60ºC 80ºC η 1,79 1,00 0,47 0,35 0,28 A B Figura 13-1. Complexidade da morfologia interna dos canais radi- culares. A. Seção longitudinal e diafanização. (Gentileza dos Profs. E. Mattos e A. Roldi). B. Seção transversal. 534 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares patologias pulpoperirradiculares75. A infecção do ca- nal radicular é usualmente mista e semiespecífica, com predomínio de bactérias anaeróbias estritas, as quais correspondem a mais de 90% dos isolados161. Assim, no tratamento endodôntico, a limpeza e a desinfecção dos sistemas de canais radiculares são importantes, sendo logradas pela ação mecânica dos instrumentos, pela ação antimicrobiana das soluções químicas auxiliares da instrumentação e pelo fluxo e refluxo da solução ir- rigadora. Vários estudos demonstraram que o emprego de substâncias químicas dotadas de atividade antimicrobia- na, durante o preparo dos canais radiculares, exerce um efeito significativo na eliminação de bactérias19,72,150,152. Assim, enquanto uma solução desprovida de ação an- timicrobiana (por exemplo, água destilada, soro fisioló- gico) exerceria apenas um efeito de lubrificação e a sus- pensão de detritos oriundos do preparo do canal radi- cular, a solução que reconhecidamente possui atividade antimicrobiana teria um efeito adicional, representado pela eliminação ou máxima redução de micro-organis- mos não removidos mecanicamente. Atividade quelante Os quelantes usados em Endodontia são substân- cias orgânicas que removem íons cálcio da dentina, fi- xando-os quimicamente. O mecanismo de desminera- lização da dentina ocorre por quelação, definida como a incorporação de um íon metálico em uma cadeia fe- chada heterocíclica, na qual o metal é ligado por dois ou mais íons, dentro do complexo molecular chamado ligante. Certos átomos ligantes fornecem elétrons ao átomo metálico e consequentemente partilham pares de elétrons com o íon metálico. A quelação correspon- de à ação dessas substâncias sobre os íons metálicos, e o composto dessa adição denominamos quelato68,106,107. A atividade do quelante depende de sua solu- bilidade e capacidade de dissociação iônica, necessi- tando água para que se possa dissociar. Sabemos que, devido à forte polarização existente nas moléculas da água, elas agem sobre a substância iônica, de forma a promover o afastamento de seus íons. Assim, podemos depreender que há maior eficiência nos agentes que- lantes quando esses se apresentam na forma de solução aquosa do que quando na forma de cremes23. Durante a instrumentação de canais atresiados recomenda-se o uso de quelantes para facilitar o tra- balho de alargamento do canal. O efeito descalcificante do agente quelante resulta em menor resistência den- tinária à ação de corte dos instrumentos endodônticos durante a instrumentação dos canais atresiados. Todavia, é preciso ressaltar que as dimensões dos canais radiculares são exíguas e o volume de solução quelante empregado é pequeno. Além do mais, há di- ficuldade física para essas soluções preencherem os ca- nais radiculares em sua plenitude. Em decorrência, é lícito supor que a eficiência das soluções quelantes na quelação de dentina durante instrumentação de canais atresiados é questionável, sob o ponto de vista clínico. Possivelmente, os resultados favoráveis obtidos estão relacionados com a ação lubrificante e não com a ação quelante da solução química. Segundo Walton e Rivera178, os agentes quelantes não revelam resultados satisfatórios quanto à ação de descalcificação, principalmente em canais atresiados. Tal fato se deve à pequena velocidade da reação quími- ca, provavelmente menos eficiente que a ação cortante dos instrumentos endodônticos. Não existe evidência de que os agentes quelantes empregados durante a ins- trumentação de canais atresiados reduzam a dureza da dentina ou removam, de modo suficiente, as obstruções do canal para permitir a passagem do instrumento. Após a instrumentação dos canais radiculares recomenda-se o uso de quelantes para a remoção da smear layer presente nas paredes dentinárias do canal. Todavia, não há por parte dos pesquisadores consenso quanto à necessidade da remoção da smear layer após o preparo dos canais radiculares. Atividade lubrificante Os instrumentos endodônticos, assim como as paredes dentinárias, apresentam rugosidades diferen- tes quando observados ao nível microscópio. Assim, durante a instrumentação do canal há contato físico apenas dos picos das rugosidades superficiais do ins- trumento com as rugosidades das paredes dentinárias, surgindo forças que se opõem ao deslocamento do instrumento. A resistência a esse deslocamento é de- nominada atrito. Estando o instrumento imóvel no in- terior do canal radicular, à medida que a força motriz aumenta, a força de atrito estática cresce para impedir seu deslocamento. Ocorrendo o movimento, a força de atrito estática deixa de existir, passando a atuar a de atrito dinâmica ou cinética, oposta ao sentido de deslo- camento do instrumento e de valor inferior ao da força de atrito estática. As forças de atrito estática ou dinâ- mica que se opõem ao movimento do instrumento es- tão relacionadas com a força que o instrumento exerce contra as paredes do canal pela equação: Fa = μFp Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 535 onde: Fa é a força de atrito estática ou dinâmica; μ é o coeficiente de atrito dinâmico para o instrumento em movimento; Fp é a força de pressão. A força de atrito não depende da área de contato entre as superfícies, mas da rugosidade e natureza das superfícies de contato (secas ou umedecidas). Para um mesmo par de superfícies, as forças de atrito dinâmicas são menores do que as estáticas, decrescem com o au- mento da velocidade e quando há lubrificação. As soluções químicas empregadas no preparo químico-mecânico dos canais radiculares, por meio de seu poder de umectação, conservam as paredes denti- nárias hidratadas e atuam também como lubrificantes, reduzindo a força de atrito e formando uma película que diminui o contato físico entre as superfícies do ins- trumento e da dentina. Em consequência, diminuem o desgaste e preservam a capacidade de corte dos ins- trumentos, durante o preparo dos canais radiculares. Em canais atresiados, favorecem a passagem dos ins- trumentos até alcançar o comprimento de trabalho. Suspensão dos detritos As substâncias auxiliares têm como função manter os detritos orgânicos e inorgânicos, liberados durante a instrumentação do canal radicular, em suspensão com o objetivo de impedir a sua sedimentação mormente na região apical. Detritos podem ser acumulados e obstruir o canal, favorecendo desvios e perfurações radiculares ou, em razão da ação de êmbolo dosins- trumentos, ser forçados a se difundir para os tecidos perirradiculares, onde atuariam como agente irritan- te. A maioria das substâncias químicas utilizadas em Endodontia apresenta fluidez satisfatória. Entretanto, a ação mecânica dos instrumentos endodônticos, du- rante a instrumentação do canal radicular, leva à sus- pensão de partículas no seio da substância química auxiliar, reduzindo sua fluidez. Antes de a substância atingir uma viscosidade crítica devemos renová-la por meio da irrigação-aspiração, o que favorece a remoção dos detritos mantidos em suspensão no interior do ca- nal radicular. A seguir, repete-se o preenchimento da cavidade pulpar com a substância química auxiliar da instrumentação. Essa renovação deve ser realizada não somente a cada troca de instrumento, mas após um pe- queno número de movimentos (10 a 15) imprimidos a ele, durante o preparo do canal radicular. Nos canais atresiados, principalmente, é um erro grave realizar a renovação da solução química auxiliar somente após o instrumento ganhar liberdade em seu interior. A sa- turação da quantidade de líquido existente no interior do canal, por meio de resíduos oriundos da instrumen- tação, em vez de favorecer dificulta o movimento do instrumento endodôntico. Além do mais, favorece a extrusão do material além do forame, o qual pode pro- vocar reações inflamatórias ou mesmo uma resposta imunológica do organismo139. É importante salientar que o volume de líquido que um canal pode conter é muito pequeno. Segundo Campos23, após a instrumentação dos canais radicula- res, o volume médio, para o maxilar superior, era de 10,3mm3 e, para a mandíbula, de 11,1mm3. Assim, es- ses pequenos volumes de solução existentes no interior dos canais têm suas propriedades esgotadas rapida- mente. Para minimizar esse problema devemos: a) manter a cavidade de acesso preenchida com solu- ção química auxiliar, já que a movimentação e reti- rada do instrumento endodôntico no interior do ca- nal favorecem a penetração e renovação do líquido; b) realizar renovações frequentes da solução química auxiliar. A capacidade da cavidade de acesso dos dentes funciona como reservatório. Infelizmente, esse é um fa- tor subestimado durante o preparo químico-mecânico dos canais radiculares, porque a solução aí presente é geralmente aspirada durante a renovação da solução química auxiliar. No Quadro 13-3 apresentamos os va- lores médios dos volumes ocupados pelas polpas den- tárias nos diferentes grupos de dentes humanos44. Outro fator importante que deve ser conside- rado é que certas substâncias, como o hipoclorito Quadro 13-3 Médias dos volumes ocupados pelas polpas dentárias (mm3) Dente Superior (mm3) Inferior (mm3) Incisivo central 12,4 6,3 Incisivo lateral 11,4 7,1 Canino 14,7 14,2 Primeiro pré-molar 18,2 14,9 Segundo pré-molar 16,2 14,9 Primeiro molar 68,2 52,5 Segundo molar 44,3 32,9 Terceiro molar 22,6 31,1 536 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares de sódio, são inativadas ao entrar em contato com a matéria orgânica. Assim, para que sua ação solven- te e antimicrobiana seja efetiva é necessário renovar sempre a solução que entra em contato com as pare- des do canal, o que é imperioso para que o hipoclo- rito de sódio mantenha seus efeitos antimicrobianos e solventes de matéria orgânica durante o preparo químico-mecânico. SOLUÇÕES IRRIGANTES São soluções químicas usadas na irrigação-aspira- ção dos canais radiculares. Sendo a irrigação-aspiração um procedimento de curta duração, é de esperar que a sua eficiência dependa mais das propriedades físi- cas do que das propriedades químicas das soluções empregadas. As soluções irrigadoras devem possuir pequeno coeficiente de viscosidade e pequena tensão superficial. Esses requisitos favorecem o aumento do alcance do jato, a formação da turbulência e o reflu- xo do líquido em direção coronária, permitindo uma maior efetividade da limpeza do canal radicular. BIOCOMPATIBILIDADE Toda substância desinfetante apresenta toxicida- de para as células vivas. Isso ocorre porque essas subs- tâncias, ao contrário da maioria dos antibióticos, não apresentam seletividade para micro-organismos. Por- tanto, torna-se uma utopia querer conciliar forte ação antimicrobiana ou solvente de tecido e compatibilida- de biológica61,63. Para Harrison63, os ensaios laboratoriais são exce- lentes na determinação do potencial relativo da toxi- cidade dos agentes químicos. Todavia, a extrapolação de tais testes para a situação clínica pode ser enganosa, pois o procedimento de uso clínico não é levado em consideração. O modo clínico no qual o agente químico é usado afeta diretamente seu potencial de toxicidade. Os efeitos lesivos causados por uma substância desinfetante sobre os tecidos dependem de sua própria toxicidade, de sua concentração, do tempo e da área de contato com os tecidos. Provavelmente, pelo curto período de tempo que permanece em contato com uma área reduzida dos tecidos perirradiculares durante os procedimentos de preparo químico-mecânico, o efeito irritante de uma substância química auxiliar da instru- mentação ou de uma solução irrigadora pode ser mini- mizado. É isso o que acontece com o hipoclorito de só- dio a 5,25%149. Embora in vitro ele apresente pronuncia- da citotoxidade112, in vivo esse efeito não é observado60, desde que a solução não seja extravasada pelo forame apical127. Além disso, uma vez controlada a infecção endodôntica por um preparo químico-mecânico ade- quado e por uma ulterior medicação intracanal, o efei- to irritante transitório causado pela substância química coadjuvante da instrumentação ou de uma solução irri- gadora torna-se irrelevante, não interferindo no reparo dos tecidos perirradiculares. Em outras palavras, na ausência de infecção e de uma agressão química per- sistente, o reparo tecidual ocorrerá naturalmente. O tratamento endodôntico radical não visa à ma- nutenção ou à cura da polpa dentária e sim a sua com- pleta remoção. Sabendo-se que a busca de um preparo ideal quanto à forma e à limpeza tem esbarrado em dificuldades, associadas principalmente à complexida- de anatômica dos canais radiculares e às propriedades físicas e mecânicas das ligas metálicas usadas na fabri- cação dos instrumentos endodônticos, é fundamental que a substância química auxiliar da instrumentação seja dotada de atividade solvente de tecido vivo ou ne- crosado e de atividade antimicrobiana. A seleção da concentração clínica ideal de uma solução de hipoclorito de sódio não deve ser determi- nada pelo tipo e intensidade de resposta inflamatória do tecido conjuntivo, mas sim pela sua capacidade sol- vente de matéria orgânica e efeito antimicrobiano168. A postura adotada por diversos profissionais em não empregar substâncias químicas ativas durante o preparo do canal radicular pode, a longo prazo, ser responsável do fracasso do tratamento endodôntico. É fundamental o respeito aos tecidos perirradiculares, mas os resultados dos testes de toxicidade das subs- tâncias químicas obtidos em laboratório não podem ser extrapolados de forma absoluta para a clínica178. É preciso considerar que os resultados labora- toriais geralmente não produzem condições reais da prática, sendo portanto desaconselhável aplicar dire- tamente seus resultados sem que haja uma adequada análise deles em relação ao comportamento clínico das substâncias químicas auxiliares da instrumentação. SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS EMPREGADAS NO PREPARO DOS CANAIS RADICULARES Entre as substâncias químicas existentes na Endo- dontia serão analisadas as rotineiramente empregadas no preparo químico-mecânico dos canais radiculares. Estudos in vitro têm demonstrado a eficiência rela- tiva de diferentes substâncias químicas quantoàs suas propriedades físicas, químicas e biológicas. Entretanto, essa efetividade não tem sido claramente demonstra- Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 537 da em estudos clínicos. Assim, pode-se afirmar que a maioria das informações é teórica63,179. Certamente, isso se deve à complexidade anatô- mica do canal radicular que dificulta o contato da subs- tância com os tecidos ou micro-organismos; à rapidez da instrumentação que reduz o tempo de permanência da substância no interior do canal; ao pequeno volume de substância que um canal pode conter; e à renovação deficiente da substância química durante o preparo do canal radicular. A substância química auxiliar deve ser aplicada no interior do canal radicular com uma seringa e agu- lha hipodérmica. É importante que a substância pene- tre em toda a extensão do canal radicular. Isso geral- mente ocorre em canais amplos, porém na maioria dos canais é necessário um preparo coronário para facilitar a penetração da substância auxiliar em direção apical. Nesses casos, a movimentação do instrumento durante o cateterismo ou preparo endodôntico favorece a pene- tração e a renovação da substância química. Machtou87 relatou que o sucesso da terapia en- dodôntica repousa sobre a tríade preparo químico- mecânico, controle da infecção e obturação dos canais radiculares. Salientou que devem ser eliminados to- dos os resíduos e os micro-organismos do interior dos canais radiculares e relatou que a ação de uma subs- tância química auxiliar depende de dois fatores: área de contato entre a substância química e os resíduos e o tempo de ação. Hipoclorito de sódio Industrialmente o hipoclorito de sódio (NaOCl) é obtido por processos eletrolíticos que originam a cha- mada indústria eletroquímica do cloro. A eletrólise de uma solução de cloreto de sódio dependendo das condições poderá fornecer: o hidróxido de sódio, cloro, hipoclorito de sódio e ácido clorídrico. O valor de um hipoclorito ou cloróforo deve-se ao teor de cloro que libera. O cloro liberado é denomi- nado cloro ativo. O teor de cloro ativo é definido pelo grau clorométrico, que representa o peso de cloro libe- rado por 100 gramas do cloróforo em natureza ou 100 mililitros (mL) de solução (grau clorométrico inglês). O teor de cloro ativo é determinado pelo método de titulo- metria iodométrica. O teor de hipoclorito de sódio nor- malmente é obtido multiplicando o resultado final do percentual de cloro ativo por um fator de conversão e tem-se diretamente o teor de hipoclorito de sódio91. O fator de conversão é obtido dividindo-se os pe- sos moleculares do hipoclorito de sódio pelo do clo- ro (Na = 23, O = 16, Cl = 35,5). Assim: NaOCl/Cl2 = 74,5/71 = 1,0493, que é o fator de conversão. Esse fator multiplicado pelo resultado final de cloro ativo (t) for- nece o teor de hipoclorito de sódio % diretamente, isto é: g% NaOCl = t × 1,0493. Tomando-se como exemplo: Água Sanitária Clorox • teor de cloro ativo = 2,309g% • teor de hipoclorito de sódio = 2,309 × 1,0493 = 2,423g% Indubitavelmente para o hipoclorito de sódio, a análise mais importante é a determinação quantitativa dos teores de cloro ativo e de hipoclorito. É evidente que o teor de cloro ativo deve-se ao teor de hipoclorito, pois esse é quem dará origem ao primeiro. As soluções aquosas de NaOCl obtidas por pro- cesso eletrolítico apresentam concentração variável de 10 a 17%. Normalmente a sua diluição origina as dife- rentes concentrações de soluções cloradas usadas em Endodontia, assim como as diversas marcas comerciais de águas sanitárias78. Classificado como um composto halogenado, o NaOCl pode ser encontrado em uma série de produ- tos, contendo concentrações e aditivos variáveis, tais como: • Líquido de Dakin: solução de NaOCl a 0,5% (equi- valente a 5.000ppm), neutralizada por ácido bórico para reduzir o pH (pH próximo de neutro). • Líquido de Dausfrene: solução de NaOCl a 0,5% (equi- valente a 5.000ppm), neutralizada por bicarbonato de sódio. • Solução de Milton: solução de NaOCl a 1% (equivalente a 10.000ppm), estabilizada por cloreto de sódio (16%). • Licor de Labarraque: solução de NaOCl a 2,5% (equi- valente a 25.000ppm). • Soda clorada: solução de NaOCl de concentração vari- ável entre 4 e 6% (equivalente a 40.000-60.000ppm). • Água Sanitária: soluções de NaOCl a 2-2,5% (equiva- lente a 20.000-25.000ppm). O hipoclorito de sódio foi utilizado para a limpe- za de feridas, em 1915, por Dakin31, sendo seu empre- go em Endodontia proposto por Coolidge79, em 1919. Walker177, em 1936, propôs a utilização da soda clorada na irrigação de canais radiculares. Sua utilização no preparo químico-mecânico de canais radiculares se tornou difundida graças a Grossman55,56. É sem dúvida a solução química auxiliar da instrumentação de canais radiculares mais usada mundialmente. 538 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares O hipoclorito de sódio apresenta uma série de propriedades, tais como: atividade antimicrobiana, sol- vente de matéria orgânica, desodorizante, clareadora, lubrificante e baixa tensão superficial. É também deter- gente, porque promove a saponificação de lipídios13,54. O hipoclorito de sódio somente existe em solução aquosa. Nesse estado ele origina hidróxido de sódio (base forte) e ácido hipocloroso (ácido fraco). Assim, em solução aquosa o hipoclorito de sódio exibe um equilíbrio dinâmico de acordo com a reação: NaOCl + H2O ' NaOH + HOCl HIPOCLORITO ÁGUA HIDRÓXIDO ÁCIDO DE SÓDIO DE SÓDIO HIPOCLOROSO Cabe ressaltar que, dependendo do pH do meio, o HOCl pode encontrar-se ionizado (meio alcalino pH >9) ou não ionizado (meio ácido, pH ≤ 5,5). H2O HOCl ' OCl + H+ ÁCIDO ÍON ÍON HIPOCLOROSO HIPOCLORITO HIDROGÊNIO Por outro lado, o NaOH é uma base forte, estando praticamente 100% dissociada. H2O NaOH � Na+ + –OH HIDRÓXIDO ÍON ÍON DE SÓDIO SÓDIO HIDROGÊNIO Para diversos autores, o ácido hipocloroso não io- nizado existente em soluções de hipoclorito de sódio com valores de pH de 5 a 9 é a substância responsável pela atividade antimicrobiana da solução. Assim, em pH ácido, a atividade antimicrobiana da solução será potencializada apesar de sua estabilidade estar compro- metida. A dissolução de tecido pulpar em um pequeno período somente se dá por um efeito combinado entre o hidróxido de sódio e o ácido hipocloroso oriundos da hidrólise do hipoclorito de sódio, cada um reagindo com determinados componentes da polpa29,40,78,158. As soluções de hipoclorito de sódio podem apre- sentar dois tipos de alcalinidade: a cáustica e por car- bonato. A alcalinidade cáustica representa a concentra- ção de hidróxido de sódio, e a por carbonato, a con- centração de carbonato de sódio presente nas soluções cloradas. O hipoclorito de sódio é um composto instável por ser oxidante, sendo estabilizado, em função da al- calinidade cáustica, por duas vias: – direta: o NaOH em excesso neutraliza os ácidos, em especial o ácido carbônico, presente quase sempre sob a forma de CO2, transformando-o em carbo- nato de sódio. A presença do carbonato de sódio (Na2CO3) dará origem a um segundo tipo de alca- linidade, a alcalinidade por carbonato. O CO2 tem a sua fonte principal a atmosfera, que vai saturar a água usada para a obtenção do produto final. – indireta: a alcalinidade cáustica, que eleva o valor do pH próximo a 13,5, vai retardar uma reação de autorredox do hipoclorito, a formação de clorato (3 ClOˉ J 2Clˉ + ClOˉ3). A velocidade dessa reação é mínima em valores alcalinos, pH ≥ 12, e esse valor só é mantido pela alcalinidade cáustica. A velocida- de é mínima, porém não é anulada. Assim, a solução de hipoclorito conterá sempre pequenas concentra- çõesde clorato109. A alcalinidade por carbonato, sempre presente nos hidróxidos, indica a desestabilização da solução de hipoclorito, pois o ácido carbônico libera cloro. En- quanto houver alcalinidade cáustica, essa liberação não ocorre. Quanto maior o teor de carbonato, mais instá- vel estará a solução de hipoclorito de sódio109. Portanto, a alcalinidade cáustica é um protetor da estabilidade da solução de hipoclorito. Por sua vez, a alcalinidade por carbonato, uma impureza sempre pre- sente nos hidróxidos, indica o contrário, isto é, a de- sestabilização, pois o ácido carbônico tem condições de liberar cloro. A toxicidade da água sanitária varia em função da quantidade de NaOH presente na solução. Para uso endodôntico, a água sanitária ideal seria aquela que apresentasse um percentual de NaOH num valor má- ximo próximo a 0,4g% (82,91). Atividade solvente A atividade solvente de tecido das soluções clo- radas tem sido estudada por diversos autores, que verificaram os fatores que influenciam a capacidade dessa solução em dissolver tecido orgânico, tais como: relação entre o volume da solução e a massa de tecido orgânico; superfície de contato entre o tecido e a so- lução de hipoclorito; tempo de ação; temperatura da solução; agitação mecânica; concentração da solução e frequência da renovação da solução no interior do ca- nal radicular30,60,167. Assim, quanto maiores forem esses fatores, maior será a capacidade de dissolução do hipoclorito de só- dio sobre os tecidos orgânicos vivos ou necrosados. Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 539 A capacidade de dissolução tecidual promovida pelo hipoclorito de sódio faz com que fragmentos de tecido pulpar sejam liquefeitos, facilitando, assim, sua remoção do interior do sistema de canais radiculares. A dissolução do tecido pulpar se verifica pelo efeito combinado entre o hidróxido de sódio e o ácido hipocloroso, cada um reagindo com determinados com- ponentes da polpa dentária. O hidróxido de sódio reage com ácidos graxos (óleos e gorduras) presentes na ma- téria orgânica, formando sais de ácidos graxos (sabão) e glicerol (álcool) (Equação I). Reage também com ami- noácidos das proteínas, formando sal e água (reação de neutralização) (Equação II). O ácido hipocloroso reage com grupamento amina dos aminoácidos das proteínas, formando cloraminas e água (Equação III)29,36,158. Baumgartner e Cuenin8 examinaram as superfí- cies instrumentadas e não instrumentadas no segmento médio de canais radiculares após o uso de NaOCl em várias concentrações. Relataram que as concentrações de 5,25%, 2,5% e 1% promoveram a remoção total de re- manescentes pulpares e pré-dentina, nas superfícies não instrumentadas. A solução a 0,5% foi menos eficaz. Cunninghan e Balekjian30 estudaram que a dis- solução de colágeno pela ação do hipoclorito de sódio a 2,6% a 37ºC era tão efetiva quanto a solução a 5% à temperatura ambiente. A elevação da temperatura po- tencializava a ação solvente de tecido. Koskinen et al.76 verificaram que o hipoclorito de sódio dissolvia a pré-dentina das paredes do canal radicular e, estudando a dissolução do tecido pulpar bovino, observaram a eficácia da concentração a 5,0% e 2,5%. Porém, salientaram que solução de hipoclorito de sódio a 0,5% não era eficiente. Atividade antimicrobiana Vários estudos demonstram que o hipoclorito de sódio apresenta excelente atividade antimicrobia- na13,62,142,147,150,151,152. No entanto, o mecanismo exato pelo qual essa substância destrói micro-organismos ainda não foi perfeitamente elucidado. Alguns autores40,54,55,56 afirmaram que o efeito antimicrobiano do hipoclorito de sódio ocorre pela liberação de oxigênio nascente por parte do ácido hipocloroso, o qual, supostamente, destruiria o micro-organismo, pela formação de radi- cais oxigenados tóxicos. Essa teoria parece infundada, uma vez que outros compostos que liberam uma quan- tidade muito maior de oxigênio nascente, como a água oxigenada, não destroem micro-organismos tão rapi- damente quanto os compostos clorados151. Destarte, sabe-se que a ação desinfetante de subs- tâncias cloradas se deve à liberação de cloro. Apesar de o hidróxido de sódio gerado pela reação do hipoclo- rito de sódio com a água também apresentar eficácia antimicrobiana, sabe-se que a formação de compostos contento cloro ativo, como o ácido hipocloroso e o íon hipoclorito, é a principal responsável pela excelente atividade antimicrobiana da solução clorada40. A dis- sociação do ácido hipocloroso depende do pH, sen- do que, em meio ácido, há o predomínio da forma de ácido não dissociado, enquanto, em pH alcalino, o íon hipoclorito encontra-se em maior quantidade. O ácido hipocloroso se encontra 100% não dissociado em pH próximo a 5,5, e 100% dissociado em pH 10. A ação desinfetante do hipoclorito de sódio é inversamente proporcional ao pH da solução. Assim, ela se torna pronunciada quando o pH da solução decai, o que é I. R–COO–R’ + NaOH ' R–COONa + R’–OH ÉSTER HIDRÓXIDO SABÃO GLICEROL DE SÓDIO H H ׀ ׀ II. R – C – COOH + NaOH � R – C – COONa + H2O ׀ ׀ NH2 NH2 AMINOÁCIDO HIDRÓXIDO α AMINO ESTEARATO ÁGUA DE SÓDIO DE SÓDIO H Cl ׀ ׀ III. R – C – COOH + HOCl � R – C – COOH + H2O ׀ ׀ NH2 NH2 AMINOÁCIDO ÁCIDO CLORAMINA ÁGUA HIPOCLOROSO Para Spanó158, nas soluções de hipoclorito de só- dio menos concentradas houve maior interação do áci- do hipocloroso com a matéria orgânica (Reação III) e que, nas soluções mais concentradas, houve maior in- teração do hidróxido de sódio com a matéria orgânica (Reação I). Grossman e Meiman54 relataram que a soda clora- da é capaz de dissolver o tecido pulpar em menos de 2 horas. Abou-Rass e Oglesby1 avaliaram os efeitos da tem- peratura, concentração e tipo de tecido (vital, necrosa- do ou fixado com formocresol), na capacidade solvente do NaOCl. Eles verificaram que o aumento da concen- tração e da temperatura potencializou a dissolução de matéria orgânica. Também revelaram que o NaOCl foi mais eficaz na dissolução do tecido vital, seguido pelo necrosado, enquanto o tecido fixado apresentou maior resistência ao processo. 540 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares relacionado com o aumento da concentração de ácido hipocloroso não dissociado. Esse dado sugere que o ácido hipocloroso apresenta maior efeito antimicrobia- no do que o íon hipoclorito9,40. Dois efeitos antimicrobianos têm sido atribuídos ao cloro ativo liberado de um hipoclorito ou clorófo- lo: inibição enzimática e formação de cloraminas, após reação com componentes do citoplasma microbiano. Muitas enzimas microbianas contêm o aminoácido cis- teína, tendo assim cadeias laterais terminando em gru- pamentos sulfidrila (SH). Tais enzimas apenas exercem suas funções, se o grupamento SH estiver livre e redu- zido. O cloro é um forte agente oxidante, que promove a oxidação irreversível de grupamentos sulfidrila das enzimas microbianas40. Evidentemente, tal efeito se dá tanto sobre enzimas associadas à membrana quan- to sobre as enzimas presentes no citoplasma. Como enzimas essenciais são inibidas, importantes reações metabólicas são interrompidas, originando a morte ce- lular. O cloro também pode reagir com o grupamento amina (NH) de proteínas citoplasmáticas, formando cloraminas, compostos de reconhecida toxicidade, os quais interferem com o metabolismo celular31,79. Toda- via, como o efeito microbicida do cloro se dá rapida- mente, mesmo em baixas concentrações, as reações de oxidação enzimática parecem preceder o acúmulo de cloraminas no citoplasma microbiano, sendo, por essa razão, o principal mecanismo envolvido na destruição da célula microbiana151. O hipoclorito de sódio também causadanos ao DNA. Alguns fatores podem interferir nas atividades antimicrobiana e solvente de tecido do hipoclorito de sódio, tais como: pH da solução O pH de uma solução pode ser definido como o logaritmo negativo da concentração de íons hidrogê- nio: pH = – log(H+). Tomando-se a água pura a 25ºC podemos calcular o seu pH: pH = – log(H+) = – log10–7 = – (– 7) = 7,0. Valores menores de pH (abaixo de 7,0) correspon- dem a concentrações mais elevadas de H+ (soluções ácidas), e valores elevados de pH (acima de 7,0) a con- centrações baixas de H+ (soluções básicas). Ácido é toda substância que, ao ser dissolvida em água, sofre ionização e libera íon H+ (próton). Base é toda substância que, ao ser dissolvida em água, sofre dissociação iônica e libera íon –OH (recebe um íon H+). As soluções cloradas terão ação antimicrobiana em meio ácido, quando então liberam ácido hipoclo- roso. Esse ácido só atua na forma não dissociada e a acidez impede a ionização do ácido hipocloroso, fa- vorecendo, assim, sua acentuada ação microbicida. O ácido hipocloroso se encontra 100% não ionizado em pH próximo a 5,5 e 100% ionizado em pH próximo a 10. Daí, a importância do pH na ação microbiana do cloro, pois o HOCl não ionizado é o componente ati- vo. Assim, a um pH acima de 9 a ionização do hipo- clorito de sódio nas soluções aquosas usuais pode ser considerada como sendo completa em temperaturas normais. Com a baixa do pH da solução de hipoclorito de sódio com valores de pH de 9 a 5, forma-se progres- sivamente ácido hipocloroso. Esse ácido é classificado como ácido muito fraco e é facilmente dissociado em meio alcalino. Nas soluções fortemente ácidas, com pH inferior a 5, o cloro elementar aparece e constitui-se na forma predominante segundo a reação: HOCl + H+ + Cl¯ ' Cl2 + H2O ÁCIDO ÍON ÍON CLORO ÁGUA HIPOCLOROSO HIDROGÊNIO CLORO Todavia, o pH alcalino (acima de 10) mantém a estabilidade das soluções de NaOCl. Por isso, o pH das soluções cloradas deve chegar às condições de acidez unicamente no momento do uso, com a liberação de cloro nascente em meio ácido53. Parks et al.109 relatam que a própria acidez tecidual é suficiente para atingir essas condições, ou seja, abaixar o pH, formar ácido hi- pocloroso e liberar o cloro. É preciso ressaltar que, embora haja uma corre- lação entre a concentração de NaOH e valores eleva- dos de pH, isso não quer dizer que se possa avaliar a concentração do NaOH a partir do pH. Isso porque o pH é um índice que somente avalia o grau de alcalini- dade; outros parâmetros podem estar envolvidos nos cálculos. Spanó158 e Santos130, avaliando as soluções de hipo- clorito de sódio após os processos de dissolução tecidual afirmaram que, quanto maior a concentração inicial da solução, menor a redução de seu potencial hidrogeniôni- co. A elevação da temperatura da solução causou maior redução percentual do potencial hidrogeniônico, o que se deve à interação do hidróxido de sódio com a maté- ria orgânica. O hidróxido de sódio reage com os ácidos graxos (óleos e gorduras), presentes na matéria orgânica formando sais de ácidos graxos (sabão) e glicerol (álco- ol). Esse, por ser um composto molecular, proporcionou Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 541 a diminuição da concentração de íons hidroxilas (–OH), promovendo a redução do potencial hidrogeniônico. O hidróxido de sódio reage também com aminoácidos das proteínas da matéria orgânica, formando sal e água (re- ação de neutralização). Assim, essas reações são respon- sáveis pela retirada de íons hidroxila do meio, promo- vendo a redução do potencial hidrogeniônico do líquido residual. Essa redução do potencial hidrogeniônico das soluções de hipoclorito de sódio reduz a velocidade de dissolução do tecido pulpar. Temperatura A temperatura da solução de hipoclorito de sódio exerce uma influência significativa em suas proprieda- des. De acordo com diversos autores, fatores como au- mento de temperatura e de concentração e longo tempo de reação química proporcionam uma maior eficácia da solução de hipoclorito de sódio quanto à sua ação solvente e antimicrobiana1,3,30,40,164. O aquecimento da solução aumenta sua capaci- dade solvente de matéria orgânica1. Uma elevação de 10ºC na temperatura da solução promove uma redução de, aproximadamente, 50 a 60% no tempo necessário para destruir micro-organismos. Por sua vez, se a tem- peratura da solução for reduzida em 10ºC, esse tempo será elevado em cerca de duas vezes40. A velocidade de dissolução do tecido pulpar bovi- no é diretamente proporcional à concentração e à tempe- ratura de utilização da solução de hipoclorito de sódio, isto é, quanto maiores a concentração e a temperatura utilizadas, maior a velocidade de dissolução tecidual. A elevação da temperatura aumenta a frequência das coli- sões moleculares, e elas contribuem para o aumento da velocidade de uma reação. O mais importante é o fato de que uma elevação da temperatura aumenta a pro- porção de moléculas que terão energia suficiente para reagir. Consequentemente, quanto maior for a tempera- tura, maior será a proporção de moléculas que colidem e que reagirão umas com as outras e, como resultado, maior será a velocidade de dissolução tecidual130. Matéria orgânica A relação entre o volume da solução e a massa de tecido tem influência na efetividade do hipoclorito de sódio. Quanto maior for essa relação, maiores serão a capacidade de dissolução e a atividade antimicrobiana do hipoclorito de sódio sobre os tecidos orgânicos vi- vos ou necrosados e sobre os micro-organismos. Durante o tratamento endodôntico, pequeno vo- lume de solução de hipoclorito de sódio contata grande quantidade de matéria orgânica, representada principal- mente por tecido pulpar, fluidos teciduais e micro-orga- nismos compondo a infecção endodôntica. Para compen- sar essa pequena relação (volume da solução/massa de tecido) durante o preparo químico-mecânico do canal ra- dicular, a solução de hipoclorito de sódio deve ser cons- tantemente renovada. Outrossim, mormente durante o tratamento de canais com polpa necrosada e infectada, devemos optar pelo emprego de água sanitária, a qual é mais estável, favorecendo a obtenção de uma concentra- ção de hipoclorito de sódio disponível para realizar uma ação solvente e antimicrobiana adequadas. Concentração A concentração de uma solução é a relação de quantidade entre soluto, solvente e solução. Essa rela- ção pode ser determinada de várias formas, entre elas a concentração comum ou em grama/litro (g/L) e a porcentagem em massa ou em peso. Massa é a quantidade de matéria que compõe o corpo e varia com o tipo e o número dos átomos de que é formada. Peso, por ser uma força (F), é o produto da massa (m) pela aceleração da gravidade (g). P = F = m × g Nessa relação, o peso de um corpo é proporcional a sua massa. Nessa equação o fator de proporcionali- dade é a aceleração da gravidade, que varia com a po- sição que estivermos em relação ao nível do mar. Um mesmo corpo (mesma massa) no nível do mar é mais pesado do que no alto de uma montanha. Concentração (C) de uma solução é a relação en- tre a massa do soluto (m1), em gramas, e o volume da solução (V), em litros. C = m1 (g/L) V Porcentagem em massa ou em peso (p) de uma solução é a massa de soluto dissolvida em 100 unida- des de massa da solução. massa da solução massa do soluto m(m1 + m2) ........................................................m1 100 .................................................................p p = 100 × m1 ou 100 × m1 m m1 + m2 p = porcentagem; m = massa da solução; m1 = massa do soluto; m2 = massa do solvente. 542Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares As atividades antimicrobiana e solvente do hipo- clorito de sódio dependem da concentração da solução química. Essas atividades diminuem à medida que a solução é diluída, sendo a capacidade solvente mais afetada do que a antimicrobiana. Quando do uso de soluções de concentrações menores, elas deverão ser renovadas no interior do canal radicular com maior frequência. Soluções mais concentradas apresentam maior atividade antimicrobiana, desde que outros fatores, como tempo de atuação, pH, temperatura e conteúdo orgânico, sejam mantidos constantes. Siqueira et al.151 demonstraram que a solução de hipoclorito de sódio a 5,25% foi mais eficaz do que a solução a 1% para ini- bir o crescimento de bacilos produtores de pigmentos negros. Em outro estudo, Siqueira et al.149 demonstra- ram que a solução a 4% apresentou atividade antibac- teriana mais pronunciada contra bactérias facultativas e bacilos produtores de pigmentos negros (anaeróbios estritos) quando comparada às soluções a 2,5% e a 0,5% (Fig. 13-2). Siqueira et al.154 avaliaram in vitro a redução da população bacteriana intracanal produzida pela ins- trumentação e irrigação com soluções de NaOCl a 1%, 2,5% ou 5,25%. Como controle, empregou-se solução salina como irrigante. Todas as soluções promoveram redução significativa no número de células bacterianas no canal. Não houve diferença significante entre as três concentrações de NaOCl utilizadas. Todavia, todas as soluções de NaOCl foram significativamente mais eficazes do que a solução salina, fato que realça a im- portância do efeito químico, além do mecânico. Esses resultados quanto à atividade antibacteriana indicam que trocas regulares da solução no canal e irrigações copiosas mantêm as propriedades das soluções, com- pensando os efeitos da concentração. Para vários autores, existe uma relação direta- mente proporcional entre a concentração da solução de hipoclorito de sódio e a velocidade de dissolução, isto é, quanto maior a concentração da solução, mais rápida é a dissolução tecidual54,60,76,158. Atividade desodorizante As infecções por bactérias anaeróbias usualmente resultam em odor fétido, devido à produção de ácidos graxos de cadeia curta, compostos sulfurados, amônia e poliaminas. O cloro pode desodorizar por dois me- canismos: 1. atividade letal sobre os micro-organismos envolvi- dos na infecção pulpar; 2. ação oxidativa sobre os produtos bacterianos, neu- tralizando-os e eliminando o mau odor. Considerações clínicas Uma vez que o NaOCl necessita estar em con- centração suficiente para exercer seus efeitos antimi- crobianos e solvente de tecidos, a questão de sua ins- tabilidade química é crítica. Uma solução de NaOCl apresenta decréscimos significativos de concentração quando armazenada em condições inadequadas ou quando o frasco, durante o uso, é frequentemente aberto. Avaliando as concentrações de cloro ativo em amostras de soluções de hipoclorito de sódio utilizadas em consultórios de endodontistas, concluímos que: • nenhuma amostra apresenta a concentração previs- ta pelo fabricante; • as soluções de hipoclorito de sódio são instáveis; • as soluções a 0,5% foram as que mais perderam clo- ro ativo proporcionalmente (Quadro 13-4). Figura 13-2. Efeito inibitório da solução de hipoclorito de sódio a 4% sobre Prevotella nigrescens. Quadro 13-4 Concentrações de cloro ativo encontradas nas amostras de soluções de NaOCl (médias) Indicada no rótulo Encontrada Capacidade de atividade 5% 3,24% 64,7% 2% 1,6% 80% 1% 0,78% 78,3% 0,5% 0,06% 11,5% Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 543 Dada a instabilidade das soluções de hipoclorito de sódio, é aconselhável que as mesmas sejam adquiri- das dentro do prazo de validade e o mais próximo pos- sível da data de fabricação. Por serem as soluções de hipoclorito de sódio instáveis, perdem eficiência com a elevação da temperatura, com a exposição à luz e ao ar e quando armazenadas por longos períodos. Grossman55, considerando a instabilidade do hi- poclorito de sódio, advoga a sua armazenagem para, no máximo, três meses, devendo ser guardado em vi- dro de cor âmbar ao abrigo da luz e do calor. O Quadro 13-5 resume as principais vantagens e desvantagens do hipoclorito de sódio. A concentração ideal em que a solução de hipo- clorito de sódio deve se apresentar, sua toxicidade e sua instabilidade são motivos de grande discussão. Entretanto, diversos autores consideram a concentra- ção de 2,5% como a de primeira escolha28,32,60,82,93,173. Em muitos países, as soluções de hipoclorito de sódio usadas em Odontologia são fornecidas a partir de agentes clareadores domésticos (água sa- nitária), sendo que o mais popular entre essas solu- ções é o Clorox. Foi Lewis80, em 1954, o primeiro a sugerir o Clorox como fonte de hipoclorito de sódio para o preparo químico-mecânico de canais radi- culares. Um estudo de Marchesan et al.90 revelou que várias marcas de água sanitária nacionais jamais apresentaram concentrações de NaOCl abaixo do especificado nos rótulos das embalagens. Os teores de cloro disponíveis variaram entre 2,53 e 2,95%, e o pH entre 12,53 e 13,44. Martins91 analisou química e quantitativamente 18 amostras de diferentes marcas de águas sanitá- rias, viabilizando-as como fonte de hipoclorito de sódio, e concluiu que as marcas Clorox, Super Globo e Q-Boa são seguras para o uso como solução quími- ca auxiliar de instrumentação na Endodontia. O teor de cloro ativo, o teor de hipoclorito de só- dio, a alcalinidade cáustica, a alcalinidade por carbo- nato de sódio e o pH de soluções-mães de seis marcas comerciais de águas sanitárias foram determinados por Lopes et al.82 e estão expressos no Quadro 13-6. Nesse mesmo trabalho concluíram que: • todas as marcas de água sanitária testadas apresen- taram teor de cloro ativo dentro dos percentuais exigidos segundo a Portaria 89, de 25 de agosto de 1994, da Secretaria de Vigilância Sanitária – Ministé- rio da Saúde18; • as marcas Q-Boa, Super Globo e Clorox apresenta- ram menor teor de NaOH (alcalinidade cáustica); • é viável o uso das marcas Q-Boa, Super Globo e Clorox como solução química auxiliar do preparo químico-mecânico dos canais radiculares. Siqueira et al.150, avaliando a atividade antimicro- biana das águas sanitárias Ajax (Colgate-Palmolive, Quadro 13-5 Vantagens e desvantagens do hipoclorito de sódio Vantagens Desvantagens Relativamente barato Instável ao armazenamento Rápida atuação Inativado por matéria orgânica Desodorizante e lubrificante Corrosivo Atividade antimicrobiana pronunciada contra bactérias, fungos e vírus Irritante para a pele e mucosa Relativamente não tóxico nas condições de uso Forte odor Ação solvente de matéria orgânica Descora tecidos Concentrações facilmente determinadas Remove carbono da borracha Clareador Quadro 13-6 Média dos resultados de teor de cloro ativo, teor de hipoclorito de sódio, alcalinidade cáustica, alcalinidade por carbonato de sódio e pH das soluções analisadas Marca Cl2 (g%) NaOCl (g%) NaOH (g%) Na2CO3 (g%) pH (solução- mãe) Ajax 2,590 2,729 0,929 0,974 12,82 Brilhante 2,446 2,566 0,994 0,285 12,89 Brilux 2,138 2,244 0,486 0,131 12,61 Clorox 2,191 2,298 0,243 0,053 12,37 Super Globo 2,354 2,475 0,209 0,126 12,27 Q-Boa 2,434 2,553 0,177 0,088 12,12 544 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares São Paulo, SP), Brilux (Pará Inds. R. Raymundo da Fonte S.A., Belém, PA), Brilhante (Indústrias Gessy Le- ver Ltda., São Paulo, SP), Q-Boa (Indústrias Anhembi S.A., Osasco, SP), Kokinos (Kokino’sInd. Com. Ltda., D. Caxias, RJ), Bariloche (Indústrias Químicas Ribeiro Ltda., Rio de Janeiro, RJ), Super Globo (Água Sanitá- ria Super Globo S.A., Rio de Janeiro, RJ) contra cepas bacterianas de Prevotella nigrescens, Propionibacterium acnes, Pseudomonas aeruginosa, E. faecalis, Lactobacillus casei, Escherichia coli e Streptococcus bovis, uma cultura mista (amostra de saliva total) e uma levedura (Candida albicans), observaram que todas as sete marcas apresen- taram atividade satisfatória, não tendo sido detectadas diferenças estatisticamente significantes entre os gru- pos (p >0,05). A concentração de NaOCl das amostras testadas variou entre 2 e 2,5%. Nery100 avaliou a influência no processo de repa- ro apical e perirradicular de dentes de cães com lesão perirradicular de diferentes soluções químicas auxilia- res empregadas no preparo químico-mecânico. Após o preparo, os canais radiculares foram obturados na mesma sessão. A análise histopatológica das amostras obtidas demonstrou que as soluções de hipoclorito de sódio a 1 e 2,5% favoreceram o reparo dos tecidos api- cais e perirradiculares, sendo os resultados semelhan- tes para as duas soluções. Várias marcas de água sanitária disponíveis no comércio nacional são fáceis de ser encontradas, mes- mo em localidades mais isoladas, apresentam um bai- xo custo e, devido ao alto consumo pela população em geral, são frequentemente renovadas no estoque do vendedor, o que diminui os riscos de decomposição da solução. Portanto, as águas sanitárias podem ser utili- zadas como soluções químicas auxiliares e na irrigação de canais radiculares como uma alternativa às soluções de NaOCl disponíveis no comércio odontológico. É re- comendável que o profissional renove frequentemente o seu estoque de água sanitária e armazene os frascos, devidamente fechados, ao abrigo da luz e do calor. Durante o tratamento de canais radiculares inde- pendentemente das condições da polpa dentária indi- camos como solução química auxiliar da instrumen- tação soluções de hipoclorito de sódio a 2,5% (águas sanitárias – Clorox, Super Globo ou Q-Boa). Nessa concentração, o hipoclorito de sódio favorece a solubi- lização dos remanescentes teciduais vivos ou necrosa- dos do sistema de canais radiculares e atua de manei- ra eficaz contra a microbiota dos canais infectados. A atividade antimicrobiana de águas sanitárias também é de fundamental importância como fator de segu- rança em deslizes da manutenção da cadeia asséptica passíveis de ocorrerem durante o atendimento clínico. Para os canais amplos com polpa vital é aconselhável o uso de solução de menor concentração. A diluição da água sanitária para uma concentração de 1% de clo- ro ativo pode ser realizada facilmente no consultório, adicionando-se duas partes do produto a três partes de água destilada. As águas sanitárias em função de suas propriedades físicas satisfatórias e de seu baixo custo também são usadas como soluções irrigadoras durante a irrigação-aspiração dos canais radiculares. O empre- go de uma mesma solução química como substância auxiliar da instrumentação e como solução irrigadora simplifica e agiliza o preparo do canal radicular. Associações de outras soluções com o NaOCl em uso alternado durante a irrigação têm sido propostas com o intuito de maximizar a eliminação bacteriana do canal radicular. Siqueira et al.155 compararam a eficá- cia da instrumentação associada a diferentes soluções irrigantes em reduzir a população bacteriana intraca- nal. Canais inoculados com E. faecalis foram prepara- dos e irrigados com as seguintes soluções: NaOCl a 2,5%; NaOCl a 2,5% e ácido cítrico a 10%, alternados; NaOCl a 2,5% e gluconato de clorexidina a 2%, alter- nados; e solução salina. Amostras foram coletadas dos canais antes e depois do preparo químico-mecânico, diluídas e cultivadas para contagem das unidades for- madoras de colônias. Todos os irrigantes significati- vamente reduziram a população bacteriana dentro do canal radicular. Não houve diferenças significantes en- tre os grupos experimentais. Todavia, todos os grupos foram significativamente mais eficazes do que o grupo- controle onde solução salina foi usada como irrigante. Tais resultados confirmaram a importância do empre- go de substâncias dotadas de atividade antimicrobiana durante o preparo químico-mecânico. Além disso, o uso combinado de outros irrigantes com o NaOCl não potencializou a redução bacteriana induzida por essa substância quando usada isoladamente na irrigação. Clorexidina A clorexidina é composta estruturalmente por dois anéis clorofenólicos nas extremidades, ligados a um grupamento biguanida de cada lado, conectados por uma cadeia central de hexametileno35. Essa bisbiguanida catiônica (carregada positiva- mente) é uma base forte, sendo praticamente insolúvel em água, daí sua preparação na forma de sal, o que au- menta a solubilidade da substância. O sal digluconato de clorexidina em solução aquosa é o mais utilizado na Odontologia34,35. Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 545 As soluções são usualmente incolores e inodoras. As aquosas são mais estáveis em pH de 5 a 8. Acima dis- so, há precipitação, enquanto, em pH ácido, há deterio- ração da atividade em razão da perda de estabilidade da solução. A atividade antibacteriana da clorexidina é excelente na faixa de pH entre 5,5 e 7, o que abrange o pH das superfícies corporais e dos tecidos110,123. O digluconato de clorexidina é um agente anti- bacteriano de amplo espectro, sendo muito emprega- do na Periodontia para reduzir a formação de placas e no tratamento de suporte de doenças periodontais125. Esse composto aromático de bisbiguanida é solúvel em água, sendo que em pH fisiológico se dissocia liberan- do moléculas de carga positiva. Além de possuir atividade antibacteriana de am- plo espectro, a clorexidina apresenta substantividade, isto é, ela se liga à hidroxiapatita do esmalte ou dentina e a grupos aniônicos ácidos de glicoproteínas, sendo lentamente liberada à medida que a sua concentração no meio decresce, permitindo assim um tempo de atu- ação prolongado. Assim, essa substância pode manter seus efeitos por um longo período35,125. A clorexidina apresenta atividade antibacteriana contra um grande número de espécies gram-positivas e gram-negativas35 (Fig. 13-3). Em baixas concentrações, a clorexidina é bacte- riostática, enquanto em concentrações mais elevadas é bactericida. Por ser uma molécula catiônica, a clorexi- dina é atraída e adsorvida à superfície bacteriana, na qual é carregada negativamente. Essa adsorção dá-se, principalmente, em componentes contendo fosfato. Na sequência do processo de lise da bactéria, a clore- xidina é atraída para a membrana citoplasmática, na qual promove uma ruptura, permitindo a liberação de componentes citoplasmáticos de baixo peso molecular, como, por exemplo, íons potássio. Além disso, ao nível de membrana, a clorexidina pode inibir a atividade de determinadas enzimas, como a adenosina trifosfatase (ATPase). Se o efeito da clorexidina em razão da baixa concentração para nesse ponto, a substância tem um efeito bacteriostático35. Adsorção é a adesão de uma substância a uma outra. No processo de adsorção, um líquido ou um gás (adsordato) se adere firmemente à superfície de um só- lido ou líquido (adsorvente). A adsorção é um proces- so de superfície. O processo de adsorção difere do de absorção onde uma substância absorvida penetra den- tro da outra (sólido) num processo chamado difusão. Basicamente o processo de absorção é na realidade a combinação da adsorção e difusão. O efeito bactericida da clorexidina é observado em concentrações mais altas, quando se verifica que o dano à membrana citoplasmática é mais grave, levan- do ao extravasamentode conteúdo citoplasmático de maior peso molecular, como ácidos nucleicos. Quando a concentração da substância é suficientemente eleva- da (100 a 500mg/L), não há mais extravasamento do conteúdo do citoplasma bacteriano, visto que ele se torna precipitado, como resultado da reação da clore- xidina com compostos fosfatados, como ATP (adenosi- na trifosfato) e ácidos nucleicos, formando complexos. Nesse último caso, o efeito bactericida é extremamente rápido. A maioria das soluções de clorexidina usadas na clínica possui efeito bactericida35. Siqueira et al.149, avaliando os efeitos inibitórios das soluções de clorexidina a 0,2 e a 2% sobre bactérias anaeróbias estritas e facultativas, comumente isoladas de canais radiculares infectados, observaram que não houve diferença significante entre elas. Entretanto, quando comparadas à solução de hipoclorito de sódio a 4%, ambas as soluções de clorexidina apresentaram atividade antibacteriana significativamente menor. Rigel et al.123 compararam, in vivo, a efetividade antimicrobiana da clorexidina a 0,2% e NaOCl a 2,5%, no preparo químico-mecânico dos canais radiculares, demonstrando que a solução clorada foi significativa- mente mais eficaz do que a clorexidina como agente antimicrobiano. Quando utilizada nas concentrações preconiza- das para emprego clínico (entre 0,12 e 2%), a clorexidi- na apresenta uma relativa ausência de toxicidade123,125. Por outro lado, o hipoclorito de sódio é citotóxico e ir- ritante aos tecidos112. Essa característica provavelmente indicaria a utilização da clorexidina como substância auxiliar da instrumentação em detrimento do hipoclo- rito de sódio. Entretanto, como já discutido, esse efei- Figura 13-3. Halos de inibição do crescimento bacteriano promo- vido por soluções de clorexidina a 0,2 e 2%. 546 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares to irritante do hipoclorito de sódio não parece exercer qualquer influência no êxito do tratamento, desde que utilizado na forma indicada, limitado ao interior do ca- nal radicular. Além disso, outras propriedades devem ser levadas em conta ao se selecionar uma substância química a ser empregada no preparo dos canais radi- culares. O hipoclorito de sódio apresenta, além da ex- celente atividade antimicrobiana, outras propriedades, como solvente de matéria orgânica e clareador, que a clorexidina não possui, o que é de grande valia durante o preparo de canais com polpa necrosada. O efeito sol- vente do hipoclorito de sódio pode auxiliar na limpeza do sistema de canais radiculares, promovendo a remo- ção de matéria orgânica em decomposição, não afetada pelos instrumentos endodônticos1,54. Embora não apresentando atividade solvente de tecido pulpar, o gluconato de clorexidina é um eficien- te antimicrobiano e possui uma relativa ausência de toxicidade. Em busca de corrigir as propriedades inde- sejáveis dessa solução, alguns autores têm sugerido o seu emprego associado ao hipoclorito de sódio. Kuruvilla e Kamath77, avaliaram, in vivo, a ativida- de antimicrobiana das soluções de hipoclorito de sódio a 2,5%, clorexidina a 0,2% e associação de ambas, como substância química auxiliar no tratamento endodôntico de dentes com necrose pulpar e reação perirradicular vi- sível radiograficamente. Foram feitas coletas microbio- lógicas antes e após o preparo. Esse estudo mostrou que a combinação hipoclorito de sódio e clorexidina resul- tou em menor quantidade de culturas positivas após o preparo químico-mecânico do canal radicular. Entretan- to, a forte pigmentação acastanhada e a impregnação da dentina oriunda da combinação das duas substâncias155, gerando o composto paracloroanilina7, desabonam seu uso associado quando da irrigação de canais. Por outro lado, Siqueira et al.155 compararam a eficácia in vitro da instrumentação associada a diferen- tes soluções químicas para reduzir a população bac- teriana intracanal e revelaram que o uso alternado do NaOCl a 2,5% com o gluconato de clorexidina a 2% não foi mais eficaz do que o NaOCl usado isoladamente. Além disso, relatam o desenvolvimento de forte pig- mentação acastanhada quando da associação da clore- xidina com o NaOCl, que tem o potencial de apresentar efeitos antiestéticos. Por tais razões, não recomenda- mos a associação dessas duas substâncias. Em um estudo clínico controlado, Siqueira et al.155 compararam a eficácia antibacteriana do NaOCl a 2,5% e da clorexidina a 0,12% quando utilizados como subs- tância química auxiliar no tratamento de dentes com canais infectados associados a uma lesão perirradicu- lar. Amostras foram coletadas do canal antes e depois da instrumentação e então cultivadas. Nos casos com cultura positiva, bactérias foram identificadas por se- quenciamento do gene da porção 16S do rRNA. Inde- pendentemente do grupo, a instrumentação e a irriga- ção resultaram em redução de mais de 95% no número de bactérias no canal. No grupo do NaOCl, 37,5% dos canais apresentavam culturas negativas. No grupo da clorexidina, 50% não apresentaram crescimento bacte- riano. Estreptococos foram o grupo de bactérias mais comumente isolado dos canais com culturas positivas. Não houve diferença estatisticamente significativa en- tre a irrigação com o NaOCl e a clorexidina. Resultados semelhantes quanto à ausência de di- ferença significante entre a eficácia antibacteriana do NaOCl e da clorexidina foram observados em vários ou- tros estudos clínicos ou laboratoriais41,52,64,73,126,141,174,176. A clorexidina pode ser a substância química de elei- ção quando há relato de alergia ao hipoclorito de sódio por parte do paciente e, possivelmente, no tratamento de dentes com polpa necrosada associada à rizogênese incompleta, onde existe grande risco de extravasamento apical da solução química. Pode haver desenvolvimento de reações graves dos tecidos perirradiculares, quando do extravasamento apical de hipoclorito de sódio du- rante a execução da terapia endodôntica127. Ácido etilenodiamino tetracético dissódico (EDTA) A instrumentação de canais radiculares calcifica- dos e atresiados sempre foi tarefa difícil para os que se dedicam à clínica endodôntica. Para esses casos, durante muito tempo se empregaram ácidos inorgâ- nicos, como sulfúrico, fenil sulfônico e clorídrico. Po- rém, esses ácidos têm um poder lesivo muito grande sobre os tecidos vivos, em particular sobre os tecidos perirradiculares55,89. Em 1957, Ostby106, baseado no trabalho de Nikifo- ruk e Sreebny103, indicou a solução salina de etilenodia- mino tetracético dissódico (EDTA) para a instrumen- tação de canais atresiados. Esse sal, derivado de um ácido fraco, é capaz de promover, em pH alcalino, a quelação de íons cálcio da dentina. O EDTA, na sua forma de ácido, apresenta um pequeno poder de descalcificação, porque sua solubili- dade em água é pequena (0,001 mol/L). Consequente- mente, seu poder quelante é reduzido, pela impossibi- lidade de uma efetiva dissociação iônica4,5,68,129. A solubilidade do EDTA está diretamente relacio- nada com o número de átomos de hidrogênio dos radi- Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares 547 cais carboxila, substituídos por sódio. Como apresenta quatro radicais carboxila, podemos obter quatro tipos de sais: mono, di, tri e tetrassódico. O EDTA apresenta a seguinte fórmula estrutural: HOOC – CH2 CH2 – COOH N – CH2 – CH2 – N HOOC – CH2 CH2 – COOH Levando em consideração a capacidade de des- calcificação e a compatibilidade biológica do EDTA em relação aos tecidos pulpares e perirradiculares, empre- gamos o sal trissódico68,99,106,129,148. NaOOC – CH2 CH2 – COONa N – CH2 – CH2 – N HOOC – CH2 CH2 – COONa Quando se coloca uma solução aquosa de EDTA no interior do canal radicular, ocorre, inicialmente,a solubilização de uma quantidade muito pequena de moléculas de fosfato de cálcio, componente mineral da dentina, até que seja estabelecido o equilíbrio: H2O Ca3(PO4)2 ' 3Ca++ + 2PO4– – – FOSFATO DE CÁLCIO ÍON CÁLCIO ÍON FOSFATO O EDTA incorpora o cálcio por meio das ligações bivalentes do oxigênio existente em sua estrutura, fe- chando-o numa cadeia heterocíclica. Essa reação é de- nominada quelação, e o produto resultante, quelato de cálcio. Ca+ + + EDTA Ca EDTA Dessa forma ocorre uma quebra da constante de solubilidade da dentina, que volta a solubilizar-se na tentativa de suprir a falta de íons cálcio. Esses íons são incorporados às moléculas de EDTA e a reação quími- ca continua até a saturação da solução de quelante, in- terrompendo o mecanismo de descalcificação. O EDTA tem ação autolimitante, pois uma molé- cula quela um mol de íon metálico. Essa solução não atua imediatamente quando colocada em contato com a dentina, necessitando esperar alguns minutos (10 a 15) para a obtenção do efeito quelante. À medida que ocorre aquele contato, há reação com os íons cálcio, neutralização e perda da ação química, necessitando, assim, de constantes renovações37,106. Diversos trabalhos indicam que as soluções de EDTA apresentam ação desmineralizadora so- bre a dentina, a qual é verificada por meio de tes- tes de microdureza. Os resultados mostram que o EDTA diminui a microdureza da dentina e o pH, en- quanto o tempo de ação da solução influencia a ação desmineralizadora28,43,118,131. Patterson113 afirma que a dureza da dentina hu- mana varia com a sua localização e possui valores de 25 a 80 na escala Knoop. Na junção cementodentinária e nas proximidades da superfície do canal radicular a dureza é menor e, quando a dentina foi submetida à ação de EDTA, a dureza máxima determinada foi de 1,6 Knnop. As soluções de EDTA também influenciam na permeabilidade da dentina. A maioria dos trabalhos revela que o emprego do EDTA aumenta essa per- meabilidade. Esses resultados geralmente são obti- dos através de infiltração de corantes ou de métodos histoquímicos113,117,118,124. Quanto à compatibilidade do quelante em relação ao tecido pulpar e perirradicular de cães, os resultados são, por vezes, discordantes. Silveira148 observou rea- ção inflamatória moderada, enquanto Ostby106 e Nery et al.99 observaram uma resposta tecidual satisfatória. O efeito antimicrobiano de soluções de EDTA é negado por Pupo et al.122. Todavia, Byström e Sund- qvist20, no tratamento endodôntico de dentes infecta- dos, observaram que o uso combinado de uma solu- ção de EDTA e de hipoclorito de sódio a 5% apresenta atividade antibacteriana mais eficaz do que quando se usava apenas a solução de hipoclorito de sódio. Siquei- ra et al.149 confirmaram que o EDTA possui atividade antibacteriana contra bacilos anaeróbios estritos pro- dutores de pigmentos negros. Para alguns autores, soluções irrigantes, como as de hipoclorito de sódio e água oxigenada, neutralizam a ação do EDTA, não se devendo, portanto, empregá- las quando houver necessidade de sua ação11,68. Saquy131 avaliou a capacidade quelante do EDTA e da associação EDTA mais solução de Dakin (hipoclo- rito de sódio a 0,5% de cloro ativo), por meio de méto- dos químicos e da análise de microdureza da dentina. Esse autor concluiu que tanto a solução de EDTA como a associação dessa com a de Dakin são efetivas em que- lar íons de cálcio, sendo que a ação quelante do EDTA não é inativada pela sua associação com a solução de Dakin na proporção de 1:1. Ostby106 adicionou o tensoativo Cetavlon (brometo de cetiltrimetilamônio) à solução de EDTA, formando, assim, uma associação conhecida como EDTAC. A asso- 548 Capítulo 13 Substâncias Químicas Empregadas no Preparo dos Canais Radiculares ciação do Cetavlon ao EDTA reduz a tensão superficial da solução em 50%. Consequentemente, o EDTAC em relação ao EDTA é mais efetivo quanto à redução da mi- crodureza da dentina e promove uma maior permeabi- lidade dentinária radicular43,58. Para Guimarães et al.58, a tensão superficial do EDTA é de 69,25 dinas/cm e a adi- ção de 0,1% de Cetavlon a reduz para 33,92 dinas/cm. Recomendamos o uso de soluções de EDTA com- binadas com soluções de hipoclorito de sódio, na re- moção da smear layer, após o preparo químico-mecâni- co de canais radiculares infectados. O EDTA também é comercializado na forma de creme ( RC-Prep-Premier) e de gel, contido em seringas (Glyde File Prep-Dents- ply/Maillefer e EDTA trissódico 24%, Biodinâmica). Atenção deve ser dada à data de fabricação e ao acondicionamento da solução de EDTA. Quando acon- dicionado em frascos de vidro, com o tempo o EDTA pode quelar o cálcio do silicato de cálcio existente na composição do vidro, diminuindo sua capacidade de atuação5. RC-Prep Apresenta-se na forma de creme com a seguinte composição química EDTA 15%, peróxido de ureia 10% e Carbowax 75%, como idealizaram Stewar et al.160. O peróxido de ureia (bactericida) é um complexo de peróxido de hidrogênio e ureia. Apresenta-se sob a forma de corpo cristalino, branco, com ligeiro odor. É solúvel em água, glicerina, álcool e propileno gli- col. É usado como fonte de peróxido de hidrogênio. O EDTA (quelante) é usado para descalcificação dos teci- dos dentários. O Carbowax é o polietileno glicol 4000, apresenta-se na consistência cremosa e na cor branca. É francamente solúvel na água e no álcool. Funciona como uma base estável para o peróxido de ureia e como lubrificante durante a instrumentação dos canais radiculares. O RC-Prep é colocado no interior do canal radi- cular e a seguir adiciona-se uma solução de hipoclorito de sódio a 2,5% e procede-se à instrumentação. A re- ação química do peróxido de ureia com o hipoclorito de sódio produz uma efervescência, com a liberação de oxigênio nascente, que maximizará a limpeza do canal, favorecendo a remoção de detritos e a eliminação de bactérias. A adição de EDTA proporciona a essa asso- ciação a ação quelante sobre o cálcio das paredes denti- nárias do canal radicular. Stewart et al.160, empregando RC-Prep e hipoclo- rito de sódio a 5% na instrumentação de canais radi- culares de dentes despulpados e infectados, obtiveram testes bacteriológicos negativos imediatamente após o preparo em 97,2% e após uma semana em 94,4% dos casos, sem o emprego de qualquer medicação intraca- nal entre as sessões. Cohen et al.27 demonstraram que o uso associado do RC-Prep com o hipoclorito sódico a 5% aumentou de maneira significativa a permeabilidade dentinária no nível do terço médio e apical. Todavia, Pécora119 constatou que essa associação promovia aumento da permeabilidade dentinária de modo menos intenso do que a utilização da solução EDTA e das soluções halo- genadas nas diferentes concentrações, quando utiliza- das individualmente. Com relação à compatibilidade com os tecidos vi- vos, Neri et al.99 em tratamento de canais radiculares de dentes de cães afirmaram que o RC-Prep é altamente citotóxico aos tecidos pulpar e perirradicular. Procu- rando justificar esses resultados, referiram-se à consis- tência pastosa do veículo (Carbowax) que dificultaria sua remoção completa do interior do canal radicular. Glyde Apresenta-se na forma de gel com a seguinte com- posição química: EDTA, peróxido de carbamida (peró- xido de ureia) em uma base hidrossolúvel. É utilizado em associação com soluções de hipoclorito de sódio. Deve ser armazenado em refrigerador. É utilizado de maneira semelhante ao RC-Prep e deve ser empregado apenas no início da instrumentação, até os três primei- ros diâmetros de instrumentos. A posterior preparação dos canais deverá ser realizada apenas com solução de hipoclorito de sódio EDTA gel Apresenta-se na forma de gel com a seguinte composição
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