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Apostila Hermenêutica Versão 2013

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________________________________________________________________ 
 
HERMENÊUTICA 
POR: RICARDO FERREIRA SACCO 
________________________________________________________________ 
 
 
 
 
 
 
 
3ª EDIÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ROTEIRO DE CURSO 
2013 
2 
 
HERMENÊUTICA 
 
 
 
Na lei tem-se o intelecto sem 
paixões, porém, em situações 
indeterminadas, a lei primeiro 
educa os homens e depois 
autoriza-os a decidir. Segue-se 
assim que é preferível que a lei 
governe (Aristóteles - sec. IV 
a.C.; Política, Livro III). 
 
 
1 - Introdução: 
 
 Começamos o estudo perguntando: o que é Direito? 
Seria o conjunto de normas jurídicas escritas e consuetudinárias ou é a leitura 
que se tem da norma no tempo e no espaço? (VIEITO, 2000: p.23) 
 
 Konrad Hesse, citado pelo Prof. Aurélio ressalta que a Constituição está 
condicionada pela realidade histórica, e podemos acrescentar também que está 
intimamente ligada ao fenômeno político produzido pela vida em sociedade, da 
qual não pode se afastar das condições concretas de seu tempo (VIEITO, 2000: 
p.32). 
 
 
1.1 - Compreensão do significado do vocábulo “Hermenêutica”: 
 
Hermenêutica deriva do vocábulo grego hermeneuein, entendida esta 
como filosofia da interpretação. Tal fato tem ligação íntima com o deus grego 
Hermes (Mercúrio para os romanos), o deus mensageiro, que trazia notícias dos 
demais deuses aos homens, sendo capaz de desvendar tudo o que a mente 
humana não compreendesse, permitindo se alcançar o significado das coisas. 
Com a rapidez de suas sandálias divinas (aladas), tornou-se o mensageiro 
predileto dos deuses, pois executava suas tarefas não somente com a astúcia e 
a inteligência que lhe eram características, mas principalmente com a gnose e a 
magia (conhecimento - sabedoria), dessa forma era “o vencedor mágico da 
obscuridade”, porque “sabe tudo e, por isso, pode tudo” (mestre dos magos). 
Hermes é o Deus do Hermetismo e da Hermenêutica, do mistério e da arte de 
decifrá-lo. 
 
 Hermes seria então um “intérprete", eis que era a entidade divina dotada 
de capacidade de traduzir e decifrar o incompreensível, o hermético. 
 
3 
 
O vocábulo Hermenêutica é aplicado não só no Direito, mas também na 
teologia protestante, substituindo a expressão latina ars interpretandi, ou arte da 
interpretação, como sendo a doutrina da arte da interpretação. 
 
 
1.2 - Definição de Hermenêutica: 
 
 É um erro tentar definir Hermenêutica como pura interpretação, e um erro 
maior ainda tentar tratá-las como sinônimos. A interpretação é a aplicação da 
Hermenêutica. A Hermenêutica descobre e fixa princípios que regem a 
interpretação, sistematizando processos aplicáveis para determinar o sentido e 
o alcance das expressões do Direito. Podemos dizer que a Hermenêutica é a 
teoria científica da arte de interpretar, que se faz aproveitando conclusões da 
Filosofia Jurídica. A interpretação é na verdade a aplicação da Hermenêutica, 
outrossim, podemos definir sinteticamente Hermenêutica como sendo o 
conjunto de regras científicas que orientarão a interpretação. 
 
 Essa teoria formada pelas regras científicas é algo complexo, talvez o 
capítulo menos seguro e mais impreciso da ciência do Direito. De pronto 
podemos concluir que é um erro substituir uma palavra pela outra, eis que 
Hermenêutica não é sinônimo de interpretação. 
 
 Carlos Maximiliano ensina que o vocábulo alemão Auslegung abrange o 
conjunto de aplicações da Hermenêutica, que em inglês se resumiria em dois 
termos técnicos: Interpretation and Construction, que seria mais preciso do que 
a palavra portuguesa correspondente - Interpretação. Desta feita, para os 
alemães tornou-se comum o uso de Hermeneutik e Auslegung, assim como 
entre nós o de Hermenêutica e Interpretação. 
 
 A interpretação busca achar o verdadeiro sentido de um grupo de 
palavras, enquanto a construção autoriza a sair do texto e procurar uma solução 
que os constituintes previram, mas não tornaram suficientemente clara. A 
construção é, portanto, imprescindível para o Direito Constitucional. 
 
 Hermenêutica é conditio sine qua non para o entendimento da norma 
jurídica. 
 
 A fim de obter um esclarecimento maior, partamos para a definição de 
Interpretação: a Interpretação é a explicação e o esclarecimento; é exprimir por 
outras palavras um pensamento exteriorizado, mostrando o sentido verdadeiro 
de uma expressão, extraindo de frase, sentença ou norma o seu conteúdo. A 
interpretação é, portanto, o ato de explicar o sentido de algo. 
 
 Interpretar uma expressão do Direito não é tão somente torná-la clara no 
respectivo dizer, mas é, sobretudo, a revelação do sentido apropriado para a 
vida real. Interpretar não é uma arte para simples deleite ou passatempo, muito 
4 
 
pelo contrário, é uma disciplina eminentemente prática e útil à atividade diária 
do operador do Direito. 
 
Na verdade toda regra jurídica pode ser considerada como uma 
proposição que subordina, a certos fatos, uma consequência necessária, 
incumbindo ao exegeta descobrir e aproximar da vida concreta, não somente as 
condições implícitas no texto, mas também as soluções que este liga às 
mesmas. Essa atividade interpretativa é uma só, embora desdobrada em uma 
infinidade de formas diferentes, como veremos. 
 
 
Regra jurídica → Fatos → Consequência necessária 
 
 
A Hermenêutica foi tratada por diversas correntes filosóficas que 
buscavam valores distintos: algumas o valor segurança, outras o valor justiça e 
outras a conciliação de ambos. 
 
Após a Revolução Francesa surgiu a chamada Escola da Exegese, 
trazendo o entendimento que a lei esgotava toda a realidade; o Estado era o 
único autor do Direito e a busca da vontade do legislador eram postulados 
básicos. Caberia ao jurista apenas a análise gramatical e da lógica formal do 
diploma legal, sem procurar soluções fora dele. Nada escapa à lei e se o 
intérprete substituísse a intenção do legislador pela sua estaria invadindo a 
esfera de competência do Legislativo. 
 
Esta escola foi rompida com a aplicação do método histórico-evolutivo, 
que buscava uma interpretação mais atualizada, perquirindo a mens legis em 
detrimento da mens legislatoris. Por este novo método, a lei após criada se 
desligava do legislador e passava a ter vida própria (autônoma), recebendo 
influências do meio social em que se encontra, adaptando-a às exigências do 
momento. 
 
Hoje os elementos extra legem se tornaram imprescindíveis à 
Hermenêutica moderna. 
 
 
2 - Aplicação da Hermenêutica 
 
Não há preceito absoluto; o hermeneuta exerce uma verdadeira arte 
guiada cientificamente, eis que a ciência elabora as regras, traçando diretrizes e 
condicionando o esforço, mas não suprimindo o coeficiente pessoal com seu 
valor subjetivo, eis que se assim o fosse, o investigador seria um autômato. 
Muito antes pelo contrário, o investigador precisa assumir uma postura 
proativa dentro das regras científicas reconhecidas, construindo a norma 
jurídica. 
5 
 
De acordo com o Prof. Aurélio Agostinho (2000, p. 43): 
 
As considerações expostas sobre a vontade do legislador 
não podem nos levar à concepção oposta de total 
liberdade de interpretação, pois isto seria o germe de 
destruição da Hermenêutica jurídica, tendo em vista que a 
norma jurídica tem como função primordial estabelecer 
limites na conduta social e, via de consequência, 
segurança nas relações jurídicas. Se tudo for possível, não 
haverá mais como antecipar os negócios jurídicos, já que 
nenhuma das partes poderá gozar do privilégio de poder 
antecipar, com uma certa margem de tranquilidade, a 
decisão judicial, a respeito do caráter lícito ou não de suas 
condutas. 
 
Este campo impreciso queconstitui a Hermenêutica está longe de ser 
exato, não dispondo de expressões precisas nem definições infalíveis ou 
completas. Embora possa parecer clara a linguagem, é forçoso verificar o que 
se encontra por detrás da letra da lei, que deve ser encarada como obra 
humana, com todas as deficiências e fraquezas. 
 
Por mais capazes que sejam os elaboradores de uma lei, logo depois de 
promulgada surgem às dificuldades e dúvidas sobre a aplicação de dispositivos 
que são aparentemente bem redigidos. 
 
 Fato é que as situações, os negócios, os interesses que determinada 
norma visa regular transformam-se com o passar do tempo, eis que surgem 
fenômenos imprevistos, novas idéias e a própria ciência revela coisas até então 
imprevisíveis quando da elaboração do texto normativo. Nem por isso se deve 
censurar o legislador ou simplesmente desconsiderar sua obra. 
 
Quando esclarecido pela Hermenêutica, o operador do Direito descobre 
na Lei a locução implícita mais diretamente aplicável a um fato do que o texto 
expresso. Desta feita multiplica a utilidade de uma obra, podendo afirmar em 
determinadas situações o que o legislador decretaria se previsse o incidente e o 
quisesse resolver, ou seja, intervém como auxiliar prestimoso à realização do 
Direito. 
 
O intérprete descobre determinações, não por meio de novos dispositivos 
materializados, mas sim pelo desdobramento de preceitos formais que não 
perturbem a harmonia do conjunto e nem alterem as linhas da obra. Descendo 
aos alicerces, extrai idéias apenas latentes até aquele momento. Com seu 
trabalho dissipa obscuridades, afasta contradições aparentes e falta de 
precisão. 
 
Ao operador do Direito deve restar claro que todo ato jurídico ou lei é 
dividido em duas partes que são o sentido íntimo e a expressão visível, partindo-
se da segunda para se atingir a primeira, ou seja, através dos vocábulos atinge-
6 
 
se a idéia. Fato é que a norma deve ser compreendida em sua “verdade” a fim 
de aplicá-la na vida real. 
 
Para se aplicar corretamente uma norma jurídica é insuficiente o esforço 
localizado apenas ao propósito de lhe conhecer o sentido e significação 
verdadeira. Há casos em que esta se adota com maior amplitude, e outros em 
que se exigem restrições cautelosas (interpretação extensiva e interpretação 
restritiva). 
Ex.: Vide Art. 103-A da CF/88. 
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício 
ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos 
seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria 
constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua 
publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em 
relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à 
administração pública direta e indireta, nas esferas 
federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua 
revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. 
 
 
Estariam os órgãos da Administração Pública distritais afastados do efeito 
vinculante dessas súmulas? 
 
A Hermenêutica vem, pois, oferecer os meios de se resolver na prática as 
dificuldades, permitindo ao hermeneuta descobrir o alcance e a extensão de um 
preceito. Isto decorre do fato de que, a palavra, quer considerada isoladamente 
ou combinada a outras, formando a norma jurídica, ostenta uma rigidez exterior 
ilusória, pois sua natureza é elástica e dúctil, variando seu significado com o 
transcorrer do tempo e a evolução da sociedade. 
 
Vejamos o exemplo do art. 215 do Código Penal que na redação vigente 
até 2005 dizia: "Ter conjunção carnal com mulher honesta, mediante fraude". 
Agora, conforme a Lei 11.106/2005, a redação do art. 215 passou a ser a 
seguinte: "Ter conjunção carnal com mulher, mediante fraude". A expressão 
"mulher honesta" constituía elemento normativo do tipo, e a exigência de 
honestidade impunha tratamento de natureza nitidamente discriminatória. O 
parâmetro de mulher honesta de quando da redação do Código Penal em 1940 
seria o mesmo de 2005? 
 
A interpretação da norma decorre da compreensão de sua efetividade, de 
forma alguma levando ao entendimento de que qualquer pessoa possa usá-la 
com interesses variados. A liberdade não é de forma nenhuma absoluta, além 
de haver também critérios hermenêuticos criados por lei,- fato é que faz-se 
importante a compreensão de que as regras de interpretação têm cunho 
científico. Deve o juiz interpretar a lei em conformidade com uma interpretação 
adequada e metódica que leve a solução mais justa entre todas as possíveis. 
 
 
7 
 
2.1 - Regras de interpretação criadas por lei 
 
No que se refere a critérios hermenêuticos criados por lei, muitos autores 
entendem que as regras de interpretação são de cunho científico, não sendo 
apropriada a sua regulamentação. Contudo havendo previsão legal é importante 
ter em mente que uma das características da norma é a imperatividade, eis que 
determina e não apenas aconselha. 
 
Do ponto de vista científico não é apropriado que sejam estabelecidas 
regras de interpretação através de leis, eis que tal matéria é própria da ciência. 
 
Um exemplo de regra de interpretação criada por lei se encontra na 
chamada Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657/42) em seu 
art. 5º. Vejamos: “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela 
se dirige e às exigências do bem comum”. 
 
Na verdade isto se trata de um mero critério de orientação, sem impedir que o 
intérprete procure outros meios de interpretação. 
 
 
2.2 - Hermenêutica Constitucional 
 
A fim de se compreender a Hermenêutica Constitucional são necessárias 
algumas observações a saber: muitas são as formas de interpretação 
necessárias à compreensão do real significado da norma, ou seja, a 
compreensão do espírito da lei, sendo que muitas vezes são utilizadas em 
conjunto. É necessário compreender também as circunstâncias sociais, políticas 
e econômicas que levam ao entendimento da vontade da lei, havendo inclusive 
o elemento histórico que busca as raízes históricas da norma, analisando-se o 
processo de formação e peculiaridades da época. 
 
No que se refere à Hermenêutica Constitucional, é de fundamental 
importância a compreensão de uma pluralidade metodológica, sendo que a 
análise teleológica ou finalista é excepcionalmente necessária, eis que estatuto 
político e jurídico, extremamente sensível a questões sociais, políticas e 
econômicas. Seu conteúdo finalista fica claro quando vista como instrumento de 
governo e transformando-se em amparo à liberdade a aos direitos 
fundamentais. 
 
A letra permanece e o sentido se adapta às mudanças que a evolução 
impinge à vida social. Tal fenômeno merece ser estudado pormenorizadamente, 
como será feito com relação às mutações constitucionais (vide artigo sobre 
mutações constitucionais e STF e entrevista com Luis Roberto Barroso). 
 
A preocupação com a efetividade da Constituição é um dos temas mais 
importantes no Direito contemporâneo. As Constituições foram feitas para durar 
8 
 
e sua longevidade é fundamental para se fundar um espírito de respeito a ela, 
eis que somente com uma Constituição forte ter-se-á instituições jurídicas 
respeitadas, e sem elas, não há possibilidade de cidadania. A interpretação é 
ponto primordial para a permanência de uma Constituição. 
 
O que o Direito Constitucional contemporâneo entende é que um texto 
escrito não impede o surgimento de uma jurisprudência constitucional. A 
interpretação evolutiva objetiva exatamente adequar a prática constitucional às 
mudanças que ocorrem na sociedade. A interpretação constitucional precisa 
acompanhar essas mudanças, entretanto nem sempre se torna necessária a 
alteração formal da Constituição para que esta tenha uma atualização constante 
e permanente. 
 
As referidas mutações constitucionais conferem um caráter dinâmicoà 
Constituição, procurando conciliar o sistema constitucional originário com as 
transformações que ocorrem na realidade social. 
 
 
2.2.1 - Interpretação evolutiva 
 
Busca adequar a Constituição às mudanças históricas, políticas e sociais 
que não estavam presentes na mente dos constituintes a fim de mantê-la viva e 
em sintonia com o tempo presente, sem, contudo, modificar os seus termos 
literais. Trata-se da já analisada mutação constitucional. 
 
Este processo é mais simples nas constituições sintéticas, mas também 
ocorre nas constituições analíticas. É importante reconhecer o significado 
jurídico atual da lei e não seu significado histórico. Este processo ocorre de 
forma bem clara na Constituição Americana de 1787, que entrou em vigor em 
1789, sendo um texto jurídico de notória longevidade, apesar da estrutura social 
que ela regula ter mudado extraordinariamente. Como exemplo histórico temos 
a evolução dos direitos dos negros americanos, sem que o texto fosse alterado. 
Vejamos: 
 
 1787 - A Constituição permite o regime de escravidão; 
 1787 - Caso Dred Scott vs. Sandford: A Suprema Corte chegou a negar a 
condição de cidadão a um escravo. Determinou que as pessoas de 
ascendência africana, quer fossem ou não escravos, não estavam 
protegidos pela Constituição e nunca poderiam se tornar cidadãos 
daquele país. Decidiu também que o Congresso não tinha autoridade 
para proibir a escravidão nos territórios da União. Declarou que, como os 
escravos não eram cidadãos, não poderiam requerer em tribunais e, 
assim como os bens móveis ou propriedade imóvel privada não poderiam 
ser retirados de seus donos sem o devido processo legal; 
 1865 - Após uma guerra civil é promulgada a 13ª Emenda, que aboliu a 
escravatura; 
9 
 
 1896 - Caso Plesy vs. Fergusson: a Suprema Corte endossou a doutrina 
equal but separate, que permitia uma forma dissimulada de discriminação 
em muitos estados. A partir de 1868 alguns estados americanos 
aprovaram leis que favoreciam a segregação de negros em escolas e 
outros ambientes, o que ia contra a emenda de igualdade (equal 
protection. As leis de segregação que ficaram conhecidas com “Leis de 
Jim Crow”, aplicadas em ambientes como escolas, banheiros, 
bebedouros públicos e transporte público. Em 1890, uma lei do Estado de 
Louisiana estabeleceu que as estações ferroviárias devessem 
providenciar vagões separados e iguais para negros e brancos. Após 
alguns anos, um fato levou ao caso Plessy vs. Ferguson, que chegou à 
Suprema Corte Americana em 1896. Nele, um senhor de nome Homer 
Plessy, pele escura, ou colored, como eram chamados os negros norte-
americanos, havia comprado uma passagem de trem para a primeira 
classe. Após sentar-se no vagão foi intimado pela polícia a sair, pois 
estava em uma área reservada somente as pessoas brancas. Se recusou 
a deixar o local e acabou sendo preso por violar a lei do Estado que 
denominava aquela área do transporte coletivo somente para a utilização 
de pessoas brancas. 
 1954 – Caso Brown VS. Board of Education: a Suprema Corte considerou 
inconstitucional a segregação de estudantes negros nas escolas públicas, 
em decisão que se tornou um marco na política de integração racial. 
 
Observa-se que na vigência da mesma Constituição evoluiu-se de uma 
interpretação que permitia a discriminação total para uma discriminação 
atenuada e, depois, para a não-discriminação. 
 
Outro ponto que se observa foi a cláusula da equal protection, inserida na 
14ª emenda à Constituição Americana em 1868, que veio estender aos estados 
a aplicação do devido processo legal. Originalmente, o objetivo dessa previsão 
era garantir os direitos dos negros (recém libertos da escravidão) frente a 
discriminações efetuadas pelos governos e legislativos estaduais. 
A Suprema Corte deu à 14ª emenda uma interpretação extremamente 
restritiva da cláusula do equal protection. Por ela, talvez em atendimento aos 
anseios da maioria da sociedade branca e conservadora da época, permitiu-se 
que a segregação racial fosse praticada de forma ostensiva até 1954 e extirpada 
na década de 1960, quando do movimento pelos direitos civis dos negros 
liderado por Martin Luther King. 
O que dizia a 14ª Emenda: Seção 1: [...] "Nenhum estado editará ou 
aplicará leis que restrinjam os privilégios e imunidades dos cidadãos dos 
Estados Unidos; nem privarão qualquer pessoa de sua vida, liberdade ou 
propriedade sem um devido processo legal; nem negarão a qualquer pessoa 
dentro de sua jurisdição a igual proteção das leis." (Gunther, Constitutional Law, 
p. A-11). 
 
 
10 
 
2.2.2 - Supremacia constitucional 
 
 A Constituição é o fundamento de todas as leis e, numa visão kelsiana a 
validade das normas está fundamentada na Constituição. No que se refere a 
sua interpretação sistemática, há se ressaltar que esta se dá apenas no âmbito 
interno da própria Constituição, em virtude de seu status de norma superior. 
 Mesmo nos casos de normas de eficácia contida, que permitem a 
restrição ou redução da norma constitucional por intermédio de leis ordinárias, 
haverá a predominância das normas constitucionais, posto que continuarão a 
ser fundamento de validade das demais normas. 
 
 
2.2.3 - Unidade da Constituição 
 
A Constituição deve ser vista como um todo, e não um aglomerado de 
normas. Na visão de Norberto Bobbio, a Constituição deve ser interpretada 
como o termo unificador das normas que compõem o ordenamento jurídico, pois 
sem ela as normas constituiriam um amontoado e não um ordenamento. 
 
Geralmente as Constituições democráticas congregam um pluralismo de 
interesses que muitas vezes aparentam-se antagônicos, por ser resultado de um 
amplo consenso na sociedade. Estes interesses, que por vezes são 
contraditórios, devem ser adequados pelo intérprete de modo a atingir o espírito 
da unidade, como o Direito de propriedade e a função social da propriedade. 
 
A Constituição precisa ser encarada como um todo harmônico e 
sistemático, pois não pode ser interpretada exclusivamente a partir de si 
mesma. É importante ficar claro que as antinomias que porventura sejam 
apontadas não são antinomias reais, mas antinomias aparentes, sendo 
solucionadas através da busca de um equilíbrio entre as normas. 
Muitas vezes a solução demanda a utilização da ponderação entre bens e 
valores. Identifica-se o bem jurídico tutelado das normas em aparente 
contradição e conjuga-os a determinados valores dando preferência às normas 
que consagrem o valor dos princípios fundamentais. Busca-se, pois, o equilíbrio 
entre os interesses em conflito. 
 
 
3 - Sistema clássico de Hermenêutica: Escola da Exegese 
 
 O sistema primitivo ou tradicional de interpretação teve denominações 
várias, sem que fosse sensivelmente alterada a essência. 
 
 O método tradicional da Escola da Exegese é o mais conservador e 
primitivo de Hermenêutica. Buscava-se restringir o Direito aos textos rígidos e 
aplicá-lo com a vontade verificada ou presumida do legislador há muito 
sepultado. Busca-se, pois, entender o pensamento do autor de um dispositivo a 
11 
 
fim de esclarecer o sentido deste, incorrendo no erro de generalizar este 
processo a todas as situações. 
 
 A interpretação dogmática do Direito teve seu apogeu na Revolução 
Francesa de 1789, pela concepção de um Direito natural oriundo da razão e 
com atributos especiais de imutabilidade e universalidade. Neste cenário surge 
em 1804 o Código de Napoleão, entendido como uma obra perfeita. Por tal fato 
o intérprete deveria ater-se ao texto legal como a fonte genuína e única de 
Direito. 
 
 Neste cenário o único elemento utilizado era o filológico e posteriormente 
os trabalhos legislativos preparatórios para se descobrir a mens legislatoris. Sua 
construção deveu-se ao uso exacerbado do Direito Romano. Este apegoà 
formalística transformou o aplicador da lei em um autômato, cheio de minúcias, 
geometricamente preciso, obcecado pela arte dos silogismos forçados, 
interpretando um texto como se vivesse há cem anos, imobilizado e indiferente 
ao progresso. 
 
Este apego demasiado à forma se aproximava dos métodos romanos, 
que fora chamado de Pandectologia, fazendo referência às compilações 
justinianas. Bem falou Jhering, citado por Carlos Maximiliano: “Através do Direito 
Romano, mas também acima e além do mesmo”. 
 
 Esta escola evolui e por fim começa a aceitar o método sistemático, 
tendo em vista que a legislação é um todo orgânico, devendo as leis ser 
interpretadas em conjunto. Contudo é possível dizer que neste caso o objetivo 
dos referidos elementos de interpretação continuava sendo descobrir a mens 
legislatoris. O fetichismo legal e o Estado como único autor do Direito são 
postulados básicos desta escola, além de sua vinculação exacerbada à vontade 
do legislador. 
 
Na verdade, da vontade primitiva do legislador consegue-se, quando 
muito, verificar o sentido desta, e jamais o alcance, eis que nunca 
preestabelecido e impossível de prever. Não se pesquisava o fator teleológico 
do Direito, a lei representava e continha toda a realidade social e não havia a 
menor preocupação do intérprete em atualizá-la. 
 
O princípio in claris cessat interpretatio foi adotado em sua íntegra pela 
Escola da Exegese. 
 
Esta escola vinha também expor a matéria dos códigos, artigo por artigo, 
facilitando a localização da vontade do legislador. Prevalece ainda hoje a linha 
de exposição sistemática, contudo o jurisconsulto serve-se do conjunto de 
disposições, com a finalidade de construir, com materiais esparsos em centenas 
de artigos, um todo orgânico. Seria, pois, o nascimento do método sistemático, 
também chamado de científico. 
12 
 
3.1 - Evolução do sistema clássico 
 
a) Método histórico-evolutivo: 
 
Insurgiu-se o método histórico-evolutivo contra a concepção dogmática 
do Direito proclamada pela Escola da Exegese, eis que cabe ao intérprete 
realizar uma interpretação atualizada da lei. 
 
A velha escolástica cede lugar ao método histórico-evolutivo. Tentam 
alguns conciliar o passado com o presente, admitindo a exegese progressiva 
sobre a base da dogmática. Insistem ainda em inquirir a vontade geradora dos 
dispositivos legais, com a diferença de não se ater apenas no que o legislador 
quis, mas também perguntando o que ele quereria se vivesse no meio 
atual, enfrentando determinado caso concreto. Busca-se, pois, o Direito com 
uma forma dúctil, adaptando-o, pela interpretação, às novas exigências sociais. 
Cumpre ao intérprete “fecundar a letra da Lei na sua imobilidade, de maneira 
que se torne esta a expressão real da vida do Direito”. 
 
O intérprete não cria disposições e nem posterga as existentes, mas sim 
deduz nova regra para um caso concreto através do conjunto de disposições 
vigentes. Maximiliano cita o jurisconsulto romano Paulo: “da regra não se extraia 
o Direito, ao contrário, com o Direito, tal qual na essência ele é, construa-se a 
regra”. 
 
A escola histórico-evolutiva conseguiu generalizar o método teleológico e 
a preocupação dos fins sociais nos trabalhos de Hermenêutica, conciliando este 
processo com a antiga dogmática. Matou de vez o apego ao método gramatical 
ou filológico de interpretação muito combatido por Jhering e seus discípulos. 
Eliminou os brocardos latinos In claris cessat interpretatio e o Fiat justitia, pereat 
mundus (Faça-se justiça, ainda que o mundo pereça). Combateu o excesso de 
erudição clássica e o desprezo pelos fatos econômicos na educação do jurista. 
Deu, enfim, o golpe de misericórdia à escola da Exegese. 
 
 
b) Método da livre investigação científica do Direito. 
 
 Proposto por François Gény que buscava um método capaz de 
possibilitar ao operador do Direito uma maior liberdade diante das lacunas da 
lei. Afirmava que o operador, depois de esgotados os recursos da lei, da 
analogia e dos costumes, poderia encontrar a solução segundo o que 
percebesse na organização social, política e econômica sem, contudo, ir contra 
a jurisprudência e a doutrina dominante. 
 
 François Gény, citado por Carlos Maximiliano, autoriza, portanto o juiz 
agir como legislador, mas após esgotados os recursos da lei. Exemplo disso 
pode ser encontrado no art. 1º do Código Civil Suíço. Vejamos: 
13 
 
 
Aplica-se a lei em todas as questões de Direito para as 
quais ela, segundo sua letra ou interpretação, contém um 
dispositivo específico. 
Deve o juiz, quando se lhe não depara com preceito legal 
apropriado, decidir de acordo com o Direito 
consuetudinário, e, na falta deste, segundo regra que ele 
próprio estabeleceria se fosse legislador. 
Inspira-se na doutrina e na jurisprudência consagradas. 
 
 
É interessante observar também o que determina o art. 4º do Decreto-Lei 
4.657/42 (Lei de introdução ao Código Civil brasileiro): “Quando a lei for omissa, 
o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios 
gerais de Direito”. 
 
 
c) Corrente do Direito Livre 
 
 Representaria a busca pelo Direito justo, defendida por Armínio 
Kantorowicz, como dentro ou fora da lei, na ausência desta ou a despeito da 
mesma. Seria decidir praeter e também contra legem. Pregava desprezar 
qualquer interpretação, construção ou analogia, inspirando-se preferencialmente 
em dados sociológicos. Em síntese, buscava um ideal de justiça, ainda que 
contra a lei. 
 
 
4 - O juiz e a aplicação do Direito 
 
No passado houve uma tendência a reduzir o juiz a uma função 
puramente automática. Hoje, muito pelo contrário, o Direito vive pela 
jurisprudência e dela depende para sua evolução. Pela jurisprudência o Direito 
evolui ante a uma legislação às vezes imóvel. 
 
Nas palavras de Carlos Maximiliano, 
 
Embora o princípio da divisão de poderes, observado sem 
restrições... extinga o papel criador do Direito, atribuindo à 
jurisprudência o dever de decidir litígios, sejam quais 
forem as deficiências da lei escrita, força a magistratura a 
reivindicar, em parte, a sua velha competência e assim 
tornar-se, de fato, uma aperfeiçoadora e dilatadora das 
normas rígidas. 
 
 
 Ao juiz não é lícito abster-se de julgar alegando ser a lei ambígua, 
omissa, obscura ou não ter a mesma previsto as circunstâncias particulares do 
caso. Caso assim o fosse, a ordem social ficaria seriamente ameaçada. 
Prevalece, portando, a exigência de onde não existe um texto explícito, o 
14 
 
magistrado utilizar-se dos meios regulares, como os costumes, a analogia e a 
equidade. 
 
Vejamos o que diz o Decreto-Lei 4.657/42 (Lei de introdução ao Código Civil) 
que foi alterada pela Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Redação 
dada pela Lei nº 12.376, de 2010): “Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz 
decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de 
Direito”. 
No art. 5º: “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se 
dirige e às exigências do bem comum”. 
 
Tais meios regulares são maneiras de preencher as lacunas da lei. No 
caso da analogia utiliza-se de uma norma que regula uma situação semelhante 
àquela que não possui a norma regulatória. Costumes são comportamentos 
sociais reiterados e tidos como corretos. Os princípios gerais de Direito são as 
bases norteadoras dos doutrinadores e juristas. 
 
Na verdade o magistrado não formula o Direito, apenas o interpreta, mas 
assim mesmo é reservado a ele um campo vastíssimo de atividade autônoma, 
independentemente das deficiências dos textos positivos. Exerce, pois, função 
relativamente criadora, formulando uma regra ad hoc, entretanto, há uma 
tendência em aplicar em processos novos a solução achada, o que por óbvioforma jurisprudência. 
 
A bem da verdade, o juiz crê apenas aplicar a lei e o legislador produzi-la. 
A diferença entre os dois é somente em grau e em método. O primeiro atende à 
espécie e o segundo generaliza. O juiz olha para o passado, enquanto o 
legislador olha para o futuro. 
 
É claro que este trabalho criador tem limites, pois Montesquieu já 
observava que todos os poderes constitucionais tendem a exagerar as próprias 
atribuições e invalidar o campo da jurisdição alheia. Maximiliano afirma: “a 
ditadura judiciária não é menos nociva que a do executivo, nem a onipotência 
parlamentar”. 
 
Carlos Maximiliano afirma também, de maneira inteligente, que existe 
entre o legislador e o juiz a mesma relação que existe entre o dramaturgo e o 
ator. Deve o ator atender às palavras da peça e inspirar-se no seu conteúdo, 
porém, se é um verdadeiro artista, não se limita a uma reprodução pálida e 
servil, dando ao contrário, vida ao papel, encarnando de forma particular o 
personagem, imprimindo um traço pessoal à representação, emprestando às 
cenas um certo colorido. 
 
Desta feita, o juiz não procede como um insensível e frio aplicador 
mecânico de dispositivos, porém como órgão de aperfeiçoamento destes, um 
intermediário entre a letra morta dos códigos e a vida real. 
15 
 
 
No passado, ao juiz não era lícito sequer interpretar a lei, apenas aplicá-
la. Vejamos o que dizia a primeira Constituição do Brasil em 1824: 
 
 
Art. 15. É da attribuição da Assembléa Geral 
 I. Tomar Juramento ao Imperador, ao Principe Imperial, 
ao Regente, ou Regência. 
[ ... ] 
 VIII. Fazer Leis, interpretal-as, suspendel-as, e rovogal-as. 
(sic) (BRASIL, 1824). 
 
 
Atualmente a autonomia do juiz no aplicar da lei prevaleceu como algo 
fundamental à celeridade e retidão na distribuição da justiça. A lei é uma norma 
jurídica geral, enquanto a regra firmada pelo juiz é uma norma jurídica individual. 
 
 É importante ficar claro que a busca por ideal de justiça do magistrado a 
qualquer preço, dentro ou fora da lei, na ausência desta – ou a despeito da 
mesma, ou seja, praeter legem e também contra legem é algo inconcebível. 
Tais escolas, como a da Livre indagação, do Direito Livre, do “Direito achado na 
rua”, etc., possuem um discurso muitas vezes convincente e aparentemente 
“justo”, mas arrasam a segurança jurídica e a previsibilidade das relações. 
 
 Se o próprio juiz se sentir a vontade para não aplicar dispositivos legais 
aos casos ocorrentes, como os prestigiar e impor à massa? A atuação deve 
recorrer aos princípios gerais e a equidade, mas apenas para compreender e 
completar o texto, e não para lhe corrigir disposições injustas segundo o critério 
pessoal do julgador, pois senso de justiça cada um possui o seu. 
 
A despreocupação com os textos, desprezando qualquer interpretação, o 
olhar demasiado para o foro íntimo e as amarras ideológicas são por demais 
nocivas à aplicação da lei. O texto interpretado oferece dupla vantagem: é útil 
para o povo e protege o juiz. Sua função com relação aos textos é dilatar, 
compreender e completar, porém não alterar, corrigir ou substituir. Pode 
melhorar um dispositivo graças à interpretação hábil e técnica, porém não negar 
a lei e decidir o contrário do que a mesma estabelece. 
 
Claro é que quando se fala em interpretação hábil e técnica está se 
incluindo também a análise da norma em face da Constituição, verificando sua 
compatibilidade e analisando se é ou não constitucional. Trata-se de norma 
existente e vigente anteriormente à promulgação da Constituição, a análise se 
fora ou não recepcionada pela mesma é essencial. 
 
A própria existência de normas jurídicas importa no reconhecimento 
oficial da necessidade de uma direção e em proclamar que a vida social não 
pode prescindir de regras obrigatórias, ou seja, de um elemento de autoridade. 
16 
 
O jurista Carlos Maximiliano cita uma forma original de Direito Livre em 
um tribunal de primeira instância de Château-Thierry, presidido pelo ”bom” juiz 
Magnaud. Este magistrado, imbuído de idéias humanitárias redigia sentenças 
mostrando-se clemente e atencioso com os fracos e humildes, mas também 
enérgico e severo com os poderosos. 
 
Na sua mão a lei variava segundo a classe, mentalidade religiosa ou 
inclinações políticas dos indivíduos submetidos à sua jurisdição. Não jogava 
com a Hermenêutica, usava linguagem de orador ou panfletário, empregava 
apenas argumentos humanos e sociais, dando razão a este ou àquele sem se 
preocupar com os textos de lei. 
 
Do “bom” magistrado Magnaud concluiu-se que foi apenas uma 
“retumbante manifestação de ideologia pessoal”. Certo é que “quando o 
magistrado se deixa guiar pelo sentimento, a lide degenera em loteria. Ninguém 
sabe como cumprir a lei a coberto de condenações forenses”. Este é um dos 
piores cenários para o advogado, eis que não faz diferença seu conhecimento, 
habilidade ou raciocínio. Não faz diferença para o cliente contratar um advogado 
brilhante e com vasto conhecimento ou um medíocre, pois não serão aspectos 
técnicos que resolverão a lide. 
Há desta feita um nivelamento por baixo dos profissionais. Tal fato tem 
ocorrido hoje em alguns de nossos vizinhos na América Latina, prejudicando 
muito as carreiras jurídicas e levando a uma insegurança jurídica que afasta 
investimentos, que são redirecionados para onde a previsibilidade das relações 
é maior e, consequentemente, os riscos são menores. 
 
O papel do magistrado não é guiar-se pelo sentimentalismo, mas sim 
manter o equilíbrio dos interesses e, dentre eles distinguir os legítimos dos 
ilegítimos. Não se prega só o lado material, ou só o lado moral; deve, 
conquanto, fundir os dados econômicos e os eminentemente sociais a fim de 
assegurar o progresso dentro da ordem, mantendo as condições jurídicas de 
coexistência humana. É importante ter em mente que não é lícito usar o Direito 
contra o Direito, eis que haveria a subversão do mesmo, que deve constituir um 
sistema harmônico. 
 
Carlos Maximiliano de maneira lapidar assevera: 
 
O furação revolucionário, ou leva por diante as instituições 
vigentes, ou passa, deixando sempre, entre os males 
transitórios que suscita, alguma semente útil para germinar 
depois. 
Sim, o demolidor impressiona, granjeia simpatia e abala o 
prestígio da teoria dominante com escalpelizar erros, cobrir 
de ridículo os preconceitos, esvurmar chagas sociais mais 
ou menos ocultas ou toleradas; porque ele descobre os 
males; engana-se apenas quanto aos remédios: parte da 
verdade clamorosa e irritante para o devaneio doido, ou 
plano sinistro. 
 
17 
 
 
 
 
4.1 - Jurisprudência 
 
Denomina-se jurisprudência o conjunto das soluções uniformes dadas 
pelos tribunais às questões de Direito relativas a um caso particular. Costuma 
ter três funções muito nítidas que foram se desenvolvendo lentamente, quais 
sejam: 
 
a) Aplicar a lei; 
 
b) Adaptar a lei, pondo-a em harmonia às idéias contemporâneas e às 
necessidades modernas; 
 
c) Função criadora, que se consiste em preencher as lacunas da lei. 
 
 
O estudo da jurisprudência também serve ao progresso, na medida em 
que prepara reformas legislativas, apontando defeitos nas leis, eis que o 
julgador sempre deplora por ter que julgar contra o Direito e a equidade. A 
jurisprudência demonstra porque a letra antiga não pode mais adaptar-se às 
exigências sociais do presente e vale, sobretudo, pelos seus fundamentos. 
 
Outro aspecto da jurisprudência é o fato de evitar que uma questão 
doutrinária fique eternamente aberta e dê margem a novas demandas, 
diminuindo, portanto, os litígios e colaborando para a segurança jurídica, porque 
de antemão faz saber qual será o resultado das controvérsias. 
 
É preferível chamar jurisprudência ao constantee uniforme 
pronunciamento sobre uma questão de Direito por parte dos tribunais e simples 
precedentes as decisões isoladas. O STF ocupa o primeiro lugar como 
autoridade em jurisprudência eis que guardião da Constituição, mas fica um 
alerta: o argumento científico deveria ter mais peso que a autoridade. 
 
Certo é que um só julgado não constitui jurisprudência e também por si só 
isolado não possui valor decisivo e absoluto. Os julgados são bons auxiliares de 
exegese, quando manuseados criteriosamente, criticados e comparados; 
examinados à luz dos princípios constitucionais. Logo, a citação mecânica de 
acórdãos não pode deixar de conduzir a erros graves. 
 
Maximiliano recorda que “a ciência dos arestos tornou-se a ciência 
daqueles que não tem outra ciência; e a jurisprudência é uma ciência facílima 
de adquirir: basta um bom índice de matérias”. A decisão não bem 
fundamentada é uma simples afirmação e, em Direito, não se afirma; prova-se. 
Conclui-se que a jurisprudência auxilia o trabalho do intérprete, mas não o 
18 
 
substitui nem dispensa. Não deve o juiz, com facilidade, afastar-se da 
autoridade dos casos constantemente julgados de forma semelhante. 
 
5 - Elementos ou processos de interpretação 
 
Os elementos de interpretação são essências a interpretação das leis, 
assim como da Constituição, sem prejuízo de seu caráter superior que lhe dá 
problemas interpretativos diferenciados, mas que essencialmente acabam 
sendo iguais aos da lei comum, pois para a sua interpretação também são 
utilizados critérios gerais da interpretação que a seguir serão analisados. 
 
As expressões interpretações gramatical, literal, histórica, sistemática e 
etc., são equivocadas para alguns porque dão a idéia de distintos 
procedimentos que se anulam mutuamente. O que deve ser compreendido é 
que eles intervêm globalmente para se ter uma visão mais completa da norma. 
Muitos são os elementos ou processos de interpretação para se buscar o 
resultado que tenha correspondência com o espírito da lei, devendo ser usados 
em conjunto. O elemento gramatical visto a seguir é a primeira linha de 
abordagem de um texto legal. 
 
 
5.1 - Elemento (ou Processo) Gramatical ou Filológico 
 
O processo gramatical leva a uma interpretação literal e preocupa-se em 
extrair o significado verbal que resulta do texto segundo as regras gramaticais. 
 
Muito usada na Escola da Exegese, que lhe dava absoluta preferência, 
mas passou a ter cada vez menor importância no Direito moderno, atento 
apenas aos aspectos exteriores do texto. As dificuldades são muitas. Podemos 
citar: o significado conforme a época, os regionalismos, as linguagens próprias 
dos indivíduos, o emprego de um mesmo vocábulo, ora no sentido vulgar, ora 
no sentido técnico-jurídico. Tudo isso gera dificuldade e controvérsia. 
 
Para a sua análise é fundamental o estudo das palavras empregadas no 
texto, bem como sua analise de pontuação e sintaxe. A linguagem é o veículo 
do pensamento do legislador ou da vontade da lei, mas pecam aqueles que dão 
valor absoluto à letra da lei independentemente do seu significado no contexto e 
dos resultados com base na realidade. Indiscutível é que sempre pensamos 
melhor que escrevemos, e isso não seria diferente com relação ao legislador. 
 
Muitos ficam indignados com a não aplicação da literalidade de um texto 
legal e acham que a única interpretação é aquela que revela o que já está 
resolvido na clareza das palavras, ainda que o resultado leve ao absurdo, com o 
que não podemos concordar. 
 
19 
 
Ao analisar um texto, a primeira linha de interpretação irá usar o elemento 
gramatical e para tal algumas considerações são importantes: 
 
a) O Direito Público utiliza mais vocábulos técnicos do que o Direito 
Privado, que os utiliza mais na acepção vulgar. O juiz muitas vezes atribui aos 
vocábulos o sentido resultante da linguagem vulgar, eis que presume haver o 
legislador usado expressões comuns, porem, quando são empregados em 
termos jurídicos, deve-se preferir a linguagem técnica. O Direito possui a sua 
linguagem e tecnologia próprias, devendo o intérprete levar isso em conta. 
 
b) Presume-se que a lei não contenha palavras supérfluas. Todas devem 
ser reconhecidas como escritas para influir no sentido da frase respectiva. Os 
lapsos ou enganos na redação de um dispositivo precisam ser demonstrados 
claramente. A linguagem tem por objetivo despertar em terceiros pensamento 
semelhante daquele que fala, presumindo-se, pois, que o legislador se esmerou 
em escolher expressões claras e precisas. Por tal fato, não tendo elementos de 
convicção em sentido diverso, deve o intérprete respeitar a letra do dispositivo. 
 
c) Embora a máxima atribuída a São Paulo,- a letra mata, o espírito vivifica 
-, nem por isso é menos certo, em alguns casos, o juiz afastar-se das 
expressões certas da lei. Um abandono desmedido da letra da lei constitui um 
perigo para a segurança jurídica. Por outro lado, o apego à letra dos dispositivos 
pode significar o sacrifício das realidades morais, econômicas e sociais, que 
constituem o fundo material e efetivo da vida jurídica. É importante atentar para 
o fato de que “Quem só atende à letra da lei, não merece o nome de 
jurisconsulto; é simples pragmático”. 
 
d) A letra não traduz a idéia na sua integralidade em cérebro alheio, 
apenas um produto semelhante, jamais idêntico. A experiência mostra que 
todos pensam melhor que escrevem. A linguagem sempre se revela 
transmissora imperfeita de idéias. Além disso, o legislativo funciona com 
intermitência; deliberam às pressas, não atentam somente para os ditames da 
sabedoria (?), deixando passar, sem exame sério, muitas matérias. 
 
e) Deve o juiz se atentar para o fato de não aplicar parágrafos isolados, e 
sim princípios jurídicos cristalizados em normas positivas. De fato, a 
interpretação meramente filológica (gramatical) é incompatível com o progresso 
e conduz a um formalismo retrógrado. 
 
Não é inútil insistir sobre a crescente desvalia do processo filológico, 
incomparavelmente inferior ao sistemático. Aproveitamos o aforismo do 
jurisconsulto Celso: “saber as leis é conhecer-lhes, não as palavras, mas a força 
e o poder”. 
 
O apego à interpretação gramatical levou ao brocardo In claris cessat 
interpretatio, o que é inconsistente, eis que nem sempre a clareza gramatical 
20 
 
revela a mens legis. Acreditavam seus defensores que a interpretação deveria 
ser usada apenas quando a lei estivesse obscura ou defeituosa. 
 
5.2 - Elemento lógico 
 
É um passo a diante em relação ao elemento gramatical para a descoberta 
da mens legis. Foi apreciado pela Escola da Exegese por ser um elemento hábil 
para a descoberta da vontade do legislador sem os riscos de utilização dos 
elementos extra legem. Sua falha, contudo, está no fato de não fornecer 
elementos suficientes para uma interpretação compatível com as exigências do 
momento da aplicação da lei. 
 
Este elemento consiste basicamente em procurar descobrir o sentido e o 
alcance de expressões do Direito sem o auxílio de nenhum elemento 
exterior, utilizando elementos da lógica geral. Pretende do simples estudo das 
normas em si, ou em conjunto, através do raciocínio dedutivo, obter a 
interpretação correta. Com certeza o pensamento deve prevalecer sobre a letra. 
 
Há se ressaltar que, segundo Miguel Reale, citado por VIEITO (2000) “não 
é fácil perceber qualquer distinção entre a interpretação lógica e a sistemática, 
pois são antes aspectos de um mesmo trabalho de ordem lógica, visto como 
regras de Direito devem ser entendidas organicamente, estando umas 
dependentes das outras”. Na verdade o elemento lógico está presente no 
sistemático, e podemos dizer ainda que na verdade está presente em todos os 
métodos, pois sem lógica não se compreendenada. 
 
 
5.3 - Elemento sistemático 
 
Passou a ser utilizado em uma fase mais avançada da Escola da Exegese, 
eis que apesar de não estar preso ao sentido literal, como ocorre no elemento 
gramatical, passou a ser utilizado para impedir contradições. 
 
Este elemento é utilizado após a primeira linha de abordagem da lei ser 
iniciada, ou seja, após a análise do elemento gramatical e da estrutura interna 
do texto, abrem-se os horizontes comparando-a a outros dispositivos legais e 
inserindo-a no contexto normativo. O elemento lógico e o sistemático passam a 
ser usados conjuntamente, permitindo a visão sistêmica, ou seja, do conjunto. 
 
Consiste em comparar o dispositivo em análise com outros da mesma lei 
ou em leis diversas referentes ao mesmo objeto e também o submetendo à 
Constituição. Por umas normas se colhe o espírito de outras. 
 
O ordenamento jurídico deve ser encarado como um todo harmônico que 
guarda sintonia entre as partes, pois do contrário seria um amontoado de leis e 
não um sistema de preceitos coordenados como o é. Portanto, o Direito não é 
21 
 
um conglomerado caótico de preceitos, mas constitui uma vasta unidade, um 
organismo regular, um sistema que representa um conjunto harmônico de 
normas coordenadas, em interdependência metódica. 
Em toda ciência o resultado do exame de um só fenômeno adquire 
presunção de certeza quando confirmado ou contrastado pelo estudo de outros; 
pelo menos casos próximos ou conexos. O processo sistemático encontra 
fundamento na “solidariedade” entre fenômenos coexistentes. Não se encontra 
um princípio isolado em ciência alguma, pois se acha cada um em conexão 
íntima com outros. 
 
De princípios jurídicos mais ou menos gerais deduzem-se consequências, 
eis que uns e outros se restringem reciprocamente. Cada preceito, portanto, é 
membro de um grande todo, por isso o exame em conjunto representa bastante 
luz para o caso em apreço. 
 
Verifica-se o nexo entre a regra e a exceção, entre o geral e o particular e 
dessa forma se obtém esclarecimentos preciosos. O preceito submetido a esse 
exame, longe de perder a sua própria individualidade, adquire realce maior. 
 
Essa idéia não é nova. Não se admitia em Roma que o juiz decidisse 
mirando apenas uma parte da lei, pois a ele incumbia examinar a norma em 
conjunto. Celso, no Digesto: “É contra o Direito julgar ou emitir parecer, tendo 
diante dos olhos, ao invés da lei em conjunto, só uma parte da mesma”. 
 
Hoje se aplica este processo (ou elemento) com uma amplitude ainda 
maior, eis que se analisa a conexidade entre as partes do dispositivo, entre este 
e outras prescrições da mesma lei, ou de outras leis, bem como a relação entre 
uma ou várias normas, além, é claro, da análise completa diante da 
Constituição, que irá condicionar, em última análise, a aplicação da norma. 
 
 
5.4 - Elemento teleológico: 
 
É o processo que dirige a interpretação conforme o fim desejado pelo 
dispositivo ou pelo Direito em geral. Grande avanço se deu na Hermenêutica 
com as teorias de Rudolf Von Ihering, que ressaltaram a idéia do fim como 
característica essencial do Direito. 
 
Considera-se hoje o Direito como uma ciência primariamente finalística, 
por isso a sua interpretação deve ser, na essência, teleológica. O hermeneuta 
sempre terá em vista o fim da lei e o resultado que a mesma precisa atingir em 
sua atuação prática. Deve descobrir o escopo da lei, que é a síntese entre o 
occasio legis e a ratio legis, pois não se pode concebê-la em uma interpretação 
fria e fora de sintonia com o bem comum. 
 
22 
 
É possível concluir que o fim da norma jurídica não é constante, eterno, 
absoluto e único, estando sempre em transformação. Cabe ao intérprete 
atualizar o fim intrínseco da norma jurídica interpretada, com base na idéia 
central de que ela tem uma finalidade social. Os meios devem estar adequados 
aos fins, e estes às necessidades sociais, pois não é possível e nem lógico uma 
lei iníqua. 
 
O próprio Direito positivo já deixa clara essa busca na Lei de Introdução 
ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657/42) em seu art. 5º. Vejamos: “Na aplicação 
da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem 
comum”. 
 
Importante destacar que a análise teleológica da Constituição é 
essencial, pois esta deve ser vista como um estatuto jurídico-político, sensível 
às questões sociais, políticas e econômicas. O Estado democrático de Direito 
tem seu fundamento na liberdade, sendo a finalidade primeira protegê-la, 
respeitados os demais valores que precisam ser compreendidos como fazendo 
parte do todo. 
 
Para o filósofo grego Heráclito de Éfeso “as coisas estão em constante 
transformação”, para ele não é possível nem mesmo “banhar-se duas vezes em 
um mesmo rio, pois as águas já passaram e haverá outras”. Desta feita ele já 
não será mais o mesmo. 
 
 
5.5 - Occasio Legis 
 
 Significa o conjunto complexo de circunstâncias específicas atinentes ao 
objeto da norma e que formaram o impulso exterior à sua emanação. Podem ser 
descritos como as causas mediatas e imediatas, as razões políticas e jurídicas, 
as necessidades que levaram a promulgá-los; o momento histórico, ambiente 
social, condições sociais e psicológicas sob as quais a lei surgiu e que 
contribuíram para a sua promulgação. 
 
Resumindo, consiste nas causas que deram origem ao texto legislativo e 
nos fatos de época que impulsionaram sua criação. Nenhum acontecimento 
surge isolado, e explicar a sua razão de ser, origem e ligação com outros resulta 
em compreender melhor ele próprio. 
 
 No que se refere à Constituição, esta é um instrumento cuja flexibilidade 
e generalidade permite-a adaptar-se a todos os tempos e circunstâncias, 
devendo ser interpretada levando-se em conta não apenas as condições e 
necessidades existentes no momento de sua promulgação, mas também 
condições econômicas, sociais, políticas e culturais no momento em que é 
interpretada, a fim de que seja possível o cumprimento dos grandes fins que 
inspiram e orientam a lei suprema de um Estado. 
23 
 
 
 O constitucionalista Luis Roberto Barroso ao ser questionado sobre a 
necessidade de contínuas emendas à CF/88 afirma: 
 
[...] É verdade que a vida política não se move 
por modelos ideais, e sim por modelos 
possíveis, mas o modelo ideal é que um partido 
liberal possa governar com essa Constituição, 
um partido trabalhista possa, e que sirva 
também ao governo de um partido conservador. 
Cabe à Constituição estabelecer os direitos e 
valores fundamentais de uma sociedade e 
deixar o restante para a política. Parte disso 
também é culpa do que eu gosto de chamar de 
narcisismo constitucional. Cada um que chega 
ao poder quer uma Constituição à sua imagem e 
semelhança. 
 
 
 A Constituição resume as tensões sociais, políticas e econômicas, por 
isto a compreensão de seu espírito é fundamental. 
 
 
5.6 - Elemento histórico: 
 
 É aquele que compreende as raízes históricas da norma objeto da 
interpretação para ter consciência do presente e projetar-se para o futuro. 
Dessa forma é fundamental que se conheça o processo de formação da lei para 
aplicá-la segundo as peculiaridades de sua época e antecipar as consequências 
futuras. 
 
 Neste elemento encontram-se trabalhos preparatórios dos atos 
legislativos, como as mensagens dirigidas pelo executivo ao legislativo, 
memoriais, pareceres, votos, debates da tribuna, etc. Para os seguidores da 
teoria subjetiva este estudo é muito relevante na descoberta da vontade do 
legislador (mens legislatoris). Para os objetivistas o valor dos trabalhos 
preparatórios é relativo, eis que se filiam à busca do fator teleológico, estudando 
os fins colimados pela lei. Por tal razão, os materiais legislativos tem seu 
prestígio em decadência,desde que a mens legislatoris cedeu primazia ao 
sistema de normas objetivadas. 
 
 
5.7 - Elemento sociológico: 
 
É aquele que busca a aplicação do texto conforme as necessidades da 
sociedade contemporânea, olhando menos para o passado e mais para o 
24 
 
futuro, tornando o intérprete um operador consciente do desenvolvimento 
jurídico. Um primeiro alerta se faz necessário: este método levado às últimas 
consequências chega ao Direito Livre, havendo na verdade uma subversão do 
Direito, transformando-o ao bel prazer do operador. 
 
O Direito não pode isolar-se do meio em que vigora e deixar de atender 
às outras manifestações da vida social. Se as normas positivas não se alteram 
na proporção em que se altera a sociedade, conscientemente ou 
inconscientemente, o hermeneuta adapta o texto às condições emergentes e 
imprevistas. A própria jurisprudência constitui um fator importante do processo 
de desenvolvimento geral. Por tal fato a Hermenêutica não pode se furtar à 
influência do meio a fim de evitar o descompasso entre o sentido literal das 
palavras e a realidade social. 
 
O bom intérprete sempre foi o renovador insinuante e cauteloso, mesmo 
que de forma inconsciente, das disposições escritas; um verdadeiro sociólogo 
do Direito. É importante citar Geoges Ripert. Para ele “quando o Direito ignora a 
realidade, a realidade se vinga ignorando o Direito”. 
 
Um segundo alerta se faz necessário: a aplicação do método sociológico 
deve ser feita com reserva e circunspecção, a fim de se evitar que prevaleçam 
as tendências intelectuais do intérprete sobre as decorrentes dos textos. 
 
 
6 - Interpretação 
 
 A interpretação feita pelos juízes é ato de conhecimento que apenas 
declara o Direito ou é um ato de vontade que cria norma jurídica? As 
concepções modernas defendem uma posição voluntarista, a qual concebe que 
a determinação de uma interpretação correta entre as várias interpretações 
possíveis é um ato de vontade. Nesta visão temos como expoente máximo 
Hans Kelsen. 
 
 A validade de uma norma encontra-se fundamentada em outra norma de 
superior hierarquia, até nos depararmos com a norma fundamental. Dessa 
forma cabe ao intérprete encontrar a norma individual aplicável a fatos 
concretos das normas gerais. A norma é para Kelsen uma moldura na qual 
várias possibilidades de execução se oferecem, sendo esta indeterminação 
proposital ou não. 
 
 A interpretação é, portanto, a averiguação do sentido da norma aplicável, 
e o resultado dessa atividade é a identificação na moldura do que ela 
representa, eis que dentro dela há várias possibilidades. O operador optará por 
uma interpretação, embora todas sejam válidas. Não há apenas uma decisão 
certa. 
 
25 
 
 Resumindo: para Kelsen a interpretação é mais um ato de vontade do 
que de cognição e, quando o juiz decide por uma das diversas possibilidades 
interpretativas, esta escolha se dá fora da esfera teórica, no âmbito da política 
do Direito, pois o legislador deixou uma margem de possibilidades para a 
aplicação de uma lei em face de um caso concreto. O sentido não é unívoco. 
 
 Kelsen rompe com o método tradicional de interpretação, que acredita ser 
possível descobrir o sentido único e correto de uma norma jurídica, pois para ele 
sempre há um resultado apenas possível e nunca um único correto. 
 
 A norma jurídica oferece um leque de possíveis significados, havendo 
muitas maneiras de se interpretar a lei. 
 
 O Ordenamento deve ser caracterizado de maneira hierarquizada, 
conforme exposto por Hans Kelsen, como uma pirâmide, que possui em seu 
vértice superior a Constituição. 
 
 
 
 
 
 
NORMA HIPOTÉTICA FUNDAMENTAL 
(TOPO DA PIRÂMIDE) 
 
DECISÕES JUDICIAIS (BASE DA PIRÂMIDE) 
 
 
26 
 
 
 
 
 A norma hipotética fundamental é um pressuposto fático-jurídico 
para a existência do ordenamento jurídico; 
 Na democracia a norma hipotética fundamental se origina de um 
contrato social e a partir disso se tem um Estado de Direito; 
 Para Kelsen as decisões judiciais são normas; 
 A subordinação entre as normas é o elemento que dá hierarquia 
entre elas; 
 A norma hierarquicamente inferior extrai da norma hierarquicamente 
superior seu fundamento de validade; 
 É dentro da teoria de Kelsen que podemos saber se a norma é 
constitucional ou inconstitucional. Neste caso é quando não há 
submissão da norma infraconstitucional à Constituição. 
 
 
 
A Interpretação é uma só, contudo, segundo Kelsen, há duas espécies de 
interpretação. Ele atribui duas denominações conforme o órgão do qual 
procede: 
 
a) Realizada por um órgão jurídico, que para ele seria a interpretação 
autêntica, em que se escolhe um dos caminhos possíveis revelados pela 
operação de conhecimento da norma jurídica; 
 
b) Realizada por uma pessoa privada, chamada por ele de interpretação 
doutrinária ou científica, que é um ato puramente cognoscitivo, 
cabendo a ela estabelecer apenas possíveis significações da lei. 
Apresenta-se como produto livre da reflexão 
 
 Kelsen ressalta que o ato que permitirá a escolha das interpretações 
possíveis é um ato político, feito pelo juiz que escolhe entre as várias 
possibilidades e sua escolha é uma norma jurídica individual. 
 
 
7 - Interpretação quanto à origem 
 
 A interpretação pode ser classificada de acordo com o intérprete que a 
realizou. Vejamos: 
 
 
7.1 - Interpretação Autêntica: 
 
27 
 
 Entende-se por Interpretação autêntica aquela que emana do próprio 
poder que fez o ato cujo sentido e alcance ela declara. É realizada pelos 
legisladores através da lei. 
 
A Interpretação autêntica fora outrora a de maior prestígio, sendo a única 
permitida, sob o fundamento de que na democracia o povo elege 
representantes, que elaboram as leis por delegação, não cabendo a ninguém 
mais interpretá-las, pois o povo somente delegou poderes ao legislador. Na 
verdade, a interpretação autêntica arranha o princípio da tripartição de poderes, 
no qual Montesquieu afirma que ao legislador cabe fazer as leis e ao aplicador 
(executivo e judiciário), interpretá-las. 
 
 O Imperador romano Justiniano, por exemplo, repelia qualquer exegese 
que não partisse dele próprio e generalizou o seguinte preceito: “Interpretar 
incumbe àquele a quem compete fazer a lei”. Entretanto, em suas próprias 
compilações autorizou a analogia, abrindo margem para a interpretação. 
 
A Interpretação autêntica vincula o juiz e transforma o legislador em um 
próprio juiz, transformando-o naquele que toma conhecimento de coisas 
concretas e procura resolvê-las por meio de uma disposição geral. A tendência 
então passou a ser o de dilatar o campo da interpretação doutrinal e de 
restringir o da autêntica, hoje, exceção rara nos países civilizados. 
 
A exegese se dava de forma obrigatória, por via de autoridade, realmente 
vinculando os próprios juizes. O Direito tornava-se ossificado e incompatível 
com a realidade, que exige dele cada vez mais dinamismo. 
 
 Por mais hábeis que sejam os elaboradores de um Código, logo depois 
de promulgado, surgem dificuldades e dúvidas sobre a aplicação de dispositivos 
bem redigidos, e por mais lúcida que fosse a visão dos legisladores, estes não 
conseguiram prever a infinita variedade de conflitos de interesses entre os 
homens. A interpretação autêntica tornou-se incompatível com uma visão 
dialética do mundo, que está em constante e em intensa modificação. 
 
Hoje a Interpretação autêntica sofre um processo de questionamento. 
Alguns jurisconsultos respeitados acham-na digna de consideração, de exame 
respeitoso por parte dos tribunais, porém não os obriga. Tomam-na apenas por 
valor científico dos próprios argumentos. Muitos outros avançam mais, 
afirmando que a interpretação autênticaé algo inconstitucional. Nossos tribunais 
não comungam com essa tese e a entendem compatível com nosso sistema 
jurídico. 
 
É importante verificar que, se o Poder Legislativo declara o sentido e o 
alcance de um dispositivo em uma lei posterior, o seu ato, embora reprodutivo e 
explicativo do ato anterior, é uma verdadeira norma jurídica, e somente por isso 
é que tem força obrigatória. Alguns defendem a possibilidade de retroatividade 
28 
 
da lei interpretativa, que remonta ao Direito Romano. Outros entendem que se 
houver uma lei interpretativa esta somente se aplicará a casos futuros. 
 
O entendimento mais correto é que, tratando-se de lei nova e, portanto, 
obrigatória, devem ser aplicados os critérios presentes no art. 5º, XXXVI da 
CF/88 e o art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil. Vejamos: 
 
XXXVI - a lei não prejudicará o Direito adquirido, o ato 
jurídico perfeito e a coisa julgada; 
 
Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, 
respeitados o ato jurídico perfeito, o Direito adquirido e a 
coisa julgada. 
 
 
É necessário ressaltar que há decisões dos tribunais favoráveis e contra 
a retroatividade da lei interpretativa. 
 
Quando o legislador tenta exprimir por meio de uma lei o conteúdo de 
outra, restringe a atividade do hermeneuta, que deve ter uma atividade livre e 
não receber pronta a interpretação de um poder político. 
 
O ideal do Direito é a certeza, embora relativa e a interpretação autêntica 
é contrária a ciência. Transforma o legislador em juiz, amplificando deste modo 
a atividade e autoridade legislativa, vulnerando o sistema de freios e 
contrapesos, a pedra de toque de nossas instituições políticas. 
 
Em síntese: se a lei tem defeitos de forma, é obscura, confusa ou 
imprecisa, faça-se outra com caráter claro de disposição nova, revogando a 
anterior, mas sem efeitos retroativos, conforme ressaltado. 
 
Para ser feita a interpretação, é necessário um profundo conhecimento 
de todo o ordenamento jurídico, compreensão sólida e conhecimento da história 
das instituições, além é claro, da experiência, da sabedoria, da lógica, 
discernimento e bom senso. 
 
 
7.2 - Interpretação Doutrinária: 
 
 É aquela realizada pelos juristas e apresenta-se como produto livre da 
reflexão, possuindo grande respaldo nos estados integrantes da família romano-
germânica. O intérprete adapta os dispositivos legislativos às exigências 
modernas, o que lhe concede ampla liberdade na aplicação do Direito. 
 
 A interpretação doutrinária adquire grande prestígio quando uniforme, 
duradoura e confirmada ou defendida por jurisconsultos de valor, brilhantes 
advogados, catedráticos e escritores. 
29 
 
 
 
 
7.3 - Interpretação Jurisprudencial: 
 
 É Jurisprudencial ou judicial a interpretação que se fundamenta no 
conjunto das soluções dadas pelos tribunais, às questões do Direito relativas a 
determinada matéria jurídica. Resumindo, é aquela realizada pelos juízes no 
exercício de sua função jurisdicional. 
 
 A Interpretação jurisprudencial é uma grande renovadora do Direito, na 
medida em que extirpa e erradica idéias até então dominantes e retrogradas. 
Apura, depura, corrige e consolida as idéias que tem fundo de ciência e utilidade 
em geral, por isso, a Interpretação jurisprudencial é sempre proveitosa. Ela 
preenche lacunas, utiliza da analogia e os princípios gerais do Direito, 
permitindo uma adaptação, que consiste em por a lei em harmonia com as 
idéias contemporâneas e as necessidades modernas, realizando como que uma 
atividade criadora, destinada a preencher as lacunas da lei. Entretanto, existe 
uma minoria que lhe nega o valor científico. 
 
 A Interpretação jurisprudencial não tem efeito compulsório, entretanto 
todo magistrado acha meritório não ter suas sentenças reformadas. Por isso, a 
Interpretação jurisprudencial isolada não tem valor decisivo e absoluto, pois 
essa é formada tanto por decisões brilhantes como por sentenças de colégios 
judiciais onde reinam a incompetência e a preguiça. Portanto, uma Interpretação 
jurisprudencial de uma decisão tomada de maneira equivocada, tornar-se-á uma 
interpretação equivocada. 
 
 Uma decisão isolada não pode ser chamada de jurisprudência, esta 
decisão é na verdade um precedente, o conjunto uniforme de precedentes 
forma a jurisprudência, e dela deriva a Interpretação jurisprudencial, que 
segundo alguns autores, é a mais importante, principalmente nos estados que 
se filiam à corrente da revisão judicial dos atos de autoridade (Judicial Review) 
ante aos juízes ordinários, segundo o exemplo dos EUA ou mesmo perante um 
tribunal especializado em matéria constitucional, como ocorre na Áustria e 
Alemanha. 
 
 
7.4 - Interpretação Administrativa 
 
É a Interpretação estabelecida pelos órgãos da Administração. De certa 
forma, despachos, decisões, circulares, portarias, instruções ou regulamentos 
das autoridades administrativas, indicam a interpretação que elas dão à lei ou 
ao regulamento. Quando constantes temos jurisprudência administrativa. Na 
verdade, essa interpretação não é obrigatória, pois os tribunais dão sempre a 
última palavra, eis que o contencioso administrativo não exclui a competência do 
30 
 
Poder Judiciário de apreciar a matéria objeto da discussão nos processos 
tramitados nos órgãos públicos, conforme dicção do art. 5º , XXXV da CF/88. 
 
 
 
8 - Interpretação quanto ao resultado: 
 
 Os diversos tipos de Interpretação podem levar o intérprete a resultados 
nem sempre semelhantes à interpretação gramatical, que é a interpretação 
obtida com base na letra da lei, naquilo que está efetivamente escrito. As 
palavras podem revelar com exatidão a mens legis, e sendo adequadas, cabe 
ao intérprete apenas realizar uma interpretação declarativa, não ampliando e 
nem restringindo o alcance do dispositivo em relação aos seus termos. 
 
Havendo imprecisão nos termos, será necessário conformá-los ao 
espírito da lei. Se os termos abrangem menos situações que as determinadas 
pela mens legis, cabe ao intérprete estender o alcance da lei em relação aos 
seus termos; se, ao contrário, os termos abrangem mais situações do que as 
desejadas pela lei, cabe-lhe restringir o alcance da lei em relação aos seus 
termos. 
 
Realmente existem leis que falham na adequação das palavras em 
relação ao seu escopo, cabendo ao intérprete ajustá-las. Isso não quer dizer 
que a interpretação é realizada apenas quando houver defeito, obscuridade ou 
contradição nas leis. É importante também se registrar a polissemia linguística 
que exige do intérprete a adequação dos múltiplos significados à mens legis. 
 
No que se refere à norma constitucional, interpreta-se estritamente os 
dispositivos que instituem exceções às regras gerais, como aquelas que 
favoreçam classes ou indivíduos, excluem outros, estabelecem 
incompatibilidades, asseguram prerrogativas ou cerceiam a liberdade ou 
garantias da propriedade. Na dúvida, segue-se a regra geral. 
 
A idéia de que se deve realizar interpretação literal da Constituição 
quando se refere a limitações aos direitos individuais e garantias da liberdade 
não deve ser vista com rigor. Hoje se admite a interpretação lógica e teleológica 
mesmo de tais disposições, com exclusão da analogia. 
 
 Ora o significado verdadeiro é mais estrito do que se deveria concluir do 
exame exclusivo das palavras ou frases interpretáveis; ora sucede ao inverso, 
eis que vai mais longe do que parece indicar a moldura visível da regra. 
 
A relação lógica entre a expressão e o pensamento faz discernir se a lei 
contém algo de mais ou de menos do que a letra parece exprimir. As 
circunstâncias extrínsecas revelam uma idéia fundamental mais ampla ou mais 
estreita, eis que o texto oferece apenas uma diretiva geral. Explícita ou 
31 
 
implicitamentese reporta a fatos, definições e medidas que o juiz deve adaptar 
à espécie trazida a exame. 
 
 
8.1 - Interpretação declarativa: 
 
 É a Interpretação que coincide com a interpretação gramatical, ocorre 
quando o legislador escreveu com palavras exatamente aquilo que quis 
efetivamente dizer, dosando-as com adequação aos significados que desejou 
imprimir na lei. Apóia-se no brocardo In claris cessat interpretatio. 
Frase inserida no código de Napoleão em 1804. 
A interpretação é inerente ao processo do Direito. Ela é importante 
sempre, eis que o que é claro para um, pode não ser claro para outro. 
 
 
8.2 - Interpretação extensiva: 
 
 A interpretação extensiva consiste em realçar as regras e princípios não 
expressos, porém contidos implicitamente nas palavras da lei. 
 
 Para se alcançar este objetivo dilata-se o sentido ordinário dos termos 
adotados pelo legislador. O texto menciona o que é mais comum e constante, 
dando âmago à idéia que o intérprete desdobra em aplicações múltiplas. 
 
O legislador pode ter usado com pouca propriedade os termos, dizendo 
menos do que queria afirmar. Ocorrendo essa hipótese, é necessário ao 
intérprete estendê-la, de modo a restabelecer sua correspondência com o 
sentido da Lei. O interprete alargará o campo de incidência da norma, em 
relação aos seus termos. Visa extrair do texto mais do que as palavras parecem 
indicar. 
 
Não se trata de acrescentar coisa alguma, e sim atribuir à letra o 
significado que lhe compete. 
 
Como exemplo, podemos citar a chamada doutrina brasileira do habeas 
corpus, conforme cita Luis Roberto Barroso. 
 
 
8.3 - Interpretação restritiva: 
 
 Ocorre quando o legislador é infeliz ao redigir a lei, dizendo mais do que 
queria dizer. Cabe ao intérprete eliminar a amplitude das palavras. Cabe a ele 
declarar o sentido verdadeiro e o alcance exato. 
 
 
 
32 
 
 
 
 
9 - Disposições contraditórias 
 
As incompatibilidades e antinomias não se presumem nas normas 
jurídicas. Se alguém alega a existência de disposições inconciliáveis, deve 
demonstrá-las. 
 
Não é raro que, ante um primeiro exame, duas expressões entrem em 
contradição, porém, se examinadas atentamente, descobre-se um nexo que as 
concilia. É quase sempre possível integrar o sistema jurídico e descobrir a 
correlação entre regras aparentemente antinômicas. 
 
Sempre que descobre uma contradição deve o intérprete desconfiar de si 
e presumir que não compreendeu bem o sentido de cada um dos trechos, 
sobretudo quando se encontram em uma mesma lei. Incumbe-lhe primeiro fazer 
a tentativa de harmonizar os textos. 
 
Se existe antinomia entre a regra geral e a particular, utiliza-se a 
particular. Em primeiro lugar deve-se verificar se os trechos não se referem a 
hipóteses diferentes ou espécies diversas, o que faz cessar o conflito. 
 
Deve também o intérprete encarar as duas expressões de Direito como 
partes de um só todo, destinadas a complementar-se mutuamente. Se uma 
disposição é secundária ou até mesmo acessória e é incompatível com a 
principal, a principal prevalece. 
 
Na interpretação sempre prevalecerá o trecho mais lógico, claro e 
verossímil, mais harmônico com a lei em conjunto e com o sistema e ainda de 
maior utilidade prática. Além de tudo, o trecho deve estar de acordo com as 
condições normais da coexistência humana. 
 
Por óbvio, nos casos de antinomia entre a Constituição Federal e a 
Estadual, prevalece a primeira, assim como prevalece a Constituição Estadual 
em face da Lei Orgânica do Município. As leis prevalecem sobre os decretos, 
instruções, portarias e avisos. 
 
As leis trabalham dentro de sua competência determinada 
constitucionalmente, ou seja, não há hierarquia entre leis ordinárias e leis 
complementares, mas sim um campo de atuação definido pela própria 
Constituição. Há matérias determinadas que são da atribuição de leis 
complementares. Se houver uma lei ordinária posterior incompatível com a lei 
complementar exigida, a lei complementar irá prevalecer. 
 
33 
 
Se houver uma matéria para a qual a Constituição não exija lei 
complementar, mas mesmo assim ela venha a ser regulada por lei 
complementar, e posteriormente houver uma lei ordinária específica sobre a 
matéria, a lei ordinária neste caso irá prevalecer, eis que mais nova, portanto 
carrega a presunção de ser mais perfeita. 
 
Uma observação importante é que não há hierarquia entre leis federais, 
estaduais e municipais, eis que cada uma deve ser elaborada de acordo com as 
competências constitucionalmente determinadas para cada ente federativo. Se 
houver choque entre elas, é porque alguma invadiu a esfera de competências 
da outra. Prevalecerá, então, aquela que fora criada nos limites da competência 
da entidade federativa. 
 
 
10 - Direito e Moral 
 
Direito e moral possuem órbitas diferentes, eis que muita coisa fulminada 
pela ética é tolerada pelas leis. Por outro lado, tudo o que os textos exigem ou 
protegem deve estar de acordo com o senso moral médio da coletividade, ou 
seja, não pode haver Direito contra a moral, embora nem todos os ditames 
desta encontrem vedação nas leis. 
 
De tal fato é possível concluir que leis positivas, usos, costumes e 
quaisquer atos jurídicos devem ser interpretados de acordo com a ética, e 
exegese contrária jamais prevalecerá, pois cabe-se dilatar ou restringir o sentido 
do texto a fim de que este respeite os princípios da moral. 
 
Se é certo que o Direito não impõe a moral, também é certo dizer que se 
opõe ao imoral. Não estabelece a virtude como um preceito, mas reprime atos 
contrários ao senso ético de um povo em determinada época. Por esse 
processo negativo indireto condena a má fé e os dispositivos para burlar a lei e 
os homens, - prestigia os bons costumes e concorre para a extinção de hábitos 
reprováveis. 
 
O Direito não busca uma idéia superior e virtuosa de moral, e sim o senso 
ético médio do povo em geral, da época em que foi feito o ato ajuizado. Seria a 
“moral da vida”. 
 
A ética exerce papel preponderante na evolução jurídica e, por meio da 
exegese, consegue alterar o sentido primitivo dos textos de modo que os deixe 
de acordo com as idéias modernas de moralidade e solidariedade humana. 
 
 Vejamos: 
 
O Direito de propriedade e a liberdade de contratar, por exemplo, são 
condicionados pela necessidade superior de fazer prevalecer o bem de todos 
34 
 
sobre o do indivíduo. Incumbe à Hermenêutica seguir o curso da consciência 
moral que se modifica dia a dia em uma mesma sociedade. 
 
Portanto, os hábitos e a moral constituem uma fonte jurídica mutável, 
progressiva e inesgotável de boa doutrina jurídica e, dessa forma, amparam, 
guiam e ajudam o hermeneuta, fazendo brotar, da letra morta, idéias novas, 
adiantadas e dignas de aplicação. Os romanos já seguiam esta regra de 
interpretação que se fundava no honesto e no útil. 
 
 
11 - Fiat justitia, pereat mundus 
 
O Direito ampara de modo direto e indireto a atividade produtiva, facilita o 
progresso e não embaraça o esforço honesto. O Direito nasce na sociedade 
para a sociedade. Faça-se justiça, ainda que o mundo pereça, - que outrora teve 
grande popularidade, deve ser substituído pelo pensamento de fazer justiça e 
deixar que o mundo prossiga. 
 
O Direito é um meio para se atingir os fins colimados pelo homem em 
atividade, e sua função é eminentemente social e construtora. O excesso de 
juridicidade é contraproducente e afasta-se do objetivo superior das leis. Faça-
se a justiça, porém do modo mais humano possível, de sorte que o mundo 
progrida, jamais pereça. 
 
Vai assim perdendo apologistas na prática a frase de Ulpiano: Durum jus, 
sed ita Lex scripta est, ou seja, “duro Direito, porém assim foi redigida a Lei. 
Poder-se-ia

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