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A LINGUAGEM DO CINEMA

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AS LINGUAGENS DO CINEMA – Graeme Turner
Cultura e linguagem
O cinema não é uma linguagem, mas gera significados. O primeiro passo é ver o cinema como comunicação; o segundo passo é colocar a comunicação do cinema dentro de um sistema maior, gerador de significados – a própria cultura (p.51).
A cultura é um processo dinâmico que produz os comportamentos, as práticas, as instituições que produzem significados que constituema nossa existência social. A cultura compreende os processos que dão sentido ao nosso modo de vida. A linguagem inclui todos aqueles sistemas dos quais se podem selecionar e combinar elementos para comunicar algo. 
Assim, o vestuário pode ser uma linguagem … nossos trajes “dizem” sobre nós e o nosso lugar na cultura (p.51). 
O sistema de linguagem de uma cultura traz consigo o sistema de prioridades dessa cultura, seu conjunto específico de valores e sua composição específica dos mundos físico e social (p.52).
O que a linguagem faz é construir, e não rotular, a realidade … é graças a ela que internalizamos os sistemas de valores que estruturam a nossa vida (p.52).
É possível, entretanto, usar nossa linguagem para dizer coisas novas, articular novos conceitos e incororar novos objetos – como em “máquina de escrever”.
Ferdinand de Saussure faz uma distinção entre a “langue” da cultura e a “parole” da expressão individual. A diferença corresponde àquela entre lnguagem e cultura (p.52).
A operação da linguagem, no entanto, nos fornece um modelo central de como a cultura produz significado, independente do meio de comunicação. 
A linguagem constrói significados de duas maneiras. O significado literal ou denotativo de uma palavra é vinculado a ela pelo uso ... como aparece no dicionário. O segundo tipo de significado, o conotativo, é interpretativo e depende da experiência cultural do usuário, e não depende do dicionário. É na conotação que encontramos a dimensão social da linguagem (p.53).
As imagens, assim como as palavras, carregam conotações. A imagem filmada de um homem terá uma dimensão denotativa – remeterá ao conceito mental de “momem”. Mas as imagens têm uma carga cultural: o ângulo usado pela câmera, a posição dela noo qquadro, ooooo uso da iluminação para realçar certos aspctos, qualquer efeitoo obtido pela cor, tonalidade ou processamento teria o potencial do significado social. A representação viisual também têm uma “linguagem”, connjunto de códigos e convenções sados pelo expectador para que tenha sentido aqulo que ele vê. As imagens chegam a nós já com mensagens “codificadas”. Uma das tarefas da análise de cinema é descobrir como isso é feito, seja em cada filme particularmente, seja no geral (p.53).
Metodologias que lidam apenas com linguagem verbal ou escrita não são de todo apropriadas. Portanto é ventajoso empregar uma análise que começou com a verbal mas que se ampliou para incluir outras atividades que produzem significaddos sociais. A função de todas essas atividades é chamada de significação – a elaboração da significância- e a metodologia é conhecida como Semiótica. Uma vez conhecida as suas premissas, podemos aplicá-las às “práticas significadoras do cinema” (p.53).
A Semiótica vê o significado social como o produttto das relações construídas entre signos. O signo é a unidade básica da comunicação, podendo ser uma fotografia, um sinal de trânsito, uma palavra, um som, um objeto, um odor, qualquer coisa que a cultura julgue significativo (p.54).
No cinema podemos falar da melodia indicativa do Jaws/Tubarão ou o rosto do Wood Allen como signos. Significam, respectivamente, uma versão particular de “tubaranidade” (significados construídos em torno do o o tubarão em Tubarão) e da “Wood Allenidade” (os conceitos e significados mentais, ambos dentro e fora de um determinado filme, construidos em torno de Wood Allen). Também podemos falar como diferentes sistemas significadores (som, imagem) funcionam para combinar seus signos numa mensagem mais complexa, por exemplo, o ataque de helicóptero, acompanhado musicalmente de “Cavalgada das valquíria” em Apocalypse Now (p.54). 
Teoricamente, o signo pode ser decomposto em duas partes. O significante é a forma física do signo. O significado é o conceito mental referido. Juntos formam o signo (p.54).
Quando mudamos nossos trajes para mudar a “aparência” , o que estamos fazendo é mudar os “significntes” pelos quais representamos a nós mesmos. Mudamos nosso aspecto (significante) mudarmos o que significamos para os outros (o significado). As identidades sociais também são signos (p.54).
Significantes carregam conotações. A Semiótica tem estudado a publicidade para mostrar como a escolha de significantes com conotações positivas (esqui aquático, relaxar à beira de uma piscina) são empregados para ultrapassar essas associações para o produto que se está anunciando, como o cigarro. Você reagirá a uma foto de Mikhail Gorbachev segundo a sua opinião sobre a sua controvertida carreira política. Esta segunda ordem é a que interessa neste livro, pois é onde atua a significação no cinema: na organização da representação para dar um sentido específico a um público específico. A Semiótica nos permite separar as idéias de sua representação para que possamos ver como é construída a nossa visão de mundo ou do cinema (p. 54). 
A semiótica faz isso analisando o filme (ou uma visão de mundo) ‘como um texto”, um conjunto de formas, relações e significados (p.55). 
O cinema tem seus próprios “códigos”, métodos taquigráficos de estabelecer significados sociais ou narrativos; e suas próprias convenções (quando um cantor é acompanhado por uma orquestra, não esperamos encontrá-la no quadro, simplesmente porque ela está na trilha sonora); em nível de significante, o cinema desenvolveu um rico conjunto de códigos e convenções. Quando a câmera faz um close up isso significa forte emoção ou crise. No final das cenas de amor podemos ver um slow fade, ou uma lenta perda de foco, ou uma modesta tomada panorâmica acima dos corpos dos amantes – imitações típicas de um expectador desviando os olhos, mas significando a continuaão e a conclusão do ato. O sistema shot-reverse-shot (alternância de tomadas) é uma convenção para representar o diálogo; o emprego da música para significar emoção também é uma convenção, pois não há nenhuma razão real para a orquestra evoluir num crescendo durante um abraço. Mortes em câmera lenta estiveram em voga nos finais dos anos 60 e começo dos 70 em filmes como Uma rajada de balas e The Wild Bunch/ Meu ódio será sua herança; o objetivo não era apenas tornar a morte glamurosa, mas mitologizar essas mortes em particular aumentando sua importância e poder. Cenas de amor em câmera lenta, tanto estetizam quanto erotizam (p.55).
O cinema como prática significadora
O cinema incorpora as tecnologias e o discursos distintos da câmera, iluminação, edição, montagem de cenário e som – tudo contribuindo para o significado (p.56). A domessticidade reprimmida de Mary Tyler Moore em Ordinary peaple/Gente como a gente é presentada pelos significantes de sua pesada maquiagem facial, da decoração da casa ou da combinação de signos visuais ou áuricos na edição que junta tomadas de seu maxilar bem cerrado e do barulho do triturador da pia. Nenhum sistema que produz significados opera sozinho. A atuaçção Micheal Keaton como Batman é construida por meio de portentosa triha sonora, da escolha de ângulos de câmera (ele é constantemente filmado de baixo para cima exagerando assim o seu tamanho e poder), da espetacular direção de arte e das inter-relações de todos esses elementos (p.56). 
As linguagens esscrita e falada têm uma gramática… No cinema não há tal sitema. O cinema não tem equivalente à Sintaxe (p.56).
Se há uma gramática do cinema, ela é mínima e funciona assim. Primeiro, cada tomada está relacinada àquela que lhes são contíguas. Segundo, diferente da Sintaxe da língua escrita, que é explicitamente regulada pela cultura, as relações entre as tomadas num filme têm de ser construídas mediante conjuntos menos estáveis
de convenções. Muito depende não só da competência do público, mas também da capacidade do cineasta de construir relações que não sejam governadas pela convenção (p.57). 
A construção da relação entre tomadas pode ser o primeiro momento na construção de um filme narrativo. Mas não é tão simples quanto parece… construindo relações entre tomadas (montagem) ou relações dentro das próprias tomadas (mise-e-en-scène)… não são mutuamente excludentes; ambas as relações são construidas por cineastas e interpretadas por expectadores (p.57).
Os sistemas significadores
A câmera
provavelmente o conjunto de práticas mais complexo na produção cinematográfica envolve a câmera. O tipo de película usada, o ângulo da câmera, a prfundidade do seu campo focal, o formato da tela por exemplo, cinemascope ou tela ampla), o movimento e o enquadramento, cada um tem a sua função específica em determinados filmes (p.57).
Diferentes significados dos flmes em preto e branco e a cores...Geralmente, películas em preto e branco são usadas para significar o passado, têm sido empregada para simular o documentário, como no filme australiano Newsfront e para oferecer um atributo nostálgico ao passado em Manhattan de Wood Allen… vídeos musicais costumam fazer uso desse processo para dar a seus textos uma aparência elegante ou de vanguarda(p.58).
O posicionamento da câmera é talvez a mais evidente das práticas e das tecnologias que contribuem para a realização de um filme. O uso de tomadas elevadas de helicóptero ou de uma grua podem transformar um filme numa apresentação artística. Boa parte da atração de Thelma and Louise/Thelma e Loise, de Ridley Scott, pode ser vista como originária do uso espetacular que se faz da câmera. A câmera pode ser dirigida ao seu objeto de modo direto ou obliquo, sendo possível sua rotação ao longo do eixo vertical (panning), do eixo horizontal (tilling) ou do eixo transversal (rolling). Se a câmera está, por assim dizer, olhando o seu objeto de cima para baixo, sua posição é de poder (p.58).
Em cidadão Kane, um confronto entre Kane e sua segunda esposa, Susan, é representado numa tomada em shor-reverse em que, numa tomada, Susan olha para cima para se dirigir a Kane e este (ou a câmera) olha para baixo para se dirigir a Susan na tomada seguinte. Susan é oprimida ou diminuida pelo ângulo da câmera, enquanto a estatura de Kane é aumentada. Na sequência, o manejo é o principal meio pelo qual o público é informado sobre a mudança de relacionamento entre as duas personagens (p.58).
Os ângulos da câmera podem identificar uma tomada com uma personagem. Um exemplo extremo de uma tomada com este ponto de vista ocorre em Spellbound/Quando fala o coração, de Hitchcok, em que a câmera adota o ponto de vista de uma pessoa que está prestes a se matar. Quando a arma dispara, a tela fica branca(p.58). 
A altura da câmera e a distância do objeto também podem ter um efeito sobre o significado de uma tomada. Uma maneira convencional de concluir uma narrativa é afastar lentamente a câmera de modo que o objeto desapareça no ambiente. Working girl/Uma secretária de futuro, de Mike Nicholl, terrmina assim (p.59).
A rotação da câmera ao longo do eixo horizontal (panning) imita o movimento dos olhos do expectador enquanto examina a cena ao seu redor. Movimentando a camera em torno de seu eixo transversal (rolling) propicia-se a ilusão de que o mundo, real ou metafórico, está sendo inclinado; às vezes isso é feito como uma tomada de ponto de vista para indicar que a personagem está caindo, doente ou drogada, ou que provavelmente vê o mundo de forma estranha. Pode ser extremamente sinistro ou perturbador, como nas sequências iniciais de The third man/O terceiro homem, em que são apresentadas as primeiras peças do quebra-cabeças de Harry Lime, ou durante os dramáticos confrontos entre Alex e Dan em Fatal attractionAtração fatal. Um rolling da câmera indica claramente, de uma forma ou de outra, um mundo fora de ordem (p.59). 
O movimento aparente da câmera, como num close up, é obtido pela manipulação de certas lentes especiais de telefoto, mais conhecidas como lentes de zoom. A alteração de foco tem uma função significadora. Um foco suave sobre um personagem ou o fundo da cena pode pretender um efeito romântico ou lírico, tal como aquele obtido em Elvira Madigan, de Bo Widerberg (p.60).
O foco rack é empregado para dirigir a atenção do expectador de uma personagem para outra. Obtém-se tannbém efeito com um rosto em foco de uma personagem para a outra a fim de conseguir um efeito dramático simbólico (p.60).
Por vezes o quadro participa da narrativa, em vez de simplesmente contê-la. Na sequência de abertura de The searches/Rastros de ódio, os títulos e os créditos dão lugar a uma tela aparentemente negra onde aparece o título, “Texas, 1868”. depois a imagem muda quando uma porta se abre se abre para revelar que a tela negra era um interior escuro, terras cedidas pelo governo a colonos, e depois da porta vemos o deserto. A justaposição da imagem de uma região desértica com o mundo doméstico dos colonos dá início a uma sucessão de contrastes que são tematica e estruturalmente fundamentais para o filme (p.60).
Iluminação
Há dois objetivos principais na iluminação cinematográfica; o primeiro é expressivo - estabelecer um estado emocional, dar ao filme uma “aparência” (como a coloração ticianica em Taming of the sherey/A megera domada, de Zeffirelli, ou o nebuloso Chariots of fire/Carruagens de fogo (p.60). O realismo é o segundo objetivo da iluminação. Esta é de longe a meta mais comum da iluminação cinematográfica (p. 62).Vale a pena observar como a iluminação seleciona e enfatiza elementos do quadro, e como isso parece ser um meio natural de dirigir a atenção do espectador para um elemento do quadro, enquanto outros são obscurecidos (p.62).
Som
Causa surpresa a pouca importância que se dá ao som no cinema. O som, no entanto, é importante. Pode desempenhar uma função narrativa (como ocorre com a harmonia tocada pela espaçonave de Close Encounters of the third kikind/Contatos imediatos de terceiro grau); é a base do musical; e fornece um forte acompanhamento emocional aos momentos cruciais do filme. A música foi a primeira forma de som introduzida no cinema, e não o uso “diegético” (isto é, a ações ou fatos contidos na narrativa), embora atualmente seja a sua aplicação básica. A ilusão do realismo depende do uso diegético do som (p.63).
Segundo Simon Frith… a música amplifica o estado emocional ou a atmosfera, e também tenta transmitir a “importância emocional” de uma cena; ele chama isso de realidade emocional da música cinematográfica, cujo objetivo é aprofundar a sensação de realismo no filme, dar a textura emocional que lhe falta (p.64).
O argumeno final de Frich é provavelmente o mais importante. Música e imagem não têm muito em comum com meios de comunicação; não são entendidos pelo público de uma maneira direta, linear, mas irracionalmente, emocionalmente, individualmente. Levi Strauss (1966), diz que o significado da música não pode ser determinado por aqueles que a tocam, mas somente por quem está ouvindo. Barthes (1977) observa que é impossível descrever a música sem adjetivos – isto é, deve ser entendida em termos de seus efeitos subjetivos e não por intermédio de um dicionário de significados (p.65). 
Mise-en-scène (colocando em cena) 
Nesse segmento quero enfatizar a importância de outros aspectos da imagem: a montagem do cenário, o figurino, o arranjo e o movimento das personagens, as relações espaciais e a colocação dos objetos que se tornaram importantes na narrativa (a arma do assassino, a carta misteriosa, oo reflexo do espelho) p.65.
No cinema a construção de um universo social é autenticado pelos detalhes da mise-en-scène. Além do mais a narrativa avança por intermédio do arranjo de elementos no quadro (p.66).
Astros e estrelas têm uma função que está além de um determinado filme e que somente em parte é incorporada neste filme. Os atores e atrizes não representam personagens
simplesmente, tornando-se eles mesmos invisíveis, ao contrário, as personagens tornam-se visíveis por meio de atores; e é sempre importante entender esses significados específicos de artistas individuais que fazem parte da caracterização (p.66).
Edição
Há uma variedade de técnicas de edição. Já mencionamos o fade out e o dissolve. Há o wipe, em que uma imagem substitue outra, precedida por uma linha de demarcação que ocorre através da tela. O método mais frequente nos dias de hoje é o simples corte de uma tomada para a próxima. Vários dispositivos de transição podem ser usados ou inventados para suavizar o corte tornando-o menos súbito ou desconcertante: sobreposição de som de uma tomada para outra… a maior parte dos filmes realistas evitam cortes súbitos (p.68).
Sequências de ação podem ganhar mais dramaticidade e complexidade se o corte ocorrer em momentos de muita ação; quando, por exemplo, um carro está prestes a bater pode-se experimentar várias perspectivas distintas do mesmo momento. A velocidade, andamento ou ritmo da edição também é importante. O filme documentário tende a usar menos a edição do que o filme narrativo, e os filmes sócio-realistas tendem a limitar esse comportamento (p.68).
O cinema é um complexo de sistemas de significação e seus significados são o produto da combinação daqueles (p.69).
A leitura do filme 
Inevitavelmente precisamos examinar minunciosamente o quadro, formar hipóteses sobre a evolução da narrativa, especular sobre os posssíveis significados, tentar obter algum domínio sobre o filme à medida que ele se desenvolve. O processo ativo da interpretação é essencial para a análise do cinema e para o prazer que ele proporciona (p.69).
Mas os filmes não são eventos culturais autônomos. Entendemos os filmes em termos de outros filmes, seu universo em termos de outros universos. “Intertextualidade” é um termo empregado para descrever o modo como qualquer texto de um filme será entendido mediante nossa experiência ou percepção de textos de outros filmes (p.69). O momento de heroísmo em Silverado, quando Emmet tira a bandagem e milagrosamente encontra forças para lutar mais uma vez, demonstra que se trata, claramente, de uma paródia da suspensão do realismo em muitos filmes de faroeste anteriores. Ver Silverado sem o conhecimento que ele pressupõe das convenções dos filmes de faroeste seria achá-lo idiota e inexplicavelmente irrealista (p.69).
Os filmes são, portanto, vistos dentro de um contexto social e cultural que inclui mais do que os textos de outros filmes. O cinema desempenha uma função cultural, por meio de suas narrativas, que vai além do prazer da história (p.69).
Como o autor define o cinema como prática social?
O autor concebe o cinema como uma atividade que vai além da sua dimensão recreativa. Segundo ele, o cinema, por meio da combinação de seus diversos recursos e “linguagens”, desempenha uma função cultural. Assim, numa obra cinematográfica os elementos deste complexo de “linguagens” ( a música, o jogo de luz e sombras, o enquadramento das cenas, o som, o manejo da câmera, etc.) se combinam, agregando sentidos e incorporando seus discursos ao filme, os quais deseja-se que sejam apreendidos pelo expectador. 
Aluno: Marcos Benício de Souza Farias

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