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de manutenção da paz, de primeira e segunda gerações. A AGNU estabeleceu duas forças de paz, a UNEF I em 1956 e a UNTEA em 1962, além de ter contribuído para a condução das operações da ONUC em 1960. No entanto, não se deve minimizar a faculdade que tem para criar missões civis, instrumento cada vez mais usado, assim como o papel que desempenha para a aprovação dos orçamentos das operações de manutenção da paz e para a consolidação dos aspectos conceituais e normativos. Recorde-se que o mecanismo de transferência dos assuntos de paz e de segurança para a AGNU, em caso de paralisia do CSNU, prevista pela Resolução 377(V) – “Unidos para a Paz” – não foi revogado. AS MISSÕES CIVIS CRIADAS PELA ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS O artigo 10 outorga à AGNU autoridade para examinar e tecer recomendações aos Estados membros e ao Conselho de Segurança sobre qualquer assunto que esteja no âmbito da Carta e de seus órgãos, a menos que o CSNU esteja examinando a matéria conforme prescreve o artigo 12. Os artigos 11 e 14 especificam que esses assuntos podem incluir recomendações relacionadas à manutenção da paz e da segurança internacionais ou a qualquer outra situação que a AGNU julgue prejudicial ao bem-estar geral ou às relações amistosas entre nações. 114 PAULO ROBERTO CAMPOS TARRISSE DA FONTOURA O artigo 13 estende o poder de recomendação da AGNU a temas econômicos, sociais, culturais, educacionais, sanitários e de direitos humanos. Por fim, o artigo 22 permite à AGNU criar órgãos subsidiários para o desempenho de suas funções. No final dos anos 80, os membros da ONU passaram a interpretar esses artigos como proporcionando à AGNU suficiente competência legal para estabelecer missões civis, que atuariam em áreas não-militares. Em julho de 1989, o Secretário-Geral Javier Pérez de Cuéllar enviou para Manágua a Missão de Observação para a Verificação Eleitoral na Nicarágua, com base na Resolução 43/24 da AGNU, de 15/11/88, que “urged the Secretary-General to give the fullest possible support to the Central American Governments in their efforts to achieve peace”75. O Conselho de Segurança manifestou- se posteriormente pela Resolução 637, de 27/7/89, na qual somente registrou a criação da ONUVEN – “notes with appreciation the Secretary General’s agreement with Nicaragua to deploy a United Nations election observer mission in that country”76 –, convalidando o procedimento adotado. A AGNU tinha-se pronunciado sobre o estabelecimento de uma missão de observação para supervisionar, pela primeira vez na história da Organização, eleição empreendida em um país independente, fora, portanto, do contexto da descolonização. No caso de processo de descolonização, a realização de um referendo superviosionado pela ONU é visto como meio para assegurar a livre manifestação do princípio de autodeterminação pela população local. Tal procedimento foi reiterado nos anos 90. A AGNU aprovou o estabelecimento da Missão de Verificação Eleitoral no Haiti (UNOVEH), em outubro de 1990; da Missão de Observação para a Verificação do Referendo na Eritréia (UNOVER), em dezembro de 1992; da Missão de Observação das Nações Unidas 75 Durch, (1993), p. 460. 76 White, (1993), p. 227. OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ MULTIDISCIPLINARES 115 na África do Sul (UNOMSA), em setembro de 1992, em uma iniciativa adotada pelo Secretário-Geral da ONU em apoio a resoluções genéricas da Assembléia; da Missão Civil Internacional no Haiti, em março de 1993 (MICIVIH, operação conjunta ONU/OEA); e da Missão de Verificação dos Direitos Humanos das Nações Unidas na Guatemala, em setembro de 1994 (MINUGUA). O desenvolvimento dessas iniciativas acabou firmando as regras das missões civis. Elas são sempre deslocadas com o consentimento das partes, mesmo em situações anômalas, como ocorreu no Haiti, com as autoridades militares de facto que permaneceram no poder entre 1991 e 1994, e na África do Sul, com a política de transição do apartheid para um regime democrático entre 1992 e 1994, e onde não há necessariamente cessar-fogo ou acordo de paz firmados, como aconteceu no caso da Guatemala até 1996. Os integrantes da missão atuam desarmados e sua influência é exercida através da presença de observadores civis. Pequeno número de militares desarmados podem também compor essas missões, geralmente para servir como elemento de ligação entre as partes em conflito no interior do país anfitrião. Ao contrário das operações de manutenção da paz, as despesas são cobertas pelo Orçamento Regular da Organização. Nada impede que a AGNU incorpore, na sua agenda de trabalho, atividades dessa natureza, agindo em concerto com o CSNU. O êxito desse tipo de medida dependerá da eficácia da Assembléia em continuar aprovando as resoluções pertinentes, o que tem ocorrido por consenso, e da habilidade em trabalhar em harmonia com o Conselho de Segurança e com o Secretariado da Organização77. 77 O caso da missão de paz na Guatemala (MINUGUA) serve para ilustrar o potencial de cooperação existente entre a AGNU, o CSNU e o Secretariado: a operação vem sendo prorrogada por resoluções da AGNU desde 1994, mas o CSNU aprovou o desdobramento de observadores militares quando surgiu a necessidade de supervisionar a desmobilização de combatentes na Guatemala, de janeiro a maio de 1997. Uma vez concluída a missão de observadores militares, o assunto voltou à AGNU. 116 PAULO ROBERTO CAMPOS TARRISSE DA FONTOURA APROVAÇÃO DOS ORÇAMENTOS DAS OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ DAS NAÇÕES UNIDAS Incumbe à Assembléia Geral a responsabilidade de aprovar todas as despesas da Organização, aí incluídas as operações de manutenção da paz. O exame da matéria passa normalmente por cinco fases: (a) preparação de um orçamento preliminar pelo Secretário- Geral para informação dos membros do Conselho de Segurança; (b) proposta do orçamento definitivo por parte do Secretariado; (c) consideração do orçamento pelo Comitê Consultivo em Questões Administrativas e Orçamentárias (ACABq); (d) exame conjunto da proposta de orçamento elaborada pelo Secretariado e do relatório do ACABq pela V Comissão da AGNU; e (e) aprovação do orçamento pela AGNU. O Secretariado da ONU não precisa aguardar a aprovação final do orçamento estimado para iniciar a operação. De modo a não comprometer, por motivos orçamentários, o encaminhamento de solução pacífica para o conflito, o Secretário-Geral está autorizado a gastar, após aprovação da operação, até US$ 5 milhões dos recursos disponíveis na conta das “despesas inesperadas e extraordinárias” do Orçamento Regular, assim como recorrer ao Fundo de Reserva estabelecido em 1992, para não retardar o desdobramento do pessoal. Poderá gastar mais US$ 10 milhões depois de o orçamento ser endossado pelo ACABq, mas só poderá coletar as contribuições individuais dos Estados membros quando o orçamento for formalmente aprovado pelo plenário da AGNU. Na medida em que os principais países atrasam o pagamento de suas cotas, o Secretariado precisa identificar fontes provisórias de custeio, o que vem consagrando a prática de recorrer aos recursos disponíveis no orçamento regular. Reforça essa tendência o fato de os Estados membros não estarem dispostos a autorizar o Secretariado a emitir bônus para cobrir suas despesas no orçamento das operações OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ MULTIDISCIPLINARES 117 de manutenção da paz, a exemplo do que foi feito nos anos 60, para arcar com os gastos da ONUC e da UNEF I, nem autorizar outras fórmulas inovadoras, tal como habilitar o Secretário-Geral a contrair empréstimos na rede bancária internacional. O poder da AGNU sobre assuntos orçamentários poderia constituir fonte de influência sobre o CSNU e sobre o Secretariado, desde que os Estados membros se envolvessem mais diretamente nas suas deliberações. No momento, a AGNU não costuma introduzir alterações fundamentais no orçamento proposto pelo