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1. Desenvolvimento Humano e Aprendizado Luciana Schermann Azambuja1 “ Podemos dizer que cada homem aprende a ser um homem. O que a natureza lhe dá quando nasce não lhe basta para viver em sociedade. É-lhe preciso ainda entrar em relação com os fenômenos do mundo circundante, através de outros homens, isto é, num processo de comunicação com eles” (Leontiev). O desenvolvimento humano refere-se ao desenvolvimento mental e ao crescimento orgânico. O desenvolvimento mental se caracteriza pelo aparecimento gradativo de estruturas mentais e algumas dessas estruturas permanecem por toda a vida, sendo que desde o seu nascimento, constrói o conhecimento. O estudo do desenvolvimento Humano em sua trajetória histórica registra no mundo ocidental o seu começo com a Filosofia. Avançou na época dos gregos que chegou a ter um ramo muito especial denominado de Psicologia por se tratar do estudo específico da alma humana (Lorenzoni e Gil). Estudar o desenvolvimento humano implica em conhecer as características comuns de cada faixa etária, permitindo assim, reconhecer as individualidades, o que nos torna mais aptos para a observação e interpretação dos comportamentos. Desta forma o entendimento do desenvolvimento humano é determinado pela interação de vários fatores Para Papalia e colaboradores (2006), o ciclo vital apresenta quatro princípios fundamentais: · É vitalício, sendo que cada período de vida é influenciado pelos acontecimentos anteriores e, ao mesmo tempo, produz influências sobre períodos futuros; · É histórico, já que cada pessoa desenvolve-se em um contexto histórico e social do qual recebe influências e no qual também interfere; · É multidimensional, pois envolve um equilíbrio entre crescimento e declínio. Com a idade, algumas capacidades aumentam enquanto outras diminuem; · É plástico, uma vez que sempre existe a possibilidade dos indivíduos transformarem e ampliarem suas capacidades. O desenvolvimento humano ocorre ao longo de toda vida, sendo cada período influenciado pelo que aconteceu antes e irá afetar o que virá depois. Nenhuma fase é mais ou menos importante do que a outra e, cada uma tem suas características próprias, ocorrendo assim o desenvolvimento do ciclo da vida (Lorenzoni e Gil). 1 Psicóloga, Doutora em Neurociências. Professora na Universidade Luterana do Brasil. De acordo com Papalia (2006), o desenvolvimento humano é o estudo da mudança e da estabilidade ao longo de toda a vida. Tradicionalmente, os primeiros estudos referentes à psicologia do desenvolvimento faziam menção somente ao desenvolvimento da criança. Entretanto, teóricos de todas as correntes concordam com o fato de que os indivíduos se desenvolvem durante toda a vida. Por tal motivo, esse foco vem mudando ao longo dos anos, e hoje, tem-se uma ideia que o estudo sobre o desenvolvimento humano deve abranger todo processo de ciclo vital, pois o estudo da psicologia do desenvolvimento traz uma compreensão sobre as transformações psicológicas que ocorrem no decorrer do tempo. Os seres humanos têm a vida dividida em fases, de acordo com a idade em que ele passa começando como um embrião e terminando com a morte. O ciclo normal de vida começa na concepção. Cada fase tem suas características específicas, compatíveis com o desenvolvimento do corpo humano bem como do cérebro e suas funções cognitivas (percepção, aprendizagem, memória, pensamento, linguagem, atenção) e comportamentais (personalidade). A primeira fase da vida chamada infância inicia do nascimento até os 12 anos. A criança não é mais um adulto em miniatura, como era na idade média, ela apresenta características próprias de acordo com a sua idade e contexto em que vive. Nesta etapa, os estímulos são de extrema importância para o desenvolvimento e caracteriza-se por um período de maior aprendizado. A infância é um período em que a criança tem vontade de experimentar tudo, tocar, sentir, se manifestar de forma ativa e criativa. Quanto mais ricos forem os estímulos nesta fase maiores as possibilidades de sucesso de desenvolvimento de algumas habilidades (motoras, cognitivas e comportamentais). Após, aos 13 anos, se inicia a fase da adolescência, onde acontece mudanças intensas nos aspectos físicos, cognitivos e psicológicos em decorrência das mudanças biológicas e fisiológicas. Nessa idade os jovens querem maior liberdade para sair com seus amigos e fazerem coisas que gostam. É a fase do desenvolvimento humano que marca a transição entre a infância e a idade adulta. A partir dos 20 anos começa a fase adulta, embora desde os 18 anos, o indivíduo é legalmente responsável pelos seus atos. Essa é a fase de maior duração das pessoas, que se estende até os 64 anos. Na adultez, ocorrem alterações importantes em todas as esferas da vida humana (novas responsabilidades e novos referenciais de existencialidade). Aos 65 anos nos países em desenvolvimento como o Brasil, a pessoa pode ser chamada de idosa. Nessa fase da vida, os problemas de saúde tendem a ser mais frequentes e, por isso, é importante uma boa alimentação e que o médico seja visitado ao menos uma vez ao ano. Com o aumento da expectativa de vida em nosso país, a pirâmide populacional está sendo modificada e os idosos estão cada vez em maior número. Diante deste contexto, outra fase da vida está crescendo rapidamente, os chamados superidosos, que são pessoas a partir dos 80 anos. Em se tratando do curso de vida, a infância, a adolescência e todos os demais estágios constituem exemplos de padrões desenvolvidos pelo indivíduo em suas interações e reconstruções com o ambiente (Sifuentes et al, 2007). Durante toda a vida os seres humanos sofrem influencias tanto de agentes internos, como externos (de natureza física e social). Esses agentes atuam estimulando suas capacidades e aptidões e promovendo o seu desenvolvimento físico e mental. O desenvolvimento e crescimento humano podem ser afetados por diversos fatores e/ou condições. Este comprometimento pode ocorrer tanto no período pré quanto pós-natal e são oriundos de fatores internos e externos. Entre os fatores internos estão as influências genéticas e as condições maternais do ambiente pré-natal. Já entre os fatores externos, a alimentação, o álcool, o tabagismo e as drogas ganham destaque, pois se sabe que, embora o feto esteja protegido pela placenta, certas substâncias podem penetrá-la e causar reações negativas como deformidades físicas e disfunções comportamentais (GABBARD, 2000). Bock (2008) refere que vários fatores atuando juntos em permanente interação afetam o desenvolvimento humano. Este são: Hereditariedade: a carga genética estabelece o potencial do indivíduo, que pode ou não se desenvolver. Existem pesquisas que comprovam os aspectos genéticos da inteligência. No entanto, a inteligência pode desenvolver-se aquém ou além do seu potencial, dependendo das condições do meio que encontra. Crescimento Orgânico: refere-se ao aspecto físico. O aumento de altura e a estabilização do esqueleto permitem ao indivíduo comportamentos e um domínio do mundo que antes não existiam. Pense nas possibilidades de descobertas de uma criança, quando começa a engatinhar e depois a andar, em relação a quando esta criança estava no berço com alguns dias de vida. Maturação Neurofisiológica: é o que torna possível determinado padrão de comportamento. A alfabetização das crianças, por exemplo, depende dessa maturação. Para segurar o lápis e manejá-lo como um adulto, é necessário um desenvolvimento neurológico que a criança de 2, 3 anos não tem. Meio: o conjunto de influências e estimulações ambientais altera os padrões de comportamento do indivíduo. Por exemplo, se a estimulação verbal for muito intensa, uma criança de 3 anos pode ter um repertório verbal muito maior do que a média das crianças de sua idade, mas, ao mesmo tempo, pode não subir e descer com facilidade uma escada, porque esta situação pode não ter feito parte de sua experiência de vida. Desta forma, desenvolvimento humano, pode ser abordado a partir de quatro aspectos básicos (aspecto físico-motor-relacionado com aspectos neurofisiológicos, intelectual, afetivo-emocional e social). Para Bock e colaboradores (2008), o desenvolvimento é um processo contínuo e ininterrupto em que os aspectos biológicos, físicos, sociais e culturais se interconectam, se influenciam reciprocamente, produzindo indivíduos com um modo de pensar, sentir e estar no mundo absolutamente singulares e únicos. Uma das grandes áreas de interesse da psicologia é o estudo de como o pensamento se modifica ao longo da vida dos indivíduos, o qual ressalta que uma questão premente são as possíveis relações que podem existir entre o desenvolvimento e a aprendizagem (Filho, 2008). Os esforços relacionados ao desenvolvimento cognitivo buscam compreender como as habilidades mentais surgem e modificam-se em face da maturação biológica e da experiência ou aprendizagem (Sternberg, 2000). 1.1 RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO HUMANO E APRENDIZAGEM No que se refere à aprendizagem como resultado do desenvolvimento e que o desenvolvimento não ocorre sem a aprendizagem (Motta, 2008). O conceito de aprendizagem emergiu das investigações empiristas em Psicologia, ou seja, de investigações levadas a termo com base no pressuposto de que todo conhecimento provém da experiência. Aprendizagem é caracterizada por um processo de mudança de comportamento obtido através da experiência construída por fatores emocionais, neurológicos, relacionais e ambientais. Aprender é o resultado da interação entre estruturas mentais e o meio ambiente, processo de aquisição de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes, possibilitado através do estudo, do ensino ou da experiência. É fundamental à vida, por meio dela que o homem se afirma como ser racional, forma a sua personalidade e se prepara para o papel que lhe cabe na sociedade. Embora fatores internos (genéticos, hereditários) sejam fatores decisivos para o desenvolvimento do aprendizado, o ambiente torna-se fundamental para este processo. Pesquisas referentes a influência do ambiente no desenvolvimento, evidenciam que quanto mais rico e cheio de estímulos este for, maior o aprendizado a criança terá. Do contrário, crianças que vivem privadas de estímulos (afetivo, cognitivo) podem vir a ter um desenvolvimento abaixo do esperado para sua idade cronológica. Alguns outros fatores também influenciam no deficitário desenvolvimento do aprendizado como por exemplo, vulnerabilidade social, carência nutricional entre outros. Para Pain (1992) o processo de aprendizagem não é uma estrutura, mas sim um efeito, um lugar de articulação de esquemas. Como praticamente todo o comportamento é aprendido, o meio será imprescindível para a formação da personalidade do indivíduo. Campos (2003), afirma que a aprendizagem leva o indivíduo a viver melhor ou pior, mas indubitavelmente a viver de acordo com o que aprende. Porém, quando realmente a aprendizagem começa e termina? Para a maioria, começamos a aprender somente quando balbuciamos nossas primeiras palavras ou damos nossos primeiros passos, mas na realidade a aprendizagem começa logo após nosso nascimento, quando, por exemplo, o bebê descobre que ao chorar sua mãe aparece e que se parar ela sumirá. Mas o que realmente importa é: a aprendizagem para em algum momento? (Diaz, 2011). Para o mesmo autor: [...] até a idade adulta, os conhecimentos aprendidos vão se acumulando e se integrando ao aparato psicológico de cada indivíduo, moldando a sua maneira própria de aprender, até a velhice, quando se observa um declínio normal da plasticidade psicológica e cerebral, para processar estímulos novos. Contudo, notamos que cada vez mais idosos estão aprendendo habilidades novas, viajando, se reinventando, em vez de apenas decaírem, como seria o esperando pela sociedade. Para Mota e Pereira (2007, p. 3): As pessoas idosas embora nossa sociedade seja reticente quanto às suas capacidades de aprendizagem podem continuar aprendendo coisas complexas como um novo idioma ou ainda cursar uma faculdade e virem a exercer uma nova profissão. A aprendizagem pode permitir compreender melhor as situações que estão a nossa volta, nossos companheiros, a natureza e o mais crucial, compreender a si mesmo, podendo ajustar e instruir ao ambiente físico e social que estamos inseridos. Com o desenvolvimento do sujeito, este cria elementos que lhe permitem absorver conhecimento, e com isso a aprendizagem ocorre de maneira mais satisfatória. Ao absorver conhecimento sobre elementos que lhes são ensinados, há o conhecimento de si próprio e este autoconhecimento é essencial para a constituição do sujeito. Desta forma, conclui-se que a aprendizagem e o desenvolvimento não coincidem inteiramente, mas são dois processos que estão em complexas inter-relações (Leonardo e Silva, 2013). RECAPITULANDO No e para o estudo do Desenvolvimento Humano, teóricos apresentam aspectos e subdivisões, mas sempre girando como básicos, neurofisiológicos, intelectual, afetivo- emocional e social ou outras denominações, cujo reconhecimento é o de ser o desenvolvimento como um processo contínuo, geralmente gradativo no indivíduo saudável. Aprender é o resultado da interação entre estruturas mentais e o meio ambiente, a aprendizagem, para que se efetive, envolve mudanças, podendo ser observável ou não nas articulações e nos próprios esquemas cerebrais, que vão refletir na “aquisição de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes. Pode-se afirmar que Desenvolvimento leva a aprendizagem e, esta como mudança leva à ampliação do próprio desenvolvimento. Referências E Obras Consultadas: BOCK, A. M. B.; GONÇALVES, M. G. M.; FURTADO, O. (Orgs). Psicologia Sócio- Histórica– uma perspectiva crítica em psicologia. São Paulo: Cortez Editora, 2008. CAMPOS, Dinah Martins Souza. Psicologia da Aprendizagem. Petrópolis, Vozes, 33.ed., 2003. DÍAZ, Félix. O processo de aprendizagem e seus transtornos. Salvador: EDUFBA, 2011. FILHO, M.L.S. Relações entre aprendizagem e desenvolvimento em Piaget e em Vygotsky.Rev. Diálogo Educ., Curitiba, v. 8, n. 23, p. 265-275, jan./abr. 2008 GABBARD, C. P. Lifelong Motor Development. Boston: Allyn & Bacon, 3º ed., 2000. LEONARDO, N.S.T; SILVA, V.G. A relação entre aprendizagem e desenvolvimento na compreensão de professores do Ensino Fundamental.Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, SP. Volume 17, Número 2, Julho/Dezembro de 2013: 309-317. LEONTIEV, A. O desenvolvimento do psiquismo. 2.ed. São Paulo: Centauro, 2004. MOTA, Maria Sebastiana Gomes; PEREIRA, Francisca Elisa de Lima. Desenvolvimento e aprendizagem: Processo de construção do conhecimento e desenvolvimento mental do indivíduo. In: FILHO, Raul de Souza Nogueira. I Colóquio sobre docência profissional e PROEJA do CEFET-AM. Amazônia: CEFET, 2007. MOTTA, A. P. F. 2008. O letramento crítico no ensino/aprendizagem de língua inglesa sob a perspectiva docente. Londrina, Disponível em: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/379-4.pdf.SIFUENTES, T.R; DESSEN, M.A; OLIVEIRA, M.C.L. Trajetórias Probabilísticas e Desenvolvimento Humano. Psic.: Teor. e Pesq., Brasília, Out-Dez 2007, Vol. 23 n. 4, pp. 379-386 PAÍN, Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. 4.ed. Porto Alegre: Artes médicas, 1992. PAPALIA, D. E; OLDS, S. W.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento Humano. 8.ed. Porto Alegre: Artmed, 2006. STERNBERG, R. J. Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
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