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O trabalho no mundo moderno - com Ricardo Antunes

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O trabalho no mundo moderno
Em entrevista ao programa “Roda Viva”, exibido pela TV Cultura, o sociólogo Ricardo Antunes, professor e pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), faz reflexões sobre emprego, linha de produção e transformações no mundo do trabalho. Afinal, para onde caminha o trabalho?
Segundo Antunes, a nova era digital abriu portas e transformou a vida dos trabalhadores, tanto positiva quanto negativamente. “Produzimos mais e mais rápido, mas com menos gente empregada e trabalhando em jornadas cada vez maiores, incluindo o tempo que passam fora da empresa empregadora”, explicou o professor.
Os efeitos colaterais dos ganhos de produtividade decorrentes da introdução de novas tecnologias terão de ser repartidos entre milhões de trabalhadores: avanços dramáticos em produtividade haverão de sem compensados por reduções igualmente dramáticas no número de horas trabalhadas. Por outro lado, Jeremy Rifkin – economista e escritor estadunidense – defende que a oferta crescente não gerará a sua própria demanda, o que detonará uma contradição interna no modelo econômico: a pulsão pelo corte de custos (logo, de salários), de um lado, e de outro a necessidade de aumentar a massa salarial, para assegurar liquidez no mercado, absorção da produção ascendente e uma justa distribuição dos frutos do progresso tecnológico. Menos horas e melhores salários significarão menos empregos formais. 
Além disso, máquinas e programas de inteligência artificial tornar-se-ão capazes de realizar funções conceituais, gerenciais e administrativas e de coordenar per se o fluxo da produção, desde a extração da matéria prima até o próprio marketing e a distribuição do produto final. A mecanização e a informatização responderão per se ao propósito de acumulação do capital e tornarão cada vez menos necessária a figura do trabalho estável, passando a predominar as atividades laborais de curta ou curtíssima duração.
O que se pode ver, na prática, é uma tendência ao aumento relativo da taxa de mais-valor (que está ligado indissoluvelmente à desvalorização dos bens-salário – MARINI, 2005, p.146) bem como da precarização do trabalho, uma vez que a acessibilidade nos permitiu – e o mercado quase nos obriga a isso - a produção mesmo em ambientes e horários de não-trabalho, como podem ser exemplificados pelos “contratos flexíveis de trabalho”.
Rifkin profetiza, pois, a hegemonia da técnica (e não do trabalho). A economia atual caminharia para uma transição que relativizará a importância de institutos milenares, como a posse e a propriedade, e globalizará o acesso just-in-time de bens e serviços. Veem-se já, ademais, os sinais dos tempos: a crescente terceirização de atividades nas corporações, a redução dos estoques, a locação de equipamentos, a despatrimonialização (imóveis antes ocupados por unidades produtivas são vendidos ou locados), entre outros.
Segundo Antunes, hoje há mais gente trabalhando em casa, ou a qualquer momento, através de computadores, tablets e celulares conectados à internet. As tecnologias da informação e comunicação têm sentido duplo, trazem avanços e prejuízos. Por exemplo, todos os movimentos de indignados em Portugal, Grécia, Espanha, Egito tiveram grande apoio, fundamental apoio nas redes sociais, nas conexões. Sindicatos e partidos tiveram um papel pequeno papel nessas movimentações. Por outro lado, os celulares são a escravização moderna. Borraram o espaço da vida pública e vida privada. A empresa flexível faz experiências e retira a estrutura física, mas cobra metas. Cria problemas sérios, como suicídios, depressões. E ainda cria um problema geracional. Quem tem mais de 40 anos não cresceu nesse mundo informatizado. E hoje a empresa acha o funcionário a qualquer hora do dia para cobrar as metas.
Ainda de acordo com ele, “tanto aqui, quanto no mundo todo, a exploração do trabalho vem se intensificando de forma brutal. As condições de trabalho caíram muito e a tendência à precarização é bem visível”. A terceirização da mão de obra, de acordo inclusive com o livro de Antunes, Adeus ao trabalho, está muito próxima da informalidade. Tanto um terceirizado facilmente vira informal, quanto um informal facilmente vira um terceirizado. E hoje são 10 milhões de trabalhadores terceirizados no país. E, lembrou Antunes, os sindicatos não conseguem representar os terceirizados, porque foram fundados na era varguista, seguindo a mesma receita de representar no mundo inteiro uma classe trabalhadora taylorista, fordista, masculina e com direitos. Hoje, essa mesma classe é masculina e feminina – sempre foi, mas procurava-se esconder – e a feminização do trabalho no Brasil é intensa. As taxas de atividade do gênero feminino cresceram sensivelmente entre 1995 e 2005, elevando-se de 48,1% para 52,9%, segundo dados compilados pela PNAD/IBGE.
É difícil para esse sindicato tradicional entender essa classe trabalhadora composta por jovens, mulheres e terceirizados. “Mas não será a primeira vez que os sindicatos terão de se adaptar aos novos tempos. Do século 19 para o século 20, os sindicatos eram de corporações de ofício e precisaram mudar para representar uma nova classe trabalhadora de massa. Hoje a gente precisa de um sindicato mais horizontalizado, que compreenda a nova morfologia do trabalho”.
E não há dúvidas de que a morfologia do trabalho está em franca metamorfose, tanto em face das novas tecnologias aplicadas à produção de bens e serviços como também em razão dos novos matizes que se constroem nas culturas operárias e corporativas, como diz Guilherme Feliciano em curso crítico de Direto do trabalho.
Um estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) em 2009, mostra que existem 15 diferentes tipos de vínculos fora do padrão CLT sendo utilizados pelas empresas. “A flexibilização das leis trabalhistas está ocorrendo na prática no mercado de trabalho no Brasil e não atinge só os trabalhadores com baixa qualificação. Ela está se disseminando cada vez mais nos níveis executivos e é mais evidente em setores muito ligados à tecnologia”, explica Marcia Carvalho de Azevedo, professora de administração da PUC Campinas. Em todos os casos estudados, tanto os profissionais quanto as empresas tentam reduzir o peso dos impostos sobre o contrato de trabalho. “Em muitas situações os trabalhadores preferem esses formatos, pois assim pagam menos tributos e, como sua remuneração é alta, eles suprem com seus próprios salários os benefícios previstos na CLT”, explica a professora.
O jornalista Alexandre Teixeira, em meio à entrevista ao professor Antunes pela “Roda Viva”, lembrou que há cerca de dois anos, o mesmo afirmara que os sindicatos estariam passando por uma espécie de tsunami e que daí deveriam surgir novas formas de sindicalismo, de atuação sindical, e questionou se há exemplos no mundo desse novo sindicato. Antunes afirmou que os sindicatos estão sendo pressionados e que já há sim exemplos novos. “A Argentina conseguiu fundar uma nova Central Sindical, independente daquela mais tradicional, que remetia a Perón, depois da crise. As centrais sindicais de Portugal e da França estão fazendo um grande esforço para tentar entender esse novo trabalhador”, responde.
Ele completou dizendo que mais importante são os novos movimentos sociais de precários e precárias. O maior deles, em escala mundial, segundo o sociólogo do trabalho, é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, o MST. “Um movimento social que representa os deserdados do campo, que não está na Lei, não é legal, mas se tornou legítimo. E esses movimentos sociais têm influenciado os piqueteiros, movimentos de desempregados”.
Casos mais delicados, como os bolivianos, peruanos e haitianos que vêm para o Brasil, numa onda migratória nova, por conta do desenvolvimento econômico, ainda não encontram sindicatos que os representem. Daí porque há a necessidade de adaptação. “Vivemos na selva, na forma mais avançada de selva, quase sem proteção”, alertou o professor. Mas os sindicatos não vão desaparecer, nem os partidos políticos – na opiniãode Antunes, vão aparecer novos desenhos de movimentos.
Ao ser questionado sobre a relevância dos avanços oferecidos por essas formas de trabalho mais desarticuladas e como se deve lidar com a legislação que não prevê nada disso o sociólogo garantiu que reconhece e até faz uso dessa flexibilidade. Trabalhos mais intelectuais e de criação combinam bem com essas empresas mais fluidas. Mas lembrou que, se alguém adoece, ou sofre um acidente, fica desamparado. E essa segunda parte não aparece na imprensa, no discurso oficial. Exatamente como acontece com o trabalho terceirizado, precarizado, das empresas de limpeza ou telemarketing, que exploram a força de trabalho ao limite, chegando a propor que as atendentes de telemarketing usem fraldões para não precisar levantar para ir ao banheiro e não perder esse tempo. Para ele, há uma questão fundamental a ser enfrentada pelo mundo sindical:
“Vamos demolir a CLT, ou vamos partir dela para construir algo novo? No mundo todo, as leis de trabalho estão desmoronando, na Europa e até na Escandinávia. Imaginem aqui no Brasil!”.

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