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A política segundo João Ubaldo Ribeiro
Marcos Fabrício Lopes da Silva*
Pilares greco-romanos sustentam, no Ocidente, as concepções primordiais de 
política. Por política, entende-se o cuidado com a polis, a cidade, envolvendo a 
garantia e o cumprimento de direitos e deveres relacionados à orientação 
normativa dos comportamentos públicos e privados. Em termos romanos, a 
palavra latina urbs denomina a cidade e determina o termo “urbano”, com 
destaque para o seu aparato material. Assim, enquanto os gregos projetaram a 
política como atividade zeladora que responde pela vida espiritual da cidade, os 
romanos, por seu turno, privilegiaram a política como meio viabilizador da 
infraestrutura dos espaços urbanos, visando à formação patrimonialista. 
Considerando a mentalidade política em vigor, as ações dirigentes da cidadania 
moderna foram promovidas pelos habitantes dos burgos, os burgueses. Estes, 
atentos à tradição política greco-romana, agruparam o cuidado espiritual e o 
material do burgo sob o nome de “política”. Logo, o discurso classista, típico da 
vida moderna, se sobrepôs a essa dualidade, mas não a anulou.
João Ubaldo Ribeiro, falecido no último dia 18, deixou importante obra sobre a arte 
política e suas artimanhas, objetivando conscientizar o público acerca dos valores 
gerenciais que se projetam para garantir a conquista e a preservação do poder 
mandatário. O livro escrito pelo intelectual baiano se chama Política: quem manda, 
por que manda, como manda (1998). A intencionalidade discursiva do autor 
apresenta semelhanças com os propósitos expressos por Nicolau Maquiavel, em O 
príncipe (1513), já que ambos pretendem contar ao público como funciona a 
mente dos poderosos. João Ubaldo Ribeiro mostra que a cultura política, como 
prática administrativa, ainda se encontra subjugada pelos interesses particularistas 
de gestão. Fazer política significa, em termos mais pragmáticos, garantir a 
governabilidade administrativa e seu sucesso executivo: “a Política passa a ser 
entendida como um processo por meio do qual interesses são transformados em 
objetivos, e estes são conduzidos à formulação e à tomada de decisões efetivas, 
decisões que ‘vinguem’”. João Ubaldo Ribeiro sintetiza a política como o poder de 
direção de uma classe política no governo do destino social: “para trocar em 
miúdos tudo isso, pode-se afirmar que a Política tem a ver com quem manda, por 
que manda, como manda. Afinal, mandar é decidir, é conseguir aquiescência, 
apoio ou até submissão. Mas é também persuadir”.
O escritor faz questão de ressaltar que fazer política difere do triste hábito que a 
contamina, referindo-se às promessas eleitoreiras e aos discursos esvaziados de 
realidade transformadora. João Ubaldo também demonstra preocupação com 
aqueles que se afugentam da preocupação com a política e destaca que essa 
atitude enfraquece o poderio popular e favorece os mandatários conservadores 
que utilizam o poder público para fins privados e corporativos. Quanto mais se 
desdenha da política, mais a corrupção e a apatia se agigantam. Sobre tais 
aspectos, salienta o intelectual baiano:
“A Política não é, pois, apenas uma coisa que envolve discursos, promessas, 
eleições e, como se diz frequentemente, ‘muita sujeira’. Não é uma coisa distinta 
de nós. É a condução da nossa própria existência coletiva, com reflexos imediatos 
sobre nossa existência individual, nossa prosperidade ou pobreza, nossa educação 
ou falta de educação, nossa felicidade ou infelicidade. É claro que uma pessoa 
pode não se preocupar com a Política e os políticos. Trata-se de uma escolha 
pessoal perfeitamente respeitável. Quando se age assim, no entanto, deve-se ter 
consciência das implicações, pois se trata de uma atitude de passividade que 
sempre favorece a quem, em dado momento, está numa situação de mando 
dentro da sociedade”.
Considerando o foco do pensamento de João Ubaldo Ribeiro – isto é, a política 
distorcida como poder de mando –, o autor pretende chamar a atenção para a 
nossa principal ferida em matéria de gestão pública: a cultura da dominação. 
Insistimos, ainda, em formatos verticais de expressão do poder. Com isso, 
forma-se, na sociedade, uma mentalidade cultural subserviente, o que prejudica o 
compromisso da política com a construção de um mundo melhor e igualitário. Para 
revertermos esse quadro, João Ubaldo Ribeiro destaca, com bastante pertinência, 
o estilo ideal de comportamento político que deve ser estimulado 
democraticamente:
“A dominação mais forte e mais difícil de vencer (até mesmo porque é comum que 
não a queiramos vencer) é a que se faz pela cabeça. Quando a nossa cabeça não 
tem autonomia, quando, mesmo que não notemos, pensam por nós, aí estamos 
dominados, seja pelo esquema interno a nosso próprio país, seja por economias e 
culturas que o colonizam, seja por ambos — como geralmente é o caso. A 
resistência contra essa dominação, quando ela realmente nos toma conta da 
cabeça, é muito difícil, inclusive porque pensamos que somos nós que estamos a 
decidir, em vez de um esquema pré-fabricado que internalizamos. Isto se percebe 
bem em situações simples, como quando concluímos que a ‘realização’ plena de 
um jovem praticando o esporte da moda não é realização plena coisa nenhuma, 
mas a consequência prevista de um processo de marketing em que ele foi colhido. 
Quando, entretanto, esse processo é mais fundo, a ponto de o confundirmos com 
nossa própria identidade, nossa maneira de ser — aí a luta é mais difícil, e só pela 
consciência política e pela produção cultural livre e autônoma conseguiremos, 
coletivamente, vencer”.

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