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PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO

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PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO E JUSTIÇA
 
Autora: Sonia Regina Vieira Fernandes*
* Mestre em Direito; professora de Direito Constitucional da Universidade Estácio de Sá; Advogada.
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INTRODUÇÃO
             Ao longo da história, o ser humano tem buscado arduamente equilibrar suas relações como os outros seres humanos, estabelecendo critérios norteadores das regras de comportamento.
            Alguns valores humanos ocidentais têm sido herdados de filósofos da antiga Grécia como Aristóteles e Platão e dos juristas romanos. A justiça é um desses valores.
            Os filósofos deram a termo justiça o sentido ético e formal, enquanto que os romanos o sentido jurídico e material.
            Os princípios fundamentais de Direito também são as grandes orientações da ordem positiva jurídica, que a percorrem e vivificam, tendo potencialidade de conduzirem a novas soluções.
            O Direito, segundo filósofos e juristas, é o veículo para a realização da justiça, que é a meta da ordem jurídica.
            O Objetivo deste trabalho é demonstrar, sucintamente, a relação dos princípios do Direito com um valor humano pregado historicamente pelos mais renomados filósofos e juristas, que é a justiça.
            Analisaremos qual a relevância dos princípios para o Direito e sua relação com a justiça, mostrando que eles constituem categorias de normas, caracterizados por serem densificação dos valores mais relevantes da ordem jurídica, que o legislador, se quiser ser coerente com sua pretensão de legitimidade e validade, deverá considerar esses princípios transcendentes ao próprio Direito positivo, conjugando-o ao ideal de justiça meditado ao longo da vida humana, por filósofos e juristas, que têm entendido, ser a justiça, a virtude total e a essência do bem viver social. 
CAPÍTULO I
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO
            A palavra princípio[1]significa começo, início, razão, base, preceito e norma. Significa ponto de partida. Para as ciências são as preposições básicas que condicionam as demais; são os alicerces do conhecimento humano.
            No Direito, os princípios constituem categoria específica de normas, caracterizadas, essencialmente, por serem densificação dos valores mais relevantes do ordenamento jurídico. Podem ser explícitos em enunciados lingüísticos ou podem estar implícitos, o que não lhes retira a posição de proeminência de que desfrutam. Têm como função essencial orientar e influenciar a interpretação e a aplicação das demais normas jurídicas, que têm o status de simples regras, bem como, por isso mesmo, de todos os atos do poder público.
A palavra princípio é equívoca. Aparece em sentidos diversos. Apresenta a acepção de começo, de início. Norma de princípio (ou disposição de princípio), por exemplo, significa norma que contém o início ou esquema de um órgão, entidade ou de programa, como são as normas de princípio institutivo e as de princípio programático. Não é nesse sentido que se acha a palavra princípios da expressão princípios fundamentais do Título I da Constituição. Princípio aí exprime a noção de mandamento nuclear de um sistema.[2]
            É necessário sublinhar que o termo princípio é utilizado, indistintamente, em vários campos do saber humano. Filosofia, Teologia, Sociologia, Política, Física, Direito e outros se servem dessa categoria para estruturarem, muitas vezes, um sistema ou um conjunto articulado de conhecimentos a respeito dos objetos cognoscíveis exploráveis na própria esfera de investigação e de especulação a cada uma dessas áreas do saber.
            Seja lá qual for o campo do saber, princípio designa a estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por uma idéia mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde as demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem e/ou se subordinam.
            No Direito, tem-se usado o termo princípio ora para designar a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, ora para designar determinado tipo de normas jurídicas e ora para estabelecer os postulados teóricos, as proposições jurídicas construídas independentemente de uma ordem jurídica concreta ou de institutos de direito ou normas legais vigentes.
1.1- Princípios fundamentais de Direito e sua relevância
            Toda sociedade é regida por determinados valores que constituem os postulados originários e primários do agrupamento coletivo.
            Para que exista uma sociedade, é fundamental uma comunhão mínima de valores que propiciem as diretrizes do que e como se pretende conduzir.
            O Direito, em seu propósito de realizar a justiça, buscará operacionalizar esses valores, surgindo, daí, o ordenamento jurídico como um conjunto de normas que expressam os valores de uma sociedade.
            Os princípios jurídicos representam os valores materiais que a sociedade elegeu à justiça, que nos mostram como alcança-la. Dworkin[3]os define como um “standart” que há de ser observado por ser uma exigência da justiça, da equidade ou de alguma outra dimensão da moralidade. Constituem as proposições primárias do direito, estão vinculados àqueles valores fundantes da sociedade, que exprimem o que foi por ela eleito com sendo justo.
            Segundo Paulo Bonavides[4], o exame teórico da juridicidade dos princípios é indissociável de uma prévia indagação acerca da eficácia normativa dos princípios gerais de Direito cujo ingresso nas Constituições se faz com força positiva incontrastável, perdendo, desde já, grande parte daquela clássica e alegada indeterminação, habitualmente invocada para retirar-lhes o sentido normativo de cláusulas operacionais.
            A inserção constitucional dos princípios ultrapassa, de último, a fase hermenêutica das chamadas normas programáticas. Eles operam nos textos constitucionais da segunda metade deste século uma revolução de juridicidade sem precedente nos anais do constitucionalismo. De princípios gerais se transformaram em princípios constitucionais.
            Segundo o mesmo autor, todo discurso normativo tem que colocar, em seu raio de abrangência, os princípios, aos quais as regras se vinculam.
            Jorge Miranda[5] ressalta a função ordenadora dos princípios fundamentais, bem como sua ação imediata, enquanto diretamente aplicáveis ou capazes de conformarem as relações político-constitucionais, aditando, ainda, que a ação imediata dos princípios consiste, em primeiro lugar, em funcionarem como critério de interpretação e de integração, pois são eles que dão coerência geral ao sistema.
Princípios axiológicos fundamentais – correspondentes aos limites transcendentes do poder constituinte, ponte de passagem do Direito natural para o Direito positivo.
....................................
Pela sua própria natureza e função, os princípios não carecem de sede fixa no texto constitucional; os que lhe não sejam exteriores (ou anteriores) podem dele ser simplesmente induzidos. Raras vêm a ser, no entanto, as Constituições, nas quais, em lugares variáveis, não apareçam enumerados princípios de que terá havido consciência aquanto da sua elaboração ou a partir de alguns dos quais terá pretendido mesmo organizar o sistema constitucional.[6]
            Segundo Paulo Bonavides[7], a juridicidade dos princípios passa por três distintas fases: a jusnaturalista, a positivista e a pós-positivista.
1.2- O jusnaturalismo e os princípios do Direito
            A fase jusnaturalista é a mais antiga e tradicional.
            Nessa fase, os princípios habitavam esfera abstrata e sua normatividade, basicamente nula e duvidosa, contrastava com o reconhecimento de sua dimensão ético-valorativa de idéia que inspira os postulados de justiça.
            Segundo Paulo Bonavides[8], a fase jusnaturalista dominou a dogmática dos princípios por um longo período até o advento da Escola histórica do Direito. Cedeu lugar, em seguida, a um positivismo tão forte, tão dominante, tão imperial,que ainda este século os cultores solitários e esparsos da doutrina do Direito Natural nas universidades e no meio forense pareciam se envergonhar do arcaísmo de professarem uma variante da velha metafísica jurídica.
            A fase jusnaturalista se caracteriza por sustentar a vigência, a validade e a eficácia do Direito natural, superior a todo e qualquer Direito Positivo.
Há, com efeito, uma terceira corrente que não compreende os princípios gerais de direito tão-somente em função das normas positivas, historicamente reveladas no Brasil e nas demais nações, entendendo que eles se legitimam como pressupostos de natureza lógica ou axiológica, isto é, como princípios de Direito Natural. No tocante ao assunto que estamos analisando, cumpre distinguir entre os autores como Giorgio Del Vecchio, que reduzem todos os princípios gerais do Direito a princípios de Direito Natural, e os que põem o problema em outros termos entendendo que a vinculação ao Direito Natural não exclui que haja princípios gerais de direito no plano positivo.
A idéia de um Direito Natural, distinto do Direito Positivo, é muito antiga. Nós a encontramos nas manifestações mais remotas da civilização ocidental a respeito do problema da lei e da justiça, o mesmo ocorrendo na cultura do Oriente. [9]
            Segundo Paulo Dourado de Gusmão[10], o jusnaturalismo, através dos tempos, tem influenciado reformas jurídicas e políticas, que deram novos rumos às ordens políticas européia e norte-americana, como por exemplo, a Declaração da Independência dos Estados Unidos (1776), a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e a Revolução Francesa, e tem como princípio a consideração do direito natural como direito justo por natureza, independente da vontade do legislador, derivado da natureza humana ou dos princípios da razão, sempre presente na consciência do homem.
            A corrente jusnaturalista concebe os princípios gerais de Direito, segundo assinala Flórez-Valdés[11], em forma de “axiomas jurídicos” ou normas estabelecidas pela reta razão. São os princípios de justiça, constitutivos de um Direito ideal. São um conjunto de verdades objetivas derivadas da lei divina e humana.
            Segundo Aurélio Wander Bastos[12],o jusnaturalismo influenciou e influencia o Direito Moderno e está dividido em duas grandes correntes: o jusnaturalismo teológico e o jusnaturalismo racionalista. As duas correntes admitem um Direito segundo a natureza do homem que às suas diferentes organizações políticas e sociais e que não coincide necessariamente com o direito das convenções, dos acordos, do entendimento.
Para o jusnaturalismo teológico, o Direito é uma revelação divina e transcende aos próprios homens. Para Tomás de Aquino, o homem é um mero portador dos princípios revelados da vontade divina, que devem presidir a sua organização política e social. O racionalismo jusnaturalista não foge do princípio idealista geral, mas admite, como Grotius, que existe um Direito imanente à natureza do homem e que as organizações políticas e sociais são formas especialíssimas de concretizar o Direito natural.[13]
            As duas correntes jusnaturalistas partem do pressuposto de que existe uma verdadeira identidade entre o Direito e a Justiça, o que significa que não existe Direito injusto. Para os jusnaturalistas o Direito é sempre um ensaio de ser Direito Justo e nunca a apoteose da injustiça, o que significa que a injustiça não é Direito.
1.3- O positivismo jurídico e os princípios do Direito
            A segunda fase da teorização dos princípios vem a ser a juspositivista, com os princípios entrando já nos Códigos como fonte normativa subsidiária ou para garantir o reinado absoluto da lei.
            A concepção positivista escreve Flores-Valdés[14], sustenta basicamente que os princípios gerais de Direito equivalem aos princípios que informam o Direito Positivo e lhe servem de fundamento.
Os princípios gerais são apenas, ao meu ver, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípios leva a engano, tanto que é velha questão entre os juristas se os princípios gerais são normas. Para mim não há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as outras.[15]
            Para os juspositivistas, o Direito é a lei, o aplicador para tirar suas conclusões, deve apenas comparar o pressuposto legal com o caso sujeito à sua aplicação. A aplicação da lei é uma conclusão mecânica que dispensa qualquer explicação ou interpretação.
            Segundo Aurélio Wander Bastos[16], não há como negar a importância do juspositivismo na ordem jurídica da sociedade contemporânea. Os países continentais ainda guardam na sua formação as nítidas características do juspositivismo e, da mesma forma, ainda são acentuadas as reações às propostas de dinamização e ampliação dos espaços interpretativos do Direito.
            Segundo o mesmo autor, poucas são as exceções nos Tribunais que reconhecem na interpretação legal fonte do próprio Direito e, em geral, predomina a posição positivista de que o Legislativo legisla, e, como tal, cria Direito, e o judiciário aplica o Direito. As novas propostas de construção legal têm tímida passagem entre os Tribunais, muito embora a pressão sociologista tenha crescido e se desenvolvido, da mesma forma que a utilização de recursos jurisprudenciais no processo de decisão tem se ampliado como forma de acompanhar a dinâmica social e evitar o atropelamento do Direito escrito pelos fatos.
            O positivismo jurídico surgiu como tentativa de amoralização do Direito.
            Segundo Hans Kelsen[17], é incontestável que a norma deve ser moralmente justa, mas essa justiça não pode ser estudada pela ciência jurídica, que se descreve normas. Conhecido é apenas o valor legal ou validade, que consiste na conformidade, objetivamente verificável pela razão, de uma norma com outra que lhe é superior.
            Ainda segundo Kelsen, a ciência jurídica deve tão-somente procurar a base de uma ordem legal, ou seja, o fundamento objetivo e racional de sua validade legal, não num princípio metajurídico de moral ou direito natural, mas numa hipótese de trabalho lógico-ténico-jurídica, supondo aquela ordem legal validamente estabelecida. A validade da norma jurídica é explicada pelas normas jurídicas hierarquicamente superiores, sendo que a validez da norma constitucional é justificada pela norma hipotética fundamental, que não é positiva, mas lógica, e suposta válida, sob pena de se tornar inválida toda ordem jurídica dela dependente.
1.4- O Pós-positivismo e os princípios do Direito
            A terceira fase da juridicidade dos princípios é a do pós-positivismo, que corresponde aos grandes momentos constituintes das ultimas décadas desde século. As novas constituições promulgadas acentuam a hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre o qual assenta todo o edifício dos novos sistemas constitucionais.
            Segundo Paulo Bonavides[18], é na idade do pós-positivismo que tanto a doutrina do Direito Natural como a do velho positivismo ortodoxo vêm abaixo, sofrendo golpes profundos e crítica lacerante, provenientes de uma reação intelectual implacável, capitaneada sobretudo por Dworkin, jurista de Harvard. Sua obra tem valiosamente contribuído para traçar e caracterizar o ângulo novo de normatividade definitiva reconhecida aos princípios.
Portanto, uma teoria política do direito completa inclui pelo menos duas partes principais: reporta-se tanto aos fundamentos do direito – circunstâncias nas quais proposições jurídicas específicas devem ser aceitas com bem fundadas ou verdadeiras – quanto à força do direito – o relativo poder que todas e qualquer verdadeira proposição jurídica de justificar a coerção em vários tipos de circunstâncias excepcionais.[19]
            Assim, Dworkin trata os princípios como Direito, abandonando a doutrina positivista e reconhecendo a possibilidade de que tanto uma constelação de princípios quanto uma regrapositivamente estabelecida podem impor uma obrigação legal.
            Paulo Bonavides[20] afirma que a proclamação da normatividade dos princípios em novas formulações conceituais e os arrestos das Cortes Supremas no constitucionalismo contemporâneo corroboram essa tendência irresistível que conduz à valoração e eficácia dos princípios como normas-chaves de todo o sistema jurídico; normas das quais se retirou o conteúdo inócuo de programaticidade, mediante o qual se costumava neutralizar a eficácia das Constituições em seus valores reverenciais, em seus objetivos básicos, em seus princípios cardeais.
            O mesmo autor conclui que:
Daqui se caminha para o passo final da incursão teórica: a demonstração do reconhecimento da superioridade e hegemonia dos princípios na pirâmide normativa; supremacia que não é unicamente formal, mas, sobretudo material, e apenas possível na medida em que os princípios são compreendidos e equiparados e até mesmo confundidos com os valores, sendo, na ordem constitucional dos ordenamentos jurídicos, a expressão mais alta da normatividade que fundamenta a organização do poder.
As regras vigem, os princípios valem; o valor que neles se insere se exprime em graus distintos. Os princípios, enquanto valores fundamentais, governam a Constituição, o regime, a ordem jurídica. Não são apenas lei, mas o Direito em toda a sua extensão, substancialidade, plenitude e abrangência.
CAPÍTULO II
A JUSTIÇA COMO FUNDAMENTO DO DIREITO
            O Direito deve ser sempre uma tentativa de realização de valores, visando à consecução de fins necessários ao homem e à sociedade. Sua finalidade é implantar uma ordem justa na vida social.
            Além de ser uma ciência cultural ou humana, o Direito é uma ciência normativa. As normas jurídicas são normas éticas, pois condicionam o comportamento humano em função da realização de um valor.
            Se o Direito é essencialmente uma ciência normativa e a estrutura lógica de toda proposição jurídica é um dever ser, qual a direção ou o ideal visado pela norma? Qual o valor fundamental e o princípio jurídico que orientam esse dever-ser?
            Nas normas éticas existe um dever ser. O destinatário deve agir de determinada forma porque assim realizará um determinado valor, escolhido previamente pelo criador da norma. Na realidade, o destinatário da norma ética poderia agir de outra forma, que seria possível e até vantajosa em certas circunstâncias, mas surge a norma para indicar-lhe um único caminho a seguir. O caminho portará o destinatário de realizar um valor.
            Sabemos que a lei deve ser justa, assim como toda e qualquer decisão baseada nas normas jurídicas devem ser justas. Del Vecchio[21] escreveu que a pedra angular de todo edifício jurídico é a noção de justo.
            Além disso, a noção de princípios gerais de Direito, a que devem, a cada momento, recorrer o juiz e os demais aplicadores da lei[22], corresponde fundamentalmente aos princípios de justiça.
            Mas, o que é justiça? Quais as suas características, sua natureza, suas espécies, seu fundamento?
            A palavra justiça é equívoca. Significará às vezes a atividade dos Tribunais, é tida como atributo divino e é freqüentemente encarada ainda hoje, como virtude total.
            Tercio Sampaio Ferraz Jr[23] verifica que nenhum homem pode sobreviver numa situação em que a justiça, enquanto sentido unificador do seu universo moral, foi destruída, pois a carência de sentido torna a vida insuportável. Reconhece que nesses termos existenciais, a justiça confere ao direito um significado no sentido de razão de existir. Diz que o Direito deve ser justo ou não tem sentido a obrigação de respeita-lo, ou seja, a perda ou a ausência do sentido de justiça é, por assim dizer, o máximo denominador comum de todas as formas de perturbação existencial, pois o homem ou a sociedade, cujo senso de justiça foi destruído, não resiste mais às circunstâncias e perde, de resto, o sentido de dever-ser do comportamento.
            Para os seguidores do positivismo jurídico, o direito se reduz a uma imposição da força social, e a justiça é considerada um elemento estranho à sua formação e validade. Para alguns, como Kelsen[24], os critérios da justiça são simplesmente emocionais e subjetivos e sua determinação deve ser deixada à religião ou à metafísica.
            Norbert Bobbio[25] em seus escritos sobre o Direito e o Estado no pensamento de Emanuel Kant, apresenta uma definição de Kant sobre uma ação justa: Uma ação é justa, quando, por meio dela, ou segundo a sua máxima, a liberdade do arbítrio de um pode continuar com a liberdade de qualquer outro segundo uma lei universal. Nesta definição Bobbio conclui que, Kant neste momento, apresenta um ideal de justiça, isto é, justiça como liberdade.
            Bobbio[26], além de Kant, faz referências a outras teorias da justiça: Filosofia Política de Hobbes, Aristóteles e do Estado Liberal.
            Na filosofia política de Hobbes, Bobbio destaca que a Justiça é uma ordem, que considera como fim último do Direito, a paz social. Ela sustenta que a exigência fundamental segundo a qual os homens criaram o ordenamento jurídico é de sair do estado de anarquia e de guerra, no qual viveram no estado de natureza. O direito fundamental que esta teoria deseja salvaguardar é o direito à vida.
            Da teoria de Aristóteles, Bobbio destaca que a justiça é igualdade. Segundo essa concepção, que é a mais antiga e tradicional, o fim do direito, ou seja, das regras coercitivas que disciplinam a conduta dos homens na sociedade, é de garantir a igualdade, seja nas relações entre os indivíduos (o que é chamada de justiça comutativa), seja nas relações entre o Estado e os indivíduos (justiça distributiva).
            Na teoria do Estado Liberal, Bobbio destaca que justiça é liberdade, isto é, o fim último do Direito é a liberdade. A razão última pela qual os homens se reuniram em sociedade e constituíram o Estado, é a de garantir a expressão mxima da própria personalidade, que não seria possível se um conjunto de normas coercitivas não garantissem para cada um uma esfera de liberdade, impedindo a violação por parte dos outros. O Direito é concebido como um conjunto de limites às liberdades individuais, de maneira que cada um tenha a segurança de não ser lesado na própria esfera de liberdade até o momento em que também não lese a esfera de liceidade dos outros.
            Assim, essas definições ou acepções de justiça não esgotam seu significado, pois teríamos de escrever um trabalho extenso para mostrar tudo que a literatura filosófica e jurídica têm a respeito.
            Tomemos como base do nosso trabalho a definição de justiça meditada por Aristóteles[27] em sua obra Ética a Nicômaco.
  2.1- A Justiça para Aristóteles
            Desde a antiguidade se procuram indicar especificações da justiça, ou seja, manifestações desta figura sempre unitária. É básica a meditação de Aristóteles[28] sobre a matéria.
            Para Aristóteles a justiça é a excelência moral, é uma forma de igualdade, que é a virtude social. É o exercício da autonomia no respeito às igualdades e desigualdades sociais, pois a igualdade vai limitar a liberdade individual, quando se constata que entre os indivíduos existem diferenças pessoais, econômicas etc. A justiça será, então, o resultado de um processo de intercomunicabilidade entre os indivíduos que materializam a linguagem jurídica.
            Ele define justiça como aquela disposição de caráter que torna as pessoas propensas a fazer o que é justo, que as faz agir justamente e a desejar o que é justo. Conclui, também, que o homem sem lei é injusto e o cumpridor da lei é justo, tendo em vista todos os atos conforme a lei são atos justos em certo sentido, pois os atos prescritos pela arte do legislador são conforme a lei.
            Distingue Aristóteles dois termos de justiça:
a)      Justiça Distributiva: è aquela que preside à distribuição das vantagens entre todosos membros da sociedade. Quando a sociedade dá a cada particular o bem que lhe é devido segundo uma igualdade proporcional ou relativa. O grupo social reparte aos particulares aquilo que pertence a todos, assegurando-lhes uma eqüitativa participação no bem comum, conforme a necessidade, o mérito e a importância de cada indivíduo. Igualdade proporcional é a que se realiza na distribuição dos benefícios e dos encargos entre os membros de uma comunidade, considerando-se a situação das pessoas. Assim, pela justiça distributiva, a sociedade visa assegurar ao particular sua parcela no bem comum, distribuída conforme a posição que ele ocupa como membro do grupo social, tendo em vista o seu mérito.
Assim, o justo é o proporcional, e o injusto é o que viola a proporção. Quanto a esse último, um dos termos se torna grande demais e o outro muito pequeno, como efetivamente acontece na prática, pois o homem que age injustamente fica com uma parte muito grande daquilo que é bom, e o que é injustamente tratado fica com uma parte muito pequena.[29]
      Embora a justiça distributiva definida por Aristóteles vise o interesse do particular, ela corresponde a uma função social, pois a sociedade, ao impor restrições aos seus membros, torna-se depositária de riquezas, de utilidades que deve redistribuir, proporcionalmente, aos indivíduos que a compõem.
b)     Justiça Comutativa: Designada por Aristóteles como uma justiça reparadora e repressiva. É a que preside às relações dos indivíduos entre si. O devido pelos indivíduos é rigoroso, por dizer respeito a um direito próprio da pessoa. É a justiça corretiva, que tanto surge nas relações voluntárias como nas involuntárias. Esta forma do justo, segundo Aristóteles, tem um caráter diferente da justiça distributiva, pois a justiça que distribui bens públicos está sempre de acordo com a proporção.
A justiça nas transações entre um homem e outro é efetivamente uma espécie de igualdade, e a injustiça nessas relações é uma espécie de desigualdade, todavia não de acordo com a espécie de proporção que citamos, e sim de acordo com a proporção aritmética. Com efeito, é indiferente que um homem bom tenha lesado um homem mau, ou ao contrário, e nem se é um homem bom ou mau que comete adultério; a lei considera apenas o caráter distintivo do delito e trata as partes como iguais, perguntando apenas se uma comete e a outra sofre injustiça, se uma é autora e a outra é vítima do delito.[30]
      Resumindo, segundo Tercio Sampaio Ferraz Jr[31], no livro V de Ética a Nicômaco, Aristóteles cuida da justiça como virtude, enquanto uma qualidade do autor e de suas obras, do agente e de sua ação. No aspecto formal, ela corresponde à idéia de proporcionalidade aritmética e geométrica. A distinção entre, respectivamente, justiça comutativa, ou a virtude da proporcionalidade entre as coisas de sujeitos pressupostamente iguais entre si, e justiça distributiva, ou a virtude da proporcionalidade entre as coisas de sujeitos diferentes, apontava para a igualdade como o cerne as justiça. A noção de igualdade conferia em termos de equilíbrio proporcional uma espécie de racionalidade à justiça enquanto código doador de sentido (moral) às regras de convivência.
 
CONCLUSÃO
 
      Podemos concluir que o Direito deve visar sempre a tentativa de realização dos valores humanos, principalmente a justiça, para que possa haver equilíbrio e igualdade sociais. A finalidade do Direito é implantar a ordem justa na vida social.
      A justiça é a condição fundamental de todos os valores, e segundo Miguel Reale[32] é a condição transcendental de sua possibilidade como atualização histórica. Ela vale para que todos os valores valham. A justiça, que compendia todos os valores, é a ratio juris, ou seja, a razão de ser ou fundamento da norma, ante a impossibilidade de se conceber uma norma jurídica desvinculada dos fins que legitimam sua vigência e eficácia.
A justiça deve respaldar o exercício do poder que elabora a norma, legitimando-o; isto é assim porque a norma jurídica traduz interesses e ideologias do órgão legiferante. A justiça exige que todos os esforços legais se dirijam no sentido de atingir a mais perfeita harmonia na vida social, possível nas condições de tempo e lugar.
O justo objetivo, e não a vontade individual, é que constitui o objeto do Direito, que é o bem devido a outrem segundo certa igualdade, numa equivalência de quantidade.
O Direito deve corresponder aos ideais e aos sentimentos de justiça da comunidade que rege, e a norma jurídica deve ser o meio para alcançar a finalidade de justiça almejada pela sociedade.
Por isso, pode-se dizer que a idéia de justiça que devem conter o Direito e a norma jurídica, além de ser um valor, é um verdadeiro princípio e ideologia, pois se assenta na concepção de mundo que emerge das relações concretas sociais, já que não pode subsistir desconectada da história. Eis porque a leitura das concepções de justiça há de ser a da situação na qual surgiu tal concepção.
Assim, dizer que uma dada ação, norma e política são justas implica dizer que determinadas pessoas têm direitos a determinados benefícios; e isto, por sua vez, significa dizer que outras pessoas têm o dever de não intervir.
Finalmente, vale destacar, que os problemas sociais relativos à justiça surgem nas comunidades porque os seres humanos estão essencialmente interessados em si mesmos e os bens são essencialmente concentrados nas mãos de poucos.[33]

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