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1 Da Prisão e da Prisão Provisória (Artigos 282 a 350 do Código de Processo Penal) Prisão – conceitos essenciais 1. Introdução: Dispõe o artigo 5º, caput, da Constituição Federal de 1988: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...”. Dentro o direito a liberdade, gênero, entre outras espécies para nos interessa o direito à liberdade de locomoção, ou seja, o direito de ir, vir e ficar, que recebeu proteção especial em nossa Constituição Federal. Para tanto, basta verificarmos: Art. 5º. da CF: XV – é livre a locomoção no território em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens: LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; LXI – ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei; LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; LXVI – ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança; LXVIII – conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer volência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder; Conclui-se, assim, ser inerente ao cidadão o direito de liberdade de locomoção, ficando a restrição desta condicionada aos requisitos estabelecidos pela lei: flagrante delito ou por ordem escrita da autoridade judiciária. Fora disto, é cabível o habeas corpus para se restituir a liberdade do indivíduo, sem prejuízo da responsabilização criminal, civil e administrativa de quem retirou a liberdade de alguém de forma ilegal. Como exceções a tais regras, é permitida a prisão, em caráter excepcional, sem ordem legal, durante o estado de defesa (art. 136, § 3.º, I) e durante o estado de sítio (art. 139, III). 2. Prisão: é a privação da liberdade de locomoção, determinada por ordem escrita da autoridade competente ou em caso de flagrante delito. Em face de nossa Constituição Federal, a regra geral é que a prisão deve ser sempre precedida de mandado judicial, salvo em caso de flagrante delito (art. 5º, LXI), transgressão militar ou crime propriamente militar 2 (art.5º, LXI), durante o estado de sítio (art. 139, II), sendo permitida, ainda, a recaptura sem mandado (art.684), vez que a prisão anterior era legal, por ter ocorrido uma das hipóteses legais. 3. Espécies de Prisão: dentre as várias espécies de prisões, temos: Prisão-pena ou prisão penal: é a que ocorre após o trânsito em julgado da sentença condenatória em que se impôs a pena privativa de liberdade. Tem finalidade repressiva. Conforme leciona Tourinho, trata-se de “sofrimento imposto pelo Estado ao infrator, em execução de uma sentença penal, como retribuição ao mal praticado, a fim de reintegrar a ordem jurídica injuriada” (Manual de Processo Penal, p. 498). No Brasil, a prisão-pena, dado ao princípio da presunção de inocência, somente é decorrente da sentença condenatória transitada em julgado. Prisão sem pena (prisão provisória) ou prisão processual: são todas aquelas que não resultem de decisão condenatória criminal irrecorrível. Essas prisões processuais têm natureza de medida cautelar, ou seja, são medidas adotadas visando resguardar o normal andamento do processo e a efetivação da sanção penal porventura aplicada, que podem ser afetadas por atos do réu que se mantém em liberdade. Como tem natureza cautelar, para ser decretada necessitam estar presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora. Estão incluídas entre estas: a) a prisão em flagrante, b) prisão preventiva, e c) a prisão temporária (Lei nº 7960/89). É de se notar que na seara penal todas as prisões ocorridas antes do advento do trânsito em julgado da decisão penal condenatória, como visto, não tem natureza de pena, devendo ser dotadas de cautelaridade (Edílson Mougenot Bonfim, Curso de Processo Penal, p. 398). Por cautelaridade se entenda a necessidade de resguardar a sociedade (cautelaridade social) ou o processo com a prisão do acusado (cautelaridade processual). Desta forma, por não se tratar de antecipação de penal, toda a prisão cautelar no Brasil, exige os requisitos para a decretação de uma medida cautelar, qual seja: fumus boni iuris e periculum in mora. Das Prisões Processuais em espécie Prisão em flagrante (Artigos 301 a 309 do Código de Processo Penal) 1. Conceito: Fernando Capez conceitua como “medida restritiva de liberdade, de natureza cautelar e processual, consistente na prisão, independente de ordem escrita do juiz competente, de quem é surpreendido cometendo, ou logo após ter cometido, um crime ou contravenção” (Curso de Processo Penal, p.217). 2. Espécies de flagrante: o Código de Processo Penal dispõe acerca de três situações que caracterizam o flagrante, enumeradas em ordem decrescente em relação à sua evidência 3 probatória. Assim, diante da redação do art. 302, temos o: a) flagrante próprio, b) flagrante impróprio, e c) quase flagrante e flagrante ficto ou presumido. Flagrante próprio: é também conhecido como propriamente dito, real ou verdadeiro. Ocorre quando o agente é surpreendido ao praticar os atos de execução do fato típico, ou seja, é surpreendido quando comete uma infração (art.302, I), bem como quando acaba de cometê-la (art. 302, II), sendo surpreendido, porém, no locus delicti ou nas suas cercanias e imediações, mas em imediata relação pessoal com o episódio, evidenciando desse modo a sua atualidade. Também se entende em flagrante delito próprio, porque está cometendo a infração penal, aquele que é surpreendido durante o protraimento do momento consumativo nos crimes permanentes (cf. art. 303, CPP). Tais situações recebem o nome de flagrante próprio ou real, porque existe imediatidade visual da prática da infração, havendo manifesta evidência probatória quanto ao fato típico e sua autoria. Flagrante impróprio: também conhecido como irreal ou quase-flagrante. Pela dicção da lei, temos que ele ocorre quando o agente é perseguido, logo após cometer o ilícito, em situação que faça presumir ser o autor da infração penal (art.302, III). Para Mirabete “deve- se entender que o ‘logo após’ do dispositivo é o tempo que corre entre a prática do delito e a colheita de informações a respeito da identificação do autor, que passa a ser imediatamente perseguido após essa rápida investigação procedida por policiais ou particulares” (Código de Processo Penal Anotado, p.353). Não quebra a continuidade a substituição ou alternância de perseguidores, desde que não haja interrupção da perseguição. Flagrante ficto ou presumido: trata-se da hipótese prevista no inciso IV do artigo 302 do Código de Processo Penal. Ocorre quando o indivíduo é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor da infração. A pessoa, agora, é encontrada, porém sem perseguição. Pode ser encontrada por mero acaso ou se porque foi procurada, estando em flagrante nas duas situações. O detido, entretanto, há de ser encontrado com objetos que façam presumir ter sido ele o autor da infração (pé de cabra, gazua, capuz, armas, documentos em branco ou adulterados). A doutrina tem entendido que “logo depois”comporta um lapso temporal maior que “logo após”. Neste sentido, é Mirabete que leciona: “embora essa expressão lexicamente seja sinônimo de ‘logo após’, tem se admitido que há uma situação de fato que admite um maior elastério ao juiz na apreciação da hipótese. Considerando-se o interesse na repressão dos crimes, há maior margem na discricionariedade da apreciação do elemento cronológico quando o agente é encontrado com objetos indicativos do crime, o que permite estender o prazo a várias horas ou, considerando-se o período do repouso noturno, até o dia seguinte” (Código de Processo Penal anotado, p. 354). 3. Legitimidade para a efetivação do flagrante: em se tratando do sujeito ativo do flagrante, temos que, conforme redação do artigo 301, qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. Há, pois, uma faculdade e uma regra. Temos assim, em relação à legitimidade, duas espécies de flagrante. 4 Flagrante facultativo: qualquer pessoa tem a faculdade de prender em flagrante delito quem seja encontrado em uma das situações de legitimidade fática do flagrante, possuindo igual faculdade, à evidência, a própria vítima ou ofendido, eis que a expressão qualquer do povo não lhe é excludente, mas compreensiva e abrangente. Flagrante compulsório ou necessário: tocante aos agentes policiais, a efetivação da prisão em flagrante constitui dever que por lei lhes é imposto (dever legal), de sorte que a omissão voluntária no cumprimento desse dever, além de sujeitar a autoridade omissa às sanções administrativas que couberem, poderá ainda implicar responsabilidade penal pelo delito de prevaricação (art. 319, CP). Recebe o nome de compulsório porque o agente é obrigado a efetuar a prisão, não possuindo discricionariedade ou conveniência para não o fazê-lo. É a regra em nosso ordenamento, sofrendo algumas exceções no caso do flagrante prorrogado ou retardado. 4. Outras classificações de flagrante: o flagrante forjado, o esperado, o preparado e o prorrogado: trata-se de 04 espécies diferentes, sendo elas: Flagrante Provocado ou Preparado: se dá quando o agente é induzido ardilosamente a praticar o fato. Não é válido em nosso ordenamento. Nota-se que neste caso, a autoridade policial ou seus agentes instigam a prática de um crime, de maneira que o delito somente é praticado diante desta atuação. Como, em regra geral, o agente que provocou o flagrante se cerca de cautelas para impedir a consumação da infração ou, então, se preparou para imediatamente, após sua prática, prender em flagrante o autor, tal crime se torna impossível (art. 17 do Código Penal), tendo o STF sumulado o seguinte entendimento: não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação (súmula 145). Flagrante Esperado: se dá quando se sabe previamente do crime e espera-se a conduta para o flagrante. Este é valido. Ocorre quando a polícia, informada da possibilidade de ocorrer uma infração penal, dirige-se até o local, aguardando a sua execução. Quando começada esta, os agentes policiais prendem em flagrante o autor, havendo aqui crime passível de persecução criminal. Flagrante Forjado (maquiado, urdido ou fabricado): é o flagrante inventado pelo sujeito ativo, que forja uma situação inexistente. Se dá quando a polícia ou terceiros forjam um quadro probatório com a única finalidade de enganar as autoridades competentes para a persecução ou julgamento no sentido de um crime em flagrante que não ocorreu, Ex.: um policial coloca droga no carro de uma pessoa e o prende em flagrante. Trata-se de prisão ilegal, sendo a conduta criminosa. Flagrante Prorrogado, retardado ou diferido: o Art. 2º, inciso II, da Lei n.º 9.034/95 (Lei do Crime Organizado) prevê que a autoridade policial pode adiar o flagrante para o momento mais oportuno. Neste caso, agentes policiais, quando surpreendem pessoas praticando infrações vinculadas a organizações criminosas, podem aguardar momento mais oportuno do ponto de vista da realização de provas e fornecimento de informações, para efetuarem as prisões. O mesmo se dá com o flagrante em tráfico de entorpecente (art. 53, 5 II, da Lei n.º 11.343/06. Trata-se de exceção a regra pela qual a Autoridade e seus agentes são obrigados a realizar o flagrante no momento em que ele ocorre. 5. Auto de prisão em flagrante: é a peça que corporifica e documenta o ato da captura e da prisão. Etapas: São as seguintes etapas do auto de prisão e flagrante: Fase de deliberação: ao receber o preso e a notitia criminis, a Autoridade deverá analisar estes, bem como os elementos que foram colhidos, com o escopo de se verificar ter ocorrido ou não infração penal e se se trata de hipóteses de flagrante delito. De fato, a prisão não obriga necessariamente a lavratura do autor, podendo a Autoridade restar não convencida da existência da infração penal ou de sua autoria, bem como por entender que não houve flagrância. Nesses casos, dispensará a lavratura do autor, podendo determinar primeiramente a instauração de inquérito policial para melhor apurar os fatos. Fase de Comunicação: caso decida lavrar o auto, deverá, primeiramente, a Autoridade comunicar o preso de seus direitos constitucionais, entre os quais da possibilidade de comunicar a prisão à sua família ou pessoa por ele indicada (art. 5º, nº LXIII, CF). A falta de expressa menção desta diligência invalida formalmente o auto, pois a exigência constitucional da comunicação referida foi posta como providência indeclinável e como condição da eficácia jurídica e validade dele. Sendo inválido, deve ser relaxado, pondo- se em liberdade o detido. Porém, a nulidade não se transmite à ação penal. Não se falará em nulidade, ainda, se a ausência de comunicação provier de falta de indicação do interessado. A assistência por advogado no momento da lavratura do auto supre a falta da comunicação à família do preso. Haverá relaxamento se houver omissão, por ocasião do interrogatório do detido no flagrante, da informação de ter o direito de permanecer calado (CF, art. 5º, LXIII). Fase de instrução: após a comunicação dos direitos constitucionais do detido e providenciadas as comunicações por ele requeridas, passa-se a instrução do auto de flagrante. Desse modo, primeiramente ouve-se o condutor (art. 304, CPP), que é a pessoa que conduziu o preso até a Autoridade. Após a colheita de sua assinatura é entregue uma cópia de seu termo de declaração, bem como recibo de entrega do preso. Após, passa-se à oitiva de pelo menos duas testemunhas, face à alusão, no plural, “a testemunhas”, inscrita no artigo 304, podendo o condutor, para se completar o mínimo legal, ser considerado como testemunha. Posteriormente, será ouvida a vítima, se houver. Nota-se que ouvidas as testemunhas e vítima são elas liberadas, logo após assinarem o termo. A oitiva do ofendido em seguida aos depoimentos testemunhais resulta de ordem que a prática consagrou, não havendo disposição legal neste sentido. Desse modo, a inversão nas oitivas de testemunhas e vítima não causa a qualquer irregularidade. Não havendo testemunhas (quer porque inexistam, quer porque não tenham ainda sido identificadas ou localizadas), sua falta não obstará a lavratura do flagrante, caso em que, face o artigo 304, § 2º, com o condutor deverão assinar o auto pelo menos duas pessoas que tenham assistido a apresentação do preso à Autoridade. São as chamadas testemunhas de apresentação. 6 Por derradeiro, deve ser interrogado o detido, alertando-se o para o direito que tem de permanecer calado. O interrogatório do conduzidoé um dos requisitos formais de validade do auto. Se irregular, nulo será o auto e, consequentemente, inválida a prisão em flagrante efetivada se o preso não for inquirido sobre o fato delituoso e suas circunstâncias. O interrogatório deverá ser sempre realizado, salvo quando sua efetivação é impossível dentro do prazo para a entrega da nota de culpa (art. 306), por uma circunstância insuperável e alheia à vontade da autoridade, que deverá ser consignada no auto. Se o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido a leitura na presença do acusado, do condutor e das testemunhas (art.304, § 3º). Encerrado o flagrante deverá, ainda, dentro do interstício de vinte e quatro horas depois de que foi lavrado, ser dada nota de culpa ao preso, com a menção dos dados previstos no artigo 306. A nota de culpa pode ser conceituada como o documento que o preso recebe, quando da prisão em flagrante delito, contendo a anotação do motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas, com a indicação da autoridade que o presidiu, que também o subscreverá. Fase de controle judicial e de defesa técnica: a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontra será comunicada ao juiz competente para que delibere a respeito da legalidade da prisão. Esta comunicação se dá através da remessa do auto de prisão em flagrante, dentro em 24h, acompanhado de todas as oitivas colhidas. Ademais, visando possibilitar a defesa técnica, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, será também remetida cópia integral dos autos para a Defensoria Pública. Também, a pedido do preso, será informado da prisão e do local onde se encontra o preso, os seus familiares ou pessoa por ele indicada. A prisão também é comunicada ao Ministério Público, que na qualidade de fiscal da lei, pode tomar as providências visando o restabelecimento da liberdade do flagrado ou, então, a conversão da prisão em flagrante em preventiva. 6. Prazo: não determina o CPP o prazo dentro do qual há de ser terminada a lavratura do auto de flagrante. Em princípio, deve ser lavrado tão logo seja o conduzido apresentado à autoridade. Porém, analisando o artigo 306 temos que a nota de culpa há de ser entregue ao preso dentro do interstício de vinte e quatro horas, e pressupondo esta entrega auto já lavrado, presume-se que, dentro do interregno declinado (24 horas), há de estar terminada a lavratura. 7. Encerramento: encerrado o auto de prisão em flagrante, deverão ser remetidas cópias dos autos ao Juiz, ao Defensor Público, caso não informado o nome do advogado e ao Ministério Público. 7.1 Providências que devem ser tomadas pelo Juiz ao receber a cópia da prisão em flagrante. De acordo com o artigo 310 do Código de Processo Penal, o juiz ao receber cópia do flagrante deverá de forma fundamentada, tomar uma das seguintes decisões: a) relaxar a prisão ilegal; 2) converter a prisão em flagrante em preventiva se presentes os requisitos do artigo 312 ou aplicar medida cautelar diversa da prisão, e III – conceder liberdade provisória. 7 7.1. O relaxamento da prisão. Constatando-se a ilegalidade da prisão em flagrante, por não haver situação de flagrância (CPP, art. 302), ou por não terem sido respeitadas as formalidades legais analisadas, deverá o juiz relaxar a prisão em flagrante (CF, art. 5, LXV e CPP, art. 310, I), sob pena de responder por abuso de autoridade (art.4. “d”, da Lei 4898/65). Assim, o relaxamento do flagrante é o remédio jurídico apropriado para combater o vício de forma ou de substância na prisão, inclusive na prisão em flagrante, sem acarretar, necessariamente, consequências no prosseguimento das investigações policiais. É dizer, mesmo sendo relaxada a prisão em flagrante, o inquérito policial terá prosseguimento para apuração da infração penal e respectiva autoria, salvo se houver determinar judicial em sentido contrário. Se o juiz não relaxar a prisão em flagrante, caberá ao interessado impetrar habeas corpus. Nada impede que o juiz, ao analisar o auto de prisão em flagrante, reconheça a necessidade de relaxamento e, não obstante, presentes os requisitos legais (CPP, art. 312), decrete a prisão preventiva do autuado. É dizer, na mesma decisão judicial fundamentada o juiz relaxa a prisão em flagrante e decreta a prisão preventiva do autuado que, por isso, não é colocado em liberdade. 7.2. As demais medidas previstas no artigo 310 do CPP Não sendo caso de relaxamento, deverá o juiz avaliar a efetiva necessidade de manter o indivíduo preso, sempre lembrando que a garantia constitucional é a de possibilitar ao indivíduo autuado em flagrante o direito de aguardar julgamento da causa em liberdade, desde que satisfeitos os requisitos da liberdade provisória (CF, art. 5°, LXVI). Assim, não sendo relaxada a prisão, deverá ser analisada a possibilidade de concessão da liberdade provisória, com ou sem fiança. Não sendo cabível a liberdade provisória, cumprirá ao juiz avaliar a o cabimento de aplicação das medidas cautelares diversas da prisão (CPP, arts. 319/320). Por fim, se a manutenção da prisão do autuado for efetivamente necessária, pela presença de um dos requisitos previstos no artigo 312 do CPP, o juiz deverá, em decisão fundamentada, converter a prisão em flagrante em prisão preventiva. Da prisão temporária (Lei n.º 7.960/89) 1. Conceito, finalidades e requisitos: é a prisão cautelar de natureza processual destinada a possibilitar as investigações a respeito de crimes graves, durante o inquérito policial. Hidejalma Muccio a conceitua lecionando: “Diz-se temporária a prisão provisória (ou prisão sem pena) praticada somente na fase pré-processual (inquérito policial), imprescindível para as investigações (esclarecimento da infração penal e colheita dos 8 elementos exigidos para a ação penal – indícios de autoria e prova da materialidade delitiva), dos crimes em lei especificados” (Curso de processo penal, vol. III, p. 636). É modalidade específica para o inquérito policial, permitindo a investigação de crimes considerados graves. Não existe prisão temporária no curso de ação penal (somente em inquérito). Assim, sua finalidade é permitir que a autoridade policial, diante da prática de um crime grave, não possuindo, ainda, elementos de prova que permitiriam a prisão preventiva, e na ausência de flagrante permaneça com o investigado à sua disposição, prive a liberdade do investigado, através de uma decisão judicial, visando, desse modo, proceder à coleta de elementos referentes à autoria e materialidade. Tem por base legal a Lei nº 7960/89, somente podendo ser decretada pela autoridade judiciária (nunca a autoridade policial). Assim, o juiz para decretá-la o faz atendendo a pedido do delegado de polícia ou do representante do Ministério Público, porém nunca de ofício (art. 2.º, caput). Isto porque o seu objetivo é facilitar a investigação policial, sendo que o Juiz deverá permanecer inerte, pois não sendo ele dominus litis, não há como aquilatar se a prisão se faz necessária ou não. Para ser decretada, a prisão temporária deverá se embasar nas situações previstas no art. 1º da Lei nº 7960/89, que são: Imprescindibilidade da medida para as investigações do inquérito policial: não se pode decretar a prisão sem qualquer razão, devendo ser levada a efeito somente quanto for absolutamente necessária às investigações. Indiciado não ter residência fixa ou deixar de fornecer dados necessários ao esclarecimento de sua identidade: tem por fim esclarecer a real identidadeda pessoa objeto das investigações, ou, então, impedir sua fuga, porquanto não tem ele qualquer ligação com o distrito da culpa ou outro qualquer. Existirem fundadas razões de autoria e participação nos seguintes crimes: 1) homicídio doloso (art.121, caput, e seu § 2); 2) seqüestro ou cárcere privado (art.148, caput, e seus parágrafos 1 e 2); 3) roubo (art.157, caput, e seus parágrafos 1, 2 e 3); 4) extorsão (art. 158, caput, e seus parágrafos 1 e 2); 5) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus parágrafos 1, 2 e 3); 6) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); 7) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); 8) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); 9) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1); 9 10) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com o art. 285); 11) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal; 12) genocídio (artigos 1, 2, e 3 da Lei n.º 2.889, de 01/10/1956), em qualquer de suas formas típicas; 13) tráfico de drogas (art. 12 da Lei número 6.368, de 21/10/1976); 14) crimes contra o sistema financeiro (Lei n.º 7.492, de 16/06/1986). Divergência na doutrina de ser necessário o preenchimento de um, dois ou os três requisitos. Amauri Reno do Prado e José Carlos Mascari Bonilha (Manual de Processo Penal, p. 204) e Mirabete entendem que a prisão pode ser decretada caso preencha apenas um dos requisitos, que são alternativos. Fernando Capez, ao seu turno, entende que somente poderá ser decretada nas hipóteses dos crimes mencionados na letra “c”, desde que presente um dos dois outros requisitos (Curso de Processo Penal, p.231). Este é o entendimento que prevalece, sendo que a investigação dos crimes gizados acima corresponderiam ao fumus boni iuris, e as hipóteses de imprescindibilidade da prisão para as investigações do inquérito e a não identificação do investigado ou a ausência dele possuir residência fixa, corresponderiam ao periculum in mora. 2. Prazo: pode ser decretada pelo prazo de até 05 dias, prorrogável por até igual período (art. 2.º, caput). Tratando-se de crimes hediondos ou equiparados a eles o prazo será de até 30 dias, prorrogáveis por mais até 30, em caso de comprovada e extrema necessidade (art. 2.º, § 4.º). Não se computa neste o prazo para encerramento da instrução. Caso expirado o prazo de prisão temporária se o juiz não prorrogá-la ou não decretar a preventiva, deve-se automaticamente colocar o preso em liberdade, sem a necessidade de um alvará de soltura, sob pena de ser enquadrado na Lei n.º 4.898/65 (abuso de autoridade). A prorrogação da prisão somente se dará em caso de extrema e comprovada necessidade, devendo ser também fundamentada, sob pena de nulidade da decisão e ocorrência de constrangimento ilegal. 3. Processamento: Postulantes: a prisão temporária pode ser decretada em face da representação da autoridade policial ou de requerimento do Ministério Público. Não pode ser decretada de ofício pelo Juiz. Nota-se que se tratando de representação da autoridade policial, deverá o Ministério Público se pronunciar. Decisão: o juiz tem o prazo de 24 horas para decidir, a partir do recebimento da representação ou requerimento, devendo a decisão ser fundamentada. Ao decretar a prisão, o juiz poderá determinar que o preso lhe seja apresentado, solicitando informações da autoridade policial ou submetê-lo a exame do corpo de delito Cumprimento: o mandado de prisão é expedido em duas vias, uma das quais deve ser entregue ao indiciado, servindo-se de nota de culpa. Efetuada a prisão, a autoridade policial deverá advertir o preso do direito constitucional de permanecer calado, bem como da 10 assistência de advogado e comunicação de algum familiar ou pessoa por ele indicada. O preso temporário deve permanecer separado dos demais detentos. Prazo: o prazo de até 05 ou até 30 dias pode ser prorrogado uma vez em caso de comprovada e extrema necessidade. Vencimento: decorrido o prazo legal, o preso deve ser colocado imediatamente em liberdade, a não ser que tenha sido decretada sua prisão preventiva, pois o atraso configura crime de abuso de autoridade. Plantão judiciário: todas as comarcas e seções judiciárias terão um plantão permanente de 24 horas, do Ministério Público e do Poder Judiciário, para a análise dos pedidos de prisão temporária. Prisão Preventiva (Artigos 311 ao 316 do Código de Processo Penal) 1. Conceito: Edílson Mougenot Bonfim conceitua como modalidade de prisão provisória, decretada pelo juiz a requerimento de qualquer das partes, por representação do delegado de polícia ou de ofício, em qualquer momento da persecução penal, para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal (Curso de Processo Penal, p. 416). 2. Pressupostos para a decretação: os pressupostos para a decretação da prisão preventiva se confundem com um dos requisitos para a concessão da tutela cautelar, que é o fumus boni iuris. Para a decretação da prisão preventiva, é necessário encontrar-se provada 1) a existência material da infração e 2) a existência de indícios de sua autoria. 3. Fundamentos para a decretação: os fundamentos se confundem com o periculum in mora, e são as hipóteses permitidas pelo ordenamento que a autorizam. Estão previstos no artigo 312, sendo eles: Garantia da ordem pública: a prisão é fundamentada com o de escopo de impedir que o agente solto continue a delinqüir, ou a de acautelar o meio social, garantindo a credibilidade da justiça, em crimes que provoquem o clamor popular. Nota-se que ordem pública, na lição de Vicente Grecco Filho, “não quer dizer interesse de muitas pessoas, mas interesse de segurança de bens juridicamente protegidos, ainda que de apenas um indivíduo” (Manual de Processo Penal, p.243). Decreta-se a prisão, pois há evidente perigo social em aguardar-se o provimento definitivo, pois solto, o réu continuará a cometer vários ilícitos. Autorizam a decretação da prisão preventiva os maus antecedentes e a reincidência, pois elas denotam evidência a provável prática de novos delitos. A comoção social gerada pela prática de um crime, que traz sensação de impunidade, justifica a decretação da prisão 11 para garantia da ordem pública. É de se observar que o clamor público, por si só, não gera o decreto de prisão, pois não se confunde com garantia da ordem pública. Conveniência da instrução criminal: visa impedir que o agente perturbe ou impeça a produção de provas, ameaçando testemunhas, apagando vestígios do crime, destruindo documentos, etc. Garantia de aplicação da lei penal: visa evitar a fuga do indiciado do distrito da culpa, que inviabilizaria futura execução da pena. Ocorrera esta hipótese sempre que razões plausíveis indicarem que o indiciado ou o acusado irá se furtar ao cumprimento da pena, caso seja condenado. Assim, será decretada com base neste fundamento, quando o réu não possuir residência fixa, não tiver ocupação lícita, etc. A fuga ou a escusa injustificada em atender o chamamento judicial, dificultando o andamento do processo, retardando ou tornando incerta a aplicação da pena, justificam, também, a prisão com base neste fundamento. Garantia da ordem econômica: incluído pelo art.86 da Lei nº 8884/94 (Lei Antitruste). Assemelha-se ao requisito garantia da ordem pública, podendo ser decretadaquando houver motivos que o crime praticado pelo réu cause perturbação à ordem econômica. Tratando-se de medida excepcional, a decretação da prisão preventiva nunca poderá ser decretada se ausente um destes pressupostos, mesmo que o crime seja de extrema gravidade. Também não se poderá decretá-la visando garantir a incolumidade física do acusado, porquanto tal situação constitui desvio de finalidade, pois cabe ao Estado providenciar a segurança com outras medidas. 4. Condições de admissibilidade (art. 313): somente será admitida a decretação da prisão preventiva: I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). II - se tiver sido condenado definitivamente por outro crime doloso, no prazo de 05 anos de reincidência; III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). Ademais, será também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. Não há prisão preventiva em contravenção penal, em crimes culposos (salvo de se não se identificar), nos crimes em que o réu se livra solto, independente de fiança. Não há prisão, também, se o réu agiu acobertado por alguma causa excludente de ilicitude (art.314). 12 5. Decretação e processamento da prisão preventiva: a prisão preventiva pode ser decretada em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, em virtude do requerimento do Ministério Público, representação da Autoridade Policial (neste caso, deverá ser ouvido o membro do Ministério Público), ou de ofício pelo Juiz. Cabe tanto na ação penal pública, como na ação penal privada, mas o assistente de acusação não pode requerê-la, pois seu interesse se resume à formação do título executivo judicial, com vistas à futura reparação do dano cível. Caso seja decretada a prisão preventiva durante o curso do inquérito policial, o inquérito policial deverá ser concluído em 10 dias (art. 10, “caput”, do CPP). Trata-se aqui de decretação da prisão sem término do inquérito. A decisão que decreta a prisão preventiva é irrecorrível, cabendo, caso há já constrangimento ilegal, habeas corpus. Nota-se que a prisão preventiva poderá, no curso do inquérito ou do processo, ser revogada, caso se verifique a falta ou a cessação do motivo que a ensejou. Da mesma forma poderá ser decretada novamente, tantas as vezes que forem necessárias, se sobrevierem razões que a justifiquem. 6. Fundamentação: o despacho que negar ou decretar a prisão preventiva será sempre fundamentado (art. 315), diante do princípio constitucional da motivação das decisões judiciais. Não tem validade e nem subsiste a decretação da prisão sem motivação. 7. Prazo: a decretação da prisão preventiva não se faz por prazo determinado, possuindo caráter rebus sic stantibus. Deste modo, enquanto os motivos que a ensejarem existirem, a prisão será mantida. Em isto não ocorrendo, será ela revogada. Entretanto, embora não tenha prazo determinado ela está limitada aos prazos estabelecidos para o término do processo. Liberdade Provisória (Artigos 321 a 350 do Código de Processo Penal) 1. Conceito: é um instituto processual que garante ao réu o direito de aguardar em liberdade o transcorrer de um processo até o seu trânsito em julgado, vinculado ou não a certas obrigações, podendo ser revogado a qualquer tempo diante do descumprimento das condições impostas. A liberdade provisória é o oposto da prisão provisória, pois permite ao réu ou ao indiciado permanecer ou ser posto em liberdade, ao contrário de estar preso durante a instrução do feito. Em regra geral, a liberdade provisória é o instituto que substitui a prisão em flagrante, sendo que ela perdura até que ocorra uma causa de extinção (quebra da fiança, por exemplo) ou até que transite em julgado a sentença. Se esta for condenatória, o réu dará início a execução da pena, não se falando mais em liberdade; ao reverso, se absolutória, a liberdade que era provisória se tornará definitiva. 2. Espécies: a liberdade provisória é, pela lei, concedida: 13 2.2.1. Com fiança – nos casos previstos nos artigos 322 a 349 do CPP. Aqui se inserem os denominados crimes afiançáveis. 2.2.2. Sem fiança (ou desonerada) e com vinculação, nos casos previstos nos artigos 310, parágrafo único, 310, III, c.c. 321 e 350 do CPP, quais sejam: a) Excludente de ilicitude (art. 310, p. único do CPP): a liberdade provisória tem lugar quando os elementos coligidos no auto de prisão em flagrante indicarem, extreme de dúvida, que o conduzido praticou o fato sobre o abrigo de uma das excludentes de ilicitude (CP, art. 23, I, II e III). A hipótese em estudo também se aplica aos casos de excludente de ilicitude previstos na parte especial do Código Penal (arts. 128, I e II; 142, I a III; 146, § 3º, 150, § 3º etc.). Neste caso, somente o juiz pode conceder liberdade provisória. A vinculação implica na sujeição do indiciado ou réu ao compromisso de comparecer sempre que chamado, a todos os atos processuais, sob pena de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, arroladas no artigo 319 do CPP, com a ressalva de que a fiança só poderá ser arbitrada se o crime praticado comportá-la. b) Indiciado ou réu pobre (art. 350, do CPP): também será o caso de concessão da liberdade provisória sem fiança e com vinculação quando o juiz, verificando a situação econômica do preso, concluir que ele não pode pagar a fiança. Pressupõe o caso, assim, ser o crime afiançável. Conforme disposto no artigo 350, p. único, se o beneficiado descumprir, sem motivo justo, qualquer das obrigações ou medidas impostas, o juiz poderá: 1) substituir a medida por outra; 2) impor outra ou outras em cumulação; ou, em último caso, 3) decretar a prisão preventiva. c) Ausência dos requisitos da prisão preventiva (CPP, art, 310, III e 321): também será o caso de concessão da liberdade provisória sem fiança quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a ausência de provas que autorizam a conversão da custódia em prisão preventiva. Se o juiz conceder a liberdade provisória nas hipóteses acima, poderá o acusador interposto recurso em sentido estrito (CPP, art. 581, V). Se o juiz negar a liberdade provisória, poderá ser impetrado habeas corpus, já que não há recurso específico (somente lembrando que o habeas corpus é ação autônoma de impugnação, e não recurso). 3. Liberdade provisória com fiança (art. 5º, LXVI, da Constituição Federal e artigos 322 a 350 do Código de Processo Penal). A fiança é um direito do acusado que lhe permite, mediante caução e o cumprimento de certas obrigações, conservar sua liberdade até a prolação de eventual sentença condenatória irrecorrível. É denominada de liberdade provisória mediante fiança ou liberdade provisória vinculada, com garantia. 3.1. Conceito: fiança, para o legislador processual penal, é uma garantia real de cumprimento das obrigações processuais do réu. Diz-se garantia real porque tem por objeto dinheiro e coisas (CPP, art. 330). Sua finalidade é substituir a prisão provisória, manter o imputado vinculado ao distrito da culpa, compelindo-o ao cumprimentodas obrigações previstas nos artigos 327 e 329 do CPP, dentre elas o comparecimento a todos os atos do 14 processo, e Assegurar, no caso de condenação, o pagamento das custas processuais, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa. 3.2. Hipóteses de inafiançabilidade: para o legislador não será concedida a fiança: a) CPP, art. 323, I, CPP: nos crimes de racismo. b) CPP, art. 323, II, do CPP: nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos. c) CPP, art. 323, III: nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito. d) CPP, art. 324, I, do CPP: aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os artigos 327 e 328 do CPP. A quebra da fiança ocorre nas hipóteses do artigo 341 do CPP, dentre elas o não comparecimento deliberado do réu a ato processual para o qual fora devidamente notificado. e) CPP, art. 324, II: em caso de prisão civil (devedor de alimentos) ou militar. f) CPP, art. 324, IV: quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312). g) Art. 31 da Lei 7.492/86: crimes contra o sistema financeiro nacional, tratados na Lei n° 7.492/86 (art. 31); h) Art. 34 da Lei 5197/67: crimes contra a fauna. i) Art. 7º da Lei 9034/95: crime organizado. 3.3 A fixação da fiança. 3.1. Competência para fixá-la: a) O Delegado de Polícia somente pode conceder fiança na fase de inquérito policial e nas infrações penais punidas com pena privativa de liberdade máxima não superior a 4 (quatro) anos (CPP, art. 322, caput). Normalmente o Delegado de Polícia arbitra a fiança logo após a lavratura do flagrante. Note-se que somente na hipótese de prisão em flagrante é que se possibilita à autoridade policial a concessão da fiança. b) Juiz de Direito. Fora das hipóteses descritas no artigo 322, caput, somente o Juiz de Direito é que poderá fixar a fiança, ainda que a persecução criminal esteja na fase policial (CPP, art. 322, parágrafo único). O juiz pode conceder fiança tanto na fase policial como durante a instrução criminal. De qualquer forma, uma vez instaurado o processo, somente o juiz é que poderá fixar a fiança. Se o processo estiver no Tribunal, caberá ao relator arbitrar a fiança. Observações: 1ª - Tanto o Delegado de Polícia quanto o Juiz de Direito podem e devem fixar fiança de ofício quando cabível, sendo certo que somente a autoridade competente é que poderá agir (CPP, art. 332). 2ª - Se o Delegado de Polícia se recusar ou demorar para decidir sobre a fixação da fiança, o preso ou alguém por ele deverá requerer a concessão da fiança ao Juiz de Direito, que decidirá em 48 horas (CPP, art. 335). 15 E se a recusa ou a demora for do juiz, a medida mais eficaz será o habeas corpus, impetrável perante o Tribunal competente. No caso de recusa, poderá, também, ser interposto recurso em sentido estrito (CPP, art. 581, V). 3ª - O Ministério Público é ouvido, tendo vista do processo após o arbitramento e o pagamento da fiança, “a fim de requerer o que julgar conveniente” (CPP, art. 333), atuando como fiscal da lei, devendo atentar para a regularidade ou não da medida. 4ª - Fixado o valor da fiança, o preso ou qualquer pessoa poderá pagá-la (art. 335). 3.2. Oportunidade para fixação da fiança. A fiança poderá ser prestada em qualquer fase da persecução criminal (durante o inquérito ou processo), “enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória” (CPP, art. 334). 3.3. Valores (CPP, art. 325): se a finalidade da fiança é substituir a prisão provisória e, havendo condenação, o valor será destinado ao pagamento das despesas processuais, eventual multa e satisfação do dano ex delicto, precisa ser devidamente dosada, sob pena de transmudar-se em providência ridícula e ineficaz. O artigo 325 do CPP, considerando a pena máxima em abstrato, fixa limites mínimo e máximo para o valor da fiança. a) Será de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos, quando se tratar de infração cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a 4 anos. b) Será de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários mínimos, quando o máximo da pena privativa de liberdade cominada for superior a 4 anos. Observações: 1ª – Considerando a situação econômica do preso, o art. 325, §1º prevê as seguintes possibilidades: Dispensa do pagamento da fiança, quando o indiciado ou réu for pobre – art. 350. Redução do valor até o máximo de 2/3. Assim, o mínimo da fiança será de 1/3 do salário mínimo. Aumento do valor fixado em até 1.000 (mil) vezes. Logo, o valor máximo da fiança será de 200.000 salários mínimos. 2ª - Em qualquer caso, não poderá a autoridade fixar um valor incompatível com a situação econômica do preso, o que equivale ao indeferimento do pedido. 3.4. Obrigações do afiançado. Quando da lavratura do termo de fiança, deverão o preso e a pessoa que prestar fiança, se for o caso, ser cientificados dos ônus processuais a que ficará sujeito o afiançado, nos termos do parágrafo único do art. 329. As obrigações a que se subordina o afiançado estão nos artigos 327 e 328 do CPP. O descumprimento injustificado das obrigações acarreta a quebra da fiança (CPP, art. 341). Contudo, basta que o juiz se convença de que o beneficiário, embora não seguisse à risca as prescrições legais, não quis, por exemplo, furtar-se à obrigação de ficar a disposição da justiça, para relevar a falta. 3.5. Destino da fiança (CPP, arts. 336 e 337): a) Réu condenado: pagamento das custas, indenização e eventual multa imposta. Se houver sobra, o valor será devolvido ao sentenciado ou a quem a prestou (CPP, art. 336, caput). b) Réu absolvido: valor devolvido 16 sem desconto (CPP, art. 337); c) Inquérito policial arquivado: o valor da fiança será devolvido integralmente, ante a perda do objeto. Mas julgada quebrada a fiança antes da decisão de arquivamento, apenas metade de seu valor será restituído, uma vez que a outra metade é julgada perdida pelo não cum DA PROVA Teoria Geral da Prova (Artigos 155 a 157 do Código de Processo Penal) 1. Introdução: para que o juiz declare a existência da responsabilidade criminal e consequentemente imponha uma sanção penal, mister se faz com que adquira a certeza acerca da ocorrência do ato criminoso, bem como de sua autoria, chegando o mais próximo da verdade real dos fatos. Necessário, portanto, que dentro do processo penal haja uma reconstrução histórica de como os fatos ocorreram no mundo fenomênico a fim de que seja prestada uma tutela jurisdicional adequada. Visando chegar a esta verdade, existe uma fase processual própria, que é a instrução, oportunidade na qual as partes procuraram demonstrar ao Juiz, a veracidade de suas alegações. Neste momento, se produzem elementos no processo que possam sustentar e fornecer elementos para que o juiz possa proferir uma decisão acerca da questão que as partes discutem em um processo, chegando-se a uma definição. Esta demonstração, que deve gerar no juiz a sua convicção, é o que chamamos de prova. Atos de instrução são, portanto, àqueles destinados a recolher os elementos necessários para a decisão da lide. A produção desses elementos é o que chama de atos de instrução. 2. Conceito e finalidade: provar consiste em tudo aquilo que seja possível atestar, garantir ou demonstrar algo existente ou não; um fato, uma autoria, uma circunstância juridicamente relevante, etc. Ainda, provar, é evidenciar, comprovar a autenticidade, falsidade deum documento. A finalidade é comprovar a veracidade do que foi objeto de alegação; convencer o magistrado da verdade dos fatos que estão sob sua análise, propiciando a formação de sua convicção. 3. Objeto da prova: é o que se deve demonstrar, ou seja, aquilo sobre o que o juiz deve adquirir o conhecimento necessário para resolver o litígio. É certo que o processo penal visa o alcance da verdade real, assim, o objeto da prova não é tão-somente aquilo que as partes trazem aos autos, mas sim todos os fatos importantes para o deslinde da causa. Desse modo, a prova visa demonstrar a falsidade ou veracidade dos fatos alegados pelas partes, bem como trazer ao juiz os elementos necessários para que ele dê embasamento em sua decisão. Ademais, no processo penal não existe a figura do fato incontroverso, como ocorre no processo civil, pois aquele se orienta pela busca da verdade real, também chamada de 17 verdade material ou substancial, e não pela verdade formal, devendo todos os fatos serem comprovados, ainda que as partes deles não divirjam. Somente não precisam ser provados os fatos públicos e notórios, os axiomáticos e os presumidos. 4. Meios de Prova: são as coisas ou ações utilizadas para pesquisar ou demonstrar a verdade. São as fontes probatórias, ou seja, os meios pelos quais o magistrado recebe os elementos de prova. Como no processo penal pátrio vige o princípio da verdade real, não há limitação aos meios de prova, sendo que o art. 332 do CPC, aplicado aqui analogicamente, dispõe que: todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste código, são meios hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa. As partes podem utilizar os meios de prova com grande liberdade. Destarte, a investigação deve ser mais ampla possível, podendo ser obtidas provas com a utilização de quaisquer meios técnicos ou científicos, como fotos, exames de D.N.A., gravações, desde que obtidas de maneira lícita. Porém, o princípio da liberdade probatória não é absoluto, tanto que o art. 155, parágrafo único, do CPP dispõe que “somente quanto ao estado das pessoas, serão observadas as restrições à prova estabelecidas na lei civil.” Por estado de pessoas, entendam-se as questões relativas a nascimento, casamento, filiação, cidadania etc. Deste modo, a filiação deve ser provada com certidão de nascimento, o casamento com a certidão correspondente. No processo penal, a título de exemplos, a existência da morte do réu deve ser provada por certidão de óbito; a existência da violência presumida por menoridade nos crimes contra a liberdade sexual (art. 224, a, do Código Penal), deve ser provada através da certidão de nascimento ou documento equivalente da vítima etc. Também não são admitidas no processo penal as chamadas provas proibidas, abrangendo aí, as ilícitas e as ilegítimas, consideradas ilegais por violações ao ordenamento jurídico. 5. Provas inadmissíveis: em face da necessidade da busca da verdade real, temos que os meios de prova não se esgotam nos arts. 158 a 250 do CPP. A previsão existente não é exaustiva, mas exemplificativa, sendo permitida as chamadas provas inominadas, ou seja, aquelas não previstas expressamente na legislação. Contudo, a Constituição Federal determina que a prova é proibida quando contrariar as normas legais ou os princípios processuais ou materiais. Desta forma não serão admitidas as provas que forem obtidas com a violação da intimidade, vida privada e honra, como disciplina o art. 5º, X, da Constituição de 1988; com a violação do domicílio (exceto nos casos previstos no art. 5º, XI, CF); com a violação de correspondência e telefonemas não autorizado (art. 5º, XII, CF); e outros meios ilícitos, como a confissão mediante tortura, a violação do sigilo profissional etc. Assim, todas as provas que contrariarem o respeito ao direito de defesa e à dignidade humana, bem como cuja obtenção viole o direito, além das provas sobrenaturais, não são admitidas. 18 O CPP, repetindo a norma constitucional, dispôs em seu artigo 157: São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação as normas constitucionais e legais. As provas ilegais ou proibidas são espécies das chamadas provas vedadas, conceituadas como aquelas feitas em contrariedade a preceito legal específico, seja este de natureza material ou processual. No que tange às vedadas, existem as ilícitas e as ilegítimas. É bom lembrar que as ilícitas são aquelas que ofendem normas de direito constitucional ou material, isto é, ilícito penal, civil ou administrativo, exemplo, interceptação telefônica sem autorização judicial etc. Tais provas, se produzidas, não possuem qualquer eficácia, devem ser retiradas dos autos e, também, destruídas. Já as ilegítimas, dizem respeito à desobediência às normas de natureza processual. Estas se produzidas não produzem efeitos, sendo nulas. Porém, nada impedem que sejam reproduzidas novamente, desde que sejam obedecidas as regras processuais pertinentes. Importante ressaltar que também se encontra proibida a prova ilegal por derivação, sendo que o CPP, adotou a tese consagrada pelo STF, consagrada pelo direito americano na expressão fruits of the poisonous tree (frutos da árvore envenenada), que implica nulidade das provas subseqüentes obtidas com fundamento na original ilícita. A teoria dos frutos da arvore envenenada aborda a questão das provas ilícitas por derivação, que são aquelas que foram colhidas através de informação ilicitamente obtida. Para melhor entendimento, registre-se aqui a lição de Nestor Távora e Rosmar Antonni: Por esta teoria, de origem da Suprema Corte Norte Americana, a prova ilícita produzida (árvore), tem o condão de contaminar todas as provas dela decorrentes (frutos). Assim, diante de uma confissão obtida mediante tortura, prova embrionariamente ilícita, cujas informações deram margem a uma busca e apreensão formalmente íntegra, é imperioso reconhecer que esta busca e apreensão esteja contaminada, pois decorreu de uma prova ilícita. Existindo prova ilícita, as demais provas dela derivadas, mesmo que formalmente perfeitas, estarão maculadas no seu nascedouro (Curso de Direito Processual Penal, p. 305, Ed. Podivm). Com a promulgação da Lei nº 11.690/2008, a aplicação da teoria dos frutos da árvore envenenada vem prevista no artigo art. 157, § § 1.º: São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. Assim, prova ilícita por derivação são aquelas produzidas com nexo de causalidade com uma prova ilícita primária. Estas também serão consideradas ilícitas. Entretanto, não demonstrado o nexo de causalidade, ou então, quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras, tais provas serão aceitas no processo. Nota-se, assim, que a teoria dos frutos da árvore envenenada não é absoluta, pois se existirem provas outras no processo, independentes de uma determinada prova ilícita produzida, não há de se falar em contaminação, nem de aplicação da teoria dos frutos da árvore envenenada. Prova absolutamente independente é chamada pelo direito americano de 19 teoria da independent source limitation, pela qual não havendo vínculo entre as provas, não há de se falar que uma contamina a outra. Por fonte independente, considera-se aquelaque por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova (art.155, § 2.º). Outra teoria também adotada que mitiga os efeitos da teoria da árvore envenenada é o descoberta inevitável (inevitable discovery limitation), pela qual se a prova que circunstancialmente decorre da prova ilícita seria descoberta de qualquer maneira, por atos de investigação válidos, ela poderá ser aproveitada, eliminando-se a contaminação. Isto se dá porque a inevitabilidade da descoberta leva ao reconhecimento de que não há proveito real com a violação legal. Ex: não há como se reconhecer a nulidade por ilicitude das declarações de uma testemunha descoberta por interceptação telefônica, se ela já fora indicada por várias outras pessoas como testemunhas do caso; uma cópia do documento foi apreendida sem mandado judicial para ingresso na residência, enquanto o verdadeiro foi apreendido na residência com mandado judicial etc. Uma vez decidida que a prova é ilícita, não havendo mais recursos contra tal decisão, ela será inutilizada por decisão do juiz, devendo ser desentranhada dos autos (art. 155, § 3.º). Princípio da Proporcionalidade e a Prova Ilícita Em se tratando de prova ilícita, um dos princípios que se tem aplicado em relação ao tema é o da proporcionalidade. Esta teoria surgiu na Alemanha, e ganhou espaço significativo na Suprema Corte Americana, onde é chamado de princípio da razoabilidade. Para sua compreensão, deve-se entender que a Constituição Federal contém uma série de princípios, que embora aparentemente colidentes, devem conviver em um ambiente sem que um anule o outro. Para tanto, o jurista ao verificar que dois princípios aparentemente se colidem, deve utilizar do princípio da proporcionalidade para que, ao interpretar o mundo fenomênico o, verifique quais deles preponderará no caso concreto. Assim, se no caso concreto, a violação de uma regra que tornaria a prova ilícita se deu para salvaguardar um interesse muito maior do que a regra violada pretendia atingir, poderá, pela aplicação do princípio da proporcionalidade, se aceitar a prova. Apesar da teoria dominante não admitir as provas ilícitas, alguns a aceitam em função da proporcionalidade e equilíbrio nos casos graves, atenuando esta rigidez da teoria dominante. Porém, mesmo aqueles que acolhem esta teoria concordam que esta só deve ser aceita quando, se inadmitida a prova ilícita, pudesse causar resultado desproporcional ao pretendido. Em suma, devem ser sopesados os valores atingidos ou ameaçados pela conduta ilícita em face dos valores violados pela produção da prova ilícita. Deste modo, em um caso de crime de homicídio, cuja a proteção penal é a vida, pode ser utilizada a prova obtida mediante interceptação telefônica, cuja a proibição é proteger as comunicações telefônicas. 20 Quando a prova colhida for pro reo, teremos a aplicação da teoria da proporcionalidade na defesa, havendo um confronto entre a proibição pela ilicitude da prova e o direito à ampla defesa, e sendo assim o princípio constitucional do direito de defesa sobrepõe-se. Além do que se a prova tiver sido colhida pelo próprio acusado exclui-se a antijuridicidade em favor da legítima defesa. Calha aqui à lição de Antônio Alberto Machado: A regra geral é a completa vedação do uso das chamadas provas ilícitas. À luz da CF, não podem ser autorizadas pelo juiz nem podem permanecer nos autos caso já tenham sido produzidas. Todavia, não obstante a clareza e a ênfase com que a Lei Maior veda as provas ilícitas, o fato é que a doutrina a jurisprudência tem a admitido, em nome do princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, o uso desse tipo de prova em função dos valores que possam estar em jogo na apuração do fato criminoso... E que não seria justo nem razoável pretender a condenação do acusado depois que a prova, mesmo ilícita, houvesse evidenciado a sua inocência. A condenação do inocente, no fundo, seria outra forma de ilicitude, tão ou mais grave do que aquela resultante da prova ilegal (Curso de Processo Penal, p. 371). Nota-se que já há precedente no STF de utilização de tal princípio quando a prova ilícita favorecer a acusação, que admitiu a validade tanto de escuta quanto de gravação de conversa telefônica ou pessoal, desde que haja uma excludente de ilicitude (legítima defesa, p. ex.). Em tais casos, o STF tem considerado lícita a prova resultante da gravação e, portanto, tem afastado a regra do art. 5º, LVI, da Constituição, admitindo o uso de tal prova pela acusação. Nesse sentido, em caso de escuta telefônica, o Tribunal decidiu no HC 74.678-SP(17), relatado pelo Min. Moreira Alves, em acórdão assim ementado: "‘Habeas corpus’. Utilização de gravação de conversa telefônica feita por terceiro com a autorização de um dos interlocutores sem o conhecimento do outro quando há, para essa utilização, excludente da antijuridicidade. (...) Afastada a ilicitude de tal conduta – a de, por legítima defesa, fazer gravar e divulgar conversa telefônica ainda que não haja o conhecimento do terceiro que está praticando crime -, é ela, por via de conseqüência, lícita e, também conseqüentemente, essa gravação não pode ser tida como prova ilícita, para invocar-se o artigo5º, LVI, da Constituição com fundamento em que houve violação da intimidade (art. 5º, X, da Carta Magna). (...) Habeas corpus indeferido." Essa decisão foi corroborada por várias outras, em casos de gravação telefônica(18): HC 75.338-RJ, Rel. Min. Nelson Jobim, RTJ 167/206 e RT 759/507, e Agravo de Instrumento 232.123 (AgRg)-SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, RTJ 168/1022. Em casos de escuta telefônica: HC 75.261-MG, Rel. Min. Octavio Gallotti, RTJ 163/759. E também em casos de escuta ambiental: RE 212.081, Rel. Min. Octavio Gallotti, Informativo do STF nº 104. 6. Ônus da prova: ou ônus probandi pode ser conceituada como a faculdade/encargo que tem a parte de demonstrar no processo a real ocorrência de um fato que alegou em seu interesse, o qual é relevante para o julgamento. O ônus probatório, portanto, representa um encargo que tem a parte de provar as suas alegações, buscando criar no juiz a convicção 21 acerca de sua veracidade (Edílson Mougenot Bonfim, Curso de Processo Penal, p.325). Tal ônus vem distribuído dentro do processo penal. De fato, a primeira parte do art.156, dispõe que “a prova da alegação incumbirá a quem o fizer”. Há uma paridade entre autor e réu, pois se distribui o ônus da prova entre as partes. Caberá ao autor (Ministério Público ou querelante) fazer prova do fato e da autoria, bem como de circunstâncias que causam o aumento da pena, além do elemento subjetivo do tipo (dolo ou culpa). Já ao réu caberá prova das causas excludentes de ilicitude, culpabilidade e da punibilidade, bem como causas que autorizem a diminuição da pena. Cabe ao réu, ainda, prova da inexistência do fato, se quiser ser absolvido com fulcro no art. 386, I. Como pela nossa Constituição Federal a inocência é presumida, cabe a acusação provar a culpa do réu, sendo que haverá absolvição no caso de restar dúvida. A responsabilidade probatória é, portanto, integralmente conferida a acusação, posto que a dúvida milita em favor do acusado. Nota-se, ademais, que demonstrando a acusação de forma eficiente todos os elementos a ensejar uma condenação, de forma transversa, estará demonstrando a inexistência de causas excludente de ilicitude e de culpabilidade. Deste modo, é de se firmar, que na dúvida o acusado é presumido inocente. Isto implica que, alegandoa defesa alguma excludente, embora não reste devidamente comprovada, existindo dúvidas com relação à sua ocorrência, a interpretação deve ser feita em favor do réu, ou seja, acolhendo-a. Ressalte-se, ademais, que o acusado não é obrigado produzir prova contra si, razão pela qual qualquer prova que foi demandada pelo juiz, e que implique prejuízo para sua defesa, pode ser negada, como por exemplo, a realização de exame grafotécnico. Por outro lado, o fato de o ônus da prova sobre determinado acontecimento alegado pelo acusado lhe incumbir, não implica que acusação está desonerada de provar a autoria e a materialidade do delito. Pelo contrário, este deve vir sempre comprovado, pois a mera dúvida implica na absolvição. Ao acusado somente caberá aprovada o fato que alegou. Não obstante, a regra do ônus da prova não é absoluta, sendo que o próprio artigo 156, sem seu inciso II, dispõe que ao juiz é facultado determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante. Isto é possível porquanto se busca no processo penal a verdade real. Deste modo, embora o juiz não deva assumir o papel de acusador ou defensor, permite a lei que, em casos de dúvidas, procure esclarecê-la, determinando-se a realização de diligências. A prova, em si, não é uma obrigação processual, todavia perfaz-se num ônus, sendo certo que não cumprido este, haverá apenas um risco, de quem não atender, perder a causa. 7. Procedimento Probatório: é o andamento dos atos processuais referentes à prova. Trata-se do conjunto de todas as atividades levadas a efeito no processo, para a prática das provas. Existem 04 momentos de andamento da prova: Proposição: é o instante em que as provas são solicitadas ou requeridas. O momento em que as partes indicam as provas que serão produzidas judicialmente. Para a acusação, 22 temos que a proposição de provas se dá na fase do oferecimento da inicial (denúncia ou queixa-crime). Para a defesa, na fase da resposta à acusação. No procedimento comum ordinário, pode se dar o requerimento na fase das diligências complementares (art. 402). Admissão: quando as provas são deferidas pelo julgador, no tocante às feituras ou produções. Podem ser admitidas tanto as provas nominadas (expressamente previstas em lei), como as inominadas (não previstas em lei). Produção: é o instante em que as provas são realizadas, produzidas e introduzidas no processo. Em regra geral, as provas são produzidas na instrução probatória. A Lei nº 11.719/08 introduziu o princípio da concentração, adotado no processo civil, pelo qual todas as provas devem ser produzidas em uma única audiência de instrução de julgamento, prevista no artigo 400, do Código de Processo Penal. Exceção ao principio da concentração está previsto no artigo 156, I, do Código de Processo Penal, pelo qual o juiz poderá ordenar, de ofício, a produção de provas consideradas urgentes e relevantes mesmo antes de iniciada a ação penal. Ressalte-se, contudo, que é de constitucionalidade duvidosa tal mudança trazida pela Lei nº 11.690/08, uma vez que confere verdadeiro poder inquisitivo ao magistrado, que pode determinar a produção de prova mesmo antes de existir uma ação penal. Valoração: é o momento da apreciação das provas pelo juiz, isto é, o exame, a análise, a comparação e o grau de convencimento das mesmas. A valoração, em regra geral, é feita pelo juiz quando o julgamento, ou, ainda, quando da necessidade de prolação de alguma decisão. 8. Sistemas de apreciação das provas: a maneira de avaliar a prova produzida variou em nossa história e na evolução do direito como ciência. De fato, o sistema de apreciação de provas evoluiu juntamente com a justiça penal, que deixou de ser um instrumento de arbítrio, para um sistema de proteção contra ele. Ao longo da história o processo penal conheceu várias formas de valoração da prova, que se amoldavam aos vários e diferentes costumes sociais então vigentes. No início se adotou o sistema étnico/pagão, deixando a apreciação das provas ao sabor das impressões do juiz, que as aferia de acordo com sua própria experiência, num sistema empírico. Após, veio o sistema religioso, em que se invocava o julgamento divino, através das ordálias, dos duelos judiciários e dos juízos de Deus. Este sistema era fulcrado na crença de que Deus intercedia no julgamento, demonstrando a inocência de quem conseguisse superar a prova imposta. Estes dois sistemas, nos Estados democráticos, não vigem mais, sendo que atualmente, temos os seguintes sistemas existentes ainda no mundo: Da prova legal, da certeza moral do legislador ou da prova tarifada: por esse sistema o julgador não tem liberdade para apreciar as provas. É a própria lei que determina sua valoração. Cabe ao julgador apenas desenvolver o seu mister aplicando a lei, pois esta estabelece, com precisão, o valor de cada prova. Existe hierarquia entre as provas, de modo a não ficar nenhuma liberdade de apreciação. Assim, é a lei quem determina ao juiz quais as provas são capazes de levar à convicção e quais outras são inidôneas para tanto. A intenção de tal sistema era evitar o autoritarismo do juiz e a discrepância dos julgamentos, pois o julgador não tinha qualquer liberdade na apreciação da prova, que era pré-valorada pela 23 legislação. Recebe também o nome de sistema tarifário, pois a lei já estabelece o valor de cada prova. Da certeza moral do juiz ou da íntima convicção: por este sistema a lei confere ao julgador ampla liberdade para decidir, não tendo necessidade de fundamentação. É o sistema contrário ao da prova legal. A admissibilidade das provas, sua avaliação e seu carreamento para os autos são deixados à discrição do juiz. É ele quem vai julgar, razão pela qual ele admite, de acordo com sua consciência, qualquer prova, não precisando fundamentar a sentença. A lei nada diz acerca do valor das provas e a decisão funda-se exclusivamente na certeza moral do juiz. É adotado este sistema no Brasil no Tribunal do Júri, destacando-se, porém, que como já visto, no ordenamento pátrio não são todas as provas que podem ser produzidas. Da livre convicção, da verdade real, do livre convencimento ou da persuasão racional: há liberdade atribuída ao julgador para a apreciação das provas, que não possuem critérios de valoração (todas as provas têm valor relativo). A lei, contudo, exige que o julgador fundamente suas decisões e só considere as provas contidas nos autos, não se admitindo ilações ou conjecturas (quod non est in actis non est mundo). Para melhor compreensão, traz-se aqui a lição de José Frederico Marques: “A regra da livre convicção não desvincula o juiz das provas dos autos: quod non este in actis non est in mundo. No entanto, a apreciação dessas provas não fica dependendo de critérios legais discriminados a priori. O juiz só decide com a prova dos autos, mas avaliando-as segundo o critério da crítica sã e racional” (Elementos de Direito Processual Penal, vol.II, p.275). É o adotado por nosso ordenamento jurídico para as decisões exaradas pelos juízos togados. A motivação das decisões judiciais é obrigação constitucional (art.93, IX, da CF). De modo geral, é considerado o melhor sistema, pois no escólio de Edílson Mougenot Bonfim: O sistema da persuação racional é uma maneira de garantir flexibilidade aos julgamentos, evitando-se situações manifestamente injustas ensejadas pela adoção cega do sistema da prova legal, sem, por outro lado, recair no excessivo arbítrio concedido aos juízes pelo sistema do livreconvencimento absoluto, permitindo um controle objetivo sobre a legalidade de suas decisões (op. cit., p.324). 9. Princípios Gerais da Prova: Dentre os princípios gerais da prova podemos destacar: Principio da Busca da Verdade Real: por ele o juiz não pode se contentar com a mera verdade formal, que é aquela verdade levada os autos pelas partes, ainda que não corresponda à realidade. O magistrado deve buscar sempre a obtenção da realidade, através da reconstrução histórica dos fatos noticiados, não podendo tomar por verdadeiros sequer os fatos incontroversos. Princípio da não incriminação: por este princípio o acusado não pode ser obrigado a produzir prova contra si mesmo. Se encontra lastreado no princípio constitucional do direito ao silêncio, cujo conteúdo é a não produção de provas em favor de sua incriminação. Por ele, o silêncio do acusado não pode ser interpretado contra si; não é ele obrigado a se submeter a exame de sangue; de bafômetro etc. 24 Princípio da autoresponsabilidade das partes: as partes litigantes assumem os riscos e as conseqüências de seus procedimentos e, para vencer a demanda, têm que provar suas alegações. Outrossim, respondem pelas omissões, negligências ou erros intencionais. Princípio da audiência contraditória: toda a prova produzida por uma das partes deverá ser levada ao conhecimento da parte adversa, para que esta conheça o seu conteúdo, bem como tenha a oportunidade de impugná-la. Toda prova, pois, gera o direito a contraprova. Princípio da aquisição ou comunhão da prova: a prova é propriedade do processo e não de uma das partes. A prova produzida e existente nos autos serve a ambos os litigantes e ao interesse da justiça. Princípio da publicidade: as provas devem ser produzidas publicamente, com livre acesso das partes e de terceiros, preservando, com isto, a regularidade dos trabalhos. Nota- se, porém, que existem exceções visando o bom andamento do feito. Princípio do livre convencimento motivado: não há valor pré-fixado para as provas, sendo que o julgador, motivando sua decisão, aprecia com liberdade as provas que são produzidas e lhes dá o devido e adequado valor. Busca e Apreensão (Artigos 240 a 250 do Código de Processo Penal) 1. Introdução: Com o escopo de se evitar o perdimento das provas real e oral, o CPP traz uma providência acautelatória, consubstanciada na busca e apreensão. Trata-se de uma medida cautelar cuja finalidade é evitar que desapareçam as provas do crime, o que tornaria impossível ou problemático o seu aproveitamento. A busca é uma medida acautelatória, liminar, destinada a encontrar a pessoa ou coisa que se procura. Já a apreensão é medida que a ela se segue. Desde que encontrada a coisa ou a pessoa, ela será apreendida. Importante observar que embora estejam imbricados, a busca e a apreensão são institutos distintos, pois pode haver busca sem apreensão, quando, por exemplo, o sujeito ou objeto não é encontrado; ou apreensão sem busca, na hipótese em que um objeto é entregue a Autoridade Policial que não estava a sua procura. Pelo CPP, a diligência da busca e apreensão trata-se de meio de prova, de natureza acautelatória e coercitiva, consubstanciada no apossamento de elementos instrutórios relacionados com objetos, pessoas ou vestígios. 2. Finalidade: o fim da busca e apreensão é apreender objetos e pessoas necessárias a prova da infração ou que tenham interesse criminal. 3. Sujeitos: podem ser ativo e passivo. Ativo: é quem pode realizar a busca e apreensão. Tal diligência poderá ser feita pela Autoridade Judiciária, bem como pela Autoridade Policial. Contudo, em regra geral quem as efetiva são pessoas a seus mandos, como oficiais de justiça, membros da polícia judiciária (investigadores). 25 Passivo: é sobre quem é realizada a diligência. Para Tourinho, o sujeito passivo é o “titular da esfera de posse, pessoal ou ambiental, em que se suspeita encontrar-se a pessoa ou coisa que se busca” (Manual de Processo Penal, p. 489). 4. Objetos e sujeitos: prescreve o art. 240, § 1º, que podem ser objetos da busca e apreensão: Criminosos (neste caso, haverá também um mandado de prisão); Coisas achadas ou obtidas por meio criminosos; Instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados e contrafeitos; Armas e munições, instrumentos utilizados na prática do crime ou destinados a fim delituoso; Para se descobrir objetos necessários à prova da infração ou a defesa do réu; Pessoas vítimas de crime; Quaisquer elementos probatórios que possam interessar ao processo (desde que não sejam proibidas pela Constituição). Não podem mais ser objetos de apreensão cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, mesmo que sejam úteis à elucidação do fato, face ao art. 5º, XII, da Constituição Federal. 5. Espécies: o CPP distingue duas espécies de busca: a) a pessoal (quando levado a efeito na própria pessoa), e b) a domiciliar (quando feita na residência de alguém). Busca domiciliar: é a procura de alguém ou alguma coisa, que se faz no domicílio alheio. A lei processual estabelece que a busca poderá ser domiciliar arrolando-a taxativamente quando veementes motivos a autorizarem, no escopo ou propósito de prender criminosos; apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos; apreender instrumentos de falsificação e objetos falsificados: apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crimes, descobrir necessários à prova de infração ou à defesa do réu. É permitida, portanto, quando fundadas razões a autorizarem (art. 240, § 1º). Nota- se que tal diligência é permitida pois o art. 5º, XI, da Constituição Federal de 1988 a prevê expressamente ao dispor que: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou durante o dia, por determinação judicial” A expressão domicílio deve ser entendida em seu sentido mais amplo, com maior aspecto de abrangência possível, não se tratando, assim, do conceito fornecido pelo CC. A doutrina entende que domicílio é qualquer compartimento habitado, aposento ocupado de habitação coletiva, de compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade. A busca e apreensão domiciliar devem ser realizadas somente durante o dia (das seis às dezoito horas, posicionamento majoritário), precedida de determinação judicial ou a qualquer hora, quando houver situação de flagrante delito. Deve ser realizada ainda, por autoridade policial ou por alguém de sua ordem. Se for o próprio juiz o executor, deverá declarar a sua qualidade e o objeto da diligência (art.245, § 1.º), mas se for realizada por mandado, os executores deverão 26 proceder à leitura do mesmo, intimando o morador abrir a porta (art.245, in fine). Em caso de recusa do morador em cumprir a ordem, será arrombada a porta e forçada a entrada. Se se tratar de coisa ou pessoa previamente determinada o que se procura, deve o morador ser intimado pelos executores da ordem a mostrá-la (art.245, § 5.º). Havendo negativa, os executores passaram a procurar a pessoa ou coisa. Caso o morador não se achar presente, será um vizinho intimado a assistir o cumprimento da ordem, se houver um e ele estiver presente. Finda a diligência, será lavrado um auto circunstanciado, assinando-o os executores com duas testemunhas presenciais. Observa-se que não é permitida a apreensão de documento em poder do defensor do acusado, salvo quando constituir elemento do corpo de delito (art.243, § 2º).
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