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CARVALHO, Age de - Antologia comentada por Manuel da Costa Pinto

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Age de Carvalho
Belérn, PA - 1958
NEGRO, forceja reconhecer a laje
marcada, conspira contra a cripta:
véspera do nome,
véstia da paixão toda paixão,
aquI
cresce uma cruz na última palavra -
A oferrada, irreperida, ir-
recusável.
[de A rena, Areia 1
Mühlauer Friedhof*
Me-
dita, a
branca
sombra da neve,
o nevo
desse silêncio, fendido: Trakl.
(Arde,
arde a folha
forasteira, o louro
latim das folhas,
123
124 o cego vento
ledor
das folhas).
Aberta, a
pedra interroga da.
* Cemitério de Mühlalf, em Innsbrucl; Áustria.
fine Triine rollt in ihr Auge zurück
Paul Celan
TRISTE-TRISTE, cisca
a alegria atrás do mundo,
junto à cerca,
quando o tempo
se destampa -
Cunca, me ouves'
É verão, de novo.
A cidreira queimada
[de Arena, Areia 1
na gaveta
desanda a florir,
uma lágrima rola de volta ao olho,
a promessa, de ré, res-
pira, arde
por se cumprir:
tens uma casa e uma cama,
João do teu lado direito,
125
moras comigo.
Ouves?
Tudo pede perdão.
[de Caveira 4' 1
CARBONO 14, teu nome:
têxtil, lês para nós
a imagem do mundo,
sua fé selvagem.
Redatado,
voltas na camisa
crucificada.
[de Caveira 4 t 1
126 Nasclunarkt
No olho da amêndoa,
no damasco, exposto
numa lágrima de figo,
sabes: eu
não sou daqui,
nunca cheguei,
nunca
saí daqui.
Caroço sem carne,
só osso, os
cernes
dessa verdade. E a verdade, circum-
aberta no coração,
desfechada
no coração,
de pé
se despe: abre-se
em gumes, cordialmente.
[de Caveira 41 1
> Um duplo exílio - geográfico e poético - caracteriza a 127
trajetória desse escritor que está à margem das principais
linhas de força da literatura brasileira, mas que por isso
mesmo traz ares renovadores. Nascido no Pará, portanto
fora do circuito das grandes cidades do Sudeste (que aca-
bam atraindo escritores de todo o país e constituindo pó-
los da produção editorial), ~g~_~!:_~~~_~_~_l}!:~_!.l:_?~~~__~!:!:Y~~_~ _
na, onde trabalha como designeI' gráfico. O ambiente de
língua alemã é responsável pelas referências, explícitas nos
poemas aqui publicados, a autores como o expressionista
Georg Trakl (morto na Primeira Guerra após uma existên-
cia marcada por perturbações psíquicas) e o romeno Paul
Celan - que adotou o alemão como idioma literário para
expressar traumas vividos durante a Segunda Guerra
(como a morte de seus pais num campo de concentração
nazista). Ou seja, Age de Carvalho dialoga com uma poé-
tica que fala de experiências-limite, que só podem ser ex-
pressas por uma linguagem áspera, descontínua, bem dis-
tante do lirismo coloquial e do rigor construtivo e
metalingüístico que caracterizam as vertentes poéticas de-
rivadas do modernismo.
Daí sua poesia ao mesmo tempo hermética (conteú-
dos de difícil entendimento, que só a muito custo conse-
guem emergir à consciência) e límpida - pois alheia aos
procedimentos retóricos que "poetizarn" a expressão dessas
vivências e imagens familiares, que irrornpern no poema
128 como fragmentos do passado - "caroço sem carne,! só
osso, os/ cernes/ dessa verdade". Mesmo quando trata de
um tema mais claro para o leitor, o poeta o faz para com-
por uma "imagem do mundo" que "abre-se em gumes":
assim, quando um ícone religioso é dessacralizado, subme-
tido ao carbono 14 (como no poema cujo título se refere
ao teste científico que averiguou a autenticidade do Santo
Sudário), a paixão de Cristo volta, redatada, na "camisa
crucificada" .
Principais Obras: Arquimura dos Ossos (1980). A Fala Entre Parêntesis (1982.
com Max Martins). Arma, Areia (!986). Pedra-um (1990) - todos incluídos
no volume Ror: 1980-1990 (Duas Cidades. 1990) -. Cavei.-a 41 (7 Lerras/Co-
sac Naify. 2003). Selcu: (antologia. Paka-Tatu, 2003).

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