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HERTZBERGER Licoes de arquitetura Cap 1

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J PÚBLICO E PRIVADO 
Os conceitos de "público" e "privado" podem ser 
interpretados como a tradução em termos espaciais de 
' "coletivo" e "individual"\ 
Num sentido mais absoluto, podemos dizer:•público é 
uma área acessível a todos a qualquer momento; a 
responsabilidade por sua manutenção é assumida 
coletivamente. Privada é uma área cujo acesso é 
determinado por um pequeno grupo ou por uma 
pessoa, que tem a responsabilidade de mantê-la .! 
Esta oposição extremo entre o público e o privado - como 
o oposição entre o coletivo e o individual - resultou num 
clichê, e é tão sem matizes e falsa como o suposto oposição 
entre o geral e o específico, o objetivo e o subjetivo. Tais 
oposições são sintomas da desintegração das relações 
humanos básicos. Todo mundo quer ser aceito, quer se 
inserir, quer ter um lugar seu. Todo comportamento no 
sociedade em geral é, na verdade, determinado por papéis, 
nos quais a personalidade de cada indivíduo é afirmada 
pelo que os outros vêem nele. No nosso mundo, 
experimentamos uma polarização entre a individualidade 
exagerado, de um lodo, e o coletividade exagerado, de 
outro. Coloco-se excessiva ênfase nestes dois pólos, embora 
não exista uma único relação humano que nos interesse 
como arquitetos que se concentre exclusivamente em um 
indivíduo ou em um grupo, ou mesmo que se concentre de 
modo exclusivo em todos os outros, ou seja, no "mundo 
externo". É sempre uma questão de pessoas e grupos em 
inter-relação e compromisso mútuo, i.e., é sempre uma 
questão de coletividade e indivíduo, um em face do outro. 
12 liÇÕES DE ARQUITETURA 
'Wenn aber der lndividualismus nur einen Teil des Menschen 
erfassf so erfassf der Koflektivismus nur den Menschen ais 
Teil: zur Ganzheif des Menschen, zum Menschen ais Ganzes 
dringen beide nicht vor. Der lndividualismus sieht den 
Menschen nu r in der Bezogenheif auf sich selbst, aber der 
Kollektivismus sieht den Menschen überhaupt nicht, er sieht 
nur die "Gesetlschaft", Beide Lebensanschauungen sind 
Ergebnisse oder Aeusserungen des gleichen menschlichen 
Zustands. 
Dieser Zusfand ist durch das Zusammensfromen von 
kosmischer und sozialer Heimlosigkeif, von Weltangsf und 
Lebensangst, zu einer Daseinsverfassung der Einsamkeit 
gekennzeichnet, wie es sie in diesem Ausmass vermutlich 
noch nie zuvor gegeben hat. Um sich vor der VerzweiRung 
zu relfen, mil der ihn siene Vereinsamung bedroht, ergrei& 
der Mensch den Ausweg, diese zu glorifizieren. Der 
moderne lndividualismus hat im wesentlichen eine 
imaginare Grundlage. An diesem Charakter scheitert er, 
denn di e lmagination reicht nicht zu, die gegebene Situation 
faktisch zu bewiiltigen. 
Der moderne Kollektivismus ist die letzte Schranke, die der 
Mensch vor der Begegnung mil sich selbst aufgerichtet 
hat .. . ; im Kollektivismus gibt sie, mil dem Verzicht auf die 
Unmiitelbarkeit persõnh"cher Entscheiclung und 
Veranfwortung, sich selber auf In beiden Falfen ist sie 
unfahig, den Durchbruch zum Anderen zu volfziehen: nur 
zwischen echten Personen gibt es echte Beziehung. Hier gibt 
es keinen anderen Ausweg ais den Aufstand der Person um 
der Befreiung der Beziehung willen. lch sehe am Horizont, 
mil der Langsamkeit a/ler Vorgange der wahren 
Menschengeschichte, eine grosse Unzufriedenheit 
heraufkommen. 
Man wird sich nicht mehr b/oss wie bisher gegen eine 
bestimmte herrschende Tendenz um anderer Tendenz willen 
emporen, sondem gegen die falsche Realisierung eines 
grossen Strebens, des Strebens zur Gemeinschah, um der 
echten Realisierung witlen. 
Man wird gegen die Verzerrung und für die reine Gesta/f 
kiimpfen. lhr ersfer Schritf muss die Zerschlagung einer 
falschen Alternafive sein, der Alternafive "lndividualismus 
oder Kollektivismus".; 
(Marlin Buber, Das Problem des Menschen, Heidelberg, 1948, também 
publicado em Forum 7·1959, p. 249) 
I"Se, porém, o individualismo compreende apenas parte da • 
humanidade, o coletivismo só compreende a humanidade 
como parte; nenhum deles apreende o todo da 
humanidade, a humanidade como um todo. 
O individualismo vê a humanidade apenas na relação 
consigo mesmo, mas o coletivismo não vê o homem de 
maneira nenhuma, vê apenas a 'sociedade'. Ambas as 
visões de mundo são produtos ou expressões da mesma 
condição humana. 
Esta condição caracteriza-se pela confluência de um 
desamparo cósmico e social, de uma angústia diante do 
mundo e da vida, por um estado existencial de solidão, que 
provavelmente nunca se manifestaram antes nesse nível. 
)Na tentativa de fugir do desespero trazido pelo isolament~,.., 
o homem, como escapatória, procura glorificá-lo. 
O individualismo moderno possui um fundamento 
imaginário. Neste aspecto, ele fracassa, pois a imaginação 
é incapaz de lidar factualmente com uma situação dada. 
O coletivismo moderno é a última barreira que o homem 
construiu para evitar o encontro consigo mesmo { ... ]; no 
coletivismo, com a renúncia à imediaticidade da decisão e 
da responsabilidade pessoal, ela se rende. Em ambos os 
casos é incapaz de efetuar uma abertura para o outro: só 
entre pessoas reais pode haver uma relação real. 
Não há alternativa, neste caso, a não ser a rebelião do 
indivíduo em favor da libertação do relacionamento. Veio 
surgir no horizonte, com a lentidão de todos os processos 
da história humana, um grande descontentamento. 
As pessoas não mais se levantarão como fizeram no 
possàóo conlra cer'la lendência predominante e a favor de 
uma tendência diferente, mas contra a falsa realização de 
um grande anseio, o anseio pelo comunitário, em nome da 
verdadeira realização. 
As pessoas lutarão contra a distorção e pela pureza. 
O pníneiro passo deve ser a destruição de uma Falsa 
escolha, a escolha: 'individualismo ou coletivismo'." -
Os conceitos de "público" e "privado" podem ser 
vistos e compreendidos em termos relativos como uma 
série de qualidades espaciais que, diferindo 
gradualmente, referem-se ao acesso, à 
responsabilidade, à relação entre a propriedade 
privada e a supervisão de unidades espaciais 
específicas. 
DOM ÍNIO PÚBLICO 13 
-2 DEMARCACOES 
I 
TERRITORIAIS 
Uma área aberta, um quarto ou um espaço podem ser 
concebidos como um lugar mais ou menos privado ou 
como uma área pública, dependendo do grau de 
acesso, da forma de supervisão, de quem o utiliza, de 
quem toma conta dele e de suas respectivas 
responsabilidades. 
O seu quarto, por exemplo, é um espaço privado em 
comparação com a sala de estar e a cozinha da casa 
em que mora. Você tem a chave do seu quarto, do 
qual você mesmo cuida. O cuidado e a manutenção da 
sala de estar e da cozinha são basicamente uma 
responsabilidade compartilhada por todos os que 
moram na casa, que têm a chave da porta de entrada. 
Numa escola, cada sala de aula é privada em 
comparação com o ha/1 comunitário. Este ha/1, por sua 
vez, é, como a escola em sua totalidade, privado em 
comparação com a rua. 
RUAS E RESIDÊNCIAS, BALI (1 ·41 
Os quartos de várias habitações em Bali são muitas vezes 
pequenas casas construídas separadamente, agrupadas em 
volta de uma espécie de pátio interno, no qual se entra por 
um portão. Depois que atravessamos o portão, não temos a 
sensação de que estamos entrando numa residência, 
embora isso seja o que acontece de fato. As unidades 
separadas da residência - área de cozinha, dormitórios e, 
às vezes, uma câmara mortuária e um berçário - possuem 
uma intimidade maior e são, certamente, de acesso menos 
fácil para um estranho. Deste modo, a casa abrange uma 
seqüência de gradações distintas de acesso. 
14 LIÇÕES DE ARQUI TE TU RA 
• 
~ 
• 
HJ 
I 
2 
• 
r=r=ll 
~ 
~lei ~~ 
1. Dormitório para os pais 5. Dormitório 
2. Altar 6. Cozinha 
3. Templo fami liar 
4. Área de estar/convidados 
7. Depósito de arroz 
8. Eira 
Muitos ruas em Boli constituem o território de uma família 
extenso.Nessas ruas estão situados os cosas dos diversos 
unidades familiares, que juntos compõem o família extenso. 
Essas ruas têm um portão de entrado, que é muitos vezes 
provido de uma pequeno cerco de bambu encarregado de 
manter os crianças e os animais do lodo de dentro, e, 
embora sejam basicamente acessíveis o qualquer um, 
tendemos o nos sentir como intrusos ou, no máximo, como 
visitantes. 
Além das diversos nuances nos demarcações territoriais, os 
balineses fazem uma distinção dentro do espaço público: o 
área do templo, que compreende uma série de recintos 
sucessivos com entrados claramente marcados, aberturas 
nas cercos ou portões de pedra (conhecidos como tjandi 
bentar). Esta área do templo serve como ruo e como 
pfayground poro os crianças. Poro o visitante também é 
acessível como ruo - pelo menos quando não estão 
acontecendo manifestações religiosos - , mos, mesmo assim, 
o visitante sente certo relutância. Como alguém estranho ao 
lugar, sente-se honrado por ter permissão de entrar. 
No mundo inteiro encontramos gradações de 
demarcações territoriais, acompanhadas pela sensação 
de acesso. Às vezes o grau de acesso é uma questão 
de legislação, mas, em geral, é exclusivamente uma 
questão de convenção, que é respeitada por todos. 
EDIFÍCIOS PúBLICOS 
Os chamados edifícios públicos, tais como o ha/1 do correio 
central ou uma estação ferroviário , podem (pelo menos 
durante os horas em que ficam abertos) ser vistos como um 
espaço de ruo no sentido territoria l. Outros exemplos de 
graus diferenciados de acesso ao públ ico estão listados 
abaixo, mos o listo, naturalmente, pode ser ampliado poro 
incluir outros experiências pessoais: 
• os pátios quadrangulares dos universidades no Inglaterra, 
como em Oxford e Combridge; são acessíveis o todos pelos 
pórticos, formando uma espécie de subsistema de caminhos 
poro pedestres que atravesso todo o centro do cidade. 
• edifícios públicos, como, por exemplo, o ha/1 do correio, 
o estação ferroviário, etc. 
• os pátios de blocos de moradia em Paris, onde o 
concierge em geral reino supremo. 
• ruas "fechados", encontrados em grande variedade por 
todo o mundo, às vezes patrulhados por guardas de 
segurança privado. 
DOMÍN IO PÚBL ICO 15 
Estação Centro/, 
Hoorlem, Holanda 
""'"" 
ç 
6 7 
lO I I 
Ruo holandesa, 
século XIX 
I . I tl81\l•t ,.,............ . .. 
UD.JITllJJillU ~\\~i\'ii~ltfr.1 J ... ... 
~~ ·~ P!l~'l''~1W'"\l! 
. ' • • lt.-l ~':.~· •• . •• ' . 
' .. " .-.. .. ' . 
... 10 :.· ·.:· I 
.. ·. ·. 
ALDEIA DE MóRBISCH, ÁUSTRIA {6·81 
As ruas na aldeia austríaca de Morbisch, perto da fronteira 
húngaro (publicado em Forum 9-1959), têm portões largos, 
como os que dão acesso a fazendas - mas aqui dão acesso 
a ruas laterais ao longo das quais se situam residências, 
estábulos, celeiros e hortas. 
.... Estes exemplos mostram como são inadequados os 
termos público e privado, enquanto as áreas 
chamadas semiprivadas ou semipúblicas, que muitas 
vezes estão espremidas no zona intermediária, são 
equívocas demais para acomodar as sutilezas que 
devem ser levadas em conta ao projetar cada espaço 
e cada área., 
• Onde quer que indivíduos ou grupos tenham a 
oportunidade de usar partes do espaço público para 
seus próprios interesses, e apenas indiretamente no 
interesse dos outros, o caráter público do espaço é 
temporária ou permanentemente colocado em questão 
por meio do uso. Exemplos desse tipo podem ser 
encontrados em qualquer parte do mundo. 
Em Bali - mais uma vez usada como exemplo - o arroz é 
espalhado para secar em amplas áreas dos caminhos 
16 d(Õ fS DE AROU TE'UiA 
públicos e até mesmo no meio-fio das estradas de 
macadame, onde permanece intocado pelos veículos e 
pelos pedestres, pois todos estão conscientes da 
importância da contribuição de cada membro da 
comunidade para a colheita de arroz. 191 
Um outro exemplo de mistura do público com o privado é o 
roupa pendurada para secar nas ruas estreitas de cidades 
do sul da Europa: uma expressão coletiva de simpatia pelo 
lavagem de roupa de cada família, que fica pendurada 
numa rede de cabos que atravessa a rua de uma casa a 
outra. 
Nápoles 
Outros exemplos são as redes e navios sendo reparados 
nos cais de aldeias e portos pesqueiros, e o Dogon: a lã 
estirado no praça da aldeia. 
O uso do espaço público por residentes, como se fosse 
"privado", fortalece a demarcação por parte do 
usuário desta área aos olhos dos outros. A dimensão 
extra dada ao espaço público por essa demarcação 
sob a forma de uso para objetivos privados será 
discutida detalhadamente mais adiante, mas antes 
devemos procurar saber quais as conseqüências que 
traz para o arquiteto. 
BIBLIOTECA NACIONAL, PARIS, 1862-1868 I H. lABROUSTE (12) 
No principal sala de leitura da Biblioteca Nacional em 
Paris, os espaços de trabalho individual, dispostos um em 
frente ao outro, são separados por uma "zona" média mais 
elevada; as lâmpadas no centro dessa prancha fornecem 
luz paro as quatro superfícies de trabalho diretamente 
adjacentes. Esta zona central é mais acessível do que os 
espaços de trabalho individual, mais baixos, e tem como 
claro objetivo o uso compartilhado por aqueles que se 
sentam de ambos os lados. 
EDIFÍCIO DE ESCRITÓRIOS (ENTRAAL BEHEER ( 13·19) 
Há muitos anos, antes de se estabelecer a moda de 
"escrivaninha lisa", as escrivaninhas dos escritórios eram 
providas de pranchas que, quando as escrivaninhas eram 
colocadas uma contra a outra, formavam uma zona central 
semelhante às que dividem as mesas de leitura da 
Biblioteca Nacional em Paris. Por meio dessa articulação, 
reserva-se um lugar para os objetos compartilhados por 
diversos usuários, tais como telefones e vasos. O espaço 
sob as pranchas cria uma área maior de armazenamento 
privado para cada usuário individual. A articulação em 
termos de maior ou menor acesso (público) também pode 
revelar sua utilidade nos detalhes. 
T.U..PO l Af(AAl E lAioiPQ t FIAS( IAO 
13 
12 14 
DOM ÍNIO PÚBliCO 17 
16 
7 18 
18 liÇÕES DE ARQUITETURA 
Portas de vidro entre espaços igualmente públicos e 
portanto igualmente acessíveis, por exemplo, proporcionam 
ampla visibilidade de ambos os lados, de modo que as 
colisões podem ser facilmente evitadas. Portas sem painéis 
transparentes têm de dar acesso a espaços mais privados, 
menos acessíveis. Quando um código desse tipo é adotado 
coerentemente em todo o edifício, é entendido racional ou 
intuitivamente por todos os usuários do prédio e assim pode 
contribuir paro esclarecer os conceitos subjacentes à 
organização do acesso. Uma classificação adicional pode 
ser obtida mediante a forma dos painéis de vidro, o tipo do 
vidro empregado: semitransparente ou opaco, ou a 
meia-porta . 
Quando, ao projetar cada espaço e segmento, temos 
consciência do grau de relevância da demarcação 
territorial e das formas concomitantes das 
possibilidades de "acesso" aos espaços vizinhos, 
podemos expressar essas diferenças pela articulação 
de forma, material, luz e cor, e introduzir certo 
ordenamento no projeto como um todo. Isto, por sua 
vez, pode aumentar a consciência dos moradores e 
visitantes quanto à composição do edificio, formado 
por ambientes diferentes na que diz respeito ao 
acesso. O grau de acesso de espaços e lugares fornece 
padrões para o projeto. A escolha de motivos 
arquitetônicos, sua articulação, forma e material são 
determinados, em parte, pelo grau de acesso exigido 
por um espaço. 
DO MÍNIO PÚBl iCO 19 
-3 DIFERENCIACAO , 
TERRITORIAL 
20 
21 22 23 
24 
I ' I 
l .n·~ ' ~I' I, 
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' ~~ -~ 
J . I ~~j 'f'~D 
Escola Montessori Delft 
v 
... -. .. / 
,.. ~ ..~- -
--...... ------ .... -- --......._~-
' 1 
20 llÇÕES DE ARQUITETURA 
Holel Solvoy, Bruxelas, 1896/V. Horlo 
{ver lambém página84) 
Ao marcar as gradações de acesso público às 
diferentes áreas e partes de um edifício em uma 
planta, obtemos uma espécie de mapa mostrando a 
"diferenciação territorial" . Este mapa mostrará 
claramente que aspectos de acesso existem na 
arquitetura, quais são a s demarcações de áreas 
específicas e a quem se destinam, e que espécie de 
divisão de responsabilidades pode ser esperada no 
que diz respeito aos cuidados e à manutenção dos 
diferentes espaços, de modo que essas forças possam 
ser intensificadas (ou atenuadas) na elaboração 
posterior da planta . 
DOM ÍNIO PÚ BLICO 21 
25 26 
27 28 
29 
4 ZONEAMENTO 
TERRITORIAL 
30 
22 l iÇÕES DE ARQU ITETURA 
O caráter de cada área dependerá em grande parte 
de quem determina o guarnecimento e o ordenamento 
do espaço, de quem está encarregado, de quem zela e 
de quem é ou se sente responsável por ele. 
EDIFÍCIO DE ESCRITÓRIOS (ENTRAAL BEHEER (30, 31) 
Os efeitos surpreendentes obtidos pelos funcionários do 
Centraal Beheer na maneira como ordenaram e 
personalizaram o espaço de seus escritórios com cores de sua 
escolha, vasos e objetos de estimação, não são apenas a 
conseqüência lógica do fato de o acabamento dos interiores 
ter sido deliberadamente entregue aos usuários do edifício. 
Embora a nudez do interior severo e cinzento seja um convite 
DOMÍNIO PUBliCO 23 
31 
32 
33 
óbvio para que os usuários dêem os toques de acabamento 
ao espaço de acordo com seus gostos pessoais, isto, por si só, 
não é garantia de que irão fazê-lo. 
É preciso algo mais para que isso aconteça: para começar, a 
própria forma do espaço deve oferecer as oportunidades, 
incluindo os acessórios básicos, etc., para que os usuários 
preencham os espaços de acordo com suas necessidades e 
desejos pessoais. Mas, além disso, é essencial que a 
liberdade de tomar iniciativas pessoais esteja presente na 
estrutura organizacional da instituição, e este aspecto tem 
24 l iÇÕES DE ARQUITETURA 
conseqüências muito maiores do que se pode pensar à 
primeira vista. Pois a questão fundamental é saber quanta 
responsabilidade a alta direção está disposta a delegar, isto 
é, quanta responsabilidade será dada aos usuários 
individuais dos escalões mais baixos. 
É importante ter em mente que, neste caso, um empenho tão 
excepcional para investir amor e cuidado no ambiente de 
trabalho só se tornou possível porque a responsabilidade de 
ordenamento e acabamento dos espaços foi deixada aos 
usuários, de maneira muito explícita. Foi graças a isso que os 
oportunidades oferecidas pelo arquiteto foram efetivamente 
aproveitadas, gerando um resultado de êxito surpreendente. 
Mas, se este edifício foi originalmente construído como uma 
expressão espacial da necessidade de um ambiente mais 
humano (embora muitos suspeitassem que isso teria sido 
motivado por considerações relativas ao recrutamento de 
pessoal), há no momento uma tendência para a 
desumanização, em grande parte decorrente de cortes nos 
custos, que afetam particularmente o quadro de funcionários. 
Mas pelo menos pode-se dizer que o edifício oferece uma 
resistência louvávél a essa tendência, e que, com um pouco 
de sorte, conseguirão conservar o seu estilo. O que desaponta 
é que o que pensávamos ser um passo inicial rumo a uma 
responsabilidade maior para com os usuários revelou ser 
apenas o último passo que pode ser dado no momento. 
Hoje, isto é, em 1990, restou muito pouco da decoração 
expressiva e colorida dos ambientes de trabalho. O apogeu 
da expressividade pessoal da década de 1970 deu lugar à 
limpeza e à ordem. Parece que o impulso de expressão 
pessoal desapareceu e que neste momento as pessoas tendem 
mais .ao conformismo. Talvez em razão do medo diante do 
crescente desemprego da década de 1980, considera-se mais 
sensato assumir uma posição menos extrovertida, e os efeitos 
dessa situação já podem ser vistos na atmosfera fria e 
impessoal da maioria dos escritórios de hoje. 
FACULDADE DE ARQUITETURA DO M IT, (AMBRIDGE, USA 
OFICINA DE TRABALHO 1967 (32, 33) 
O grau de influência que os usuários podem exercer, em 
casos extremos, sobre seu ambiente de trabalho ou de 
moradia é claramente demonstrado nos ajustes feitos à 
arquitetura existente pelos estudantes de arquitetura do MIT. 
Os estudantes opuseram-se a ter de trabalhar em 
pranchetas de desenho arrumadas em filas longas e 
rígidas, todas voltadas na mesma direção. Usando restos de 
material de construção, eles construíram o tipo de espaço 
que queriam - no qual podiam trabalhar, comer, dormir e 
receber seus orientadores. 
Seria de esperar que cada novo grupo de estudantes 
desejasse fazer seu próprio ajuste, mas a situação evoluiu 
de outra maneira. O resultado da feroz disputa com as 
autoridades loca is de prevenção a incêndios foi que todos 
as estruturas teriam de ser derrubadas, a menos que um 
sistema completo de sprinklers fosse instalado. Depois que 
essa providência foi tomada, a situação tornou-se 
permanente, e o ambiente, se é que ainda existe, pode ser 
visto como um monumento ao entusiasmo de um grupo de 
estudantes de arquitetura. Mas não devemos nos 
surpreender se tudo já não foi eliminado (ou venha a sê-lo) 
- a burocracia da administração centralizadora voltou a 
assumir o controle. 
A influência dos usuários pode ser estimulada, pelo 
menos nos lugares certos, i.e., onde se pode esperar o 
envolvimento necessário; e como isto depende do grau 
de acesso, das demarcações territoriais, da 
organização da manutenção e da divisão de 
responsabilidades, é essencial que o projetista esteja 
plenamente consciente desses fatores nas suas 
gradações adequadas. Nos casos em que a estrutura 
organizacional impede os usuários de exercerem 
qualquer influência pessoal em seu ambiente, ou 
quando a natureza de determinado espaço é tão 
pública que ninguém se sente inclinado a exercerem 
influência nele, não há motivo para que o arquiteto 
tente fazer uma contribuição nesse sentido. 
No entanto, o arquiteto ainda assim pode tirar 
vantagem da reorganização que o ato de ocupar um 
novo edifício sempre requer e tentar exercer alguma 
influência na reavaliação da divisão de 
responsabilidades, pelo menos no que diz respeito ao 
ambiente físico. Uma coisa pode levar à outra. Pelo 
simples fato de apresentar argumentos capazes de 
assegurar à alta direção de que delegar 
responsabilidades pelo ambiente aos usuários não 
resulta necessariamente em caos, o arquiteto coloca-se 
em posição de contribuir para melhorar as coisas, e 
certamente é seu dever fazer pelo menos uma tentativa 
nesse sentido. 
ESCOLA MONTESSORI, DELFT (34, 35) 
Uma prancha de madeira acima da porta, com uma 
largura extra para que sobre ela possam ser colocados 
objetos - como neste caso entre a sala de aula e o ha/1-, 
presta-se mais a ser usada se for acessível pelo lado 
adequado, i.e. , pelo lado de dentro da sala de aula. A 
estante acima pode criar um efeito estético agradável se a 
vidraça for recuada, mas é improvável que seja usada. 
EDIFÍCIO DE ESCRITÓRIOS (ENTRAAL BEHEER (36·39) 
Embora o cuidado pelos espaços dos escritórios no edifício 
Centraal Beheer, nos quais cada funcionário tem sua 
própria ilha particular para trabalhar, seja da 
responsabilidade dos usuários, nenhum membro do quadro 
de funcionários sente-se diretamente responsável pelo 
espaço central do edifício. A área verde neste espaço 
central é mantida por uma equipe especial (cf. Obras 
DOMÍNIO PÚBLICO 25 
3A 35 
36 37 
38 
39 40 
Públicas), e os quadros nas paredes são colocados por uma 
equipe de profissionais. 
Estes empregados também fazem seu trabalho com grande 
dedicação e cuidado, mas há uma diferença de atmosfera 
marcante entre a área comunitária e os espaços individuais 
de trabalho com toda a sua diversidade. 
Nos balcões de lanches deste espaço central, o serviçoé 
feito pela mesma moça todo dia; o serviço de lanches foi 
organizado de tal modo que cada garçonete foi alocada 
num balcão específico. Ela se sentia responsável por aquele 
balcão e, com o tempo, acabou por considerá-lo seu 
26 liÇÕE S DE ARQUITETUR A 
domínio, dando-lhe um toque pessoal. Estes balcões de café 
já foram removidos, e bancos e máquinas de café foram 
instalados em seu lugar. Todo o edifício está passando por 
uma renovação e uma limpeza, e durante este processo um 
grande número de ajustes será feito para atender aos 
requisitos de um local de trabalho contemporâneo. 
(ENTRO MUSICAL VREDENBURG 140) 
A idéia subjacente que teve êxito no Centraal Beheer não 
se aplica aos balcões de lanches do Centro Musical em 
Utrecht. Ali a situação varia consideravelmente de um 
concerto para outro, com diferentes balcões e diferentes 
balconistas servindo o público. Já que, no caso, não se 
esperava uma afinidade especial entre os empregados e os 
espaços específicos de trabalho, havia motivo suficiente 
para que as áreas de lanches fossem completadas e 
inteiramente mobiliadas pelo arquiteto. 
Em ambos os edifícios - no Centraal Beheer e no Centro 
Musical - as paredes dos fundos são providas de espelhos. 
No primeiro, porém, eles foram instalados pelos 
funcionários e no segundo foram escolhidos pelo arquiteto 
de acordo com os mesmos princípios gerais que regem todo 
o edifício. Os espelhos da parede dos fundos permitem que 
se possa ver quem está à frente, atrás e perto de nós. 
Eles evocam as pinturas de teatro de Manet 141), que usou 
espelhos para desenhar o espaço dentro do plano do 
quadro e, assim, definir o espaço mostrando as pessoas e 
como estão agrupadas. 
O Centro Musical tem um quadro de funcionários 
competente e dedicado que cuida do lugar. 
O mesmo não pode ser dito, por exemplo, dos vagões de 
refeição das ferrovias holandesas: os garçons 
constantemente trocam de trem. Seu único compromisso 
consiste em deixar o vagão limpo e asseado para o turno 
seguinte. Imagine como as coisas seriam diferentes se o 
mesmo garçom trabalhasse sempre no mesmo trem. Embora 
o vagão-restaurante tenha desaparecido - dos trens 
holandeses pelo menos-, uma nova forma de serviço 
surgiu nas viagens aéreas. Mas as refeições servidas nos 
aviões são mais uma imposição ao passageiro do que um 
serviço; são servidas em horas que convêm mais à 
companhia do que ao passageiro (além de serem muito 
caros, pois estão incluídas no preço já bastante alto da 
passagem). 
Do lufthansa 
Bordbuch, 6/88 
41 
42 
43 
44 
S DE USUÁRIO 
A MORADOR 
A tradução dos conceitos de "público" e "privado" à 
luz de responsabilidades diferenciadas torna mais fácil 
para o arquiteto decidir onde devem ser tomadas 
medidas para que os usuários/ habitantes possam dar 
suas contribuições ao projeto do ambiente e onde isto 
é menos relevante. Na organização de um projeto em 
função de plantas-baixa s e de cortes, e também de 
acordo com o princípio das instalações, podem-se criar 
as condições para um maior senso de responsabilidade 
e, conseqüentemente, também um ma ior envolvimento 
no arranjo e no mobiliamento de uma á rea. Deste 
modo os usuários tornam-se moradores. 
EsCOLA MONTESSORI, DELFT 144-47) 
As solos de aula desta escalo são concebidos como unidades 
autônomos, pequenos lares, por assim dizer, já que todas 
estão situados ao longo do ha/1 do escola, como uma ruo 
comunitária. A professora, a "tia", de cada casa decide, junto 
com os crianças, que aparência terá o lugar e, portanto, qual 
será o seu tipo de atmosfera. 
Cada solo de aula também tem seu pequeno vestíbulo, em vez 
do usual espaço comunitário para toda a escola, que em 
geral sign ifica a ocupação total do espaço por filas de 
cabides e suo inutilizoção para qualquer outro fim. E, se cada 
sala de aula tivesse seu próprio banheiro, isto também 
28 LIÇÕES DE ARQUITEIURA 
contribuiria para aprimorar o sentido de responsabilidade da 
criança (a proposto foi rejeitada pelas autoridades 
educacionais sob o pretexto de que seriam necessários 
banheiros separados paro meninos e meninos- como se fosse 
assim na cosa deles-, o que exigiria o dobro de banheiros]. 
É perfeitamente concebível que os crianças de cada solo 
mantenham seu "lar" limpo, como os pássaros fazem com seu 
ninho, dando deste modo expressão à ligação emocional com 
seu ambiente diário. 
A idéia Montessori, no verdade, compreende os chamados 
deveres domésticos como porte do programa diário para 
todas as crianças. Assim, dó-se muito ênfase ao cuidado com 
o ambiente, fortalecendo com isso o afinidade emocional das 
crianças com o espaço à suo volta. 
Cada criança também pode trazer suo próprio planto para a 
sala de aula e cuidar dela. (A consciência do ambiente e a 
necessidade de cuidar dele ocupam um lugar proeminente no 
conceito de Montessori. Exemplos típicos são o tradição de 
trabalhar no assoalho sobre tapetes especiais - pequenas 
áreas temporárias de trabalho que são respeitadas pelos 
outros -e a importância atribuída ao hábito de arrumar as 
coisas em armários abertos.] Um passo à frente, no sentido de 
uma abordagem mais pessoal poro os espaços que circundam 
diariamente os crianças, incluiria o possibilidade de regular o 
aquecimento central de cada solo. Isso aumentaria o 
consciência das crianças quanto ao fenômeno do calor e ao 
cuidado que temos de tomar para nos mantermos aquecidos, 
ao mesmo tempo em que os tornaria mais conscientes dos 
usos do energia. 
Um "ninho seguro" - um espaço conhecido à nossa 
volta, onde sabemos que nossa s coisas estão seguras e 
onde podemos nos concentra r sem sermos perturbados 
pelos outros - é a lgo de que cada indivíduo preciso 
tanto quanto o grupo. 
Sem isso, não pode haver colaboração com os outros. 
Se você não tem um lugar que possa chamar seu, você 
não sabe onde está! 
Não pode haver aventura sem uma base para onde 
retornar: todo mundo precisa de a lguma espécie de 
ninho para pousar. 
O domínio de um grupo particular de pessoas deveria ser 
respeitado tanto quanto possível pelos "estranhos". Por esta 
razão, há certos riscos ligados ao chamado uso 
multifuncional. Vamos tomar como exemplo uma sala de 
aula: se é usado poro outros finalidades foro do horário 
escolar, por exemplo, para atividades do vizinhança, toda 
a mobília tem de ser deslocado temporariamente e, claro, 
nem sempre é colocada de volto a seu lugar adequado. Em 
ta is circunstâncias, figuras de borro modelado deixados 
para secar, por exemplo, podem ser quebradas 
"acidentalmente" com facilidade, ou então o apontador de 
lápis de alguém pode desaparecer. 
45 
DOMIN10 PÚBliCO 29 
46 
47 
É importante que as crianças possam exibir as coisas que 
fizeram, digamos, na aula de trabalhos manuais, sem medo 
de que possam ser destruídas, e que possam também deixar 
trabalhos inacabados sem que haja o perigo de serem 
retirados ou "arrumados" por "estranhos". Afinal de contas, 
uma faxina completa feita por outra pessoa pode fazer 
30 liÇÕES DE ARQUITETURA 
alguém sentir-se perdido em seu próprio espaço na manhã 
seguinte. 
Uma sala de aula, concebida como o domínio de um 
grupo, pode mostrar sua própria identidade ao resto da 
escola se lhe for dada a oportunidade de fazer umo 
exposição das coisas com as quais o grupo estó 
especialmente envolvido (coisas que as crianças fizeram 
dentro ou fora da sala de aula). Isto pode ser executado de 
modo informal usando-se a divisória entre o ha/1 e a sala 
de aula como espaço de exposição e abrindo-se muitas 
janelas com peitoris generosos na divisório. 
Um pequeno mostruário (neste caso, até iluminado) é um 
desafio para o grupo apresentar-se de maneira mais 
formal. O exterior da sala de aula pode então funcionar 
como uma espécie de "vitrine" que mostra o que o grupo 
tem a "oferecer". 
Desse modo, cadaturma pode apresentar uma imagem com 
que os outros podem se relacionar e que marca a transição 
entre cada sala de aula e o espaço comunitário do ha/1. 
1 
ESCOlAS APOLLO 148-50) 
Se o espaço entre as solas de aula foi usado para criar 
áreas semelhantes a alpendres, como na escola Montessori 
de Amsterdom, essas áreas podem servir como lugares de 
trabalho adequados onde se pode estudar sozinho, i.e. , 
sem estar na sala de aula mas também sem ficar isolado 
desta. Esses lugares consistem numa superfície de trabalho 
com iluminação própria e num banco encostado a uma 
parede baixa. Para regular o contato entre a sala de aula e 
o ha/1 da maneira mais sutil possível, foram instaladas 
meias-portas, cuja ambigüidade pode gerar o grau 
adequado de abertura para o ha/1 e, ao mesmo tempo, 
oferecer o isolamento necessário a cada situação. 
Aqui encontramos mais uma vez (como na escola de Delft) 
o mostruário de vidro contendo o museu-miniatura e a 
exposição da sala de aula. 
r ~--- - ~· ----------1--------
r-~~ I I 
I I I 
I I 
I I 
I I !I ; : 
DOM NIO PUBL CO 31 
48 49 
50 
51 
6 O "INTERVALO" 
O significado mais amplo do conceito de intervalo foi 
introduzido em Forum 7, 1959 (lo plus grande réolité 
du seuil) e em Forum 8, 1959 (Dos Gestolt gewordene 
Zwischen: the concretizotion of the in-between) 
A soleira fornece o chove poro o transição e o conexão 
entre áreas com demarcações territoriais divergentes e, 
no qualidade de um lugar por direito próprio, constitui, 
essencialmente, o condição espacial poro o encontro e 
o diálogo entre áreas de ordens diferentes. 
32 LIÇÕ ES DE AROUIHIURA 
O valor deste conceito é mais explícito no soleira por 
excellence, o entrado de uma coso . Estamos lidando 
aqui com o encontro e o reconciliação entre o ruo, de 
um lodo, e o domínio privado, de outro. 
A criança sentada no degrau em frente à sua casa está 
suficientemente longe da mãe para se sentir independente, 
para sentir a excitação e a aventura do grande 
desconhecido. 
Mas, ao mesmo tempo, sentada ali no degrau, que é parte 
da rua assim como da casa, ela se sente segura, pois sabe 
que sua mãe está por perto. A criança se sente em casa e 
ao mesmo tempo no mundo exterior. Esta dualidade existe 
graças à qualidade espacial da soleira como uma 
plataforma, um lugar em que os dois mundos se superpõem 
em vez de estarem rigidamente demarcados. 
. ~ 
~ . . . 
'!!'P'-
~ """"'"' j,._~ ~~. 
ESCOLA MONTESSORI, DELFT (52·56) 
A entrada de uma escola primária devia ser mais do que 
uma mera abertura através da qual as crianças são 
engolidos quando as aulas começam e expelidas quando 
elas terminam. Deveria ser um lugar que oferecesse algum 
tipo de conforto para as crianças que chegam cedo e para 
os alunos que não querem ir logo para casa depois das 
aulas. 
As crianças também têm seus encontros e compromissos. 
Muros baixos em que se possa sentar são o mínimo a se 
oferecer; um canto bem abrigado é melhor, mas o melhor 
mesma seria uma área coberta para quando chove. 
A entrada de um jardim-de-infância é freqüentada pelos 
pais- ali eles se despedem de seus filhos e esperam por 
eles quando as aulas terminam. Os pais que esperam os 
filhos têm assim uma bela oportunidade para se conhecer e 
poro combinar visitas das crianças às casas dos colegas. 
Em suma, este pequeno espaço público, como local de 
encontro para pessoas com interesses comuns, cumpre uma 
importante função social. Como resultado da mais recente 
transformação, em 1981 (56), esta entrada não mais existe. 
DOMINIO PUBliCO 33 
52 51 
53 55 
56 
57 
59 
58 
DE ÜVERLOOP, lAR PARA IDOSOS 157, 58) 
Uma área coberta na porta da frente, o começo da 
"5oleira", é o lugar em que dizemo5 olá ou adeu5 ao5 
vi5itante5, limpamo5 a neve da5 bota5 e penduramo5 o 
guarda-chuva. 
A5 entrada5 coberta5 para 05 apartamento5 do abrigo De 
Overloop, em Almere, 5Õo equipada5 com banco5 perto da5 
porta5 da frente. A5 porta5 da frente e5tão di5po5ta5 de 
dua5 em dua5 para formar um alpendre combinado, o qual, 
porém, é dividido em entrada5 5eparada5 por uma divi5ória 
vertical que se projeta a partir da fachada. A5 meia5-portas 
permitem a quem e5teja 5entado do lado de fora manter 
contato com o interior do apartamento, de modo que 5e 
pode pelo meno5 ouvir o telefone tocar. E5ta zona de 
entrada é vi5ta como uma exlen5Õo da ca5a, como 5e pode 
perceber pelos capachos colocado5 do lado de fora. 
34 LIÇOES Ot AR OUITEIURA 
Graça5 à saliência da cobertura, ninguém preci5a e5pero1 
na chuva até que a porta 5eja aberta, enquanto a 
atmo5fera ho5pitaleira do lugar dó a quem chega a 
5en5ação de que já está qua5e dentro da ca5a. 
Pode-se dizer que o banco na porta da frente é um motive 
tipicamente holandê5 - pode ser vi5to em muita5 pinturas 
antiga5, mas, no no550 5éculo, Rietveld, por exemplo, cri01 
o mesmo arranjo, completado por uma meia-porta, em sut 
famo5a ca5a Schroder. Utrecht, 1924 159). 
DE DRIE HOVEN, lAR PARA IDOSOS (60) 
Em situações nos quais posso ser necessário um contato 
entre o interior e o exterior - num lar poro idosos, por 
exemplo, alguns dos moradores possam boa porte de seu 
tempo no solidão de seus próprios quartos por causo do 
mobilidade reduzido, esperando que alguém vá visitá-los, 
enquanto outros moradores que ficam do lodo de foro 
também gostariam de algum contato-, em tais situações, 
uma boa idéio é instalar portos com duas seções, de 
maneiro que o porte de cimo posso ser mantido aberto e o 
porte de baixo fechado. Essas "meio-portos" constituem um 
cloro gesto de convite: o porto está aberto e fechado ao 
mesmo tempo, i.e. , suficientemente fechado para evitar que 
os intenções dos que estão lá dentro fiquem 
demasiadamente explícitos, mos aberto o bastante poro 
facilitar o converso casual com quem está passando, o que 
pode levar o um contato mais íntimo. 
A concretização do sole ira como intervalo significa, em 
primeiro lugar e acima de tudo, criar um espaço para 
as boas-vindas e as despedidas, e, portanto, é a 
tradução em termos arquitetônicos da hospitalidade. 
Além disso, a soleira é tão importante para o contato 
social quanto as paredes grossas para a privacidade. 
Condições para a privacidade e condições para manter 
os contatos sociais com os outros são igualmente 
necessárias. Entradas, alpendres e muitas outras 
formas de espaços de intervalo fornecem uma 
oportunidade para a "acomodação" entre mundos 
contíguos. Esta espécie de dispositivo dá margem o 
certa articulação do edifício em foco, o que requer 
espaço e dinheiro, sem que sua função possa ser 
facilmente demonstrável - e ainda menos quantificável -, 
e, por esse motivo, torna-se muitas vezes difícil de 
realizar, exigindo esforço e trabalho de persuasão 
constante durante a fase de planejamento. 
RESIDÊNCIAS DOCUMENTA URBANA (61 -70) 
O edifício em formo de meandro, denominado "serpente", 
é composto de segmentos, cada um deles projetado por 
arquitetos diferentes. As escadas comunitários foram 
colocados numa situação de amplo luminosidade, bem 
maior que o do espaço residual costumeiro, em geral de 
pouco luminosidade. 
Numa residência poro vários famílias, o ênfase não deve 
recair exclusivamente sobre medidos arquitetônicos 
destinadas o prevenir o barulho excessivo e o 
inconveniência dos vizinhos; uma atenção especial deve ser 
dado em particular à disposição espacial, que pode 
conduzir aos contatos sociais esperados entre os vários 
ocupantes de um mesmo edifício. Por conseguinte, 
atribuímos às escadas mais importância do que de costume. 
As escadas comunitários não devem ser apenas uma fonte 
de aborrecimento no que diz respeito ao acúmulo de 
sujeira e à limpeza - devem servir também, por exemplo, 
como um ployground poro os crianças de famílias vizinhos. 
Por este motivo, foram projetados com o máximo deluz e 
abertura, como ruas com telhado de vidro, e podem ser 
avistados dos cozinhas. Os alpendres de entrado abertos, 
com duas portos, uma após o outro, expõem ao território 
comunitário um pouco mais de seus moradores do que os 
portos fechados tradicionais. 
Embora, naturalmente, tenho-se tomado cuidado poro 
assegurar o privacidade adequado nos terraços, os famílias 
vizinhos não estão de todo isolados umas dos outros. 
Procuramos projetor os espaços exteriores de tal modo que 
o vedação necessário roube o mínimo possível dos 
DOMINIO PUBliCO 35 
60 
61 
36 l i ÇÕES DE ARQUITETURA 
1':'1 ....... . 
_. .... .,~"~•• 
•••• :J1188 
~~········ II:::J~··Orãlial 
........ .,~··· 
62 63 
64 65 
66 67 
condições espaciais paro contatos entre os vizinhos. Tal 
expansão do espaço mínimo requerido poro "finalidades de 
circulação" mostrou-se capaz não apenas de atrair os 
crianças - serve também como um lugar em que os vizinhos 
podem se sentar e conversor. Neste coso os moradores 
também providenciaram os equipamentos. 
Edificio à direito. O. Steid/e, arquiteto. 
.......,._,~-~ 
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\01\f ~il!i/ 
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DOMÍNIO PÚBliCO 37 
68 
69 
70 
Além da tradicional porta da frente, as moradias têm uma 
segunda porta de vidro que também pode ser trancada e 
que conduz à escada, obtendo-se assim um espaço de 
entrada aberto. Uma vez que esse espaço intermediário 
entre a escada e a porta da frente é interpretado de 
maneira diferente por pessoas diferentes- i.e. , não apenas 
como parte das escadas mas também como uma extensão 
da casa - , é usado por alguns como um ho/1 aberto, no 
qual a atmosfera da casa pode penetrar. Deste modo, 
dependendo de qual das duas portas é considerada como a 
verdadeira porta da frente, os moradores podem expor sua 
38 liCÕES DE ARQUITETURA 
individualidade, em geral restrita à intimidade do lar, ao 
mesmo tempo em que a escadaria perde algo de suo 
característica de terra-de-ninguém e pode até adquirir un:: 
atmosfera autenticamente comunitária. O princípio do 
caminho vertical para o pedestre, tal como aplicado no 
projeto habitacional de Kassel, foi posteriormente 
elaborado no conjunto habitacional LiMa em Berlim. 
As escadas desse conjunto conduzem a terraços 
comunitários nos telhados. No final, decidiu-se que não 
seria necessário incorporar as varandas para lazer 
previstas no projeto de Kassel , já que o pátio isolado 
oferecia o espaço de lazer adequado, especialmente pore 
. . 
as cnanças ma1s novas. 
CITÉ NAPOLEON, PARIS, 1849 IM. H. VEUGNY (71·74) 
A Cité Nopoléon, em Paris, foi uma dos primeiros 
tentativas, e certamente o mais notável, de solução razoável 
poro o problema do distância entre o ruo e o porto da 
hnte num prédio residencial de muitos andores. Este 
espoço interior, com suas escadas e passarelas, evoco as 
edificações de vários andares de uma aldeia nas 
montanhas. Uma razoável quantidade de luz alcança os 
andores mais altos através do telhado de vidro. 
Os moradores dos andores de cima abrem suas janelas 
poro este espaço interior, e o presença de vasos de plantas 
mostro, pelo menos, que os pessoas dão valor a esse 
detalhe. Embora não tenho sido possível - em que pesem as 
boas intenções dos construtores - transformar esse espaço 
interior (fechado como é em relação à ruo lá foro) numa 
ruo interna verdadeiramente funcional segundo nossos 
podrões, não há dúvida de que este exemplo se destaca de 
maneiro brilhante, sobretudo quando se penso em todas 
aquelas sombrios escadarias construídas desde 1849. 
1.···.··--~••uHu••l .. :·.•. ,······~········· ,_, ::::::~::·_·:: 
o 5 10 
I L..J'tJ 
DOMÍNIO PUBLICO 39 
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73 
74 
75 
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7 DEMARCACOES PRIVADAS 
I 
NO ESPACO PÚBLICO 
I 
O conceito de intervalo é o chove para eliminar a 
divisão rígida entre áreas com diferentes demarcações 
territoriais. A questão está, portanto, em criar espaços 
intermediários que, embora do ponto de vista 
administrativo possam pertencer quer ao domínio 
público quer ao privado, sejam igualmente acessíveis 
para ambos os lados, isto é, quando é inteiramente 
aceitável, para ambos os lados, que o "outro" também 
possa usá-lo. 
DE DRIE HOVEN, lAR PARA IDOSOS (75·77) 
Os corredores servem como ruas num edifício que deve 
funcionar como uma cidade para seus moradores, afetados 
por sérias limitações, já que o maior porte deles é incapaz 
de deixar o área sem ajudo. As unidades de habitação 
situadas ao longo desta "ruo" têm, aos pares, áreas 
semelhantes a alpendres, que, por um lado, pertencem às 
habitações, mos, por outro, também fazem porte da "rua". 
Os moradores colocam suas coisas ali, cuidam deste espaço 
e com freqüência criam plantas e flores ali , como se este 
fosse parte de sua próprio cosa, uma espécie de varando 
no nível da rua. Embora a área do alpendre seja 
completamente acessível aos transeuntes, permanece como 
porte da rua. 
É extremamente difícil reservar os poucos metros quadrados 
necessários a um objetivo como esse dentro da infinito rede 
de regulamentos e normas que se referem às dimensões 
mínimas e máximas que governam cada um dos aspectos 
do projeto arquitetônico. 
No caso dos abrigos sociais, esse aspecto é considerado, 
40 liÇÕ ES O E A RQ UI TE! U R A 
do ponto de vista administrativo, como uma redução 
indevida do tamanho da unidade domiciliar, ou como uma 
expansão indevida do corredor: a funcionalidade de cada 
metro quadrado é, afinal, medida de acordo com a 
utilidade quantificável. O amor e o cuidado que os 
moradores investem neste espaço, que, estritamente, não é 
porte do apartamento, dependem de um detalhe 
aparentemente menor, ou seja, a janela que lhes permite 
vigiar os objetos que foram colocados lá fora , não só como 
uma precaução contra o roubo, mas simplesmente porque é 
agradável poder ver os próprias coisas ou verificar como 01 
plantas vão indo. O arquiteto precisa de uma dose 
incomum de engenhosidade para que esta idéia consigo 
passar pela vigilância cuidadoso dos autoridades 
responsáveis pela prevenção de incêndios. 
Os quadros de luz no "De Drie Hoven" perto das portos do 
frente foram instalados em pequenas muretas salientes, de 
tal modo que se pode colocar facilmente um tapete ao lodo. 
o o 
Usando pedaços de tapete, os moradores se apropriam do 
pequeno espaço assim criado e o equipam, estendendo desta 
moneira os limites de sua casa além da porta da frente. 
Se incorporamos os sugestões espaciais adequados e m 
nosso projeto, os moradores sentem-se mais inclinados 
a expandir suo esfera de influência em di reção à área 
pública. Até mesmo um pequeno ajustamento, no 
forma de uma articulação espacial do entrado, pode 
ser o bastante poro estimular a expansão do esfera de 
influência pessoal , e, deste modo, o qualidade do 
espaço público será consideravelmente aprimorado no 
interesse comum. 
RESIDÊNCIAS DIAGOON (78·83) 
O que poderia ser feito com os calçados nos "ruas 
residenciais", se coubesse aos moradores a 
responsabilidade pelo espaço, pode ser imaginado com 
base na experiência com as calçadas em frente às 
residências Diagoon, em Delh. A área em frente às 
moradias não foi projetada como jardim; foi simplesmente 
pavimentada como uma calçada comum e, 
conseqüentemente, como parte do domínio público, 
embora, de modo estrito, não o seja. 
As áreas pertencentes às diversas casos não foram 
demarcadas, e o loyouf não contém nenhuma sugestão de 
demarcação privada. A pavimentação foi leito com blocos de 
concreto comum, o que desperta automaticamente associações 
com uma rua pública porque as calçadas em geral são 
pavimentadas com o mesmo material. Os moradores então 
começaram a remover alguns dos blocos de concreto para 
colocar plantas no lugar. "Dessous les pavés la plage." 
O resto dos blocos foi deixado intactopara proporcionar um 
caminho até a porta ou um espaço para estacionar o corro 
da família perto da casa. Cada morador uso a área em frente 
à sua casa de acordo com suas necessidades e desejos, 
incorporando a parte da área de que necessita e deixando o 
resto acessível para o uso público. 
Se o layouf tivesse partido da idéia de áreas separados, 
privadas, então sem dúvida todos iriam usá-las ao máximo 
em seu próprio benefício, mas surgiria uma divisão 
irreversivelmente abrupta entre o espaço público e o 
privado, em vez da zona intermediária que foi criada, uma 
fusão do território estritamente privado das casas e da área 
público do rua. Nesta área de intervalo, entre o público e o 
privado, demarcações individuais e coletivas podem 
superpor-se e os conflitos resultantes devem ser resolvidos 
mediante um acordo entre os portes. É aqui que cada 
morador desempenha o papel que revela o tipo de pessoa 
que quer ser e, por conseguinte, como desejo que os outros 
o vejam. Aqui se decide também o que o indivíduo e a 
coletividade podem oferecer um ao outro. 
DOMINIO PÚBliCO 41 
78 
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MORADIAS LIMA (84-89) 
O conjunto de moradias LiMo está localizado no ponto de 
uma área triangular, cujo esquina é ocupado por uma 
igreja. Os volumes desta igreja não se relacionam 
claramente com o alinhamento arquitetônico geral. 
42 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
Construir nesta ilha triangular implico manter o igreja à 
porte como uma estruturo destacado e autônomo . O pátio 
bastante diferente do tradicional e muitos vezes deprimente 
pátio berlinense, e suo concepção é o de um espaço 
público com seis caminhos de acesso para os pedestres, 
incluindo conexões com a ruo e com o pátio vizinho. Estes 
caminhos para pedestres constituem parte dos escadarias 
comunitárias. No centro do pátio há um amplo tanque de 
areia dividido em segmentos, cujas laterais foram 
decorados com mosaicos pelas próprias famílias dos 
moradores. 
Não foi difícil despertar o entusiasmo dos moradores - os 
quais já estavam profundamente interessados no projeto do 
pátio- especialmente depois que eles viram as fotografias 
do parque de Gaudí e as Torres Watt. A ajuda técnico e 
organizacional foi fornecida por Akelei Hertzberger, que 
empreendeu vários projetos semelhantes no passado com 
resultados igualmente bem-sucedidos. 
No começo, foram principalmente as crianças que 
contribuíram com seus "ladrilhos", mas logo em seguida os 
adultos aderiram, trazendo qualquer pedaço de cerâmica 
que pudessem obter. 
Nenhum arquiteto hoje seria capaz de dedicar tonto 
atenção o um tanque de areia, nem isto seria necessário, 
porque é algo que pode ser deixado poro os próprios 
moradores. É difícil imaginar uma maneiro melhor de 
responder ao incentivo oferecido. Mos ainda mais 
importante é o foto de que o tanque de areia se tornou 
algo que pertencia o eles e um objeto de seus cuidados: se 
um fragmento do mosaico cai ou revelo ser pontudo 
demais, por exemplo, algo será feito sem que haja 
necessidade de reuniões especia is, cartas oficiais ou 
processos contra o arquiteto. 
Uma área de rua com o qual os moradores estão 
envolvidos, onde marcos individuais são criados por 
eles próprios, é apropriado conjuntamente e 
transformado num espaço comunitário. 
DOMiNIO PÚBLICO 43 
87 88 
89 
8 CONCEITO DE 
OBRA PÚBLICA 
Coniunto residencial 
Biilmermeer, 
Amsterdam 
90 91 
92 
Fotomontagem 
44 liÇÕES OE ARQUITETURA 
Proieto residencial Familistere, Guise, França 
O segredo é dor aos espaços públicos uma formo tal 
que a comunidade se sinto pessoalmente responsável 
por eles, fazendo com que cada membro da 
comunidade contribuo à suo maneira para um 
ambiente com o qual posso se relacionar e se 
identificar. 
O grande paradoxo do conceito de bem-estar coletivo, 
tal qual se desenvolveu lodo a lodo com os ideais do 
socialismo, é que ele acabo subordinando as pessoas 
ao sistema que foi construído para libertá-las. 
Os serviços prestados pelos departamentos de Obras 
Públicas Municipais são vistos, por aqueles em cujo 
benefício esses departamentos foram criados, como 
uma abstração opressivo; é como se as obras públicas 
fossem uma imposição vindo de cimo; o homem 
comum sente que "não tem nado o ver com ele", e, 
deste modo, o sistema produz um sentimento 
generalizado de alienação. 
o~ jordin$ público$ e O$ cinturÕe$ verdes em volto do$ 
bloco~ de oportomento$ no$ novo$ área$ urbano$ $ãO de 
responsabilidade dos departamentos de Obrm Público$, 
que fazem o que podem poro tornar e$SO$ áreas tão 
atraente$ quanto possível -dentro dos limites dos 
orçamento$ alocados - em benefício do comunidade. 
Mo$ os resultados conseguidos desta maneiro não deixam 
de ser rígidos, impessoais e ontieconômicos, comparados 
com os que poderiam ser alcançados se todos os moradores 
dos apartamentos tivessem o oportunidade de usar um 
pequeno pedaço de terra (mesmo que fosse apenas do 
tamanho de uma vogo de estacionamento) poro seus 
próprios objetivos. 
O que foi negado à coletividade poderio ter sido o 
contribuição de cada morador do comun idade. O espaço 
poderio ser usado de modo mais intensivo se nele fossem 
investidos amor e cuidado pessoal. 
Um exemplo desta afirmação pode ser visto no Fomilistere 
em Guise, no França, um projeto de moradias construído 
poro o fábrica de fogões Godin: uma comunidade de 
moradores e trabalhadores moldado de acordo com os 
idéias de Fourier. Embora construído no século XIX, ainda 
conservo seu interesse como um exemplo do que pode ser 
feito. 
MORADIAS VROESENLAAN, RomRDAM, 1931-34 I J. H. VAN 
DEN BROEK (93, 94) 
As áreas de lazer e conforto comunitários só podem 
florescer pelo esforço comunitário dos usuários. Essa deve 
ter sido o idéio subjacente aos espaços comunitários 
interiores - sem cerCO$ e divi$órios - que foram projetado$ 
no$ ano$ 20 e nos anO$ 30. 
DOMÍNIO PUBliCO 45 
93 
94 
95 DE DRIE HOVEN, LAR PARA IDOSOS (95) 
O espaço cercado contendo animais, que deve suo 
existência à iniciativa de um membro do equipe do "De 
Drie Hoven", desenvolveu-se até tornor·se um zoológico em 
miniatura, com um faisão, um povão, golinhos, cobras, 
uma porção de patos num logo cheio de peixes. Poro os 
idosos que moram no Lar, os animais compõem uma visto 
agradável e interessante, e os quartos com visto poro o 
menagerie são os mais procurados. 
Abrigos de fabricação caseiro para os animais passarem a 
noite foram providenciados por entusiastas, mas, logo que 
esse esquema popular virou um sucesso e a expansão se 
tornou necessária, o Departamento de Inspeção de 
Moradias decidiu que os coisas não podiam mais continuar 
assim; estipularam então que era preciso submeter à 
aprovação de autoridades e comissões competentes uma 
planta de construção elaborada por profissionais. 
Para a população local, a menagerie representa um convite 
ao envolvimento nos cuidados com os animais ou 
simplesmente um passeio para ver como eles estão. Quando 
é que as crianças da cidade vêem animais? Os únicos que 
a maioria delas vê em seu ambiente são animais domésticos 
de estimação, cachorros presos em coleiras, já que parece 
impossível organizar formas de posse coletiva de animais 
com divisão de responsabilidades pela sua manutenção. 
Uma idéia dessa natureza nem sequer é sugerida - os 
moradores locais, afinal, normalmente não exercem 
nenhuma influência na maneira como seus espaços 
comunitários são organizados e usados. Mas não podemos 
46 liÇÕES DE ARQUITETURA 
esperar que o setor de Obras Públicas vá cuidar de animais 
por toda a cidade. Para isso, seria necessário um novo 
departamento com funcionários especializados, para não 
falar dos milhares de avisos dizendo "Não dê comida aos 
• • 11 
an1ma1s . 
A distribuição dos espaços e os animais no "De Drie 
Hoven" constituemum fator de indução natural para o 
contato social entre os seus idosos moradores e a 
população local - dois grupos com limitações diferentes. 
Os moradores do Lar são fo rçados pelas circunstâncias a 
ser estranhos na cidade, mas graças a "seu" jardim podem 
oferecer alguma compensação para os outros - os quais, 
por suo vez, são estranhos na área do "De Drie Hoven". 
Estes exemplos servem para ilustrar como as melhores 
intenções podem levar à desilusão e à indiferença. 
As coisas começam a dar errado quando as escalas se 
tornam grandes demais, quando a conservação e a 
administração de uma área comunitária não podem 
mais ser entregues àqueles que estão diretamente 
envolvidos e se torna necessária uma organização 
especial, com sua equipe especializada, com interesses 
e preocupações próprios quanto à sua continuidade e, 
possivelmente, à sua expansão. Quando se atinge o 
ponto em que a principal preocupação de uma 
organização é assegurar a continuidade de sua 
existência - independente dos objetivos para as quais 
foi criada, ou seja, fazer pelos outros o que não se 
pode esperar que eles mesmos façam -, neste 
momento a burocracia assume o controle. As regras 
tornam-se uma camisa-de-força de regulamentos. 
O sentido de responsabi lidade pessoal perde-se numa 
burocracia sufocante de responsabilidades para com 
superiores. Embora não exista nada de errado com as 
intenções do elo individua l nesta interminável cadeia 
de interdependências, elas se tornam virtua lmente 
irrelevantes porque estão demasiado afastadas 
daqueles em cujo benefício todo o sistema foi 
inventado. A razão pela qual os habitantes da cidade 
se tornam estra nhos em seu próprio ambiente de vida 
é porque o potencial da iniciativa coletiva foi 
grosseiramente superestimado ou porque a 
participação e o envolvimento foram subestimados. 
Os moradores de uma casa não estão de fato 
preocupados com o espaço fora de seus lares, mas 
também não podem ignorá-lo. Esta oposição conduz à 
alienação diante de seu ambie nte e - na medida em 
que suas relações com os outros são influenciadas por 
ele - conduz também à alienação diante dos 
moradores vizinhos. 
O crescimento do nível de controle imposto de cima 
poro baixo está tornando o mundo à nossa volta cada 
vez mais inexorável: e isso abre caminho para a 
agressividade que, por sua vez, conduz a um 
enrijecimento ainda maior da teia de regulamentos. 
O resultado é um círculo vicioso, a falta de 
comprometimento e o medo exagerado do caos 
alimentando-se mutuamente. 
A incrível destruição da propriedade pública, 
destruição que está aumentando nas principais cidades 
do mundo, pode ser provavelmente imputada à 
alienação diante do ambiente de vida. O fato de que 
os abrigos de transporte público e os telefones 
públicos venham sendo, semana após semana, 
completamente destruídos é na verdade uma 
alarmante acusação à nossa sociedade como um todo. 
Quose tão alarmante, no enta nto, é que essa tendência 
- e sua escala - é enfrentada como se fosse um mero 
problema de organização: por meio do expediente de 
reparos periódicos, como se tudo não passasse de uma 
questão rotineira de manutenção, e da aplicação de 
reforços-extras l"à prova de vândalos") . Desta 
maneira, a situação parece estar sendo aceita como 
"apenas mais uma dessas coisas". Todo o sistema 
repressivo da ordem estabelecida é gerado para evitar 
conflitos, para proteger os membros individuais da 
comunidade das incursões de outros membros da 
mesma comunidade, sem o envolvimento direto dos 
indivíduos em questão. Isso expl ica por que há um 
medo profundo da desordem, do caos e do 
inesperado, e por que os regulamentos impessoais, 
"objetivos", são sempre preferidos ao envolvimento 
pessoal. É como se tudo devesse ser regulamentado e 
quantificável, de modo que permitisse um controle total 
e criasse as condições para que o sistema repressivo 
da ordem nos torne locatários em vez de 
co-proprietários, subordinados em vez de participantes. 
Assim, o próprio sistema cria a alienação e, embora 
afirme representar o povo, na verdade impede o 
desenvolvimento de condições que poderiam resultar 
num ambiente mais hospitaleiro. 
• O arquiteto pode contribuir para criar um ambiente 
que ofereça muito mais oportunidades para que as 
pessoas deixem suas marcas e identificações pessoais, 
que possa ser apropriado e anexado por todos como 
um lugar que realmente lhes "pertença". O mundo que 
é controlado e administrado por todos e para todos 
terá de ser construído com entidades pequenas e 
funcionais, não maiores do que as capacidades de 
cada um para mantê-las. Cada componente espacial 
será usado mais intensamente (o que valoriza o 
espaço), ao mesmo tempo em que se espera que os 
usuários demonstrem suas intenções. Mais 
emancipação gera mais m.otivação, e deste modo 
pode-se liberar a energia represada pelo sistema de 
decisões centralizadas. Isto constitui um apelo em 
favor da descentralização das responsabilidades, de 
suo restituição onde for possível, e em favor da 
delegação de responsabilidade a quem de direito-
para que possam ser tomadas medidas eficazes, para 
resolver os problemas da inevitável alienação diante 
do "deserto urbano". 
DOM INIO PUBl i CO 47 
96 
9 A RUA 
Amsterdam, bairro 
operário, a vida nas 
ruas: bem diferente de 
hoje, mas lembre-se 
de como as moradias 
eram apertadas e 
inadequadas naquele 
tempo 
97 
9B 
Gioggia, Itália. Rua 
de convivência, sem 
trânsito. Procurando 
um lugar na sombra 
48 L I Ç Õ E S DE A RQU I TETU RA 
Para além de nossa porta ou do portão do jardim, 
começa um mundo com o qual pouco temos a ver, um 
mundo sobre o qual praticamente não conseguimos • • 
exercer influência. Há um sentimento crescente de que 1114 
o mundo para além de nossa porta é um mundo hostil, de 
de vandalismo e agressão, onde nos sentimos gal 
ameaçados, nunca em casa. No entanto, tomar esse int 
sentimento generalizado como ponto de partida para o di1 
planejamento urbano seria fatal. • c 
Certamente seria bem melhor voltar ao conceito otimista ca1 
e utópico da "rua reconquistada", que podíamos ver tão • c 
claramente diante de nós há menos de duas décadas. nÚI 
Nesta visão, inspirada pelo prazer existencialista diante aa 
da vida no pós-guerra (especialmente o Provo, no caso POI 
da Holanda), a rua é de novo concebida como o que &Sf 
deve ter sido originalmente, ou seja, um lugar onde o rue 
contato social entre os moradores pode ser estabelecido: est 
como uma sala de estar comunitária. E o conceito de dis 
que as relações sociais podem até ser estimuladas pelo ma 
aplicação eficiente de recursos arquitetônicos pode ser de1 
encontrado em Team X e especialmente em Forum, • C! 
onde, como um tema central, esta questão era pel 
repetidamente levantada. a f. 
A desvalorização desse conceito de rua pode ser A F 
atribuído aos seguintes fatores: esti 
• o aumento do tráfego motorizado e a prioridade que 
recebe; 
• o organização sem critérios de áreas de acesso às 
moradias, em particular as portas da frente, por causa 
de vias indiretas e impessoais de acesso, tais como 
galerias, elevadores, passagens cobertas (os 
inevitáveis subprodutos de construções muito altas) que 
diminuem o contato com o nível da rua; 
• a anulação da rua como espaço comunitária por 
causa do assentamento dos blocos; 
• densidades reduzidas de moradias, enquanto o 
número de moradores por unidade também diminui 
acentuadamente. Assim, a queda da densidade 
populacional vem acompanhada por um acréscimo no 
espaço de habitações por moradores e na largura das 
ruas. A conseqüência inevitável é que as ruas de hoje 
estão bem mais vazias do que as do passado; além 
disso, a melhoria no tamanho e na qualidade das 
moradias significa que as pessoas passam mais tempo 
dentro de casa e menos na rua; 
• quanto melhoresas condições econômicas das 
pessoas, menos ela necessitam dos vizinhos, e tendem 
a fazer menos coisas juntas. 
A prosperidade crescente parece, por um lado, ter 
estimulado o individualismo, enquanto, por outro lado, 
pe rmite que o coletivismo assuma proporções além da 
nossa compreensão. 
Devemos tentar lidar com esses fatores - ainda que o 
arquiteto seja incapaz de fazer mais do que exercer 
uma influência incidental nos aspectos fundamentais 
de mudança social mencionados acima - criando 
condições para uma área mais viável de rua onde quer 
que seja possível. O que significa que isto deve ser 
feito no âmbito da organização espacial, isto é , por 
meios arquitetônicos. 
• Situações em que a rua serve como uma extensão 
comunitária das moradias são familiares a todos nós. 
Dependendo do clima, as partes ensolaradas ou as 
partes com sombra são as mais populares, mas o 
tráfego motorizado está sempre ausente ou pelo menos 
longe o bastante para não impedir que os moradores 
vejam uns aos outros e possam ser ouvidos. 
As ruas de convivência, que não servem mais 
exclusivamente como via de tráfego e que estão 
organizadas de tal modo que há também espaço para 
as crianças brincarem, estão se tornando uma 
presença cada vez mais familiar tanto nos novos 
conjuntos habitacionais quanto nos projetos de 
renovação - pelo menos na Holanda. Os interesses do 
99 
Moradias Spangen. 
Rotterdam, 1919/ 
M. Brinkman. Rua de 
convivência, sem 
trânsito. Procurando 
um lugar aa sol 
DOMINIO PÚBLICO 49 
IOI 
100 102 
pedestre estão sendo finalmente levados em 
consideração, e com a instituição da woonerf (área 
residencial com severas restrições ao tráfego e 
prioridade total para os pedestres) com base jurídica, 
ele está reconquistando seu lugar ou, pelo menos, não 
é mais tratado como um fora-da-lei. No entanto, ainda 
que os motoristas sejam obrigados a se comportar de 
modo mais disciplinado, seus veículos ainda constituem 
um embaraço, pois são tão grandes e, em especial, tão 
numerosos, que ocupam cada vez mais o espaço 
público. 
MORADIAS HAARLEMMER HOUTIUINEN ( 100-1 09) 
O tema central no Haarlemmer Houttuinen é a rua como 
espaço de convivência, elaborada em associação com Van 
Herk e Nagelkerke. A decisão de reservar uma área de 
27 metros para o trânsito - mais relacionada com política 
do que com planejamento urbano- obrigou-nos a construir 
dentro desse limite de alinhamento imposto; como 
resultado, não sobrou espaço para jardins nos fundos (que, 
de qualquer modo, ficariam permanentemente na sombra). 
Em suma, essas circunstâncias desfavoráveis- i.e. , 
orientação indesejável e ruído de trânsito - deixavam claro 
que o lado norte deveria acomodar a parede de fundo, e, 
deste modo, toda a ênfase recaiu automaticamente na rua 
de convivência do lado sul. Esta rua de convivência é 
acessível apenas para os carros dos próprios moradores e 
para os veículos de entregas; o fato de estar fechada ao 
tráfego motorizado em geral e também a sua largura de 
sete metros - um perfil inusitadamente estreito pelos 
padrões modernos - criaram uma situação capaz de evocar 
a antiga cidade. Os equipamentos necessários à rua, tais 
como luzes, estacionamentos de bicicletas, cercas baixas e 
bancos públicos, estão distribuídos de tal modo que apenas 
uns poucos carros estacionados já são o bastante para 
50 liÇÕES DE ARQUITETURA 
,i:l 1~<-?.,lfii\"t 
::; :::::;::::::::::::::::::: ~:::::::::::::::::: : ::::::::::::::::::::::::::::::::: : :::::::::::::::::::::::::::::::: 
'\0... . SI 
r 1 ' ' • 1 (/\J 
obstruir a passagem de qualquer tráfego adicional. Foram 
plantados árvores para formar um centro a meio-caminho 
entre as duas seções da rua. As estruturas que se projetam 
a partir dos fachadas - as escadas externas e as varandas 
-articulam o perfil da rua, fazendo-a parecer menos 
ampla do que os sete metros da frente de uma casa até a 
frente de outro. A conseqüência é uma zona que 
proporciono espaço poro os terraços das residências 
térreos. Estes canteiros com muros baixos não são maiores 
do que as varandas do primeiro andar; é claro que não 
podiam ser menores, mas o questão é saber se ficariam 
melhores se fossem maiores. Como oferecem bem menos 
privacidade do que as sacadas, podemos nos perguntar se 
os moradores do andar térreo não ficam em desvantagem, 
mas, por outro lado, o contato imediato com os transeuntes 
e com as atividades gerais da rua parece ser atraente para 
muitas pessoas, especialmente quando a rua readquire algo 
de sua antiga qualidade comunitária. Foram deixadas 
faixas em aberto ao lado dos espaços privados externos; 
deliberadamente, ficou indefinida a organização dessas 
faixas. O departamento de obras públicas não resistiu à 
oportunidade de pavimentar esses espaços. Os moradores, 
por suo vez, estão colocando plantas ali, apropriando-se 
gradativamente dessa área basicamente pública. 
A construção civil na Holanda tem a tradição de dedicar 
muita atenção aos problemas de acesso aos andares mais 
altos, e uma grande variedade de soluções foi desenvolvida 
no país - todas com o objetivo de dar a cada residência 
uma porta de entrada com o máximo de acesso possível 
pela rua. No verdade, a solução que adotamos é apenas 
uma outra variação de um tema essencialmente antigo: a 
escadaria externa de ferro conduz o um patamar no 
primeiro andar, onde fica a porta da frente da moradia do 
andar de cima; daí a escadaria continua por dentro do 
DOMÍNIO PÚBLICO 51 
103 
104 
Reiinier Vinkeleskade, 
Amslerdam, 1924 I 
J. C. van Epen 
105 IOó 
107a 
107b 
108 107c 109 
edifício, passando pelos dormitórios do moradia do andar 
térreo até a moradia do andar de cima. 
As entrados para os moradias dos andares de cima, 
localizadas em "varandas públicas" com vista para a rua, 
não constituem obstáculo para as moradias do andar térreo, 
mas dão a estas uma espécie de abrigo para suas próprias 
entradas. Como as escadas são leves e transparentes, o 
espaço que fica embaixo delas pode ser totalmente usado 
para caixas de correio, bicicletas e para as brincadeiras das 
crianças. Houve um esforço considerável para separar os 
áreas de acesso às habitações dos andares de cima e os 
espaços de jardim em frente das habitações do andar 
térreo. Isso se reflete na definição clara das 
responsabilidades dos moradores quanto à limpeza de suas 
áreas de acesso. A ausência de uma definição assim tão 
clara resultaria sem dúvida numa utilização menos intensa 
do espaço disponível para cada morador. 
O conceito da rua de convivência está baseado na 
idéia de que os moradores têm algo em comum, que 
têm expectativas mútuas, mesmo que seja apenas 
porque estão conscientes de que necessitam um do 
outro. Este sentimento, no entanto, parece estar 
desaparecendo rapidamente de nossas vidas. 
A afinidade entre os moradores parece diminuir à 
medida que aumenta a independência proporcionada 
pela prosperidade. Tal anonimato chega mesmo a ser 
elogiado pelos adeptos do coletivismo e da 
centralização: se as pessoas se relacionam muito entre 
52 liÇÕES DE ARQUITETURA 
Segunda andar 
Primeiro andar 
Andar térreo 
DOMÍNIO PÚH ICO 53 
110 111 
si, há o perigo de um excesso de "controle social", 
eles argumentam. 
Na verdade, quanto mais isoladas e alienadas a s 
pessoas se tornarem em seu ambiente diá rio, mais 
fácil será controlá-las com decisões autoritárias. 
Embora o "controle social" não tenho de ser nega tivo 
por definição, ele sem dúvida existe e seus efe itos 
negativos são sentidos quando não podemos fazer 
nado sem que sejamos julgados e vigiados pelos 
outros, como em toda comunidade muito concentrado, 
uma vila , por exemplo. 
Devemos aproveitar todas as oportunidades possíveis 
poro evitar uma separação rígida entre habitações 
e para estimular o que restou do sentimentode 
participar de algo que nos é comum. 
Em primeiro lugar, esse sentimento de comunidade está 
presente em qualquer interação social do cotidia no, tal 
como nos brincadeiras dos crianças, no hábito de 
revezar-se poro tomar conta das crianças, na 
preocupação em manter-se informado sobre o saúde 
do outro, em sumo, em todos esses cuidados e alegrias 
que talvez pareçam tão evidentes que tendemos a 
subestimar sua importância. 
• As unidades de habitação funcionam melhor quando 
as ruas em que estão localizadas funcionam bem como 
espaços de convivência , o que por suo vez depende 
particularmente de verificar o quanto são receptivos, 
i.e., em que medida o atmosfera dentro dos cosas pode 
se integrar à atmosfera comunitário do rua lá fora. Isto 
54 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
é determinado em grande parte pelo planejamento e 
pelo detalhamento do /ayout do vizinhança. 
CoNJUNTO HABITACIONAL SPANGEN, RomRDAM, 1919 I 
M. BRINKMAN (110, 111) 
As galerias de acesso no conjunto habitacional Spanger 
Rotterdom ( 1919) ainda não foram superados no que diz 
respeito ao que oferecem aos moradores. Como só existe 
portos do frente em um lodo dessa "ruo de convivência·. 
moradores têm como companhia apenas seus vizinhos 
imediatos. Isso é uma desvantagem em comparação cor 
uma ruo normal, onde naturalmente encontramos os 
vizinhos também do outro lado da ruo. No entanto, em Um 
Spongen, o contato entre vizinhos é excepcionalmenle 
intenso, o que mostro como é importante o ausência do 
trânsito. Ainda assim, o interação que ocorre nos acesSO\ 
do galeria não se estende à ruo abaixo, onde ficam os 
fundos dos residências. Não se pode estar em dois lu gar~ 
ao mesmo tempo. 
ALOJAMENTO PARA ESTUDANTES WEESPERSTRAAT (112·115 
As unidades de habitação poro os estudantes casados o 
quarto andor induziram à construção de uma rua·golerio 
que poderio ser visto como um protótipo para uma ruo de 
convivência, livre do trânsito e com visto poro os telhodol 
do cidade velho. É um lugar seguro mesmo para as 
crianças pequenos, que podem brincar ali enquanto seus 
pois podem ficar sentados em frente às suas cosas. 
O exemplo em que esse projeto se baseou foi, na verdooe 
o complexo Spongen de 45 anos atrás. 
r ~ 1·x r~ -~ ... ~ -1·· l .ld ' i 1 j ~ 1 ~. IJ : - · · • • · a ~ 1 ~ I 
-- .J ,. • . ~ ~ . <f: • ~ C-1 - ' -' 
Um dos problemas nas ruas-galerias é a colocação das 
janelas dos quartos de dormir: se se abrem para a galeria, 
surge a desvantagem de uma privacidade insuficiente. Essa 
situação pode ser melhorada ao se erguer o nível do chão 
do quarto de dormir, de modo que os que estão dentro 
passam olhar pela janela com sua visão acima das cabeças 
dos pessoas que estão do lado de fora, ao mesmo tempo 
em que o janela é alta demais para que os que estão do 
lado de fora possam olhar para dentro do quarto. 
O edifício como um todo acabou se tornando muito menos 
aberto, e, em conseqüência, a rua-galeria não é mais 
acessível ao público. 
PRINCÍPIOS DE ASSENTAMENTO (I I 6) 
Pode·se ver como isto funciona, de uma forma elementar, 
nos princípios de assentamento adotados de um modo ou 
de outro em todos os projetos de moradia recentemente 
construídos. 
. ' I I 
1~11[] 
A procura por mais espaço e luz solar para todas as 
unidades habitacionais conduziu, no planejamento urbano 
do século XX, ao abandono do até então habitual 
assentamento de quadras dentro do perímetro. 
O resultado foi a perda do contraste entre a reclusão 
tranqüila dos pólios cercados e a agitação e o barulho do 
DOMÍ NIO PÚSL CO SS 
112 
113 
114 115 
116obc 
117 118 119 
trânsito da rua adjacente. As fachadas dando para as ruas 
eram as frentes (e por isso os arquitetos concentraram seus 
esforços nelas), enquanto as fachadas mais informais dos 
fundos, com suas varandas e varais de roupa - algumas 
favorecidas por sua orientação, outras muito ao contrário-, 
formavam o chamado lado de convivência. Este arranjo foi 
superado pelo assentamento em faixas, com habitações de · 
duas frentes, o que criou a possibilidade de colocar todos 
os jardins ao lado (diagrama a). É importante compreender, 
porém, que com esse tipo de fayout todas as portas da 
frente de uma fileira de casas dão para os jardins da 
próxima fileira. Assim, todo o mundo vive numa meia-rua, 
por assim dizer, com os espaços entre os blocos sendo 
essencialmente os mesmos em vez de se alternarem entre o 
espaço do jardim e o espaço da rua. Incidentalmente, o 
princípio de assentamento em faixa permite esta forma de 
alternância na medida em que a orientação seja adequada 
(diagrama b), mas, mesmo se este não for o caso, vale a 
pena esforçar-se para assegurar que as frentes dos blocos 
(isto é, onde as portas da frente estão localizadas) fiquem 
uma em frente à outra (diagrama c) . Se as entradas das 
habitações ficam uma em frente à outra, todos olham poro 
o mesmo espaço comunitário - você pode ver as crianças 
56 liÇÕES DE ARQUITETURA 
do vizinho saindo apressadas de manhã para a escolo 
seu relógio está atrasado de novo?). 
Mos ter uma visão completa de seus vizinhos também 
estimular a bisbilhotice, motivo pelo qual, com esse tipo 
assentamento, é ainda mais importante, do que com o 
que as janelas e os portas da frente sejam posicionados 
bastante cuidado em relação às da cosa oposta, de tal 
que se possa oferecer a cada entrada pelo menos alguma 
privacidade, capaz de protegê-la contra a indiscrição 
excessiva. No caso dos tradicionais esquemas de quadros 
fechadas de moradias, todos os jardins e todas as 
ficam uns em frente aos outros. As áreas dos jardins têm 
portanto uma natureza diferente daquela das áreas do 
RoYAL CRESCENTS, BATH, INGLATERRA 1767 I J. Wooo, J. 
(11 7· 119) 
Embora certamente não tenham sido projetadas com o 
objetivo de contribuir para a interação de vizinhos, os 
fachadas curvas dos "crescentes" de Bath são 
particularmente interessantes nesse aspecto. 
Por causa da concavidade da curva, as casas dão uma 
para as outras. É o mesmo efeito de quando estamos 
trem e os trilhos descrevem uma curva: por um momento 
podemos ver os outros vagões cheios de passageiros, 
presença não tínhamos notado ainda. Uma fachada 
com as casas voltadas para a mesmo área contribui 
natureza comunitária da área. 
Enquanto o lado côncavo de uma fachada pode 
o sentimento de comunidade, o lado convexo dos fundos 
faz com que as casas, por assim dizer, se distanciem 
das outras, contribuindo assim paro o privacidade dos 
jardins. A solução dos crescentes contempla os dois 
aspectos. 
RóMERSTADT, FRANKFURT, ALEMANHA, 1927-28 I E. MAY (120-123) 
Ernst Moy, como seu colega mais famoso, Bruno Taut, está 
entre os mais importantes pioneiros da construção de 
moradias no Alemanha. Os numerosos complexos 
habitacionais que construiu em Frankfurt no período 
1926-1930 mostram como tinha uma percepção aguçada 
dos detalhes urbanos que podem melhorar as condições de 
vida. A lição que ele ensina é que plantas muito monótonas 
de loteamento, que em geral resultam dos orçamentos 
limitados poro a habitação social, podem ser transformadas 
num excelente ambiente de moradia, apesar dos meios 
limitados, no medida em que as plantas sejam 
desenvolvidos com um sentido adequado de orientação e 
de proporção. 
Naturalmente, é importante compreender que a arquitetura 
das moradias e o projeto do ambiente à sua volta foram 
entregues à responsabilidade do mesmo homem, que, além 
disso, não fez nenhuma distinção entre a arquitetura e o 
planejamento urbano, conseguindo assim ajustar moradias 
e ambiente de tal modo que se tornaram partes 
complementares de um todo único. 
O conjunto habitacional Rõmerstadt está situado num suave 
declive às margens do rio Nidda. As ruas paralelas seguem 
o direção do vale. Embora pudesse parecer evidente, neste 
coso, com ruas em terraço, planejar coerentemente

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