Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Antecedentes Históricos do Sistema Único de Saúde Breve História da política de saúde no Brasil O sistema de saúde brasileiro adquiriu, ao longo de sua evolução, características marcantes que acompanharam as tendências políticas e econômicas de cada momento histórico. Alguns aspectos que marcaram a história da organização desse sistema: a evolução da política de saúde deu-se em estreita relação com a evolução da política econômica e social da sociedade brasileira, obedecendo a ótica do capitalismo nacional, por sua vez, influenciado pelo capitalismo internacional; a saúde pública não se constituía em prioridade dentro da política do estado brasileiro, recebendo maior atenção apenas nos momentos de epidemias ou endemias que refletiam na área econômica ou social e ameaçavam o modelo capitalista adotado; a assistência à saúde desenvolveu-se a partir da evolução da previdência social, com ênfase na medicina curativa e lucrativa a partir da contratação de serviços privados; o sistema de saúde estatal consolidou a dicotomia entre ações preventivas e de caráter coletivo (responsabilidade do ministério da saúde e das secretarias estaduais e municipais de saúde) e as ações curativas e de caráter individual(responsabilidade assumida pela previdência Social e pela medicina liberal). Breve resgate da história da política de saúde no Brasil, abordando períodos históricos e relacionando ao contexto econômico e político de cada momento, desvelando-se algumas dificuldades e entraves que são estruturais e persistem até os dias de hoje. Período Colonial/Imperial (1500 a 1989) No período de 1500 a 1822, o Brasil, como colônia de Portugal, tinha sua produção econômica realizada por meio dos ciclos do açúcar e da mineração, à base do trabalho escravo, com destino ao comércio internacional, de acordo com os interesses da coroa Portuguesa. Após 1822, com a proclamação da independência, a produção econômica brasileira, também mantida à base do trabalho escravo, ainda se destinava à exportação, porém com maior liberdade de comércio com outros países, especialmente com a Inglaterra. Nesse período imperial, houve um crescimento na produção do café, que embora se destinasse à exportação, dinamizou o comércio interno, promovendo mudanças na estrutura social e o aumento do poder da burguesia local, o que culminou, em 1889, com a proclamação da república. No final desse período, ideias abolicionistas e exigências internacionais contribuíram para a progressiva substituição do trabalho escravo pelo trabalho assalariado, o que motivou a imigração de trabalhadores de origem europeia para a produção cafeeira e as atividades industriais emergentes no Brasil. O quadro sanitário do Brasil colonial e imperial caracterizava-se pela existência de diversas doenças transmissíveis, trazidas inicialmente pelos colonos portugueses e, posteriormente, pelos escravos africanos e diversos outros estrangeiros que aqui chegavam para fins de comércio ou por imigração. Muitas doenças tornaram-se endêmicas e outras, provocavam epidemias Política de Saúde: ação ou omissão do estado, enquanto resposta social diante dos problemas de saúde e seus determinantes, assim como da produção, distribuição e regulação de bens, serviços e ambientes que afetam a saúde dos indivíduos e da coletividade. Endemia: Ocorrência coletiva de uma determinada doença transmissível em uma determinada área geográfica acometendo a população de forma permanente e contínua. Epidemia: Ocorrência súbita de uma determinada doença transmissível em uma determinada área geográfica, acometendo em curto espaço de tempo grande número de pessoas. assustadoras e dizimavam enormes contingentes populacionais. Eram frequentes as Doenças sexualmente transmissíveis, a lepra (hoje conhecida como hanseníase), a tuberculose, Febre amarela, a cólera, a malária, a varíola, a Leishmaniose, além de doenças provocadas por Desnutrição, acidentes por animais peçonhentos e as decorrentes das aglomerações urbanas nas cidades e das condições precárias de trabalho nas lavouras. Não se pode falar da existência de uma política de saúde no período colonial e imperial. No entanto, eram tomadas medidas que visavam minimizar os problemas de saúde pública que afetavam a produção econômica e prejudicavam o comércio internacional. Eram medidas que incluíam: O saneamento dos portos por onde escoavam as mercadorias; A urbanização e infraestrutura nos centros urbanos, de maior interesse econômico e que eram muito insalubres (Salvador, Recife, Ouro Preto, Rio de janeiro, Cuiabá e São Paulo); e Campanhas para debelar as epidemias frequentes e prejudiciais à produção, que afetavam a imagem brasileira nos países com os quais o Brasil mantinha o comércio internacional. Essas intervenções eram pontuais e logo abandonadas, assim que conseguiam controlar os surtos presentes na época. A primeira campanha foi realizada em Recife e Olinda, entre 1685 e 1694, para debelar uma epidemia de febre amarela que afetava a produção e exportação de cana de açúcar. A assistência médica limitava-se apenas às classes dominantes, constituídas principalmente pelos coronéis do café e era exercida pelos raros médicos que vinham da Europa (medicina liberal). Aos demais (índios, negros e brancos pobres), restavam apenas os recursos da medicina popular e as sangrias(extração de sangue) que eram praticadas para a cura de algumas doenças. Surgem as primeiras casas de misericórdias, que se destinavam ao abrigo dos doentes, indigentes e viajantes, sem assistência médica e tratamento aos problemas de saúde. Datam desse período: A fundação das escolas de Medicina do Rio de janeiro(1813) e da Bahia (1815); A criação da Imperial Academia de Medicina em 1829 - Órgão consultivo do imperador para as questões de saúde pública; e a organização da inspetoria de saúde dos Portos em 1828. Período da Primeira República (1889-1930) Após término da monarquia, a sociedade brasileira inicia a organização de seu estado moderno, marcado pelo predomínio dos grupos vinculados à exportação do café e à pecuária. Inicia-se a primeira república (república velha), em oposição ao período posterior governado pelo presidente Getúlio Vargas. No campo político, esse período foi marcado pelo domínio das elites agrárias de São Paulo, Minas Gerais e Rio de janeiro. A maioria dos presidentes dessa época eram políticos mineiros e paulistas que se alternavam no poder e adotavam medidas que favoreciam o setor agrícola, principalmente o café(paulista) e da pecuária(mineiro), caracterizando a chamada política do café-com-leite. A atuação política era de repúdio à monarquia e visava à consolidação dos ideais republicanos e da ideologia liberal. No campo econômico, tipicamente agroexportador, houve a hegemonia na produção de café, mantida à base do trabalho assalariado. Houve também um crescimento significativo da produção industrial, que juntamente com o setor agrário, passou a exigir gradativamente aumento de mão de obra, levando os governos brasileiros à adoção de políticas de incentivo à imigração europeia. A situação de saúde da população apresentava o mesmo panorama do período anterior, com predomínio das doenças pestilenciais como cólera, febre amarela, malária, tuberculose tifo, peste, varíola, gripe espanhola, e outras. As condições de saneamento básico eram bastante precárias e várias epidemias matavam a população e dificultavam o recrutamento de trabalhadores da Europa. As ações e programas de saúde visavam ao controle das doenças epidêmicas, principalmente nas áreas fundamentais para a economia agrária exportadora (área dosportos) e buscavam atrais os imigrantes para a lavoura do café e da indústria incipiente. Assim, as ações de saneamento básico e infraestrutura eram realizadas, prioritariamente, nos espaços de circulação de mercadorias, especialmente, nos portos de Santos e Rio de janeiro. Em 1902, o presidente Rodrigues Alves lançou o programa de saneamento do Rio de janeiro e de combate à febre amarela em São Paulo. Essas medidas visavam estimular o comércio internacional e fomentar a política de imigração – trazendo para as lavouras cafeeiras a mão de obra necessária à produção de café. Com essa finalidade, o governo de Rodrigues Alves nomeou Oswaldo Cruz, médico e pesquisador do instituto Pasteur para a Diretoria Geral da Saúde Pública, o qual elegeu as campanhas sanitárias como modelo de intervenção de combate às epidemias rurais e urbanas, de conotação militar. Esse modelo de inspiração americana foi trazido de Cuba e caracterizava-se pela centralização das estruturas administrativas, pela concentração de poder e por um estilo repressivo de intervenção médica nos corpos individual e social. Além das campanhas sanitárias e das ações de saneamento básico nas áreas de interesse comercial, foi criado o instituto Soroterápico de Manguinhos, no Rio de janeiro, depois de denominado Instituto Oswaldo Cruz, com a finalidade de pesquisa e desenvolvimento de vacinas. Em 1904, houve a imposição legal contra a varíola, desencadeando-se uma revolta popular (revolta da vacina) liderada por opositores políticos do governo e médicos contrários à vacinação, sendo reprimida após alguns dias, depois da morte de alguns líderes populares. Revolta da Vacina: Reação popular ocorrida no período de 10 a 16 de novembro de 1904, contra a lei da vacinação obrigatória de combate a varíola, aprovada em 31/10/1904. A população estava insatisfeita com as medidas autoritárias e policialescas das campanhas sanitárias comandadas por Oswaldo Cruz para o combate de várias epidemias. Com a aprovação dessa lei que permitia a entrada nas residências de brigadas sanitárias acompanhadas por policiais para a vacinação à força, movimentos estudantis e populares iniciam manifestações, sob lideranças de políticos opositores do governo e médicos contrários à vacina. O centro da cidade do Rio de janeiro transformou-se em campo de guerra e sua contenção deu-se após forte repressão policial que resultou em muitas prisões, feridos e mortes. Após o episódio a vacinação tornou-se opcional e passado algum tempo, com aceitação dessa medida, a epidemia de varíola foi controlada. Em 1920, Carlos Chagas assumiu o coando do Departamento Nacional de Saúde, inovando o modelo campanhista de Oswaldo Cruz, criando alguns programas que introduziam a propaganda e a educação sanitária da população como forma de prevenção das doenças. Nessa ocasião, foram criados alguns órgãos para controle da tuberculose, da lepra e das doenças sexualmente transmissíveis. Observa-se nesse período o nascimento da saúde pública, cujo modelo de intervenção chamado de sanitarismo campanhista estrutura-se sob a influência dos saberes fundamentados pela bacteriologia e pela microbiologia, contrapondo-se à concepção tradicional baseada na teoria dos miasmas que era utilizada para explicar o processo saúde- doença. Por outro lado, surge a Previdência Social que vai incorporar a assistência médica aos trabalhadores como uma de suas atribuições a partir de contribuição com Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs). As primeiras CAPs foram instituídas nas empresas ferroviárias e, mais tarde, estendidas aos portuários, marítimos e outras áreas, dando início ao sistema previdenciário no Brasil, como resposta das empresas e do governo às reivindicações operárias. Observa-se ainda o crescimento da medicina liberal, que era utilizada pela classe dominante e com poder aquisitivo, restando à maioria da população brasileira que não tinha direito às CAPs apenas os serviços oferecidos pelos escassos hospitais filantrópicos mantidos pela igreja ou a prática popular da medicina. Conclui-se que o estado brasileiro, na área da saúde, caracterizou-se ao longo desse período por dois aspectos básicos: o primeiro refere-se à estreita relação entre a política de saúde estabelecida e o modelo econômico vigente e a clara dicotomia entre as ações de saúde pública e as ações de assistência médica. Emerge nessa conjuntura a estruturação de dois modelos de intervenção nas questões da saúde: O sanitarismo campanhista e o curativo-privatista. No decorrer dos anos 20, o controle do governo federal passa ser disputado por outros grupos sociais que se fortalece econômica e politicamente no processo de urbanização e industrialização crescente, surgindo rupturas no cenário político. Por outro lado, a crise econômica aprofunda-se no Brasil a partir da crise mundial de 1922 a 1929, que trouxe impactos negativos para a exportação do café. Diante desse panorama, as oligarquias agrárias perdem força política, o que favoreceu a revolução de 1930 que foi comandada por Getúlio Vargas e representantes da classe dominante vinculada a outras áreas econômicas. Contaram com o apoio da classe média urbana (representada por profissionais liberais, intelectuais, militares e tenentes) e das classes populares insatisfeitas com as condições de vida e trabalho. Assim, a revolução de 1930 marcou As CAPS foram criadas em 1923, pela lei Eloy Chaves e são consideradas como embriões da previdência. Eram financiadas com recursos das empresa, do governo e dos empregados e o controle era exercido por patrões e empregados. Tinham como finalidade, além dos benefícios previdenciários, a assistência médica aos trabalhadores segurados e seus familiares. O modelo sanitarismo campanhista- que envolve uma abordagem coletiva e ambiental da doença e caracteriza-se pela prática autoritária. O modelo clínico curativo- privatista- realizada através das CAPs e da medicina liberal que privilegiam a abordagem individual e medicalizante dos problemas de saúde e negam a relação da doença com as condições de vida dos indivíduos e coletividade o fim da hegemonia política dos grupos ligados ao café e à pecuária, crescendo a influência das indústrias mais voltadas para o mercado interno e o aumento do capital. Inicia-se uma nova fase política sob o comando de Getúlio Vargas que se mantém no poder por 15 anos. Período da Segunda República ou Era Vargas (1930-1945) A partir de 1930, o Brasil esteve sob o comando político do presidente Getúlio Vargas, quando foi promovida uma ampla reforma administrativa e política que culminou com a Constituição de 1934, iniciando-se o governo constitucional até 1937 e a ditadura do estado novo de 1937 a 1945. Trata-se de uma fase de forte centralização política e participação estatal nas políticas públicas, o que, aliado às políticas populistas, atribuiu ao presidente o apelido de “pai dos pobres”. No período em questão, ocorre um deslocamento do polo dinâmico da economia para os centros urbanos, com grande investimento no setor industrial na região centro-sul, especialmente nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Esse encaminhamento reforça ainda mais a importância econômica e financeira dessa região, agravando os desequilíbrios regionais ainda vigentes nos dias atuais. Essa política promove o êxodo rural, especialmente da região nordeste para os centros econômicos do país, contribuindo para o processo de urbanização precária e desordenada e a proliferação de favelas nas grandes cidades. A crescente massa urbana constitui a mão de obra para o setor industrial crescente. Esse, por suavez, passa a exigir cada vez mais investimentos em infraestrutura de grande porte. O estado, como regulador das relações entre capital e trabalho, estabelece o salário mínimo, o que junto a outras medidas, possibilita o acúmulo de capital necessário ao investimento na infraestrutura demandada pela industrialização, a exemplo da Siderúrgica de Volta Redonda. Para a promoção da expansão do sistema econômico em projeto, foram realizadas mudanças na estrutura do estado e uma legislação paralela para a efetivação das mudanças, além da criação do ministério do trabalho, da Indústria e Comércio e do Ministério da Educação e Saúde. No governo de Vargas, foram promulgadas as leis trabalhistas que estabelecem uma relação contratual entre capital e trabalho e, ao mesmo tempo, garantem alguns direitos sociais aos trabalhadores. Também se promoveu a vinculação dos sindicatos à estrutura do estado com exigência de pagamento de contribuição sindical por parte dos empregados sindicalizados. O crescimento acelerado da indústria se dá à custa das condições precárias de trabalho, aumentando os riscos e problemas de saúde aos trabalhadores urbanos, piorando as condições de vida e saúde dessa população, que não contava com moradia e saneamento adequados. Dessa forma, aos problemas antigos (doenças endêmicas e epidêmicas) foram acrescidos outros decorrentes da inserção no processo produtivo industrial e das condições precárias no modo de viver, tais como: acidentes de trabalho, doenças profissionais, estresse, desnutrição, verminoses, entre outros. No entanto, as medidas adotadas caminhavam no sentido de manter a força de trabalho em condições de produção, valendo-se da assistência médica vinculada à Previdência Social, que a partir de 1933 transformou as CAPS em Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs). A gestão dos IAPs passou gradativamente para o controle do estado, sendo o seu presidente nomeado pela república e os representantes dos trabalhadores e patrões indicados pelos sindicatos atrelados ao poder executivo, mudando a prática da escolha por eleição direta. O financiamento era de forma tripartite, com participação dos empregados, empregadores e estado, sendo este último o centralizador dos recursos financeiros. De acordo com Mendes, a assistência médica era prerrogativa fundamental das CAPs, por meio de uma rede própria desenvolvida para esse fim, passando a ser um aspecto secundário no período dos IAPs. Esses institutos priorizavam a contenção de gastos, tendo em vista a política de acumulação do capital necessário ao investimento em outras áreas de interesse do governo. A criação do Ministério da Educação e Saúde ocorreu em 1930, com a função de coordenar as ações de saúde pública no mesmo modelo de sanitarismo campanhista do período anterior. Conforme Roncalli, essa fase corresponde ao auge do sanitarismo campanhista na área de saúde pública, com a criação do Serviço Nacional de Febre Amarela, do Serviço de Malária no Nordeste e da Fundação Serviço Especial de Saúde Pública (SESP). A política de saúde adotada reforça a antiga dicotomia: as ações de caráter coletivo sob a gestão do Ministério da Educação e Saúde (modelo sanitarismo campanhista), separadas das ações curativas e individuais, vinculadas aos IAPs, reforçando a dualidade do modelo assistencial. Destaca-se que a população de maior poder aquisitivo utilizava os serviços privados de saúde integrantes da medicina liberal crescente, enquanto a maioria da população não vinculada à previdência contava apenas com os escassos serviços públicos e das instituições de caridade, além das práticas populares de tratamento. Período da Redemocratização ou Desenvolvimentista (1945- 1963) O ano de 1945 é marcado pelo final da segunda guerra mundial, com a vitória dos Estados Unidos e das forças aliadas sobre o fascismo e o nazismo, com a derrota de Hitler. Nesse contexto, os regimes ditatoriais são enfraquecidos e um clima de democratização faz parte do cenário mundial. Motivados por esse clima e pela crise econômica brasileira, forças sociais lideradas pelos opositores do regime impõem a deposição do presidente Getúlio Vargas em 29 de outubro de 1945. Com a deposição de Vargas, reinicia-se um período de redemocratização do país com eleições para presidente e para a Assembleia Constituinte, seguindo-se a consolidação do populismo nacionalista, o pluripartidarismo de caráter nacional e maior efervescência social. Após eleições populares, deu-se início ao governo de Eurico Gaspar Dutra (1946 – 1951), quando a quarta Constituição Federal foi aprovada, mantendo-se o regime presidencialista e os direitos trabalhistas estabelecidos no governo de Vargas. Em tempos de guerra fria, Dutra alinha-se à política dos Estados Unidos da América em oposição aos países socialistas. No decorrer de seu IAPs- Institutos de Aposentadorias e Pensões- criados no governo de Getúlio Vargas, vinculados ao Ministério do Trabalho. Foram criados vários institutos, agora não mais por empresas e sim por categorias profissionais: dos marítimos(IAPM); dos bancários(IAPB); dos comerciários(IAPC); dos Empregados de Transportes e Cargas(IAPTEC); e dos Industriais(IAPI) A Fundação Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) foi criada em 1942 e financiada por americanos interessados na exploração da borracha na Amazônica. Além do combate à malária, a Fundação SESP desenvolveu outras ações de saúde pública nas regiões norte e nordeste do país e outras áreas de interesse estratégico para a economia. mandato, intervém nos sindicatos e partidos, declara ilegal o Partido Comunista Brasileiro, governa com um Congresso representante da classe dominante, adota medidas anti- inflacionárias e congela os salários dos trabalhadores. Dutra lançou o Plano Salte (Saúde, Alimentação, Transporte e Energia) elaborado em 1948 e aprovado em 1950, destacando a saúde como uma de suas prioridades, o que não se consolidou na prática, uma vez que a maior parte dos recursos do plano foi destinada à área de transporte. De acordo com alguns autores, o sanitarismo campanhista, no âmbito da saúde pública, revigorou seu caráter centralizador e autoritário. Um debate político se faz presente na sociedade com críticas dirigidas à atuação da Fundação SESP e com propostas para a criação de um Ministério da Saúde independente. Foi observada uma redução dos casos de tuberculose, malária e outras doenças transmitidas por insetos, o que foi atribuído por alguns ao resultado das campanhas sanitárias e, por outros, como decorrência do desenvolvimento do período. Segue-se o mandato de Getúlio Vargas (1951-1954) que retorna ao poder por meio de eleições diretas (1951-1954). Nessa nova fase, retoma seus projetos econômicos, expande a Companhia Siderúrgica Nacional, amplia as rodovias, cria as usinas hidrelétricas, a Petrobrás, entre outras medidas, para garantir a infraestrutura necessária ao processo de industrialização que deseja implementar, numa política de caráter nacionalista. No campo político, Vargas sedimentou o populismo, como “modalidade de relação entre governantes e governados”. O populismo adotado caracteriza-se, principalmente, pela prática de contato direto com as massas populares, sem a intermediação de partido ao qual era filiado( o PTB), desqualificando a ideia de democracia representativa, numa perspectiva de vínculo emocional com o povo para poder ser eleito e governar. Nessa prática, faz concessões sociais, enquanto adquire o apoio popular para as medidas econômicas e políticas adotadas. Alguns autores destacam que nesse clima de barganha e pressões, a assistência médica expandiu-se em todos os Institutos de Aposentadorias e Pensões(IAPs), generalizando pouco a pouco os direitos, que se diferenciam entre os Institutos, conforme a capacidade reivindicativa e de organização de cada categoria. No entanto, a implantação de programas e serviços de atenção médica tem como marca o clientelismo, favorecido pelo atrelamento dos sindicatos e Institutos ao estado. Em julho de 1953, foi criado o Ministério da Saúde independente da área da educação, sendo- lhe destinado apenas um terço dos recursos alocados no antigo Ministério da Educação e Saúde. Durante 10 anos, esse Ministério foi dirigido por 14 ministros, caracterizando-se pela transitoriedade de seus titulares como resultado da intensa barganha política e prática clientelista que envolvia a escolha de seus dirigentes. A proposta de separação do Ministério da Saúde do antigo Ministério de Educação e Saúde já era debatida havia algum tempo, paralelamente ao tipo de política de saúde defendida para o país. Existiam dois grupos de sanitaristas que defendiam propostas distintas: os que defendiam a manutenção do tradicional modelo do sanitarismo campanhista e a prática higienista da fundação SESP; e os que desenvolviam a corrente de opinião do sanitarismo desenvolvimentista, sob o argumento da relação entre o nível de saúde da população e o grau de desenvolvimento econômico do país. Esses últimos defendiam uma proposta de articulação das campanhas sanitárias à promoção de assistência e de articulação de ações preventivas e curativas, de acordo com as necessidades da população, a serem executadas no nível municipal. No entanto, os parcos recursos destinados à pasta limitavam a sua atuação, permanecendo-se a pouca efetividade nas questões relativas à saúde pública brasileira. O mandato de Vargas foi acompanhado de intensos conflitos políticos entre os Nacionalistas que defendiam o desenvolvimento do país sem o capital estrangeiro e os Desenvolvimentistas que defendiam a entrada do capital estrangeiro para o deslanche industrial no Brasil. Com o aumento da oposição ao governo e o envolvimento de sua segurança pessoal ao atentado de Calos Lacerda, porta-voz da oposição getulista, a pressão para renúncia de Getúlio Vargas aumentou. Diante dessas pressões e sem ver uma saída honrosa, Getúlio suicidou-se em 1954, saindo da vida para entrar na história, como mártir do nacionalismo, herói popular e pai dos pobres. Juscelino Kubitschek que governa o país de 1956 a 1960, através da coligação Nacional- Desenvolvimentista, promove grandes transformações econômicas com apoio do capital estrangeiro e põe em ação o plano de Metas, cuja síntese é a construção de Brasília para sede da nova capital. Ao final de seu governo, o país contava com uma estrutura industrial complexa e consequente fortalecimento da burguesia industrial. Era evidente a crise econômica com crescimento da inflação e da dívida externa brasileira. Seu governo caracteriza-se pela ênfase ao desenvolvimento, com a visão das políticas sociais como paliativas. Nesse contexto, a saúde pública obtém modestas conquistas, enquanto os IAPs fortalecem o modelo de assistência médica curativa aos seus segurados na perspectiva de manutenção do trabalhador saudável para a produção. Aqueles que possuíam mais recursos e cuja categoria profissional exercia maior poder de pressão constituíam hospitais próprios para o atendimento dos segurados. Algumas empresas insatisfeitas com a atuação dos Institutos começaram a contratação de serviços médicos particulares, o que mais tarde viria a se constituir nas empresas médicas ou medicina de grupo que terá espaço garantido na assistência previdenciária nos anos seguintes. Amplia-se assim o modelo médico-assistencial privatista que se tornou hegemônico dos anos 60 aos 80. Segue-se um período tumultuado na política do país, com a vitória de Jânio Quadros em 1961 e sua renúncia no mesmo ano e a condução política de seu vice, João Goulart, com forte oposição política da elite nacional, por defender reformas de base e políticas sociais. A partir de uma articulação dos militares, da burguesia industrial e da elite nacional, foi planejado o golpe das forças armadas que se concretizou no dia 31 de março de 1964, instaurando-se a ditadura militar, que perdurou até sua lenta; gradual e pactuada transição para o regime democrático em 1985. Período do Regime Militar (1964-1984) O período de ditadura militar que perdurou por 20 anos foi cortado por conjunturas específicas: a primeira fase de 1964 a 1968 – de institucionalização da ditadura; a segunda fase de 1968 a 1974 – de expansão da industrialização com capital internacional ou período do milagre brasileiro; a terceira fase de 1974 a 1984 – de crise econômica e do regime militar e abertura política. Na primeira fase (1964-1968) – de institucionalização da ditadura, os governos militares estabeleceram eleições indiretas para presidente, cassaram os mandatos de diversos parlamentares federais e estaduais, intervieram nos sindicatos, entre outras medidas autoritárias e antidemocráticas. Os partidos políticos foram dissolvidos com a criação do bipartidarismo que permitia o funcionamento apenas de dois partidos – a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) que representava os militares e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) de oposição consentida. Com a Constituição de 1967, confirma-se e institucionaliza-se o regime militar e suas formas de atuação e o governo segue por meio de Decretos e Atos Institucionais. Promoveu-se nesse período o processo de restauração da ordem na sociedade, entendida como repressão a qualquer discordância, a modernização da estrutura econômica subordinada aos interesses do grande capital nacional e internacional, a reestruturação do aparelho estatal, com a expansão de sua tecnoburocracia. Cresce o investimento em infraestrutura para favorecer o processo de modernização e industrialização do país e gradativamente são reduzidos a gastos sociais, favorecendo a acumulação capitalista. Segue-se o período de crise da política econômica (1974-1984), agravada pela crise do petróleo e recessão mundial e pela redução de empréstimos internacionais que afetaram a economia brasileira, evidenciando-se os sinais de esgotamento do modelo que gerou concentração de renda para uma minoria e empobrecimento para grande parcela da população. No campo da saúde, implantou-se, de modo gradual e intenso, um sistema de saúde caracterizado pelo predomínio financeiro das instituições previdenciárias e por uma burocracia técnica que priorizava a mercantilização da saúde. Nessa perspectiva, em 1966, promoveu-se a unificação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões(IAPs), com a criação do Instituto Nacional de Previdência e Assistência Social (INPS), subordinado ao Ministério do Trabalho e Previdência Social, com responsabilidade pelos benefícios previdenciários e pela assistência médica aos segurados e seus familiares. A medida uniformiza os benefícios para todas as categorias, mas acaba com a gestão tripartite (trabalhadores, empregadores e União) que existia até então nos IAPs, passando o INPS a uma gestão centralizada do ponto de vista administrativo e financeiro e com fins de capitalização. Destaca-se que até 1964, a assistência médica previdenciária era prestada, principalmente, pelos hospitais, ambulatórios e os consultórios médicos da rede de serviços próprios dos Institutos, passando-se a partir de então à contratação prioritária dos serviços privados de saúde. Assim, o INPS passou a ser o grande comprador dos serviços privados de saúde, estimulando-se um padrão de organização da prática médica pela lógica do lucro. Além do fortalecimento do setor privado, a previdência mantém a expansão da medicinade grupo, modalidade em que as empresas contratavam uma empresa médica para assistência aos seus empregados, deixando de contribuir com o INPS. A medicina de grupo, também orientada para a comercialização da saúde e pelo lucro, teve grande expansão no período e destinava-se principalmente aos trabalhadores com maior poder aquisitivo. Ocorreu no período uma expansão da assistência médica da previdência a partir da inclusão dos trabalhadores rurais (1971), das empregadas domésticas (1972) e dos trabalhadores autônomos (1973). A ampliação da seguridade e da assistência médica a outras categorias traz um grande impacto para os gastos da previdência, já elevados, em decorrência do modelo assistencial, da forma de contrato com as empresas privadas que favoreciam a lucratividade, além de fraudes e corrupção frequentes, com grande ônus aos cofres previdenciários. O ministério da Saúde, com a missão de atuação em âmbito coletivo, é relegado ao segundo plano, perdendo poder e privilégios políticos. Com recursos limitados, torna-se ineficiente para enfrentar os problemas de saúde pública que se agravam no país em decorrência das condições precárias de vida impostas à maioria da população. Os sanitaristas perdem espaço político com consequente desvalorização do modelo sanitarista campanhista de anos anteriores. As ações de saúde pública reduzem-se ao controle e erradicação de algumas endemias comandadas agora pela então criada Superintedência de Campanhas de Saúde Pública (SUCAM). O sistema previdenciário foi desvinculado do Ministério do Trabalho, passando-se à subordinação do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), criado em 1974, o que não traz mudanças nas características em curso dos serviços de saúde: o privilegiamento do modelo clínico de caráter individual, curativo e especializado em detrimento das ações coletivas e de saúde pública; a expansão do complexo médico-assistencial privado composto pelo hospital, pela indústria farmacêutica e de equipamentos médico-hospitalares e pela medicina de grupo; a lógica lucrativa do setor saúde; a desigualdade de acesso e diferenciação no atendimento de acordo com a clientela, além da exclusão de parcela importante da população do atendimento à saúde. Com a criação do MPAS, também foi criado o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS), cujos recursos eram destinados ao financiamento da construção de hospitais. Esse Ministério elaborou o Plano de Pronta Ação (PPA) que ampliava a contratação de hospitais e clínicas particulares para atendimentos de urgência de qualquer indivíduo, segurado ou não. Essas medidas contribuíram para elevar os gastos previdenciários e fortalecer a dicotomia entre atenção preventiva e atenção curativa. A assistência médica financiada pela Previdência Social alcançou, na década de 70, a maior expansão em número de leitos, em cobertura e em volume de recursos arrecadados. A forma de contratação e pagamento de empresas privadas para prestação de assistência aos segurados favoreceu o processo de corrupção com consequente desfalque para o orçamento previdenciário. Fazendo jus a essa política, ocorreu uma expansão de clínicas e hospitais privados construídos com recursos da previdência e de faculdades particulares de medicina com enfoque na medicina curativa – com ênfase nas especialidades médicas e na sofisticação tecnológica, com consequente aumento de consumo de equipamentos médico-hospitalares e produtos farmacêuticos. Ao final de 70, aprofunda-se a crise do modelo de saúde previdenciária. Crise essa, favorecida: pelo alto custo da assistência que é complexa, pouco resolutiva e insuficiente para a demanda; pela menor arrecadação financeira em tempos de crise econômica; e pelos desvios dos recursos, alimentados pela ânsia de lucro do setor privado. Vive-se um caos nos serviços públicos de saúde, há muito sucateados e insuficientes para a demanda existente. Como os problemas sociais e de saúde agravam-se e a resolução por parte do Ministério da Saúde é lenta e insignificante, cresce a insatisfação da sociedade e um clima propício para o surgimento dos movimentos sociais. Esses movimentos sociais denunciam a ineficiência das estruturas de saúde pública e previdenciária, reivindicam serviços de saúde e lutam por melhores condições de vida à população menos favorecida. Em 1975, a crise do setor saúde foi discutida na V Conferência Nacional de Saúde. Foram levantados os problemas da insuficiência, má distribuição e falta de coordenação dos serviços de saúde, além de sua inadequação e ineficácia. Nessa ocasião, o Governo Federal apresentou a proposta de criação de um Sistema Nacional de Saúde através da lei 6.229 que definia as atribuições dos diversos ministérios envolvidos com a questão saúde, além das atribuições das instâncias federal, estadual e municipal. No entanto, a oposição dos empresários da saúde dificulta a regulamentação dessa lei e o governo mantém sua intervenção política em alguns programas verticais, tais como: Programa Materno infantil, Programa Nacional de Imunização, Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (PRONAN), Sistema Nacional e Vigilância Epidemiológica etc. Em 1977, efetivou-se uma nova reordenação burocrático-administrativa do sistema de saúde com a criação do Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (SIMPAS). Esse sistema é composto pelos órgãos: Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) – direcionado para o pagamento de benefícios aos segurados; o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) – encarregado da prestação de assistência médica individual e curativa por meio dos serviços privados contratados e conveniados aos trabalhadores urbanos e rurais; a Fundação Legião Brasileira de Assistência (LBA) – com a finalidade de prestar assistência à população carente; o instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (IAPAS); a empresa de processamento de dados da previdência Social (DATAPREV); a fundação Nacional de Bem-Estar do Menor (FUNABEM); e a Central de Medicamentos (CEME). A política econômica dos anos do regime militar trouxe como consequências: concentração de renda, arrocho salarial, redução do poder de compra do salário mínimo, aumento de preços, colapso dos serviços públicos de saúde e transporte e precárias condições de vida para a população brasileira. Essa situação reflete-se nas altas taxas de morbidade e mortalidade por doenças endêmicas e algumas epidemias ainda persistentes, altas taxas de mortalidade materna e infantil, entre outras doenças de massas resultantes e/ou agravadas pelas condições de vida e trabalho. No período, também aumentaram as mortes por doenças cardiovasculares e por neoplasias. A partir as Conferência de Alma Ata, ocorrida em 1978, começa a ser difundida na América Latina e no Brasil, com apoio da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), o conceito de Atenção Primária à saúde e os princípios da medicina comunitária que preconizava: a descentralização, o autocuidado de saúde, a atenção primária realizada por não profissionais de saúde, a participação da comunidade, entre outros. Assim, alguns programas vinculados aos departamentos de medicina preventiva foram implantados na perspectiva de formação de estudantes da área de medicina, propiciando novas práticas e novas concepções para a organização dos serviços de saúde. Essas práticas permitiram aos Departamentos de Medicina Preventiva das Faculdades de Medicina uma consciência crítica dos problemas sanitários do país. Uma abundante produção acadêmica passa a apresentar severas críticas ao modelo assistencial e fundamentação teóricaquanto à determinação social da saúde- doença, além de alternativas para reestruturação do sistema de saúde, partindo da concepção de saúde como direito de cidadania. Tendo como referência as recomendações internacionais e a necessidade de expansão da cobertura dos serviços de saúde, foi criado em 1976 o programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (PIASS). Esse programa promoveu uma grande expansão da rede ambulatorial pública e favoreceu a entrada de técnicos provenientes do movimento sanitário nos órgãos de Saúde do Estado e o surgimento de novas experiências no campo da saúde pública. PIASS – Programa que foi criado com a finalidade de extensão da cobertura dos serviços de saúde prioritariamente nas zonas rurais e pequenas cidades do interior do país. Teve sua implantação em algumas comunidades da região nordeste, seguindo-se os mesmos princípios preconizados pela atenção primária à saúde. A crise do regime militar começa a ganhar evidências e manifesta-se no processo eleitoral de 1974, quando o partido MDB sai vitorioso das eleições para cargos legislativos e ganha a prefeitura na maioria das grandes cidades. Cresce o processo de redemocratização do país, com a lei da Anistia em 1977, que concede direito de retorno aos exilados e condenados por crimes políticos. No que se refere à saúde, todo esse clima favoreceu o fortalecimento do debate e o surgimento de propostas para reformulação do setor. Uma dessas propostas gerou o projeto denominado PREV-SAÚDE que foi discutido na VII Conferência Nacional de Saúde no governo de João Figueiredo. Esse programa, no entanto, não foi implementado por encontrar objeções dos dirigentes do INAMPS e pressão dos empresários da saúde. O movimento social mantém-se articulado e pressiona o governo por mudanças no modelo de assistência previdenciário em crise crescente em função da escassez de recursos e do aumento dos custos operacionais para sua manutenção. Assim, em 1981, foi criado pelo governo o Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP) ligado ao INAMPS, que traz em seu plano a proposta de mudança do modelo assistencial, tendo em vista: a melhoria da qualidade da atenção; a ampliação de serviços para as populações urbanas e rurais; a descentralização e a hierarquização dos serviços de saúde por nível de complexidade. A partir desse plano, vários sanitaristas entraram para áreas estratégicas do INAMPS e iniciaram a fiscalização da prestação de contas dos prestadores de serviços credenciados para combate das fraudes e passaram a exercer maior influência no processo de reforma do setor saúde, apesar das disputas com o setor privado. A partir do CONASP, foi possível a criação, em 1983, do programa de Ações Integradas de Saúde. Os governos estaduais, através de convênios com o Ministério da Saúde e da Previdência Social, recebiam recursos que eram repassados aos municípios, o que possibilitou a expansão da cobertura por meio da construção de Unidade Básica de Saúde e a contratação e capacitação de recursos humanos para os serviços de atenção básica. Vale destacar que a ampliação dos serviços acontecia como resposta das autoridades estaduais e municipais às reivindicações dos movimentos sociais e de saúde que foram se fortalecendo por via da organização nos diversos espaços (da academia, do sindicalismo, das comunidades e de várias associações). PREV- SAÚDE – Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde – que visava uma reorientação do sistema vigente, através de uma integração entre os dois ministérios (Saúde e Previdência Social) e as secretarias estaduais e municipais de saúde. Propunha-se à extensão da cobertura dos serviços a toda a população, com ênfase na atenção primária à saúde e na participação comunitária. Ações Integradas de Saúde (AIS) – O programa tinha como objetivo articular todos os serviços que prestavam assistência à saúde da população de uma região e integrar as ações preventivas e curativas com vistas à integralidade da atenção. Através das AIS, o INAMPS repassava 10 % de sua arrecadação para as Secretarias Estaduais de Saúde, propiciando a extensão dos serviços de saúde de atenção básica. Na cidade de São Paulo a participação do movimento de saúde foi decisiva para conquistas que se sucederam na história da saúde pública brasileira nos anos 70 e 80. Nos últimos anos do regime militar o Brasil estava envolto em uma grande crise econômica caracterizada por alta inflação e forte recessão econômica. Enquanto isso, aumenta a participação social, fortalecem-se os sindicatos e a oposição política, culminando em 1984 com o Movimento das Diretas Já que resultou na Emenda Dante de Oliveira, com garantia de eleições diretas para presidente naquele ano. No entanto, a emenda não foi aprovada e em janeiro de 1985, o colégio Eleitoral escolheu Tancredo Neves que concorreu com Paulo Maluf para Presidente da República. Com a morte de Tancredo Neves, o seu vice Sarney assumiu o poder, iniciando-se o Período da Nova República. Na ocasião, novas conquistas foram obtidas pelo movimento da Reforma sanitária, com apoio de alguns parlamentares, movimentos de saúde, trabalhadores da saúde, acadêmicos e entidades como CEBES e ABRASCO. Essas entidades tiveram papel fundamental na politização, divulgação de conhecimentos, críticas e experiências inovadoras na érea da saúde e propostas de articulação da sociedade para as mudanças na esfera sanitária – fortalecendo a proposta da Reforma Sanitária – em construção ao longo dos anos 70 e 80. O Movimento de saúde na cidade de São Paulo nasceu na região leste no final dos anos 70 e espalhou-se para outras regiões de maneira articulada. Era composta por moradores das periferias, maioria mulheres, que lutavam pela ampliação e qualidade dos serviços de saúde nos seus bairros, por saneamento básico, creches, educação e outras políticas públicas, consideradas como direitos de cidadania e dever do estado. Esse movimento articulou-se aos demais, reforçando a luta pela Reforma Sanitária Brasileira. CEBES – Centro Brasileiro de Estudos da Saúde, criado em julho de 1976. Através da Revista Saúde em Debate mantinha um espaço de divulgação dos problemas de saúde brasileira, de crítica e propostas para reformas do sistema de saúde. ABRASCO – Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, criada em 1979, atuava na formação de profissionais com ênfase na saúde coletiva e articulação com a sociedade organizada e o poder público para a reorganização das políticas públicas de saúde. Reforma Sanitária A Reforma Sanitária refere-se ao projeto articulado ao longo dos anos 70 e 80 no Brasil, na perspectiva de formulação do sistema de saúde que aprofundou no período do regime militar a sua característica de assistência médica curativa fortemente vinculada ao setor privado e lucrativo, eminentemente excludente, curativo, pouco resolutivo e dispendioso. O projeto de reforma sanitária preconiza a criação de um sistema único de saúde, acabando com o duplo comando do Ministério da Saúde e do INAMPS que executavam ações de saúde em perspectivas antagônicas. A defesa desse projeto era encaminhada pelo movimento sanitário que aglutinava sanitaristas comprometidos com as mudanças do sistema de saúde e diversos atores sociais, entre os quais, lideranças populares, trabalhadores, sindicatos, parlamentares de esquerda, intelectuais e estudantes de saúde e entidades como CEBES e ABRASCO. Todos em luta contra as condições precárias de vida da população, contra as iniquidades do sistema de saúde epelo reconhecimento da saúde como direito social a ser garantido pelo estado. Esse projeto, cujo desenho e conteúdo consolidaram-se gradativamente ao longo do tempo, preconizava a transformação da relação entre Estado e Sociedade, com clara defesa da participação social de forma institucionalizada nos rumos da política de saúde e pela construção da cidadania. Tinha como ambição a universalização do direito à saúde, compreendida como qualidade de vida e um modelo de atenção com ênfase na integridade. Nos anos 80, o movimento sanitário usou como tática a ocupação dos espaços institucionais e a formulação e implementação de políticas de saúde frente à crise do INAMPS, o que propiciou o surgimento de alguns programas de expansão dos serviços e sua descentralização, como as Ações Integradas de Saúde – AIS (1983) e Sistema Unificado e Descentralizado da saúde – SUDS (1987). Teve como momento expressivo a realização da VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, em cuja oportunidade, a reforma mais completa do setor saúde foi debatida e pactuada para sua inscrição na Constituição Federal. Embora a maior parte das propostas discutidas e encaminhadas pelo movimento da Reforma Sanitária tenha sido inscrita no capítulo da saúde da nova constituição em 1988, a reforma não se acaba ato, uma vez que encaminhamentos para a devida implementação do sistema Único de Saúde(SUS) encontram barreiras estruturais e conjuntura desfavorável no período pós-constituinte. É importante destacar que estão sempre presentes na sociedade outros projetos de interesse lucrativo do setor, os quais impõem barreiras à consolidação SUS, manifestadas nas dificuldades de financiamento e repasses de recursos para a sua completa universalização e integridade, desde o seu nascimento e com persistência nos dias atuais. Período da Nova República (1985 – 1988) Em março de 1985, José Sarney tomou posse na Presidência da República e, mantendo o compromisso assumido por Tancredo Neves, enviou ao Congresso a proposta de convocação da Assembleia Nacional Constituinte a ser composta pelos deputados federais e senadores que seriam eleitos nas eleições previstas para 1986 e pelos senadores já eleitos em 1982. Diante desse cenário de redemocratização da sociedade, diversas entidades e movimentos sociais mobilizavam e estimulavam a participação popular em vários estados no processo de discussão da nova Carta Constitucional. Desejava-se que a sua elaboração fosse fruto da participação dos diversos segmentos sociais e não apenas das elites econômicas e políticas e, consequentemente, avançasse no aspecto da democracia e na garantia dos direitos e deveres da cidadania. Na ocasião, o quadro sanitário evidenciava a redução das doenças imunopreveníveis e da mortalidade infantil, a manutenção da mortalidade por doenças cardiovasculares e neoplásicas, aumento da mortalidade por causas externas (acidentes, homicídios etc). da epidemia da AIDS e surgimento de epidemias de dengue em algumas capitais. Enquanto isso, persistem as iniquidades e precariedades do sistema de saúde e os protestos populares pela conquista de direitos sociais, inclusive de saúde. Esse clima de ebulição participativa e de lutas por ampliação da cidadania foi favorável para se colocar a saúde na agenda política e difundir as propostas da Reforma Sanitária. Assim, a realização da VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986 criou um espaço importante para o debate dos problemas do sistema de saúde e de propostas de reorientação da assistência médica e de saúde pública. A Assembleia Nacional Constituinte foi instalada em fevereiro de 1987, sendo eleito Ulisses Guimarães para presidir a elaboração da nova constituição brasileira, que teria a participação social por meio de instrumentos jurídicos – as emendas populares com propostas a serem incorporadas na carta Magna Enquanto se elaborava o arcabouço jurídico do SUS no processo constituinte, um decreto da União de julho de 1987 transformava as AIS no Sistemas Unificado e Descentralizado de Saúde VIII Conferência Nacional de Saúde – Realizada na cidade de Brasília em 1986 com a participação de cerca de 5.000 pessoas, representantes dos diversos movimentos sociais, movimentos populares de saúde, trabalhadores, usuários, estudantes e intelectuais da saúde, parlamentares, sindicatos, entre outros. No evento foram debatidos (não sem conflitos e contradições) os princípios e diretrizes da Reforma Sanitária, destacando-se: o conceito ampliado de saúde, o reconhecimento da saúde como direito de todos e dever do estado, a criação do SUS (através da unificação dos serviços do INAMPS e do Ministério da Saúde), e descentralização e hierarquização dos serviços, a atenção integral às necessidades de saúde da população e a participação popular. A partir dessa conferência, foi instituída uma Comissão Nacional de Reforma Sanitária para o encaminhamento das propostas à Assembleia Nacional Constituinte e sua inscrição na nova Carta Magna. (SUDS) – a ser implantado por meio de convênio entre os governos federal, estadual e municipal. O SUDS representou cero avanço na medida em que possibilitou a formação dos conselhos estaduais e municipais de saúde, a desconcentração de recursos e poder da esfera federal para a estadual, o esvaziamento do INAMPS e o aumento ( mesmo que insuficiente) da cobertura de serviços de saúde para a população. Vale ressaltar que a implantação do SUDS promoveu uma estadualização do INAMPS, por meio da fusão de suas estruturas às secretarias estaduais de saúde. Como resultado, ocorreu uma concentração de poder nas secretarias estaduais de saúde, as quais estabeleciam com os municípios uma relação clientelista, repassando-se os recursos com mais facilidade, quando o gestor municipal era da mesma agremiação partidária ou por outros interesses políticos. Finalmente, em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foi aprovado o Sistema Único de Saúde (SUS) que incorporou a maioria das propostas do movimento da Reforma Sanitária apresentadas por emenda popular acompanhada da participação dos segmentos interessados. Também não se deu de modo consensual, ocorrendo embate e conflitos entre os que defendiam os interesses privatistas e os que lutavam pela saúde pública e estatal. A aprovação do SUS com os princípios e diretrizes da Reforma Sanitária significou uma grande vitória da sociedade. Não obstante, foi criado em um período em que o Brasil se encontrava em grande instabilidade econômica, altas taxas de inflação e influências da conjuntura internacional neoliberal que, juntamente com o recuo dos movimentos sociais, traz sérias dificuldades para a sua regulamentação e implementação de seus princípios e diretrizes e da concretização das propostas da Constituição Cidadã. Destaca-se que o início dos aos 90, o Governo de Fernando Collor de Malo reduziu em quase metade os recursos para o setor saúde, ao mesmo tempo em que os governos estaduais também reduziram sua participação orçamentária para a saúde. Essas deliberações contrariam a política pública do SUS que já nasce enfrentando o caos em que estavam os serviços de saúde e a descrença popular em relação ao estado. A reforma sanitária deparou, no período de 1988 a 1992, com dois governos (Fernando Collor de Melo e Itamar Franco) que, embora distintos, reforçaram o projeto conservador em saúde, com a implantação distorcida do SUS e o apoio ao modelo médico-assistencial privatista reciclado de expansão da assistência médica supletiva, entre outros fatos. Nesse sentido, vale destacar que se ampliaram no Brasil as diversas modalidades de assistência médica supletiva com interesse de lucro na saúde, tais como: medicinade grupo, cooperativas médicas e seguro-saúde, evidenciando o florescimento do projeto conservador antagônico à política de saúde defendida pela reforma sanitária. Fonte: livro SUS – antecedentes, percurso, perspectivas e desafios Digitado: moderadora do Instagram: @enfermagemagora
Compartilhar