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A abordagem do texto: considerações em torno dos objetos e unidades de análise textual 1 Anna Christina Bentes (UNICAMP) 1. Introdução Tomando como base o desenvolvimento da Lingüística Textual (doravante LT) no Brasil, postulamos que a principal característica dessa disciplina é a de apresentar um referencial teórico e metodológico que possibilita um tipo de compreensão e de apropriação mais global do fenômeno textual por parte dos sujeitos nos mais diversos campos sociais. Sendo assim, nosso principal objetivo neste texto é o de discutir como as explicações produzidas pela lingüística do texto consideram, a um só tempo, três pontos de vista: o linguístico, o cognitivo e o social, sendo que é essa necessária articulação transdisciplinar que singulariza a linguística do texto como um tipo de estudo que integra diversas ciências e que integra também perspectivas dentro do campo dos estudos linguísticos. De forma a dar conta deste objetivo, estruturamos o trabalho em três partes: uma em que procuramos (i) discutir brevemente de que maneira a LT compreende o fenômeno linguístico como de fundamental importância para a compreensão da textualidade, (ii) apresentar brevemente o ponto de vista sociogonitivo sobre o fenômeno linguístico textual e (iii) mostrar como a LT desenvolveu um olhar que enfatiza os aspectos sociais e culturais do fenômeno textual. Esperamos que este texto faça jus à metáfora produzida por Gerd Antos, citada por Ingedore Koch, sendo mais uma “estação intermediária” para a produção contínua de novas discussões sobre esse e outros temas. 1 Este texto é uma versão mais detalhada de duas apresentações feitas pela pesquisadora: a primeira, no VI Congresso Internacional da Abralin, que aconteceu em João Pessoa, Paraíba, em março de 2009; a segunda, no VII Simpósio de Estudos Linguísticos da Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal Fluminense, que aconteceu em Niterói, Rio de Janeiro, em setembro de 2009. 2. O fenômeno linguístico como fundamental para a compreensão da textualidade Historicamente, a LT desenvolveu, ao longo das últimas quatro décadas, um quadro explicativo que sempre conferiu aos elementos lingüísticos, responsáveis pela materialidade dos textos (orais ou escritos), uma ênfase para a qual não se faz necessário nenhum tipo de justificativa. Afinal, como bem diz Marcuschi (2008: 87), “sem língua não há texto”. Podemos dizer que, desde o seu surgimento, a LT tem analisado alguns fenômenos de natureza linguistico-textual (materializados linguisticamente por meio de, por exemplo, expressões referenciais e articuladores textuais), tais como os processos de coesão referencial / progressão referencial; coesão sequencial / progressão textual. No entanto, o domínio empírico da LT, a saber, os fenômenos linguísticos escolhidos para serem estudados pelos pesquisadores, não são quaisquer: em geral, são muito estudados porque são muito importantes para a construção da chamada textualidade. Assim, podemos dizer que fenômenos lingüísticos de natureza variada foram e são estudados pela LT porque a natureza verbal da linguagem humana tem sido o principal objeto dos linguistas, em geral, e também, dos linguistas do texto.Vamos a um exemplo: Pelas 23.59h, apareceu no horizonte um objeto luminoso e grande voando em direção sul que deixava uma pista em zigue-zague. Então, de repente, esse objeto mudou para o leste sendo que o traço por ele deixado assumiu a forma de uma foice... (exemplo retirado de Marcuschi, 2008: 117) De acordo com Marcuschi (2008), para a solução da anáfora “ele”, no exemplo acima, ter-se-ia dois candidatos: “objeto luminoso” e “leste”; a decisão sobre qual das duas expressões é retomada pelo pronome é feita, nesse caso, considerando-se principalmente a congruência cognitivamente estabelecida (Pause, 1984 apud Marcuschi, p. 116) entre as informações semânticas contidas na predicação sobre o referente (um objeto luminoso que voava para o leste deixando pistas) e as informações semânticas contidas na predicação dadas sobre o pronome (o objeto luminoso que voava para o leste e que mudou de direção, deixando um rastro em forma de foice). Ainda de acordo com as teorias sobre progressão referencial, o processo de reconstrução do antecedente para um elemento anafórico com antecedente explícito (anáfora direta) pressupõe a consideração, muitas vezes conjunta, de uma série de informações do tipo: 1)Informações morfológicas (congruência entre o antecedente e o elemento pronominal); 2)Informações sintáticas (função e posição sintática das expressões) 3)Informações semânticas (o papel do referente) 4)Informações temáticas (o tema da frase ou de um texto) 5)Informações de conteúdo textual (informações sobre um referente pronominalizado) 6)Informações lexicais (informações de sentido que o próprio lexema traz consigo) 7)Informações enciclopédicas (conhecimento do indivíduo, expectativas que uma informação traz consigo, inferências possíveis etc.) (Cf. Marcuschi, 2008, p. 117)? Parece redundante dizer, mas o foco sobre um determinado fenômeno lingüístico-textual, no caso, a anáfora direta (AD), não necessariamente significa que a explicação elaborada se funda em uma abordagem internalista2 da língua. Muito ao contrário, a compreensão dos processos de produção textual e da forma como ocorre a reconstrução dos sentidos sociais deles constitutivos pressupõe uma visão linguística que articule, de maneira integrada, os conhecimentos construídos sobre o fenômeno linguístico em si, sobre as relações entre língua e mundo e sobre as relações entre os usos linguísticos e seus sentidos sociais ao longo do século XX e do início do século XXI. Se observarmos os próprios critérios elencados acima para que se possa analisar de maneira mais precisa um fenômeno semântico-textual como o da anáfora direta, a visão de língua pressuposta nos trabalhos desenvolvidos no campo é a de: 2 No Brasil, o debate sobre as teses externalistas e internalistas é feito por Morato (2002, 2004), Salomão (2003), Koch e Cunha-Lima (2004). • Um sistema simbólico sobredeterminado sintatica e semanticamente, recebendo sua determinação a partir de um conjunto de fatores definidos pelo contexto e que contribuem para a produção de sentidos; • Uma atividade social, histórica e cognitiva, desenvolvida de acordo com práticas socioculturais, obedecendo, assim, a convenções de uso fundadas em normas socialmente instituídas. Então, uma primeira conclusão a que podemos chegar é a de que, mesmo onde parece não haver a mobilização de conceitos e dispositivos analíticos oriundos de estudos linguísticos de base sociocognitiva e sociopragmática, de forma a dar explicações sobre, por exemplo, o uso de artigos ou de pronomes demonstrativos em um sintagma nominal; ou sobre o funcionamento de sequências conectivas e/ou anafóricas, das repetições, das elipses, é lá mesmo é que os encontramos. Em outras palavras, para que seja possível fazer uma análise textual-discursiva com base nos pressupostos teóricos e metodológicos que vem sendo propostos pela LT, é necessário uma formação razoável em pelo menos dois tipos de estudos linguísticos: os estudos gramaticais de base funcionalista e os estudos semânticos de base sociopragmática e/ou de base sociocognitiva. Além, é claro, de uma compreensão das categorias analíticas desenvolvidas no interior da LT. Por isso é que se pode dizer que os estudiosos da LT, ao enfocarem aspectos que são (aparentemente) de natureza estritamente linguística, como é o caso da AD, de forma a compreender a natureza e o funcionamento dos processos de produção e compreensão dos textos, consideram: • a articulaçãode informações advindas de diferentes teorias lingüísticas (como o estruturalismo e o funcionalismo); sem esse tipo de aporte teórico, é difícil compreender como se dá a estabilidade textual (Marcuschi, 2008); • a elaboração de categorias analíticas de natureza textual (como por exemplo, a noção de coesão referencial ou de cadeia referencial ou ainda de progressão referencial), que necessariamente demandam a explicação sobre um conjunto de competências sociocognitivas; • uma abordagem intra e interdisciplinar complexa, estabelecendo diálogos no interior da linguística e com outras disciplinas de forma a produzir explicações mais gerais e satisfatórias sobre o fenômeno textual. 2. O ponto de vista sociocognitivo sobre o fenômeno linguístico-textual A partir de agora, desejamos enfocar o fato de que os processos de compreensão e produção textual pressupõem uma competência sociocognitiva ampla por parte dos sujeitos que abrange um conjunto de saberes e capacidades tais como: conhecimentos pessoais e enciclopédicos; capacidade de memorização; domínio intuitivo de um aparato referencial; partilhamento de conhecimentos sobre os elementos que compõem as circunstâncias mais imediatas; o partilhamento de normas sociais; o domínio de tecnologias de vários tipos. (Cf. Marcuschi, 2008) Ao longo da construção e consolidação da disciplina, a eleição de determinados fenômenos linguístico-textuais a serem descritos e analisados está diretamente relacionada, dentre outros objetivos, com o interesse de compreender melhor como se pode visualizar a interação dos saberes e capacidades acima elencados no curso da produção e da comprensão dos textos. No Brasil, algumas das categorias analíticas desenvolvidas nos estudos de, por exemplo, Marcuschi (1983, 2001, 2008), Fávero e Koch (1988), Koch (1989, 1990, 1997, 2002, 2004), Koch e Travaglia (1989), Jubran et al. (1990), Jubran et al. (1992), Jubran (1993, 2003; 2005; 2006a, 2006b; 2006c), Koch e Marcuschi (1998), Cavalcante (2000), Hilgert (1997, 2000); Pinheiro (2005), Koch, Bentes e Cavalcante (2007), Travaglia (2006) e nas obras organizadas por Jubran e Koch (2006), Koch, Bentes e Rezende (2006), Koch, Morato e Bentes (2005), Cavalcante, Rodrigues e Ciulla (2003), acabam por fornecer informações sobre as características semântico-pragmáticas dos textos e sobre os processos de natureza sociocognitiva vislumbrados nos textos. Por exemplo, ainda há muito o que dizer sobre o funcionamento dos processos de referenciação de determinados gêneros textuais, mas os estudos de Koch já apontam para o fato de que vários gêneros da imprensa escrita fazem um uso muito criativo das expressões referenciais com o objetivo de produzir determinados efeitos de sentido. Vamos ao exemplo de como Koch (2002) caracteriza as descrições definidas: A escolha de determinada descrição definida pode trazer ao leitor/ouvinte informações importantes sobre as opiniões, crenças e atitudes do produtor do texto, auxiliando-o na construção do sentido. Por outro lado, o locutor pode por vezes, ter o objetivo de, pelo uso de uma descrição definida, sob a capa do dado, dar a conhecer ao interlocutor, com os mais variados propósitos, propriedades ou fatos relativos ao referente que acredita desconhecidos do parceiro, como no exemplo (10), em que, na verdade, o locutor parece fazer é anunciar que o governo vai publicar um “pacote”: (10) Tem ocorrido rumores de que o governo estuda medidas severas para contornar a crise. Na verdade, o pacote fiscal a ser editado nos próximos dias irá aumentar ainda mais o desemprego no país.” (Koch, 2002: 88) O trabalho de Koch procede à análises dos recursos lingüísticos mobilizados no interior dos gêneros de forma que estes possam se constituir em “quadros de orientação” para o interlocutor (Cf. Bauman, 2004; Hanks, 2008). Por exemplo, a autora afirma que descrições definidas tais como “esse cidadão anônimo”, “o homem da camisa branca”, “o cidadão desconhecido”, o desconhecido da camisa branca”, articuladas no interior de uma matéria jornalística da Revista Veja, de 06/89, revelam ao mesmo tempo, o ponto de vista do produtor e as suas inferências sobre o que é informação nova e relevante para o seu interlocutor.Além disso, o trabalho de categorização e de análise de Koch é ele mesmo uma espécie de guia de leitura, já que ressalta, nesse caso, as funções (cognitivas e pragmático-discursivas) desempenhadas pelos elementos lingüísticos nos textos. No entanto, é necessário dizer que essas pistas sobre aspectos semânticos, pragmáticos e sociocognitivos, fornecidas pelas descrições definidas são inerentemente incompletas, já que as conexões e/ou elaborações são de responsabilidade dos leitores/ouvintes concretos; são esses últimos os responsáveis pela interpretação dos elementos indiciais presentes nos textos. Por exemplo, qual o efeito que causam as repetições de determinadas estruturas, de determinados tópicos no leitor/ouvinte? Ele percebe de forma rápida e eficaz o constante trabalho sobre a linguagem desenvolvido pelos mais diversos profissionais ao produzirem determinados gêneros? Se percebe, o que esse trabalho significa, de uma forma geral, para ele? Quais os horizontes ideológicos que são instaurados por/nesse trabalho sobre a linguagem? Uma resposta geral que tenta dar conta de perguntas como estas é a produzida por William Hanks: “embora qualquer fragmento de texto possa ser interpretado de múltiplas formas (por meio de centrações alternativas), a gama de possibilidades nunca é infinitamente aberta no mundo social real. Ao contrário, ela se encontra em parte inscrita na forma textual, e também é em parte debatida pelos atores” (Hanks, [1989] 2008:136). Assim, é fácil enxergar que as análises desenvolvidas por autores mais representativos da LT brasileira que privilegiem determinados elementos linguísticos ou sequências textuais articulam diferentes pontos de vista da ciência da linguagem contemporânea como a pragmática lingüística, o estruturalismo lingüístico e o funcionalismo (ver os tipos de informação demandadas para a explicação de uma anáfora direta, por exemplo). Além disso, a LT se distingue de outras maneiras de explicar o fenômeno textual porque incorpora radicalmente a concepção de que os textos são “recursos essenciais da constituição individual e social do conhecimento”, ou seja, são “formas socialmente preconcebidas para a seleção, acumulação, estruturação e formulação do conhecimento”. (Antos, 1997 apud Koch, 2002, p. ) Se, por um lado, o autor constrói uma formulação que define o texto como um recurso fundamentalmente cognitivo, Beaugrande (1997), no mesmo ano, postula que o texto é “um evento comunicativo em que convergem ações lingüísticas, sociais e cognitivas.” É essa concepção de texto, que abrange duas grandes dimensões (a linguística e a sociocognitiva), que é assumida por muitos autores no Brasil. Vejamos agora um exemplo de um outro fenômeno muito caro aos analistas de texto: a anáfora indireta. Fomos a uma discoteca na noite passada e depois jantamos num restaurante japonês e finalmente acabamos a noite num barzinho perto de casa. O garçom era ótimo. (exemplo retirado de Marcuschi, 2008:83) O exemplo acima somente pode ser analisado se considerarmos que entre a expressão anafórica (garçom) e as “âncoras” (co-texto antecedente – “discoteca”, “restaurante japonês”, “barzinho”) não há uma relação explícita, mas uma relação entre domínios referenciais, sendo que as anáforas indiretas (AI) podem ser compreendidas como estratégias sistemáticas para suprir lacunas na cadeia referencial construída linguística, textual e sociocognitivamente. (Marcuschi, 2008) Além disso, a enorme presença das AI em textos orais e escritos revela que elas são uma dasestratégias mais produtivas. Isso reforça a postulação de que as anáforas (diretas e indiretas) não são “propriedades” do texto, mas resultam do trabalho dos sujeitos sobre os textos e sobre a linguagem. No entanto, as AI continuam a representar, como nos diz Marcuschi, um “desafio teórico” importante. Mais uma vez, podemos dizer que lá onde não se vê uma abordagem complexa tanto por articular diferentes dispositivos analíticos advindos dos estudos linguísticos (especialmente de estudos gramaticais de base funcionalista e de base sociopragmática e/ou sociocognitiva) como por se voltar para dispositivos construídos por outras disciplinas (especialmente a psicologia social, a retórica, os estudos literários e as ciências cognitivas), é que podemos reconhecer: a) o desenvolvimento de dispositivos analíticos que colaboram para a compreensão da complexidade dos processos sociocognitivos envolvidos na produção e compreensão dos textos; b) o reforço de uma abordagem que prevê uma indissociável articulação, na elaboração de seus dispositivos analíticos, entre os estudos lingüístico- textuais e outras ciências, de forma a alcançar o objetivo de explicar a natureza sociocognitiva do fenômeno linguístico-textual. Por fim, um importante pressuposto sociocognitivista, em sentido amplo, é o de Van Dijk & Kintsch (1983, p. 83) que defendem que o processamento cognitivo de um texto consiste de diferentes estratégias processuais, entendendo-se estratégia como "uma instrução global para cada escolha a ser feita no curso da ação". Para os autores, tais estratégias consistem em hipóteses operacionais eficazes sobre a estrutura e o significado de um fragmento de texto ou de um texto inteiro. Assim, de acordo com Koch (2008a), falar em processamento estratégico significa dizer que os usuários da língua realizam simultaneamente, em vários níveis, passos interpretativos finalisticamente orientados, efetivos, eficientes, flexíveis, tentativos e extremamente rápidos. Além disso, a autora afirma que “o processamento estratégico depende não só de características textuais, como também de características dos usuários da língua, tais como seus objetivos, convicções e conhecimentos de mundo” (Koch, 2008b, p. 17) Ao assumirem esses pressupostos, os pesquisadores do campo dos estudos do texto produzem análises textuais que não apenas consideram que os sujeitos envolvidos nos processos de produção e compreensão textual operam de forma estratégica de modo a produzir e/ou compreender textos, mas também revelam, em suas análises, as pistas linguísticas que vão sendo deixadas pelos produtores e que indiciam a natureza estratégica e sociointerativa do processamento textual. 3. A ênfase nos aspectos sociais e culturais do fenômeno textual Se nos perguntarmos sobre quais os dispositivos analíticos criados a partir do desenvolvimento da própria LT e/ou foram reelaborados e incorporados ao seu instrumental analítico de forma a se produzir explicações sobre a natureza social e cultural do fenômeno textual, podemos dizer que um dos primeiros foram os critérios estabelecidos para a definição da textualidade: coerência; situacionalidade; intencionalidade; aceitabilidade; intertextualidade, informatividade. A partir do estabelecimento desses critérios, a LT assume que a coesão não é um critério nem necessário nem suficiente para a construção da textualidade. A nosso ver, a própria ênfase dada à noção de processamento estratégico permitiu que se desse visibilidade à articulação entre teorias de base cognitiva e teorias pragmáticas, já que as operações cognitivas necessariamente feitas pelos participantes do processo de produção e compreensão textual encontram-se inextrincavelmente vinculadas aos propósitos comunicativos desses participantes e ao conjunto de conhecimentos, crenças e valores forjados nas experiências sociais. Uma outra ênfase importante e que mostra a relação entre os processos de produção textual e o mundo social nos quais emergem é a consideração de que os textos são heterogêneos em sua constituição, ou seja, são formados/compostos a partir de tipos/sequências textuais de diferentes naturezas, principalmente em função das restrições da situação enunciativa. Acreditamos que as importantes mudanças pelas quais passou a compreensão do objeto textual no interior do campo da Lingüística Textual e da Lingüística revelam, segundo Bentes e Rezende (2008), um primeiro momento, onde o mais importante era descrever a chamada text-language, principalmente considerando fenômenos e recursos que permitissem observar a conectividade entre as partes internas que constituem o texto; e um segundo momento, onde o conceito de texto passou a estar necessariamente associado ao de textualidade, pressupondo assim uma concepção de língua como ação e ou atividade e o texto como um lugar de construção de relações e de objetos-de-discurso de naturezas diversas e dependentes do contexto histórico e social mais amplo. 4. Conclusões Assim, a LT é historicamente marcada pelas seguintes opções: • uma abordagem necessariamente interdisciplinar; • a articulação de diferentes dispositivos analíticos no interior mesmo do campo da linguística (abordagem intradisciplinar complexa); • a eleição de objetos de estudo tais como unidades complexas e/ou processos constitutivos da produção e recepção de textos. Alguns exemplos de unidades desenvolvidos pela LT: • unidades linguísticas: expressões referenciais; conectivos; anafóricos; • unidades textuais: tópico discursivo; sequência textual; • unidades discursivas: gêneros textuais. Alguns exemplos de processos de natureza diversa que são estudados / analisados pela LT: • o estabelecimento da coerência textual; • a elaboração de inferências; • o estabelecimento de relações intertextuais; • a progressão textual; • a progressão referencial; • a construção conjunta da referência no curso da interação verbal; • o estabelecimento de uma orientação argumentativa para a produção textual; A meu ver, continuamos a ter pela frente uma urgência de várias tarefas dentre as quais: • o aprofundamento das descrições e análises das complexas estruturas textuais; • as análises dos processos cognitivos constitutivos das e incorporados às interações sociais que estão na base da produção e recepção dos textos; • as investigações das dimensões socio-interacionais da produção e da recepção dos textos; • as investigações que enfatizem o entendimento do fenômeno textual articulando seus aspectos formais e sociohistóricos (Hanks, 2008). Por fim, pode-se dizer que a LT, de um modo geral, compreende os textos como formas de cognição social que permitem ao homem organizar cognitivamente o mundo (Koch, 2002:157), o que significa dizer que cognição e mundo social encontram-se fundamentalmente imbricados e a LT tem um compromisso com a elucidação dos processos de produção e de recepção textual que se desenvolvem no curso da vida social. Por isso, os textos constituem-se no que a autora, seguindo Antos, denomina “estações intermediárias” para a criação de outros textos e para a assimilação textualmente baseada do conhecimento. Essa concepção de texto é o que propicia que essa disciplina cumpra a sua tarefa de ir fomentando a convergência e a imbricação de muitos caminhos para o desenvolvimento e o aprimoramento dos estudos sobre o fenômeno textual. 5. Bibliografia BAUMAN, R. (2004). A world of others’ words: cross-cultural perspectives on intertextuality. Oxford: Blackwell publishing. BEAUGRANDE, R. 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