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O diagnóstico de talassemia beta major é facilmente estabelecido durante a infância, com base na presença de anemia grave acompanhada dos sinais típicos de eritropoiese ineficaz maciça: hepatoesplenomegalia, microcitose profunda, esfregaço sanguíneo característico (eritrócitos microcíticos e hipocrômicos que lembram os da anemia ferropriva grave e presença também de muitos eritrócitos elípticos e em forma de gota) e níveis elevados de HbF, HbA2 ou ambas. A maioria dos pacientes necessita de terapia crônica de hipertransfusão para manter um hematócrito em torno de 27-30% a fim de inibir a eritropoiese e esplenectomia, que é indispensável caso a necessidade de transfusão anual aumente mais de 50%. Suplementos de ácido fólico podem ser úteis. Deve-se fazer avaliação precoce à procura de deficiências endócrinas que podem decorrer da sobrecarga de ferro (intolerância à glicose, disfunção tireóidea e início tardio da puberdade), infecções, úlceras da perna e doença do trato biliar. Além disso é aconselhável vacinação precoce com Pneumovax, prevendo uma futura esplenectomia. - Talassemia β intermédia – Os estigmas são semelhantes, mas a sobrevivência não depende de hipertransfusão crônica. A esplenectomia pode trazer benefícios para alguns pacientes. - Talassemia β minor ou traço talassêmico – Habitualmente há microcitose profunda e hipocromia com células em alvo, porém com anemia apenas mínima ou discreta. Em geral há elevação da HbA2. São essenciais o aconselhamento genético e a orientação do paciente. Os pacientes devem ser advertidos de que seu quadro pode ser confundido com um quadro de deficiência de ferro. Pode ocorrer deficiência de ferro durante a gravidez e em caso de sangramento crônico. Síndromes de talassemia α Há quatro talassemias α clássicas: o traço da talassemia α-2 (deleção de um dos 4 loci da globina α), o traço da talassemia α-1 (dleção de 2 loci), a doença da HbH (deleção de 3 loci) e a hidropsia fetal com Hb Bart (deleção dos 4 loci). Há também formas de talassemia α sem deleção. - traço da talassemia α-2 – estado portador silencioso e assintomático. - traço da talassemia α-1 – assemelha-se à talassemia beta minor. A prole duplamente heterozigota para talassemia α-2 e talassemia α-1 exibe um fenótipo mais grave, denominado doença da HbH. - doença da HbH – A produção de HbA é de apenas 25-30% do normal. O feto acumula algumas cadeias β não-pareadas e, em adultos, as cadeias β não-pareadas se acumulam e são solúveis o suficiente para formar tetrâmeros β4, denominados HbH. Os pacientes com doença da HbH apresentam talassemia intermédia, com anemia hemolítica moderadamente grave, mas com eritropoiese ineficaz mais leve. É comum a sobrevida do paciente até a meia-idade sem necessidade de transfusão. - hidropsia fetal – estado homozigoto para deleção cis da talassemia α-1, que resulta em ausência total da síntese da globina α, o que significa que não há produção de qualquer hemoglobina fisiologicamente útil após o estágio embrionário. O excesso de globina γ forma tetrâmeros denominados Hb Bart (γ4) que têm afinidade muito alta pelo O2, quase não liberando-o para os tecidos fetais e resultando em asfixia tecidual, edema (hidropsia fetal), ICC e morte in útero. Diagnóstico e tratamento: Os indivíduos com traço de talassemia α podem exibir hipocromia e microcitose leves, habitualmente sem anemia, e níveis normais de HbA2 e HbF, necessitando somente de aconselhamento genético. A doença da HbH, semelhante à talassemia beta intermédia, apresenta a complicação adicional de que a hemoglobina HbH comporta-se como uma hemoglobina moderadamente instável. É necessária esplenectomia se houver desenvolvimento de anemia excessiva ou necessidade de transfusão. Fármacos oxidativos devem ser evitados. A sobrecarga de ferro pode levar à morte dos pacientes mais gravemente acometidos. Prevenção O diagnóstico pré-natal das síndromes talassêmicas já está disponível em ampla escala e se baseia na amplificação do DNA fetal por PCR, sendo a amostra obtida por amnioscentese ou biopsia das vilosidades coriônicas. VARIANTES ESTRUTURAIS TALASSÊMICAS As variantes estruturais talassêmicas caracterizam-se por síntese defeituosa e estrutura anormal. Hemoglobina Lepore (α2(βδ)2) Os alelos da Hb Lepore apresentam um fenótipo semelhante ao da talassemia β, exceto pela presença adicional de 2-20% de Hb Lepore. Os heterozigotos compostos para Hb Lepore e um alelo da talassemia beta clássico também podem apresentar talassemia grave. Hemoglobina E A HbE é levemente instável, porém não o suficiente para afetar significativamente o tempo de sobrevida dos eritrócitos. Os heterozigotos assemelham-se aos indivíduos com traço da talassemia β leve. Os homozigotos apresentam anormalidades um pouco mais acentuadas (microcitose, hipocromia e níveis de Hb discretamente reduzidos), porém são assintomáticos. Os heterozigostos compostos para HbE e um gene da talassemia β podem apresentar talassemia β intermedia ou talassemia β major, dependendo da gravidade do gene talassêmico co-herdado. O aconselhamento genético deve se concentrar na interação da HbE com a talassemia β. Persistência hereditária da Hb fetal Caracteriza-se pela síntese contínua de níveis elevados de HbF na idade adulta. Não há efeitos deletérios aparentes mesmo quando toda a hemoglobina produzida é HbF. HEMOGLOBINOPATIAS ADQUIRIDAS As duas hemoglobinopatias adquiridas mais importantes são a intoxicação por monóxido de carbono e a metemoglobinemia (já descrita anteriormente). O monóxido de carbono apresenta maior afinidade pela hemoglobina que o oxigênio, podendo substituí-lo e diminuir seu transporte. A carboxiemoglobina tem cor vermelho-cereja e mascara o desenvolvimento da cianose habitualmente associada a uma liberação precária de O2 para os tecidos. Em alguns pacientes com mielodisplasia, eritroleucemia ou distúrbios mieloproliferativos, pode-se observar igualmente uma forma leve de doença da HbH, insuficiente para alterar a evolução da doença subjacente. TRATAMENTO DA HEMOSSIDEROSE TRANSFUSIONAL A transfusão sanguínea crônica pode ocasionar infecção transmitida pelo sangue, aloimunização, reações febris e sobrecarga letal de ferro. (uma unidade de concentrado de hemácias contém 250-300mg de ferro, sendo o ferro assimilado em uma única transfusão de duas unidades de concentrado de hemácias igual à ingestão durante 1 a 2 anos!). Como não há mecanismos para aumentar sua excreção, o ferro se acumula. Os pacientes que recebem amis de 100 unidades de concentrado de hemácias geralmente apresentam hemossiderose. Os níveis de ferritina aumentam, seguidos de disfunção endócrina precoce (intolerância à glicose e atraso da puberdade), cirrose e miocardiopatia (cardiotoxicidade, pericardite, disritmia e insuficiência cardíaca). Sendo assim, a decisão de iniciar um suporte transfusional a longo prazo deve ser associada à instituição de tratamento com agentes quelantes de ferro. A deferoxamina é utilizada por via parenteral e exige infusão lenta crônica, proporcionando melhora da eficiência da quelação e proteção dos tecidos. É relativamente atóxica, mas há relatos de reações cutâneas localizadas, incluindo urticária, além de catarata e surdez. Mesmo com níveis relativamente moderados de sobrecarga de ferro e sem sintomas ao longo de muitos anos, verifica-se a deterioração irreversível dos órgãos-alvo. Para se obter uma sobrevida significativa a quelaçãp deve ser instituida precocemente. Outra opção de agente quelante de ferro é o deferasinox, cuja administração é oral (doses únicas diárias de 20- 30mg). Os resultados são semelhantes, mas há aumento